quinta-feira, 27 de outubro de 2022

 

O FIM DOS TEMPOS

Côn. José Gerald Vidigal de Carvalho*

Um capítulo de São Lucas nos leva a meditar o que Jesus fala sobre o futuro (Luc 21,5-19). Ele descreve um futuro longínquo, sua volta no fim dos tempos e todo um conjunto de acontecimentos misteriosos, cuja data fica oculta no segredo do Pai Quando Ele evoca o cenário do fim, Jesus o faz sempre numa linguagem tradicional dos apocalipses e num grande quadro cósmico que engloba o céu e a terra, o sol, a lua e as estrelas. Jesus tem também em vista fatos mais próximos como a ruina do Templo, o julgamento de Jerusalém e retoma as ameaças dos profetas contra a cidade infiel. Enfim, Jesus faz alusão às provas de sua comunidade, às perseguições que sofrerão os discípulos através dos tempo da Igreja. É de se notar que as três perspectivas são estreitamente imbrincadas e, por vezes, indissociáveis, semelhantes a fotografias que se projetam, a saber, diante da última destruição do Templo se perfilam os sinais do fim do mundo, tendo como pano de fundo o julgamento de Jerusalém quando se proclama a vinda do Filho do Homem para julgar os vivos e os mortos. Tudo isto impossível de calcular e inútil querer prever. Entretanto, duas certezas aparecem claramente: a primeira é que a história do mundo entrou com a vinda de Jesus na sua fase definitiva, mesmo que esta fase deva durar por centenas e milhares de séculos, e a segunda certeza é que as declarações de Jesus, urgentes para hoje, restarão válidas até o fim dos tempos e por, isto, é preciso aguardar, vigiar, estar atentos. Com relação ao Templo que estava guarnecido com belas pedras e dons, Jesus afirmou: “De tudo o que estais vendo, dia virá em que não ficará pedra sobre pedra que não seja derrubada”. Daí a questão posta pelos discípulos sobre isto: “Quando, pois serão essas coisas, Mestre, e qual o sinal do seu próximo acontecimento”? Jesus respondeu, não mostrando um sinal preciso, mas dando um sinal de valor permanente em todo e qualquer tempo de provação: “Tomai cuidado para não serdes desencaminhados”. Depois São Lucas, quase sem transição abre até o fundo a perspectiva tomando uma palavra de Jesus no que concerne o fim dos tempos, isto é, haverá fatos terrificantes. O futuro, porém, pertence a Deus, o único que conhece tudo que acontecerá nos últimos tempos. Quanto a nós temos o tempo atual para O servir e O amar, praticando o bem e evitando o mal. Temos o espaço de nosso coração para acolher a palavra de Jesus e o espaço do mundo para receber com sabedoria suas mensagens de conversão e de paz. Cumpre trabalhar na construção do templo que é coração de cada um. É preciso ter a coragem da fé para não se curvar diante das exigências do mundo e suas ilusões, mas, ao contrário urge testemunhar fielmente, o amor de Deus, a palavra de Cristo.  Aquele que se entregar à prece estará aberto ao Espírito Santo que lhe dirá o que deve ser feito.  O verdadeiro seguidor de Cristo não se curva às exigências do mundo, mas pratica em plenitude a caridade, amando verdadeiramente a Deus e ao próximo e nada, assim, tem a temer. É preciso irradiar total harmonia, dando um autêntico testemunho do Evangelho firmar corajosamente o princípio de que o amanhã a Deus pertence. É pela perseverança que cada um obterá sua santificação rumo à eternidade. O seguidor de Cristo, porém, será sempre um sinal de contradição perante as incongruências de um mundo que se aparta das verdades eternas. O Reino dos céus estará reservado para os que lutam contra os inimigos da alma e enfrentam uma bela batalha de ininterrupta fraternidade. O cristão sabe que não há rosas sem espinhos e o caminho que leva ao céu supõe muita disposição para poder praticar as virtudes Isto supõe fortaleza interior afim de enfrentar as dificuldades e vencer as contradições naturais à caminhada por este mundo. Então, sim, o porvir será sempre encarado com tranquilidade sem preocupações estéreis. A perseverança no bem é, deste modo, fundamental, mesmo porque Jesus afirmou: “É pela vossa perseverança que obtereis a vida” (Lc 21,19). Com a força do amor, abraçado à cruz de Jesus, aceitando sempre a vontade divina que o cristão marcha sereno rumo à eternidade junto de seu Deus. A pobre vontade humana restará sempre firme, imerso cada um na certeza de um final feliz. Assim sendo, a perspectiva do fim dos tempos longe de levar a uma resignação condenável, conduz à paciência de se edificar com fé a própria vida sem atitudes estoicas e apreensões fúteis no que tange a consumação dos tempos. A paciência na qual deve viver o cristão o sustem longe de qualquer apreensão atinente ao fim do mundo, dado que quem ama Jesus tem a garantia da vida eterna. * Professor no Seminário de Mariana durante 40 anos.

segunda-feira, 24 de outubro de 2022

 

AS DUAS PRIMEIRAS BEM-AVENTURANÇAS     

Côn.; José Geraldo Vidigal de Carvalho*

As bem-aventuranças mostram que Jesus não veio a este mundo para julgar, mas para nos indicar o caminho que conduz a Deus. (Mt 3, 1-12). Não se pode limitar a vida cristã ao mero cumprimento de algumas regras estritas, a fim de evitar o castigo eterno. Jesus veio para ostentar o amor, para que cada um possa curtir e partilhar esta dileção com os irmãos e irmãs.  O verdadeiro cristão deve estar cônscio de que ele tem dentro de seu coração o segredo da felicidade que o mundo ignora. Eis porque é preciso que ele viva de acordo com as Bem-aventuranças pelas quais obterá a verdadeira felicidade. Reflitamos hoje sobre as duas primeiras bem-aventuranças. Bem-aventurados os pobres de espírito porque o reino dos céus é para eles. Jesus não disse, bem-aventurados os que vivem na miséria, as mães cujos filhos morrem de fome, mas disse:” Bem-aventurados os que têm um coração de pobre”. Isso porque, na época em que Ele pregava, a palavra pobre tinha já uma longa história. Nos textos mais antigos o pobre era uma pessoa vergada, oprimida, incapaz de resistir e de levantar a cabeça, alguém que devia sempre ceder aos poderosos. O acento era colocado não sobre a indigência em si, mas sobre a humilhação do pobre. A palavra tomara uma coloração religiosa e os opressores apareciam como orgulhosos e ímpios e o pobre feito figura do homem submisso que colocava sua confiança em Deus e aguardava dele o socorro. Assim a primeira beatitude de Jesus não se dirige precisamente aos mendigos, aos indigentes, mas a todos os que têm um coração bastante pobre para se acharem pequeninos diante de Deus, mãos abertas para receber dele a força e a esperança. Jesus não diz “vós que precisais de tudo, ficai na miséria”! Ele não prega um fatalismo mais ou menos resignado. Ele diz “Guardai um coração de pobre diante dos irmãos e diante de Deus”. Este Deus ignora as classes sociais porque em todo homem ele vê um filho que tem necessidade de ser amado e de ser perdoado, de ser salvo. Os homens julgam pelos sinais exteriores, sinais por vezes enganosos de riqueza ou de pobreza. Deus olha o coração, porque é possível ser rico com um coração de pobre e pobre com um coração de rico. É que exatamente o pobreza material, não a miséria, predispõe para pobreza do coração.  É igualmente verdade dizer que Deus tem uma ternura especial para aqueles que precisam de tudo, tudo como uma mãe guarda os tesouros de paciência e de compreensão para cada um de seus filhos sobretudo os mais frágeis. No coração de Deus não há exclusão de ninguém. Ele ama cada um tal como ele é, Ele não estabelece categorias.  Somos nós que dividimos, que excluímos os outros. Num mundo no qual as relações sociais são frequentemente deturpadas, a tentação pode nos levar a fechar mais ou menos a porta do Reino aos que são diferentes de nós e colocamos então barreiras lá onde Cristo passou para as destruir. Acontece mesmo que a irritação paralisa no coração do cristão seu desejo evangélico de justiça e de liberdade e, por isto, uma segunda bem-aventurança vem precisar a dos pobres de coração: “Bem—aventurados os mansos porque eles possuirão a terra”. Jesus não diz “Felizes os incapazes, os frustrados, felizes os que têm medo de viver e que trepidam diante das verdadeiras responsabilidades, mas felizes os mansos, os pacíficos, os que não aspiram o poder, os que aceitam lutar sem ira, os que sabem não abusar de suas forças, os que deixam sempre aos outros um espaço livre e   os meios de se superarem. É a mansidão mesma de Cristo que podia dizer: “Tomai o meu jugo e colocai-vos na minha escola porque eu sou manso e humilde de coração”. Saibamos, pois, que o Evangelho é sumamente exigente. Ele não oferece uma poesia fácil e infantil, mas um realismo cristão.  O realismo do batizado, adultos e conformado pelo Espírito, realismo que está na base da verdade interior, do acolhimento filial daquilo que Deus faz em função da sua misericórdia imensa pelo mundo. Trata-se então -de uma grande, muito grande virtude. Ela só, é capaz de aproximar as distâncias que a natureza e as leis põem entre os homens; pois aos superiores ela inspira doçura e caridade, respeito e obediência aos inferiores. Apenas ela pode abrandar as inevitáveis injustiças da vida e da sociedade, destruir nos fortes o instinto da tirania, e o instinto da revolta dos fracos e tudo isto na mais admirável fraternidade. Sejamos sempre rigorosos em examinar a nossa consciência para acolher toda graça de uma total mansidão e seremos, de fato, felizes. *Professor no Seminário de Mariana durante 40 anos.

segunda-feira, 17 de outubro de 2022

 

O PUBLICANO CONVERTIDO

Côn. José Geraldo Vidigal de Carvalho*

A Zaqueu, que por mera curiosidade espreitava Jesus no alto de um sicômoro, é por Ele convertido, Cristo indo inclusive onde ele morava e lhe disse: “Hoje a salvação entrou nesta casa. (Lc 19,1-10). Isto é, aliás, o que Ele quer poder dizer cada tarde nas casas dos que o temem e amam e Lhe oferecem os trabalhos diários. A salvação que chegou à casa de Zaqueu aconteceu porque, seja como for, ele estava à procura do Senhor: “Ele procurava ver quem era Jesus”. Por entre os afazeres de chefe dos coletores de impostos, fatigado do desprezo dos outros, desgostoso de tantos anos perdidos em fraudar a justiça, ele não tinha uma pretensão senão uma ideia, uma visão, um nome na sua mente: Jesus. Diante de Jesus ele poderia se explicar, com Jesus ele poderia recomeçar sua vida. A miséria humana, muito frequentemente, é ter dito adeus aos recomeços, ou entregando-se à mediocridade, ou deixando de lado sérios compromissos. Um outro segredo de Zaqueu foi saber reconhecer seus limites e de agir em consequência. Com sua pequena estatura ele teria podido se perder na multidão e não veria o célebre galileu. Mas não, a esperança viva o fez inventivo. Não levou em conta nem mesmo uma atitude ridícula de subir em uma árvore e sua astúcia acabou sendo recompensada. Transformar nossas debilidades num desejo de um encontro saudável, oferece forças impensáveis. É preciso subir em um sicômoro, ser pequenino aos olhos dos outros e não se deixar paralisar ante tais esforços a serem feitos e não se deixar sem ação ante as dificuldades. Zaqueu ignorou as fragilidades de seu coração e vai lá até onde Jesus passaria. Ele não deixou passar a hora de Deus. No cimo da árvore ele aguarda, ele espera. Ele não previa o que iria acontecer. Eis que Jesus se aproxima e o olha e diz: “Zaqueu desce depressa é preciso que hoje eu fique na tua casa”! Não é preciso grandes coisas para que Jesus venha até nós. Basta que Ele, quando   nós o aguardamos, veja o nosso olhar   e vislumbre um pequeno ato de fé, de sinceridade. Isto ainda que o passado seja pesado, o presente doloroso, e o futuro incerto. E depois? Tudo mais virá da grande bondade divina. O que importa, dia a dia, e Zaqueu naquele dia o percebeu, é O acolher com alegria e sinceridade Não pode ser triste coração que recebe Cristo a quem se deve oferecer toda a nossa vontade de conversão, todas as misérias do nosso coração, todo anseio de acertar os passos com Deus. Jesus vem a nós procurar o que pode parecer perdido, nossas misérias que para Ele nunca estão ocultas. Ele quer, porém que vamos a Ele com absoluta confiança e abramos diante dele nossas mãos arrependidas e Ele as encherá do júbilo de uma total remissão.  Ele indo à casa de Zaqueu não foi para o honrar um homem rico, mas para transformar o seu coração, para que ele se convertesse, para o salvar, mudando de vida.   Ele vem ao encontro dos pecadores para os converter.   Como ocorreu com Zaqueu, ele quer ser acolhido com júbilo, sendo recebido o seu amor Jesus deseja prontidão. Ele então disse s Zaqueu: “Zaqueu desce depressa “E “Ele desceu rapidamente”. Deus não tolera tergiversações, dubiedades, demoras inúteis. Ele estava no seu interior desejoso exatamente de algo pessoal da parte de Jesus. Zaqueu reconheceu no seu interior a grandiosidade da graça recebida.  Disse então:” Vê, Senhor, dou aos pobres metade de meus bens e, se defraudei alguém, em qualquer coisa, vou restituir o quádruplo”. Ele passava a praticar a beneficência. Jesus, por sua vez, voltando-se para ele disse: “Hoje salvação veio a esta casa por ser também filho de Abraão. O Filho do homem veio procurar e salvar o que estava perdido”.  Este evangelho quer nos ensinar que todos os homens e mulheres são objeto da misericórdia de Deus. Conforme Jesus disse, no céu haverá alegria entre os anjos por causa de um pecador que venha a se arrepender. Porém, para alcançar a misericórdia é preciso que nós tenhamos um mínimo de conhecimento daquele que nos pode oferecê-la e amá-lo COM toda nossa alma. Zaqueu encontrou-se com o próprio autor do perdão, porque teve a oportunidade de realizar um verdadeiro processo de conversão. Analisou os próprios erros do passado, prometeu se corrigir e ajudar principalmente aqueles aos quais, de alguma forma, havia prejudicado. Professor no Seminário de Mariana durante 40 anos.

 

quarta-feira, 12 de outubro de 2022

 

Qual é o carisma do JSC?

Responde o Diretor Espiritual, Côn. José Geraldo Vidigal de Carvalho

O carisma do JSC é santificação de seus membro, que através de equipes bem estruturadas

Há mais de quarenta e um anos vem formando apóstolos de outros jovens e fornecendo ao ESC continuação deste ideal  seus líderes e também profissionais competentes nas mais variadas profissões. Prestar colaboração eficientemente e humildemente com o Pároco, Pe. Paulo Dione Quintão, sempre sintonizado com os objetivos paroquiais. Marca ainda o JSC a perseverança em seus ideais e o cuidado para que grupos estranhos e fugazes não roubem seus melhores membros, Daí a ufaneia de muitos jovens: Sou membro do JSC| Cumpre rezar sempre para que este Grupo floresça cada vez mais para glória de Deus e bem das almas. A promoção das Jornadas de Conscientização cristã é um ponto alto das atividades deste Grupo de líderes cristãos e admirável a liderança com que os encarregados destas Jornadas exercem seu papel, inclusive trazendo os sacerdotes convidados para as Confissões e eventualmente para alguma Palestra. Muitas vezes o diabo tentou desestruturar o JSC, mas com a graça de Deus a ordem acabou reinando, quando espíritos malignos quiseram dominar os companheiros de ideal. O Diretor Espiritual e um Grupo esclarecido de jovens do JSC atuaram vigorosamente venceram graças a Deus. Avante JSC, pois o bem a de triunfar sempre!

.

segunda-feira, 10 de outubro de 2022

 

HUMILDADE NA ORAÇÃO

Côn. José Geraldo Vidigal de Carvalho*

Dois homens rezam ao mesmo Senhor, no mesmo templo, mas há uma diferença no conhecimento real do verdadeiro Deus, mostrando assim notável desigualdade na prece, no que diz respeito à autenticidade da mesma. (Luc 18,9-14). Para o fariseu a prece não havia senão um ponto de referência, a saber, o seu eu.  Satisfeito e seguro de si mesmo, se julgava o único intacto, puro.  Isto por ser ele o artesão de sua própria perfeição. Os outros para ele são escravos do dinheiro, conhecem as aventuras com a mulher dos outros, se entregam a empreendimentos injustos. Mancomunados com o sistema fiscal do opressor, o trabalho assim lhes macula as mãos. Ele, contudo, homem à parte, se conserva inatacável. Para ele a santidade consiste em ter uma imagem gratificante de si mesmo, cumprindo rotas que ele mesmo traçou. Ele é o único digno do amor de Deus e o único a merecer sua estima e, assim, devia excluir os outros. A dúvida não há lugar para ele, pois colocou Deus a seu serviço, tudo isto fruto de sua soberba. Eis porque toda sua segurança repousa sobre suas obras e ele se blasona de estar rigorosamente em dia com as normas legais, com o dízimo, e se sente tranquilo por usar de tudo mais como bom, segundo ele então julgar.  Além disto, seus julgamentos o asseguram em si mesmo e o confirmam na sua impressão de equilíbrio e superação própria.  Assim sendo toda a segurança de sua consciência repousa em suas obras. Seus jejuns regulares lhe asseguram na impressão de equilíbrio e de convicção de sua inteireza interior. O pior ainda é que tudo isto o leva a assim orar:” Eu te dou graças ó Senhor de ser o único a teus olhos, te dou graças por me terdes escolhido para ser um homem privilegiado à parte. Eu te agradeço, Senhor, por não ser como os outros homens; te agrade com pelas graças de luz que me dás sobre mim mesmo e sobre os outros”. Não contente por introduzir na sua prece todos seus desprezos, todas as suas agressividades, tão contente de desprezar os outros para se colocar em primeiro lugar diante de Deus, ele vai imaginar que Deus o tinha escolhido, excluindo os outros, como se o coração de Deus fosse tão pequenino para amar tais dimensões. Quanto ao publicano, não tinha vindo ao Templo para encontrar um Deus que testemunha suas conquistas espirituais, mas, sim, um confidente de sua miséria, e, por isto, se coloca à distância¸ como alguém que não teria direito ao amor de Deus, e deste modo ele viera porque sabia que o amor não é uma questão de direito. Ele não ousava levantar os olhos com receio de reencontrar um olhar que ele não poderia suportar, o olhar de Deus, cheio de amor, mas d um amor imerecido por ele. Ele não se compara com os outros, dado que uma primeira comparação já o tornaria humilde, aquela correlação de sua vida falsa e mesquinha, com aquilo que fulgiria da santidade divina. Ele tinha o senso do pecado que não consiste em se imaginar criminoso, nem se curvar ante misérias mais ou menos artificiais, mas, sim, de reconhecer humildemente com uma espécie de evidência   como a falsidade se instala facilmente na vida humana, levando a perder o sentido do Reino de Deus a quem tão pouco sabemos amar. Desde modo, pode fazer uma prece verdadeira aquele que atravessa a barreira do orgulho e exprime a verdadeira conversão, o autêntico retorno a Deus: “Meu Deus tem piedade de mim pecador!”. Os anos passam, as ilusões desaparecem, o tempo foge, e só a prece do humilde pode nos abrir o caminho da paz, porque ele nos situa diante de Deus, como criatura, cônscio de sua responsabilidade de pecador, mas também na certeza da vitória de Cristo e na esperança de tudo aquilo que Ele prepara para quem não é soberbo. De fato, “Quem se humilha, será exaltado” ou   seja, é Ele que restaura no seu amor e eleva tudo junto dele, sobre a mesma cruz e na mesma glória, os que por ele souberam ser humildes, mansos e serviçais; Deus quer que saibamos pedir sempre perdão de nossas culpas. Jamais as atitudes arrogantes do fariseu, mas o reconhecimento humilde da fragilidade humana como ostentou o publicano. Somente Deus é santo, perfeito.  Errar é humano, perseverar orgulhosamente no erro é condenável. Sejamos humildes como o publicano e nunca soberbos como o fariseu. Rezar sempre: “Jesus manso e humilde de coração, fazei o meu coração semelhante ao vosso”, e veremos que a humildade é o alicerce da verdadeira grandeza do ser humano. A humildade prospera nos corações que bem conhecem sua própria miséria e indigência, persuadidos intimamente de que todo bem procede de Deus. Estejamos certos de que onde há orgulho, aí haverá também ignomínia; mas, onde há humildade, haverá sabedoria. * Professor no Seminário de Mariana durante 40 anos.

 

quinta-feira, 6 de outubro de 2022

 

  PERSEVERANÇA NA ORAÇÃO

Côn. José Geraldo Vidigal de Carvalho*  

Neste domingo Jesus propõe uma parábola para mostrar a seus discípulos que é preciso orar com perseverança (Lc 18,1-8) Ele quer acentuar a importância da prece, especialmente o valor da prece de súplica. Se a viúva sabe importunar o juiz iníquo a ponto de o fazer ceder e assim obter o que se pretendia, quanto mais a prece   de intercessão do cristão encontrará no coração de Deus, Pai misericordioso, um acolhimento justo e favorável. Jesus garante que a prece persistente encontrará sempre a resposta favorável. Esta constância é o fator essencial para aquele que se entrega a uma prece proveitosa. Poder-se-ia até dizer que não é difícil começar a rezar, mas a dificuldade surge quando é preciso insistir no pedido feito à divindade. Para superar esta dificuldade o Mestre divino fornece de uma maneira discreta a condição essencial. Com efeito, a figura que é dada para ilustrar a perseverança na prece é a de uma viúva. Na sociedade antiga as viúvas faziam parte das pessoas as mais vulneráveis socialmente, dado que elas não gozavam da proteção masculina. Esta viúva insistia junto ao juiz com suas reclamações até que ela viesse a obter o que esperava. Ela teria todas as razões para desanimar. Sua causa parecia bem perdida de início, porque tivera a infelicidade de cair nas mãos de um juiz que não respeitava nem Deus, nem ninguém. Ela, contudo, ficava firme no seu intento. Se ela importuna o juiz é pelo fato de que a solução de sua questão lhe era imprescindível. Tanto perseverou que acabou sendo atendida, sendo-lhe feita justiça. Se assim agiu um juiz iníquo, “Deus não faria justiça a seus eleitos que a Ele clama noite e dia?” A primeira condição para participar do Reino de Deus é reconhecer nossa necessidade, como fez a viúva da parábola, a qual expressava bem sua pobreza. A prece, na verdade nasce da fraqueza pessoal. A pobreza do coração leva à perseverança, pois tal orante não se apoia nas suas capacidades ou pretensos direitos humanos ou espirituais. A perseverança nascerá do reconhecimento da própria dependência para com Deus, Pai misericordioso, ao qual pedimos a graça solicitada. A pobreza do coração nos leva a reconhecer nossas falhas e nossas necessidades. A viúva sabia que o juiz, mesmo iníquo, era o único que podia ministrar justiça. Do mesmo modo, nós devemos reconhecer que nós dependemos fundamentalmente de Deus em toda a nossa vida, Ele é o nosso princípio e fim. Rezar como amar é uma abertura de si e um dom de si para ajudar a si mesmo e ao o próximo. O que depende de nós é a abertura de nosso coração e dom de nós mesmos, nunca, porém, forçando o outro a acatar tudo isto. Assim sendo, a atitude de quem reza é estar atento e velar perseverantemente sem busca de qualquer exaltação pessoal. O principal é estar atento à necessidade própria e do próximo e isto leva à perseverança, seguindo o conselho de São Paulo: “Sede assíduos na oração” (Rm 12,12), Trata-se de se voltar para Deus e ter sempre o coração e as mãos abertos. Rezar, como amar, é um dom e uma experiência de relações mútuas. Quem pensa que saber rezar mostra que não dá na sua prece mais do que recebe do Espírito Santo. Há necessidade de uma total abertura do coração para estar completamente disponível ao dom que lhe vem do Todo Poderoso Senhor, reconhecendo a maneira pela qual este Deus nos atende. Pode ocorrer que o que nós pedimos não se realize por motivos que desconhecemos. Eis por que o orante penetra fundo nos dizeres de Jesus que nos ensinou a assim nos dirigir ao Pai:” Seja feita a vossa vontade”. Isto quer dizer que se conforma em tudo ao que o Pai quer nos dar e como o quer nos conceder.  Sabe, porém, que o Senhor deseja o bem de todos. Assim, reza e deixa tudo nas mãos de Deus. Em síntese, o que importa é ter fielmente uma prece confiante no Amor de Deus que pode e quer o bem de cada um de nós. O importante é saber viver intensamente a fé com relação à palavra divina a tudo que ensina o magistério da Igreja numa completa coerência, numa total confiança. Deus é o Pai de todos nós e a prece é a voz da fé, de nossa crença nele, de nossa esperança e nosso amor. Rezar e entregar tudo nas mãos do Onipotente Senhor, pois, com efeito “Deus não fará justiça a seus eleitos que clamam a Ele dia e noite”? (Lc 18,7). Com razão dizia Tertuliano que “a prece perseverante vence o próprio Deus”, Este Deus quer que sejamos exigentes na oração e, portanto nada de hesitações. Devemos sempre nos lembrar que nós nos dirigimos a quem nos ama e quer nos dar o que pedimos, mas que se faça isto com amor, humildade e perseverança. Deus sabe que isto é um bem para quem reza e reconhece sua total dependência dele.  “Professor no Seminário de Mariana durante 40 anos..