A VIDA INTERIOR
Côn. José Geraldo Vidigal de Carvalho*
Para o autêntico seguidor de Cristo é louvável sempre o empenho em viver honestamente, tendo o ideal de observar fielmente os mandamentos divinos compendiados no Decálogo. Entretanto, é preciso algo mais, a saber, crescer continuamente na fé, firmar-se sem cessar na esperança e se abrasar na caridade, intentando participar intensamente na vida trinitária. É que o cristão está envolvido nas delicadezas de Deus, mas cumpre no decorrer das horas do dia a lembrança de que este Senhor Onipotente habita lá no interior de cada um pela graça santificante. Isto significa usufruir a vida sobrenatural o mais plenamente possível dentro das limitações humanas. Há dentro de cada batizado um tesouro infinito que é preciso saber apreciar e explorar. Desta união com a Trindade Santa resulta inclusive uma recitação mais fervorosa das demais orações cotidianas. É preciso, porém, estar ininterruptamente aderido a Deus, ainda que seja por breves pensamentos repletos de amor por entre as múltiplas atividades de cada hora. Trata-se de abrir para a alma o horizonte das realidades eternas. Há barreiras, contudo, que devem ser apartadas através da intenção de fazer todas as coisas para honra e glória do Ser Supremo. Em tudo que se pratica é Ele quem age em cada um, como bem se expressou o profeta Isaías (Is 26,12). Aliás, Jesus foi claro: “Sem mim, vós nada podeis fazer” (Jo 15,5), mas nem sempre se pensa nesta sublime verdade. Se Ele age no ser humano, e disto se tem consciência, tudo é feito com total capricho, atenção e eficiência. Deus deve se tornar o fim e o princípio de todas as ações. Dá-se então um progresso contínuo e não se desfalece perante as fraquezas naturais a seres finitos. Não há lugar para o orgulho perante o bem praticado, porque a força vem do alto, conforme declarou São Paulo: “Eu tudo posso naquele que é a minha fortaleza” (Fl 4,13). O mesmo Apóstolo, entretanto, também afirmou: “Eu me gloriarei de minhas fraquezas, para que habite em mim a força de Cristo (2 Cor 12,9), É que, segundo ele, o justo vive de fé” (Rm 1,1). Daí ser imprescindível crescer constantemente nesta virtude. Crer na realidade de Deus “no qual nós vivemos, nos movemos e existimos (At 17,28). A fé é um guia severo, mas infalível. Atrás do veu das apar\ências, ela descerra a vitória perene (1 Jo 5,4). Faz ter ânimo a despeito de todos os fatores humanos que tentam impedir o esforço rumo à perfeição. Ela leva o cristão a contar apenas com Deus que se torna para o fiel uma rocha inabalável. Mostra que, de fato, Deus está por toda parte, portanto bem próximo de cada um. Não é um Deus longíquo, distante. Ele dá ao que nele crê o querer e o realizar tudo (Fl 2,13). De si mesmo, ninguém é capaz nem de mover um de seus dedos. Nada escapa à ação divina. Apenas a depravação da vontade que se volta contra Ele é algo que não vem dele. Como o ser humano é livre precisa também estar plenamente atento à ação divina para a realização das boas obras, das mínimas ações nas quais há uma grandeza singular. Mister se faz, porém, afastar qualquer obstáculo à ação divina, Então o cristão se faz, verdadeiramente, um cristóforo, deífico no total sentido do termo. Para que esta luminosidade celeste não se obscureça no decorrer das horas importa progredir nas virtudes teologais. Pela fé se verifica a adesão à vida da graça. Pela esperança vem a certeza da ajuda para estar unido a Deus neta terra e, um dia, por toda a eternidade e é pelo amor que já se possui este Deus desde agora. Aí está o esencial de qualquer oração sólida e profunda. Donde o conselho do Livro da Sabedoria: “Procurai-O na simplicidade do coração” (Sb 1,1). Se é preciso ao ser humano descomplicar tudo na sua existência, isto deve acontecer sobretudo nas realações com o Todo-poderoso Senhor que é a simplicidade absoluta. Ele quer por isto mesmo uma sinceridade absoluta. O fiel pode desta forma dizer a Ele que, não obstante toda sua pequenez, O adora, nele confia e O ama de todo coração. Este cristão já não teme mais nada e repete com São Paulo: “Se Deus está conosco, quem estará contra nós” (Rm 8,31). Desta maneira, o cristão passa a existir numa atmosfera de serenenidade. Nas dificuldades procura logo o refúgio no seu Senhor e nele encontra a luz, o consolo, a energia para não desfalecer perante as dificuldades e os sacrifícios. Pode repetir o que está no Livro Cântico dos Cânticos.: “Eu encontrei aquele que a minha alma ama, eu o abracei e não deixarei mais” (Cant 3,4). * Professor no Seminário de Mariana durante 40 anos.
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