quinta-feira, 30 de maio de 2013

PASSAR ALÉM DO VISÍVEL

PASSAR ALÉM DO VISÍVEL
Côn.José Geraldo Vidigal de Carvalho*
No mundo agitado de hoje, felizmente, são inúmeros os seguidores de Cristo que almejam uma sadia experiência de Deus, passando além do visível, vencendo a barreira daquilo que impede usufruir em plenitude as verdades reveladas. O ser humano é capaz de penetrar pela fé as realidades espirituais. Pode sair do que é material para se imergir no mundo sobrenatural afim de que, assim iluminado, cumpra com sucessso sua missão neste mundo sem se prender a ilusões terrenas. Trata-se de passar para um outro lado como bem se expressou o Papa Bento XVI.  Segundo este sábio Pontífice, é possível a travessia “com a qual saímos dos nossos modos habituais de pensar e viver e ultrapassamos o mundo meramente material para chegar ao essencial, ao além, rumo àquele Deus que, de sua parte, veio aquém, em direção a nós”. O homem tem, de fato, possibilidade de superar seus limites, pois não está preso nos horizontes mundanos. Assim sendo, lhe é viável descobrir uma dimensão do infinito. A fé, realmente, oferece uma abertura maravilhosa para degustar um pouco da felicidade infinita de Deus. Esta virtude teologal não retira quem crê de sua condição humana, mas, ao contrário, lhe dá ensejo de atingir sua plenitude. Esta experiência faz reconhecer que a situação do ser finito é por vezes precária, difícil e cumpre, então, descobrir a dimensão de profundidade do infinito que palpita em cada um para não se deixar abater por entre as circunstâncias da vida. É preciso, em consequência, uma total disponibilidade para acolher os dons celestiais que projetam o cristão na consciência da presença de Deus que nele age em todas as suas ações. Há no mais íntimo do ser racional um desejo profundo de estar com Deus e isto é parte integrante de sua natureza. O bulício exterior é que obnubila esta atração interior. Esta é o que há de mais sagrado e vital naquele que foi criado à imagem e semelhança de seu Criador. O mundo quando se torna uma instituição perversa, contrária ao espírito de Deus e seus ensinamentos, abafa esta tendência natural para o Ser Supremo. Jesus foi claro ao assim se dirigir ao Pai, referindo-se a seus seguidores: “Não peço que os tires do mundo, mas que os guardes do mal. Eles não são do mundo, como eu na sou do mundo. Consagra-os na verdade, a tua palavra é a verdade” (Jo 17, 15-17). Acontece é que não se procura um momento de silêncio para refletir nestas sentenças luminosas do Filho de Deus. O epígono do Redentor deve ser consagrado na verdade e isto supõe e inclui a santificação espiritual interior que conduz à intimidade com o Pai, através do Filho na luz do Espírito Santo. É o esforço que deve ser feito para se atingir a maturidade espiritual. A condição essencial é então encontrar instantes para uma oração mais contemplativa e menos discursiva e mesmo os mais atarefados podem deparar espaços no seu dia a dia para poder estar com o seu Deus, se estabelecendo firmemente nele. É então que se depara a energia para vencer os numerosos obstáculos que se opõem a esta tertúlia sublime, não obstante as aliciações externas. Disto resulta aquela ventura que o mundo não pode oferecer e o cristão, na plenitude de sua correspondência à graça, se torna eficiente em todos os seus empreendimentos, fazendo-se um profissional competente, serviçal, irradiando a beatitude que traz consigo. Pode, desta maneira, desfrutar tudo de bom que existe em seu derredor e conhecer a autêntica felicidade. Desta forma o que recomendou São Paulo aos Efésios se realiza, ou seja, alcançar “a medida da plena estatura de Cristo” (Ef 4,13). Não se deixa o cristão assim se dominar pelo mundo, mas se volta para Deus no interesse mesmo do mundo, pois “uma alma que se eleva, eleva a terra inteira”. Entende-se então a máxima verídica: “Se és cristão, tens o mundo nas mãos”. Une-se o cristão a Deus para atrair todos para Ele. Quem vive o seu batismo transcende o mundo  para fazer luzir o divino no humano. Bem se pode compreender como isto é importante para a sociedade em geral e, sobretudo, para a Igreja. Tal fiel se torna apto para vencer as tentações, o poder do mundo, o maligno e suas manobras ardilosas. Por isto ajuda na obra de retificação da caminhada humana dentro da história que fica impregnada da energia  espiritual de quem vive em plenitude o Evangelho. Percebe o autêntico cristão sua responsabilidade perante a comunidade que precisa ser revitalizada com seu progresso espiritual. Concretiza-se o que Cristo falou: “Vós sois a luz do mundo”. * Professor no Seminário de Mariana durante 40 anos.

quarta-feira, 29 de maio de 2013

O ENCONTRO COM DEUS

O ENCONTRO COM DEUS
Côn. José Geraldo Vidigal de Carvalho*
Na sua imensa generosidade Deus mesmo veio ao encontro do homem como está claro na Bíblia. Ele se manifestou a Moisés como “Aquele que é”, ou seja, Aquele no qual a essência se confunde com a existência. Ele é o Ente Supremo, o próprio Ser subsistente. Assim sendo, dado que o homem                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                   deve, em consequência, se voltar para Ele, existe um preceito no Deuteronômio: “Amarás ao Senhor, teu Deus com todo o teu coração, com toda a tua alma e com todas as tuas forças” (Dt 6,5). Entretanto, este encontro com Deus se deu em toda sua plenitude para ser racional através de Cristo. Com efeito, este foi o acontecimento maior de toda a história humana: a Encarnação da Segunda Pessoa da Santíssima Trindade. Aí o magno mistério de Deus que desceu do Céu para assumir nossa humanidade. Solene as palavras de São João no prólogo de seu Evangelho: “O Verbo se fez carne e habitou entre nós” (Jo 1,14). O Papa Bento XVI foi felicíssimo ao explicar: “Aqui a palavra “carne”, segundo o uso hebraico, indica o homem na sua integralidade, o homem todo, mas justamente sob o aspecto da sua caducidade e temporalidade, de sua pobreza e contingência”. Eis porque não se pode deixar o corpo fora da relação de amor para com o Criador de tudo. No encontro com Deus o corpo tem um papel importante na caminhada espiritual. Não pode ser visto como um obstáculo à afinidade com a divindade. No pensamento humano, não iluminado pela fé, o ser de Deus se acha além de toda realidade material, sua perfeição não seria compatível com tudo que está presente no mundo cósmico. O homem não poderia assim se unir ao divino senão pela parte que escapa à matéria, isto é, pela sua alma. Na filosofia dualista grega o corpo humano era tido como o túmulo da alma. Sob o influxo desta errônea concepção muitas correntes espirituais ensinaram um desprezo do corpo, para oferecer à alma todas as possibilidades de se voltar para Deus. Cunhou-se até um princípio antropologicamente falso: “Tudo que se dá ao corpo, se tira da alma”. Deste modo, o corpo seria um entrave para o encontro com Deus. Na sua dimensão material isto seria verdade, tanto que São Paulo afirmou: “Eu castigo o meu corpo e conservo-o na escravidão, a fim de não me suceder que, depois de ter pregado aos outros, eu venha a ser desaprovado”. É que sob este aspecto  o corpo é a fonte do pecado que afasta de Deus. Cristo, aliás, ordenou: “Se tua mão é para ti uma ocasião de pecado, corta-a {...} se o teu pé é para ti ocasião de pecado, corta-o [...] se o teu olho é para ti ocasião de pecado, arranca-o" (Mc 9, 43ss).  Precioso alerta, dado que a pessoa humana é um corpo animado por uma alma e uma alma que anima o corpo, tanto que a alma separada do corpo não constitui a pessoa humana. Cristo, contudo, veio reencontrar o homem e é nesta mesma corporeidade que ele nos encaminha para o Pai. Por Jesus o corpo se tornou o sacramento do reencontro com Deus, apesar de destinado à morte por ser material. Foi pela carne do Verbo Encarnado, morto no Calvário, que o homem obteve a vida eterna e por Seu sangue aí derramado para remissão dos pecados que se deu a reabilitação humana. Corpo sagrado do Filho de Deus o qual depois de sepultado ressuscitou imortal e impassível já com um corpo glorioso. É o que se dará com o homem que morrerá, mas ressuscitará um dia a exemplo de Cristo.  Adite-se que é pela água derramada no corpo no dia do Batismo que o cristão é introduzido na realidade do Corpo de Cristo. Este Corpo de Jesus alimenta o cristão na Eucaristia, Pão da vida eterna. Dentro destas considerações, o corpo deixa de ser um óbice para o encontro com Deus, pois na realização prática da fé está o fundamento deste encontro.   A penitência que o cristão se impõe se torna então uma participação na paixão de Cristo na alheta de São Paulo: ”Eu completo em minha carne o que falta às tribulações de Cristo (1 Cor 1,14). A austeridade imposta ao corpo fica deste modo sublimada por uma configuração ao processo redentor de Jesus. Eis porque o corpo é uma parte integrante da relação com Deus ao qual se devota um amor que não pode ser afetado pelas imposições carnais. Assim sendo, não se pode esquecer a importância das genuflexões diante do Santíssimo Sacramento, a participação nos diversos ritos litúrgicos, nas procissões, o valor do sinal da cruz. Fica, portanto, afastado qualquer resquício de maniqueísmo. Isto representa o respeito que o cristão tem para com seu corpo que não pode ser manchado no pecado (1 Cor 6,13). Ele é o templo da Santíssima Trindade. Donde também o cuidado para com aqueles que passam necessidade (Mt 25,35-36). Cumpre, além disto, um crescimento contínuo na devoção à Eucaristia, pois o Corpo e Sangue de Cristo são o verdadeiro alimento do batizado. Em suma, deve-se amar a Deus também com todo nosso corpo, bem simbolizado no coração no preceito do Deuteronômio, * Professor no Seminário de Mariana durante 40 anos.

terça-feira, 28 de maio de 2013

A ESPIRITUALIDADE DO CRISTÃO

A ESPIRITUALIDADE DO CRISTÃO
Côn. José Geraldo Vidigal de Carvalho*
Um dos segredos da vida cristão é saber transformar os obstáculos em meios de santificação. Em vez de crescer na aspereza, na intolerância, na insensibilidade, na crítica mordaz, na maledicência, no lamento, cumpre caminhar suavemente no sentido contrário a tudo isto. Progredir na simplicidade, na gratidão, no despojamento e na confiança. O júbilo tem a ver com uma essencialidade que só na simplicidade espiritual se pode acolher. Muitos, além disto, são os que deploram as tentações, as distrações nas orações, as dificuldades interiores e exteriores. Isto pode paralisar e desencorajar no percurso rumo à perfeição ordenada por Cristo: “Sede perfeitos como o Pai celeste é perfeito” (Mt 5,48). Os obstáculos, contudo, podem ser um trampolim para que o cristão se eleve até Deus. O reconhecimento da própria fraqueza já é um ato de humildade que muito agrada ao Ser Supremo e disto resulta um abandono confiante em Suas mãos, junto ao desejo sincero de evitar qualquer complacência com o que não está de acordo com Sua vontade santíssima e sapientíssima. O espírito de confiança leva à vitória contra o mal, dispõe o fiel a se concentrar nas suas preces e o deixa sereno diante de qualquer situação complicada. A segurança interior é fruto do contato continuo com Deus. As contingências terrenas vão sendo superadas e as adversidades se fazem degraus para se atingir uma espiritualidade mais apurada. Deus vai se tornando um amigo muito querido. Para tanto, sobretudo a participação no Santo Sacrifício da Missa e a Comunhão se tornam a força poderosa e se prolongam através do dia por força da união com a humanidade e divindade de Jesus. Fica assim mais fácil tomar a cruz de cada instante e seguir o Mestre (Mt 26,24).  O que se esquece muitas vezes é que Jesus sempre insistiu na necessidade da penitência, da mortificação, da austeridade, o que se dá no cumprimento dos deveres cotidianos e na paciência perante as tribulações. No Evangelho se acham normas severas, imperiosas, mas também a certeza de que a doutrina de Cristo oferece a garantia da possibilidade de observá-las.  Claras suas palavras: “Coragem, eu venci o mundo” (Jo 16,33). A ruptura com tudo que não se coaduna com o Decálogo é a marca definitiva da espiritualidade do seguidor de Cristo. Este foi claro: “Vos sois meus amigos se fizerdes o que eu vos prescrevo” (Jo 15,14). O resultado, entretanto, é faustoso, ou seja, o encontro da alegria verdadeira que flui sempre da consciência do dever cumprido. O ser humano vai atingindo sua plena maturidade e pode inclusive usufruir plenamente as maravilhas que o Criador espalhou nesta terra. Pauta seus atos pela virtude e pela coragem e vive intensamente cada instante dele tirando todo proveito. Feliz aquele que caminha segundo o Espírito Santo para uma semelhança com Cristo de progresso em progresso nas vias da própria santificação até alcançar “a medida da plena estatura de Cristo” (Ef 4,13). Trata-se do homem espiritual que tem o pensamento de Jesus (1 Cor 2,15). Para que se consiga chegar a este estágio cumpre nunca se opor à ação santificadora do Espírito Santo, não O contristando nunca (Ef 34,30). É deste modo que se concretiza o desejo de Jesus: ”Nisto será glorificado meu Pai: que deis muito fruto; e assim vos demonstrareis que sois meus discípulos (Jo 15,8). Desta maneira a verdadeira espiritualidade atinge todo o ser do cristão como falou São Paulo aos Tessalonicenses: “E ele próprio, o Deus da paz, vos santifique até à perfeição e que todo o vosso ser, o espírito, a alma e o corpo, se conserve irrepreensível para a vinda de nosso Senhor Jesus Cristo” (1 Tes 23). Em suma, uma inteligência renovada, sentimentos santificados, vontade inteiramente submissa aos ditames do Evangelho, o que vem a ser o fundamento indispensável do edifício cristão. A fé se torna assim uma afirmação divina, “consistência daquilo que se espera; demonstração de realidades que não se vêem” (Hb 11,1). Eis porque as provações são recebidas como um aspecto positivo da pedagogia de Deus na alheta do Apóstolo que afirmou: ”sabemos que Deus em tudo coopera para o bem daqueles que O amam” (Rom 8,28). Flui então, portanto, confiança total na sabedoria divina. A tudo isto se acrescente que Jesus sempre sublinhou a importância da fidelidade nas pequenas ações e aí está outro sinal de uma autêntica espiritualidade que não busca nunca ações espetaculares (Lc 16,10). * Professor no Seminário de Mariana durante 40 anos.

segunda-feira, 27 de maio de 2013

VIDA INTERIOR

A VIDA INTERIOR
Côn. José Geraldo Vidigal de Carvalho*
Para o autêntico seguidor de Cristo é louvável sempre o empenho em viver honestamente, tendo o ideal de observar fielmente os mandamentos divinos compendiados no Decálogo. Entretanto, é preciso algo mais, a saber, crescer continuamente na fé, firmar-se sem cessar na esperança e se abrasar na caridade, intentando participar intensamente na vida trinitária. É que o cristão está envolvido nas delicadezas de Deus, mas cumpre no decorrer das horas do dia a lembrança de que este Senhor Onipotente habita lá no interior de cada um pela graça santificante. Isto significa usufruir a vida sobrenatural o mais plenamente possível dentro das limitações humanas. Há dentro de cada batizado um tesouro infinito que é preciso saber apreciar e explorar. Desta união com a Trindade Santa resulta inclusive uma recitação mais fervorosa das demais orações cotidianas. É preciso, porém, estar ininterruptamente aderido a Deus, ainda que seja por breves pensamentos repletos de amor por entre as múltiplas atividades de cada hora. Trata-se de abrir para a alma o horizonte das realidades eternas. Há barreiras, contudo, que devem ser apartadas através da intenção de fazer todas as coisas para honra e glória do Ser Supremo. Em tudo que se pratica é Ele quem age em cada um, como bem se expressou o profeta Isaías (Is 26,12). Aliás, Jesus foi claro: “Sem mim, vós nada podeis fazer” (Jo 15,5), mas nem sempre se pensa nesta sublime verdade. Se Ele age no ser humano, e disto se tem consciência, tudo é feito com total capricho, atenção e eficiência. Deus deve se tornar o fim e o princípio de todas as ações. Dá-se então um progresso contínuo e não se desfalece perante as fraquezas naturais a seres finitos. Não há lugar para o orgulho perante o bem praticado, porque a força vem do alto, conforme declarou São Paulo: “Eu tudo posso naquele que é a minha fortaleza” (Fl 4,13). O mesmo Apóstolo, entretanto, também afirmou: “Eu me gloriarei de minhas fraquezas, para que habite em mim a força de Cristo (2 Cor 12,9), É que, segundo ele, o justo vive de fé” (Rm 1,1). Daí ser imprescindível crescer constantemente nesta virtude. Crer na realidade de Deus “no qual nós vivemos, nos movemos e existimos (At 17,28). A fé é um guia severo, mas infalível. Atrás do veu das apar\ências, ela descerra a vitória perene (1 Jo 5,4). Faz ter ânimo a despeito de todos os fatores humanos que tentam impedir o esforço rumo à perfeição. Ela leva o cristão a contar apenas com Deus que se torna para o fiel uma rocha inabalável. Mostra que, de fato, Deus está por toda parte, portanto bem próximo de cada um. Não é um Deus longíquo, distante. Ele dá ao que nele crê o querer e o realizar tudo (Fl 2,13). De si mesmo, ninguém é capaz nem de mover um de seus dedos. Nada escapa à ação divina. Apenas a depravação da vontade que se volta contra Ele é algo que não vem dele. Como o ser humano é livre precisa também estar plenamente atento à ação divina para a realização das boas obras, das mínimas ações nas quais há uma grandeza singular. Mister se faz, porém, afastar qualquer obstáculo à ação divina, Então o cristão se faz, verdadeiramente, um cristóforo, deífico no total sentido do termo. Para que esta luminosidade celeste não se obscureça no decorrer das horas importa progredir nas virtudes teologais. Pela fé se verifica a adesão à vida da graça. Pela esperança vem a certeza da ajuda para estar unido a Deus neta terra e, um dia, por toda a eternidade e é pelo amor que já se possui este Deus desde agora. Aí está o esencial de qualquer oração sólida e profunda. Donde o conselho do Livro da Sabedoria: “Procurai-O na simplicidade do coração” (Sb 1,1). Se é preciso ao ser humano descomplicar tudo na sua existência, isto deve acontecer sobretudo nas realações com o Todo-poderoso Senhor que é a simplicidade absoluta. Ele quer por isto mesmo uma sinceridade absoluta. O fiel pode desta forma dizer a Ele que, não obstante toda sua pequenez, O adora, nele confia e O ama de todo coração. Este cristão já não teme mais nada e repete com São Paulo: “Se Deus está conosco, quem estará contra nós” (Rm 8,31).  Desta maneira, o cristão passa a existir numa atmosfera de serenenidade. Nas dificuldades procura logo o refúgio no seu Senhor e nele encontra a luz, o consolo, a energia para não desfalecer perante as dificuldades e os sacrifícios. Pode repetir o que está no Livro Cântico dos Cânticos.: “Eu encontrei aquele que a minha alma ama, eu o abracei e não deixarei mais” (Cant 3,4). * Professor no Seminário de Mariana durante 40 anos.

terça-feira, 21 de maio de 2013

IMPORTÃNCIA DO CONCÍLIO DE TRENTO

IMPORTÃNCIA DO CONCÍLIO DE TRENTO (1545-1563)
Côn. José Geraldo Vidigal de Carvalho*
O Concílio de Trento foi o instrumento essencial da reforma católica no século XVI.  Após nove anos de esforços, o Papa Paulo III conseguiu com êxito abrir a primeira sessão, dia 13 de dezembro de 1545. Este Concílio reafirmou o conteúdo da fé. Foi um empreendimento notável do Pontífice Romano por causa das vicissitudes da política internacional da época.  A Catedral de Santa Maria de Trento foi durante 19 anos a sede deste Concílio. Houve intervalos freqüentemente muito longos, sobretudo, sob o Pontificado de Paulo IV (1555-1559). Quando o Papa Pio IV (1559-1565) encerrou o Concílio, a maior parte dos problemas da Reforma tinham sido estudados a fundo e sabiamente resolvidos. A Eucaristia, como o conjunto dos sacramentos, assim como o Santo Sacrifício da Missa, o culto a Nossa Senhora e aos santos, o purgatório, foram objeto de decretos dogmáticos. As duas fontes da fé, a Escritura e a Tradição, foram declarados intactos pela Igreja, Apenas esta Igreja como veiculo privilegiado da graça do Divino Espírito Santo, é quem dá ao verdadeiro sentido da Bíblia. O Concílio reconheceu expressamente a cooperação do homem na obra de sua salvação e negou que a justificação pela fé basta para se receber a graça. Eis porque os cânones conciliares reafirmaram claramente que todos os sete Sacramentos da igreja contêm realmente a graça e que seu uso é indispensável para a salvação eterna dos batizados. Quanto ao Matrimônio, foi defendida sua indissolubilidade, como também foi tomada uma medida importante para acabar os matrimônios clandestinos.  As uniões secretas fora declaradas não só ilícitas, como já havia sido decretado no 4º. Concílio de Latrão, mas também inválidas, não se reconhecendo senão o casamento contraído na presença do Pároco e duas ou três testemunhas. A redefinição dos dogmas foi acompanhada por uma reforma disciplinar que retirava a Igreja dos abusos e críticas reinantes. O Concílio lembrou aos Bispos a obrigação da residência nas suas dioceses e enumerou, com cuidado, suas tarefas. Propôs para os padres a criação, em cada Diocese, de centros formação, ou seja, os
Seminários, iniciativa decisiva e que daria ótimos resultados. O Concílio de Trento reorganizou ainda os Estatutos das ordens monásticas, decretou a participação obrigatória nas Missas dos Domingos e Dias Santos de Guarda e decidiu que houvesse a redação de um manual de instrução religiosa para uso do clero e instrução dos fiéis, a saber, o Catecismo. O sucessor de Pio IV, o Papa Pio V, (1566-1572) se dedicou na aplicação dos decretos doutrinais e disciplinares deste Concílio. Publicou o Breviário para uso dos sacerdotes e o Catecismo para a doutrinação dos fiéis Este Catecismo que ficou em vigor até o Concilio Vaticano II em 1965. Aliás, neste ano de 2013 se comemora também os vinte anos da publicação do Novo Catecismo da Igreja Católica. Pio V fez também reforma do Missal simplificando-o. A Missa era celebrada na Europa segundo vários ritos, mormente, o romano, milanês, galicano, dominicano e outros. O Papa simplificou e uniformizou o rito comum da Igreja Latina. A Missa, dita de Pio V, ficou em vigor até o Concilio Vaticano II. Tudo isto fruto do Concílio de Trento.  Pio V contou com grandes bispos reformadores como São Carlos Borromeu de Milão.  Por volta de 1560, como resultado deste Concílio, a Igreja e os católicos reencontraram a dignidade de sua fé. O Concílio de Trento constituiu o fato mais importante da restauração católica.  Segundo Ranke,”rejuvenescido, purificado e unido pòde o catolicismo opor-se vigorosamente ao mundo protestante”. A doutrina católica se tornou mais precisa. Os decretos do Concílio de Trento modelaram fortemente o futuro da Igreja.  Definiram as condições de uma liturgia viva e de uma vida sacramentai profunda.
 * Professor no Seminário de Mariana durante 40 anos.

SANTA RITA DE CÁSSIA

SANTA RITA DE CÁSSIA
Côn. José Geraldo Vidigal de Carvalho, palestra preparada para a reunião do  JSC do dia 18 de maio de 2013


Grande  glória de Viçosa ter Rita de Cássia por Padroeira.
Notável título de Rita de Cássia ser Padroeira de Viçosa.
Glória, sim, desta cidade por ser Santa Rita uma das mais famosas seguidoras de Cristo e, por isto mesmo, tão poderosa diante de Deus, tendo ela se tornado a advogada das causas impossíveis.
Pérola preciosa na coroa de méritos que Rita de Cássia ostenta por ser Viçosa um dos lugares do mundo onde ela é de modo especial amada e glorificada com manifestações realmente apoteóticas e dada a importância desta urbe famosíssima.
Por tudo isto, festivas são as horas do dia 22 de maio.
Seus méritos são festejados. Suas virtudes, proclamadas. Uma vida cristalizada em feitos imortais é revivida com carinho. Todos admirados com suas ações fundidas nos bronzes do heroísmo cristão. Seus atos se mostram cravejados de facetas adamantinas. Uma existência inigualável a refletir a beleza do Evangelho, a ostentar dotes celestiais, a fulgir toda a grandeza, toda a nobreza que comovem os corações e que a religião consagra. Estamos, de fato, homenageando uma heroina digna da escolha do Deus Altíssimo.
Poderosíssima intercessora. Venerada no mundo inteiro,
Por tudo isto, de fato, uma das maiores glórias de Viçosa: ter Rita de Cássia como Padroeira! Ela esposa, mãe, religiosa se celebrizou em todas as linhas do termômetro da perfeição cristã.

Uma cristã extraordinária e as jovens podem dela se orgulhar

Quando percorremos a História da humanidade contemplamos heroinas que se impuseram por merecimentos indiscutíveis e se se fizeram objeto de admiração e respeito.
Por seu gênio e engenho se destacaram rainhas como Catarina II, da Rússia; Vitória, da Inglaterra; Guilhermina, da Holanda e tantas outras soberanas ilustres.
Por seus dotes se impuseram George Sand, a escritora famosa; Margaret Kennedy, a aplaudida intelectual; Mary Mitchell, a culta astrônoma; Maria Montessori, a magistral pedagoga italiana.
Corajosas foram as mártires Inês, Maria Goretti, Águeda, Cristina, Cecília, Luzia, Perpétua, Felicidade entre inumeráveis outras testemunhas da virtude.
Fé profunda foi a da Cananéia do Evangelho a arrancar o milagre de Cristo só com o tocar na fímbria de suas vestes.
Grande o amor que Maria Madalena, Maria Cléofas, Verônica, Maria Salomé demonstraram ao divino Redentor por entre seus sofrimentos.
Notabilíssimo o patriotismo de Joana d’Arc; profunda a sabedoria de Santa Teresa; maravilhosa a dedicação à Igreja da parte de Catarina de Sena.
Sem fim seria o desenrolar das grandezas daquelas que se impuseram nas variadas provas do valor humano.
Rita de Cássia, porém, é como uma síntese de toda a magnitude feminina de todos os tempos, pois ostentou no mais alto grau as virtudes preconizadas pelo Filho de Deus e se tornou uma santa universal superando, assim, as demais personagens por maiores que tenham sido seus feitos exceção feita à Mãe de Jesus na qual brilhou a plenitude das graças divinas.
Através dos séculos objeto de veneração, de imitação se fez um espelho a ser continuamente mirado, um livro vivo para os discípulos de Cristo, uma mestra inigualável da conduta cristã; rainha de milhares de corações que amam o bem, a nobreza, tudo que mais  engrandece o ser racional.
Sua sabedoria foi genial convertendo seu marido Paulo Fernando. Sua coragem foi olímpica suportando anos e anos de tortura, revelando paciência admirável ante um esposo cruel e sem princípios, seu algoz. Sua resignação foi estupenda diante do assassinato de seu consorte, que ela havia convertido, e perante a morte de seus dois filhos. Ela se mostrou muito mais forte que Resfa, pois viu o dedo de Deus a impedir maiores desatinos e entendeu a ação da Providência com raro descortínio. Entre ver seus filhos a vingarem a morte do pai, ela agradeceu à Providência os levar para o céu sem a mancha de tão grande crime.
Ela possuiu em alto grau a maior de todas as ciências, pois, queria conhecer a Cristo e apenas Cristo Crucificado, o que lhe mereceu aquele espinho na fronte. Este muito a martirizou, mas a levou à escola do sofrimento que purifica, santifica, glorifica.
Sua persistência em se consagrar a Deus a levou a vencer todos os obstáculos e quebrou todas as barreiras, dado que encontrou em Santo Agostinho, São João Batista e São Nicolau Tolentino uma trindade poderosa a introduzi-la no convento das agostinianas. A exemplo de Abraão, ela esperou contra toda a esperança (Rm 4,18).
Ninguém mais mortificada do que ela dentro do Convento em Cássia! Ninguém mais obediente! Lá está, até hoje, aquela famosa parreira, que desabrochou viçosa de um galho seco que ela regou a mando de uma Superiora desassisada, mas que lhe provou a humildade e a obediência. Milhares de peregrinos contemplam lá aquele poço que lhe deu, não apenas a água material pela qual expressava a prática da virtude, mas gestos de grandeza interior a esplender em ação tão simples.
Rosas a desabrocharem em seu jardim de Rocca Porena em pleno inverno bem simbolizam o perfume das peregrinas virtudes desta santa admirável a fazer através dos tempos cair pétalas de bênçãos sobre seus devotos.

Desçamos a detalhes sobre sua vida
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Infância e adolescência


O coração é tomado de entusiasmo quando se recorda sua infância naquela localidade encravada nas belas montanhas da Úmbria, onde seus virtuosos pais, Antônio e Amata Mancini, souberam plasmar a religiosidade da filha querida. Esta lhes transmitiam a certeza de uma união íntima com Deus e todos encantava pela sua piedade. Jovem, nunca se deixava levar por tudo que é tão comum à vaidade feminina, pois Rita queria apenas ser uma açucena delicada, uma rosa purpúrea, um lírio nacarado para Deus, pouco se importando com os olhares humanos.

Esposa inigualável

Tornou-se depois modelo de esposa e mãe com aqueles fatos já rememorados. Mary Stuart a pérola da Escócia foi prisioneira dezoito anos de sua ignóbil prima Isabel, Rita, a pérola da Itália, por tempo semelhante foi torturada por aquele marido desastrado. Como foi mostrado, ela converte seu esposo. Lágrimas de mulher santa eram preces ardentes que penetraram o céu, eram chamas de amor, cascatas de luz. Esposa mártir ela se abraçou ao cadáver de Paulo Fernando e o banhou de lágrimas de amor e dor. Imitou então a Jesus e perdoou seus inimigos.

Mãe devotada

João Tiago e Paulo seus filhos vão em seguida martirizar ainda mais o seu coração, pois alimentavam sentimentos de vingança. Pobre mãe! Noites intranqüilas! Momentos de susto! Agonia prolongada! Pélago de tristeza! Oceano de sofrimento! Ela, porém, reza. Qual outra Branca de Castela diz a eles que os preferiria mortos a contemplá-los cometendo tão horrípilo crime pagando sangue com sangue, fazendo justiça com as próprias mãos. Rita, porém, é uma santa mãe e verá suas súplicas atendidas, inscrevendo página aurífera nos anais dos triunfos maternos. Deus encaminhou os acontecimentos e acidentalmente seus filhos que haviam se arrependido dos seus maus propósitos, expiram em paz, vítimas da peste que então ali grassara! Sofre o coração de Rita, mas ela aceita este pesar julgando-o muito melhor do que a catástrofe de os ver morrer impenitentes. Oferece por eles o sacrifício da separação. Que mãe admirável!
Os triunfos que mulheres valorosas alcançam todos os dias a despeito das crises mais arriscadas serão sempre um monumento que a Igreja ostentará com ufania. Entre eles este de Rita superando sofrimentos físicos e morais.

Religiosa modelar

Viúva, correu ela a abraçar a cruz de Cristo retirando-se do mundo. Entregar-se-ia à ascese mais aguda por amor ao divino esposo.
Sua entrada no Convento das agostinianas que não poderiam receber senão virgens está repleta de misteriosa intervenção de seus santos protetores. Nada de novo o fato de eles lhe abrirem as portas da vida religiosa  por um ato milagroso. Com efeito, se um anjo fechou a boca dos leões na cova em que Daniel fora lançado para ser por eles devorados ( Dan 6,23); se Felipe foi guiado pelo espírito de Deus junto ao carro que conduzia o mordomo-mor da Rainha da Etiópia (Atos 8, 26 s); se os corvos alimentaram a Elias sobre as margens do Carith (I Reis 17,6) impossível não foi que Rita penetrasse no mosteiro de Roca Porena estando fechadas as portas. Ela poderia dizer às religiosas: “Não vos revolteis contra o braço do Senhor. Eu fui trazida aqui pelo Deus Poderoso que me arrancou dos perigos do mundo, me foi escudo e proteção. Dirigida por meus protetores Agostinho, Nicolau Tolentino e João Batista escapei dos precipícios que cercam o Mosteiro e devassei com eles estas muralhas e agora quero triunfar de vossas recusas, pois aspiro pelos tabernáculos do Senhor”! Com estas ou outras palavras Rita humildemente venceu a resistência das agostinianas. É que os pensamentos de Deus não são os pensamentos dos homens, nem os Seus caminhos, as veredas humanas (Is 55,8).
Ei-la agora entre as esposas do Cordeiro. Ninguém mais a separará de sua união profunda com a Trindade Santa. O Senhor é sua herança definitiva, é a sorte venturosa que lhe tocou em partilha.. Quem poderá agora deter as lavas deste vulcão aceso no coração de Rita? Ela se dilatava aos rigores da cruz e parecia antecipar a estes gozos inefáveis precursores da eternidade feliz, se aperfeiçoando através do sofrimento e da integral imitação do Crucificado. Ela encontrava nele esta felicidade que é o encanto das almas elevadas e puras. As atrações do mundo haviam de há muito perdido o sentido para ela que bem sabia que tais atrativos nunca conduzem à verdadeira beatitude. Coisa alguma faria arrefecer sua fidelidade a Cristo. Ela repetia com o Apóstolo: “Quanto a mim, não aconteça gloriar-me senão na cruz de nosso Senhor Jesus Cristo, por quem o mundo está crucificado para mim e eu para o mundo”( Gl 6,14).

Prova terrível de sofrimento

Rita, porém, não podia contentar-se com estes testemunhos já de si, porém, tão expressivos do amor com que Cristo distingue seus eleitos.  Tão intimamente unida às dores de Jesus seu amor a Ele arrancou, de fato, um dos espinhos da Coroa do Crucificado. Na sua fronte estará para sempre o sinal de sua associação total ao Mártir do Gólgota. Ei-la ornada  com um diadema que lhe afiança uma coroa de glória no céu. O sofrimento é sua herança na terra, mas na Casa do Pai ela estará bem perto do Cordeiro Imolado. Por tudo isto jamais o sorriso se apartou de Rita que realizou o sublime paradoxo da alegria no sofrimento.
Eis porque no seu leito de morte ela pede em pleno rigor do inverno que lhe tragam rosas de seu jardim. Lá as encontraram. Rosas cheias de espinhos, mas ressumbrando perfume. Bem o símbolo de sua vida nesta terra.
O amor então lhe arrebatou o coração e bem podemos aquilatar os últimos arroubos de seu entusiasmo à vista da pátria celeste.

Entrada gloriosa no céu

Dia 22 de maio de 1456 os sinos do Mosteiro misteriosamente se põem a tocar como a proclamarem: Rita acaba de entrar no céu! Eis o hino da vitória! Agora ela assume seu lugar no paraíso de onde derramaria bênçãos sobre bênção para seus devotos. Deixa esta terra a heroina de peregrinas virtudes e doravante a voz da epopéia sagrada é a única digna de lhe cantar os merecimentos. A ela cabe somente a coroa da imortalidade. Posuit in capite eius coronam - Deus colocou sobre sua cabeça uma coroa, é o que está escrito lá em Cássia junto à urna que conserva o corpo intacto da grande serva do Senhor. O preço de seus sacrifícios é o salário da glória eterna.
É assim que se fraguam os ânimos varonis, se acrisolam os espíritos abalizados, se abalizam os gigantes da fé, se agigantam os santos da Igreja, se santificam as almas puras dignas de Deus, se deificam as eleitas do Eterno e se eternizam as filhas do Pai do céu.
Ó santa admirável, Rita de Cássia. Ó Padroeira ilustre e poderosa ante o trono de Deus!
Se Cristo afirmou: “Todo aquele que se declarar por mim diante dos homens, também eu me declararei por ele diante de meu Pai que está nos Céus” (Mt 10,32), que prestígio não é o de Rita que em toda a sua vida optou por Jesus e Jesus crucificado e, na verdade, em três estados de vida, ou seja, como esposa, mãe e religiosa. Tudo isto com rasgos de amor e total submissão à vontade divina.
Seu corpo incorrupto é como um sinal que se levanta diante dos pórticos da Igreja para glorificar uma heroina que força o tempo e as gerações que a sucederam a perpetuar sua memória. Em toda parte em que é invocada ela se mostra a protetora dos males do corpo e da alma. Curas maravilhosas, prodígios sem conta. Como os males interiores e invisíveis são os que mas atormentam e matam, os corações dos tristes, dos deprimidos, dos aflitos, dos perseguidos, dos desesperados só na invocação do nome de Rita acham a consolação, o remédio, o alívio, o bálsamo o lenitivo. Ela é, realmente, a Santa das causas ou coisas impossíveis. Seu culto se espalhou rapidamente por toda a Europa e daí para outras partes do mundo. Em 1628 o papa Urbano VII lavrou o decreto de sua beatificação. Pôr permissão dos Sumos Pontífices mesmo antes de sua canonização inúmeras Igrejas já lhe eram consagradas. Glorioso foi o dia 24 de maio de 1900, quando Leão XIII a canonizou consagrando assim a devoção de que ela já era alvo em tantos lugares.
No céu  Santa Rita está adornada com duas capas reluzentes: uma de ouro que é o manto das religiosas agostinianas, outra de variegadas cores, indicando que é rainha e esta gala lhe é outorgada pela cidade de Viçosa, da qual é indiscutivelmente rainha. Disto temos uma prova a mais vendo esta multidão a tomar inteiramente a Praça Silviano Brandão proclamando ser ela desta cidade a soberana.
Qual dos dois mantos mais gloriosa torna Rita no céu? O das agostinianas ou o que os viçosenses lhe dão?
Ambos a fazem igualmente ilustre, porque o manto da realeza que lhe damos se assentou sobre o hábito de religiosa, o brocado sobre o burel. O hábito de Santo Agostinho é uma das mais vistosas e bizarras galas que se trajam no paraíso, mas sobre esta gala em Rita no mesmo céu se apresenta o manto real que Viçosa lhe dá. Este, com efeito, realça aquele pois revela a grandeza de ter sido ela agostiniana e, ao mesmo tempo, a fazendo uma soberana. Além do mais, o manto real que lhe oferecemos está todo ele reluzente de fios de ouro de nossos afetos, de nossos louvores, da imitação de suas virtudes aqui na terra.
Glória, portanto, de Rita o ser Padroeira de Viçosa!

Responsabilidade do viçosense

Se assim é, envolvamos-nos em esperanças. Lá do alto ela está a proteger sua cidade, venham ou não reformas de base ou sem base. Viçosa estará sempre na trilha do progresso, do desenvolvimento. Há de reinar paz nas famílias e ordeira há de ser sempre a urbe dedicada a Rita.
Grande responsabilidade a do viçosense: tornar cada vez mais ornamentado o manto de sua soberana lá no céu. Crianças a guardarem o lírio da pureza. Jovens a conservarem intacto seu coração longe das insídias do maligno. Mães a imitarem o seu devotamento aos filhos. Pais carregando com perseverança a cruz de cada dia. Esposas a salvarem seus consortes na paciência, na tolerância. Todos estampando em sua existência um pouco da celestial grandeza de sua Padroeira.
Cada um tem uma missão a exercer na sociedade. É a trincheira sagrada onde vitórias são obtidas, é a arena das grandes lutas. Fidelidade ao dever de cada dia, à santidade, à virtude é o que pede Rita a seu devoto.
Deste modo ela aceitará os votos que se elevam até ela lá no céu e terá motivos renovados para proteger e amparar a quantos assim a louvam de coração sincero.
Há de proteger o JSC para que continue sua trajetória apostólica admirável e iluminará o coral do  JSC que estará abrilhantando na Praça Silviano Brandão a solenidade do dia 22 de maio durante todo o tempo da Procissão.
Entornará ela novas ondas de bênçãos sobre aqueles que promovem o seu culto, cercando a cidade de Viçosa de ilustração e glórias, Viçosa a atestar sempre que só na virtude há nobreza, só na Religião há heroísmo.



Apêndice

Na gloriosa história de Viçosa merece destaque especial a Capela situada à Rua dos Passos, carinhosamente chamada por muitos de Igrejinha dos Passos, pois segundo as melhores fontes foi neste local que nasceu esta urbe universitária. Ali se constituiu o patrimônio primeiro da futura Paróquia de Santa Rita de Cássia. Dia 8 de março de 1800, o Padre Francisco José da Silva, por provisão episcopal foi autorizado a erigir uma ermida sob invocação de Santa Rita. Por isto o nome primitivo de Viçosa era Santa Rita do Turno , Capela filial de Rio Pomba e elevada a freguesia pelo decreto de 14 de julho de 1832 com  as filiais São José do Barroso  e Conceição do Turvo. Depois passou a ser chamado de Viçosa em homenagem a D. Antônio Fereira Viçoso.

segunda-feira, 20 de maio de 2013

O ANO LITÚRGICO

  
               O ANO LITÚRGICO
Côn. José Geraldo Vidigal de Carvalho*
A Igreja, Mãe e Mestra, desde o início do cristianismo sabiamente foi organizando o Calendário Litúrgico para comemorar os mistérios da fé, assim como a memória de Maria e dos santos. O Ano Litúrgico começa no primeiro domingo do Advento com a preparação para o Natal, seguindo-se os demais Tempos Litúrgicos. Através do ano, o Domingo, segundo a tradição dos Apóstolos é o principal dia da semana, no qual os fiéis têm a obrigação de participarem do Santo Sacrifício da Missa. A principal data do Ano Litúrgico é a comemoração da Páscoa, o maior dia do ano. A sequência de leituras bíblicas que se repetem a cada três anos nos domigos e solenidades são dividas em ano A, B e C. No ano A lêem-se as leituras do Evangelho de São Mateus, no ano B, o de São Marcos e no ano C, o de São Lucas, como acontece neste ano de 2013. O Evangelho de São João é lido em ocasiões especiais, sobretudo nas Festas mais importantes. Nos dias da semana no Tempo Comum há leituras diferentes para os anos pares e para os anos ímpares, com exceção do Evangelho que se repete de ano a ano. É assim  que, de três em três anos, aqueles que participam da liturgia diária terão praticamente lido toda a Bíblia. As leituras, inclusive os salmos, estão de acordo com os tempos litúrgicos, a saber, no Advento ajudam na preparação para a solenidade do Natal, quando também se dirigem os pensamentos para a segunda vinda de Cristo no fim dos tempos, ditos escatológicos. O tempo do Natal vai de 25 de dezembro até a festa do Batismo de Jesus. O tempo da Quaresma, época de especial conversão e penitência, vai de quarta-feira de Cinzas até Quinta-feira Santa, quando começa o tríduo Pascal. O Tempo Pascal estende-se até o domingo de Pentecosts e depois continua o Tempo Comum até o Advento. Neste período se celebram também várias festividades em homenagem à Virgem Maria com leituras especiais. Como salienta a CNBB, "o Tempo comum não é tempo vazio, é tempo de a Igreja continuar a obra de Cristo nas lutas e nos trabalhos pelo Reino." (Documento 43, 132). Por isto também neste período a Liturgia apresenta as Leituras bíblicas numa catequese admirável. Sábios, portanto, os critérios da escolha das Leituras através do ano. O calendário litúrgico cristão se torna uma celebração atualizada da salvação. Quando se relaciona a sinfonia do tempo cósmico com o tempo da história, se pode perceber que o tempo judaico e o tempo cristão se tornaram aquele da recordação das intervenções de Deus na história humana. Eis aí o aspecto de memorial que estrutura a concepção da liturgia na sua relação com o tempo. As festas não são apenas marcas na roda inexorável da sucessão das horas, ritmada pelo decurso de estações e fatos cósmicos. Elas são momentos chaves, permitindo à comunidade reencontrar a lembrança da presença de Deus. O ciclo lunar permaneceu um referencial para determinar o momento das festas especialmente a de Páscoa, celebrada no primeiro domingo depois da lua cheia do equinócio de março. Toda celebração litúrgica comemora e festeja o mistério pascal, mesmo si cada festa específica, como a da Transfiguração, se ligue mais a uma de suas facetas. O ano litúrgico combina as duas, seu epicentro é constituído pela Páscoa, mas todo o resto do ano se desenvolve segundo um programa que tem em conta os limites da capacidade humana de entrar neste mistério divino. Nenhuma festa do ano litúrgico não se compreende sem a referência pascal, mesmo as festas dos santos nas quais a Igreja “proclama este mistério nos seus santos que sofreram com Cristo e são glorificados com ele” (SC n 104). É que viver a realidade da Ressurreição de Cristo consiste em fazer penetrar a eternidade de Deus no tempo humano. É inscrever a existência de cada um na perspectiva escatológica. Em cada dia do ano litúrgico, a liturgia eucarística e a liturgia das horas introduzem uma porosidade entre a vida presente e a vida eterna e leva os batizados a viverem o mistério pascal. Eis porque a morte não aparece então mais do que uma derradeira etapa da conformação com Cristo a qual foi iniciada no batismo. Nesta trajetória terrena a presença Deus transfigura assim o tempo dos fiéis e todas as atividades humanas.  Pelo batismo e pela sua iniciação permanente na vivência de Cristo os cristãos são constituídos portadores do sacramento no qual renasceram para a vida sobrenatural. O ponto capital, portanto, do ano litúrgico é permitir aos fiéis terem sempre consciência do mistério pascal nesta vida, esperando que a escatologia realize a plenitude da mesma. Ao longo de sua história a liturgia não cessou nunca de ser a pedagoga desta sublime experiência que vai conhecendo através dos diversos ciclos litúrgicos a contínua novidade e grandeza de cada verdade da fé comunitariamente celebrada. * Professor no Seminário de Mariana durante 40 anos

quinta-feira, 16 de maio de 2013

VIVER INTENSAMENTE A FÉ

VIVER INTENSAMENTE  A FÉ
Côn. José Geraldo Vidigal de Carvalho*
Nunca se valoriza demais o precioso dom da fé pela qual se pode estabelecer um diálogo intenso com Deus. Desta sublime convivência com o Ser Supremo resulta a imperiosa necessidade de fazer frutificar esta crença beatificante. Isto significa irradiar por toda parte a ventura de poder dar à existência humana um sentido certo e duradouro. Com efeito, aquele que se entrega sem reservas ao amor divino através de uma real experiência de fé e se aparta da própria segurança, se torna um iluminado e pelo fato de estar inebriado num júbilo íntimo profundo anela que outros encontrem esta mesma felicidade. Aí está a magna missão do cristão, o qual como discípulo de Cristo, precisa difundir por toda parte como afetuoso é o Senhor Todo-Poderoso. Mostrar que os valores da fé se distinguem profundamente dos valores do mundo. Estes acabam por sufocar as indagações que borbulham lá no íntimo do ser racional e não satisfazem as aspirações fundamentais que palpitam dentro do coração humano. Obscurecido fica o destino final de quem foi criado para, além morte, conhecer a recompensa de seus atos na curso terreno. Apenas à luz da fé é possível triunfar das paixões desregradas que são tendências que animalizam e, em conseqüência, vencer o pecado que é uma irracional revolta contra o Criador de tudo. É que a autêntica vivência da fé comporta a obediência a quem sabiamente estabeleceu leis fora das quais a pessoa humana não alcança nunca sua maturidade. Isto exige evidentemente renúncias que redundam naquela paz que supera todas as riquezas e prazeres mundanos. Estes prazeres envolvem em escuridão, angústia existencial ao passo que a fidelidade à voz da consciência que clama por um procedimento de acordo com a vontade divina traz luz, serenidade, imperturbabilidade. O Papa Francisco advertiu: «Não se é cristão a tempo parcial, apenas em alguns momentos, em algumas circunstâncias, em algumas escolhas. Não se pode ser cristão assim; é-se cristão em todos os momentos. Totalmente!». De fato o júbilo que paira em quem crê em Jesus comporta momentos cruciais e deve impregnar todos os pensamentos e ações do discípulo do Redentor, tornando visível a todos que não pode ser infeliz “coração que ama a Cristo”. Seria contraditório ao cristão viver sem superabundância, sem extravasar a riqueza que se acha em sua alma.  Um dos erros mais calamitosos de um epígono do Filho de Deus é não compartilhar os bens espirituais que lhe advêm através da fé. É uma chaga que o batizado fixa em si próprio. É um opróbrio que se projeta sobre si mesmo. Por muito inconcebíveis e intrigantes que as mudanças bruscas de um exílio terreno possam ocasionar, é muito mais danoso não saber transformar as tribulações em momentos de crescimento espiritual para tornar o mundo melhor. Quem age com uma fé arraigada fica blindado perante as provações que Deus permite e que são inevitáveis ao longo da caminhada rumo à Casa do Pai.  A fé confere paciência por muito penosos e difíceis que sejam os sofrimentos nesta marcha para o céu. A fé, contudo, é penhor do amor, da amizade e das bênçãos daquele que habita na alma em estado de graça. Desta maneira, quem tem fé jamais se deixa possuir pela disfunção emocional que abafa o alento da vida que necessita existir através da primeira das virtudes teologais. De tudo isto resulta então a santidade vivida intensamente pelo cristão, o qual é sempre agradável a Deus que o ajuda e recompensa com consolações inenarráveis. Tanto isto é verdade que os grandes santos se regozijavam por entre aflições e repetiam com São Paulo: “Eu tudo posso naquele que é a minha fortaleza” (Fl 4,13). É lógico também que para se chegar a esta plenitude da luminosidade da fé é preciso a oração contemplativa e as preces que pedem que a fé seja cada vez mais aumentada. Cumpre, outrossim, uma união com Maria que recebeu aquele sublime elogio de Santa Isabel: “Bem-aventurada aquela que acreditou”. (Lc 1,45. Ela então fortalece a fé e torna suaves as preocupações, exuberante o júbilo e leva a sublimar as dificuldades cotidianas. Isto porque ela é “a mulher vestida de sol”(Ap 12. 1) que aclara neste vale de lágrimas todos que dela se avizinham, protegendo-os, sustentando-os, encorajando-os a exercer fielmente a vocação cristã sobre a rocha de uma fé inabalável.  Num momento de pulcra inspiração Giuliano Vigini mostrou que é deste modo que “o tu da fé pessoal se funde, reascendendo e amadurecendo, no nós da comunidade eclesial”. O cristão santificando sua vida pela fé, fazendo em tudo a vontade de Deus, fica então a serviço de todos os homens e da criação inteira e se torna o mais útil dos humanos e dos cidadãos desta terra.
* Professor no Seminário de Mariana durante 40 anos.

quarta-feira, 15 de maio de 2013

O FENÕMENO RELIGIOSO HODIERNO

O FENÕMENO RELIGIOSO HODIERNO
Côn. José Geraldo Vidigal de Carvalho*
Apesar de se viver num contexto que o Papa Francisco muitas vezes caracteriza com precisão como impregnado de uma cultura “hedonista, consumista, narcisista”, se percebe como VAI acentuando a procura da Religião. É possível mesmo que o desencanto com a busca desenfreada do prazer, o vazio deixado pela demanda de bens materiais e a exacerbação do amor excessivo a si mesmo acabem por conduzir a muitos na volta ao que transcende. Isto leva infalivelmente ao contato com o Ser Supremo. A transcendência divina vem a ser o conjunto de atributos de Deus que lhe ressaltam a superioridade em relação à criatura. Dentro destas considerações um erro de perspectiva é o julgamento de que há menos pessoas freqüentando os cultos religiosos do que, por exemplo, acontecia antigamente nas Missas dominicais. Isto numa perspectiva de que a população aumentou e que, portanto, deveria haver uma maior participação de fiéis. Cumpre, porém, observações pertinentes. Não só se multiplicaram as Missas nas comunidades dentro das Paróquias, inclusive nas comunidades rurais, visível isto com a multiplicação de templos, como também o fenômeno religioso não deve ser medido pela quantidade, mas pela qualidade. É o que se dá quando se pensa que o número de católicos no Brasil diminuiu. Em compensação, certamente, no termômetro divino, a fé, o fervor cresceram naqueles que passaram a viver não um ritualismo vazio, mas uma participação religiosa séria, comportando compromissos reais com a vivência do Evangelho. Percebe-se uma espiritualidade diferente que quer envolver-se no mundo, fazendo o cristão um fermento na massa, uma luz nas trevas por meio de um depoimento de vida que move, comove e acaba por remover as barreiras daqueles que se afastaram do Criador ou nunca O conheceram. Há mais espírito de uma oração contemplativa que leva à reflexão e imerge na experiência de Deus. Trata-se de uma realidade religiosa mais profunda revestida de sinceridade interior, longe da hipocrisia. O cristão de hoje está muito mais imbuído do espírito de serviço, compartilha e ajuda a seus irmãos com mais eficiência e persistência. Diminui-se a olhos vistos a escassez de virtude naqueles que freqüentam as cerimônias religiosas e há mesmo em muitos a mística do despojamento de si neste sentido de que há um compromisso maior com a evangelização. Multiplicam-se as diversas pastorais que vão de encontro a necessidades específicas de diversos setores. Com isto, os carismas de cada um podem ser exercidos e não há motivo para omissões no imprescindível apostolado.  Este deixa de ser um proselitismo para se transformar numa manifestação da verdade não com meras palavras, mas pelo testemunho de vida. Abre-se deste modo o caminho para que muitos reencontrem a Deus. Há dentro de cada ser humano uma inquietude que vai sendo respondida com a nova maneira de se tornar um cristão praticante. É preciso, realmente, tornar pragmático o espiritual, levando mensagens que ressoem no cotidiano das pessoas. É a transferência daquilo que se crê para as ações do dia a dia. A grande tarefa no mundo de hoje é deitar por terra os ídolos criados pela mídia e que têm poder de relativizar a vida religiosa, tornando-a mundana. Como, de tanta repetida, perdeu a sua força a expressão “ter senso crítico” apela-se sabiamente para a freqüência aos Grupos de Reflexão os quais oferecem meios para se escapar da manipulação cultural. Há inúmeros líderes leigos que percebem a centelha de piedade que há no povo e sabem trabalhar este aspecto positivo canalizando-o para uma participação ativa nos ritos litúrgicos e na união com Deus. São os guias perspicazes, hábeis, engenhosos, talentosos que promovem uma verdadeira revolução religiosa dentre dos setores nos quais atuam. Hoje, mais do que nunca, as autoridades eclesiásticas estão atentas para atinar com o meio termo e, com as luzes celestiais, evitam as distorções. Por outro lado, como suporte de tudo isto os estudos bíblicos, os cursos de aprofundamento de tudo que se estudou no Catecismo, os encontros que conduzem a uma primorosa formação ascética e mística vão incrementado a piedade de quem foi batizado e é chamado a ser um profeta da Verdade. Adite-se que os Meios de Comunicação da Igreja vão i se tornando cada vez mais atuantes, eficientes, além da divulgação das mensagens religiosas através da internet. * Professor no Seminário de Mariana durante 40 anos.

terça-feira, 14 de maio de 2013

A CHAVE DA SOLUÇÃO DOS CONFLITOS

A CHAVE DA SOLUÇÃO DOS CONFLITOS
Côn. José Geraldo Vidigal de Carvalho*
A primeira atitude daqueles que vivem um desentendimento é não privilegiar o conflito para não acentuar a discórdia. Os aspectos opostos a outros por parte de cada pessoa, os quais são fontes das tensões, precisam ser solucionados não com uma síntese que ignore as razões das partes, mas numa visão superior que leve a uma unidade. Quando cada um se firma no princípio de que está absolutamente certo e o outro totalmente errado não se chega nunca a uma concórdia. Prevalece o desacordo. Entretanto, para que se chegue a um novo caminho cumpre um auto-exame de ambas as partes, dado que no momento no qual se passa a reconhecer que o ser humano não é infalível se acha aberta a via para a compreensão e para o perdão cordial. Trata-se de não enfatizar as falhas alheias, porque, seja quem for, tem suas carências. Como tantas vezes tem repetido o Papa Francisco, “o cristão deve construir pontes e não muros”. De fato, se uma pessoa se empareda irredutível no seu modo de pensar, bloqueia qualquer passagem para uma situação harmoniosa. Fica impedida a troca de idéias. O ideal é encontrar uma diversidade reconciliada para que entre os cônjuges, entre pais e filhos, entre mestres e alunos, entre os amigos se possa sempre caminhar lado a lado deparando a unidade na verdade.  Nada mais saudável do o respeito ao perfil caracterológico do outro para se compreender suas atitudes, tendo cada um consciência de que possui qualidades e defeitos. Apenas assim se encontrará a maneira pela qual um possa ajudar o outro sem passar recibo no que está errado, mas entendendo que é possível que brilhe em qualquer circunstância a luz da superação do problema em tela. Cumpre que as partes em litígio saibam um escutar o outro, pois tantas vezes o que ocorre é desinformação. Afastadas a prepotência, a exasperação da linguagem comunicativa, meio caminho está aberto para uma conciliação. Nunca se deve querer mudar a identidade do outro, mas sim oferecer todos os meios para um diálogo, uma aproximação. É necessário saber, como bem se expressou o atual Papa, que “algumas pessoas vêem sempre o copo meio cheio, e outras, ao contrário, meio vazio”. Portanto, trata-se, em tantas ocasiões, de uma questão psicológica fruto de uma mentalidade que deve ser captada para que se possa perceber o ponto de vista alheio. Não é fácil saber o limite da visão do semelhante, se não há uma predisposição para atinar com sua cosmovisão. O ponto de partida deve ser, em tudo, a acolhida cordial e nunca uma tomada de posição prévia. As problemáticas existenciais são complexas e exigem discernimento de parte a parte.  A tudo isto se acrescente que o significado das palavras mal decodificado pode levar a não se atinar com que o outro está realmente dizendo. Nada mais desejável que se esteja falando a mesma linguagem. Seja como for, uma condição da parte de qualquer pessoa para evitar situações conflituosas é o perfeito equilíbrio do corpo e do espírito, um bom estado físico e mental. Há sempre uma tendência para transferir para os outros os próprios problemas e defeitos. É preciso, portanto, cuidado no julgamento para que possa haver um consenso. Nos seres humanos há obscuridade e luz, esta é que deve prevalecer, aquela não pode ser acentuada. Nada desgasta mais, quer o homem, quer a mulher, do que a animosidade sem motivo ou que deveria ser evitada. O segredo da vida é transformar a agitação em cooperação. Nada mais necessário do que baixar o nível de defensividade, abolindo definitivamente acusações mútuas. A interação emocional é de vital importância em toda parte. Atitudes negativas devem ser evitadas, pois causam ressentimentos, aumentam a taxa de absenteísmo e reduzem o nível de energia positiva. É preciso inclusive que no afã de se resolver uma pendência não se empregue qualquer atitude que pode se configurar como suborno afetivo. Sem sinceridade nada de positivo se constrói. Assim qualquer tipo de elogio desproporcionado ao invés de resolver pode agravar o mal estar entre duas pessoas. . É preciso, isto sim, sempre a busca de reforços interpessoais, como a atenção que se manifesta nos mínimos detalhes, incluindo não se querer dominar o outro a partir da suposição, a priori, de que ele está errado. Sábio o conselho bíblico: “Reprime o furor e deixa a cólera; não te exasperes, para não seres levado ao mal” (Sl 37,8). Com calma tudo se resolve. Nunca se deve esquecer que, quanto mais espontâneo alguém for e quanto mais investir em si próprio como ser humano, maiores serão as chances de se dar bem com todas as pessoas, impedindo os conflitos. * Professor no Seminário de Mariana durante 40 anos.  


segunda-feira, 13 de maio de 2013

A IGREJA NO MUNDO PÓS-MODERNO

A IGREJA NO MUNDO PÓS-MODERNO
Côn.José Geraldo Vidigal de Carvalho*
Num contexto consumista no qual impera o liberalismo econômico a Igreja que condenou as teses do comunismo ateu prega a procura da igualdade de oportunidades e de direitos e pugna pelos benefícios sociais. Defende uma equânime distribuição e redistribuição das riquezas e reprova a concentração dos bens nas mãos de uns poucos. A doutrina social do magistério eclesiástico aborda com perfeição as magnas questões que afligem a sociedade. Diante do fenômeno da pobreza, se de um lado condena o paternalismo paralisante, ensina que cumpre a promoção do pobre pelo pobre mesmo, abrindo as portas para um trabalho digno. Todos devem poder enfrentar a vida por meio de uma profissão qualquer. A ajuda aos doentes precisa ir até o ponto de que ele recupere a saúde para poder ter forças e se entregar a um labor produtivo. É claro que nas moléstias crônicas a Igreja batalha para que a aposentadoria por invalidez seja suficiente para arcar com as despesas atinentes à manutenção da vida. Bem se sabe que, por exemplo, os vicentinos primam por uma notável assistência aos doentes e procuram captar recursos para suas obras caritativas. Eles também demonstram assim que os mais necessitados são o tesouro da Igreja. Aliás, o Papa Francisco patenteou sempre este interesse pelos marginalizados e, sem esta dedicação aos pobres, afirmou “construiremos uma Igreja medíocre, morna e sem força”! A caridade como esmola é urgente como socorro imediato ao necessitado. Cumpre implantar por toda parte a cultura da solidariedade. Nunca se insiste demais nas correções na vida dos cristãos que vivem no luxo e nos gastos desnecessários, esquecidos daqueles que passam por dificuldades. São os que adoram o dinheiro e o consumo, em vez de auxiliar os outros, dissipam o que têm com o supérfluo. É a vivência de um materialismo destrutivo e que impede entesourar para o céu, pois ao invés de se ir ao encontro da miséria alheia se desperdiça com o inútil, o não necessário. Cumpre, então, sobrrtudo também evitar o hedonismo, alimentado,  pela propaganda que incrementa a compulsão pela compra inútil. Por tudo isto, é preciso a projeção da transcendência espiritual na existência do discípulo daquele que asseverou: “O que fizerdes ao menor de vossos irmãos foi a mim que o fizestes”. O referencial de todo ato caritativo é Cristo visto na pessoa do próximo. Isto é hoje tanto mais imperioso, porque se vive num mundo que aliena Deus, menoscaba os valores e estimula a ganância. Eis a razão pela qual a Igreja mais do que nunca incentiva o combate esclarecido pelo progresso ético, educacional, profissional. Devem ser valorizados os Cursos técnicos que oferecem um mercado de trabalho utilíssimo em vários setores da sociedade, Esta precisa de competentes enfermeiros, eletricistas, fotógrafos, cabeleireiros, de especialistas em marketing, em informática, em contabilidade, em corte e costura, enfim em tantas outras atividades que não requerem um Curso Superior. Há inclusive, oferecido por entidades ligadas às pastorais paroquiais, cursos para garçons, para funcionárias domésticas, para diaristas. Estão, felizmente, voltando às Escolas de Ensino Médio os Cursos de Magistério, de Secretariado que habilitam com eficiência pessoas que não podem, por razões diversas, freqüentarem uma Universidade. É imprescindível incorporar todas as pessoas, quanto antes, à comunidade através de uma educação que lhes possibilite ascensão no mundo do trabalho. Isto é possível quando se age com aquele amor pregado por Cristo no Cenáculo, dileção que gera retidão, justiça e impregna as relações sociais de uma espiritualidade que ultrapassa todas as barreiras. O impacto do imperialismo cultural dos países capitalistas e das classes ricas, somente assim, poderá ser enfraquecido. Entender-se-á também que não há populações inferiores só por não se identificarem com os padrões ditos civilizados dos países do primeiro mundo. Deste modo se estará caminhando para um novo conceito de desenvolvimento que não seja a mera prática de idéias ilusórias transmitidas pelo capitalismo internacional as quais reforçam a dependência. Somente, desta maneira, se dirá que, com toda a verdade, que se é cristão, porque não se está de acordo com a corrupção, com a imoralidade, com tudo que se contrapõe ao Evangelho. As forças do bem são ontologicamente mais fortes que as do mal. Estas forças bem dirigidas mudarão a fisionomia do mundo dito pós-moderno. Somos todos responsáveis pela transformação da sociedade hodierna. Enquanto, porém, aquele que é cristianizado compactuar com a mentalidade materialista reinante, ele não apenas trai o Evangelho como contribui para piorar a situação mundial. Professor no Seminário de Mariana durante 40 anos.

quarta-feira, 8 de maio de 2013

DESILUSÃO COM A POLÍTICA

DESILUSÃO COM A POLÍTICA
Côn. José Geraldo Vidigal de Carvalho*.
A grande dúvida que paira na mente do cidadão perante o que vem acontecendo no Brasil é se, de fato, há da parte dos líderes políticos uma convicção para transformar a realidade. Neste momento, apesar de tanta miséria, o que se vê são construções monumentais erguidas com o dinheiro público e que se transformarão em elefantes brancos. É o caso típico dos estádios de futebol nos quais verbas astronômicas estão sendo gastas num desperdício de dinheiro que clama aos céus. No entanto, com estas quantias vultosas hospitais poderiam estar sendo construídos, ou os já existentes deveriam ser mais bem equipados. Favelas estariam em condição de serem erradicadas. Escolas que funcionam em estado precário teriam recursos para serem reedificadas, oferecendo condições aptas para um ensino mais eficiente. Cumpre, por tudo isto, reabilitar a política nacional. No dizer do papa Francisco “a política é uma forma mais elevada de caridade social. O amor social se expressa no trabalho político para o bem comum”. A reta aplicação dos impostos, por sinal, em nossa pátria, altíssimos não se dá, exatamente pela má formação daqueles que se mostram condutores incompetentes a malbaratar o erário público Isto ocorre ainda, o que é mais calamitoso, no desvio de somas fabulosas no interesse pessoal. Quando tal não acontece, o essencial para o povo fica completamente esquecido porque faltam idéias e não se projeta um progresso real em longo prazo. Em razão disto os valores éticos ficam postergados e a democracia desonrada. Multiplicam-se as desgraças e as classes inferiores, é claro, são as mais prejudicadas. As alianças políticas resultadas da ânsia pelo poder massacram as magnas questões que afligem a população, uma vez que o objetivo é ganhar as eleições seguintes a todo preço e um absurdo enriquecimento pessoal. Deste modo, muitos políticos deixam de ser os guardiões da soberania da nação, porque vale um país o que valerem as condições humanas de seus habitantes e a honradez de seus dirigentes. Quem recebe um mandato público precisa contemplá-lo como um serviço à comunidade e não aos partidos e, menos ainda, a si próprio. São muitos os maus agentes da missão que receberam nas urnas. As obrigações assumidas, as promessas feitas são olvidadas. Nem de longe, alguns pensam em atender as dimensões humanas de seus eleitores. Negócios feitos por baixo do pano vão dilapidando a riqueza nacional e os frutos amargos destas atitudes iníquas se fazem ver por toda parte. Entretanto, é preciso que os bons políticos, juntamente com o povo, lutem mais tenazmente para quebrar os círculos viciosos, impedindo que os medíocres cheguem ao poder. Este é sagrado, porque toda autoridade vem do Ser Supremo. É necessário,então, pugnar com destemor contra as camarilhas do poder. Entretanto, os chefes de Estado ou chefes de serviço, têm, eles em primeiro lugar, obrigação de se mostrarem honestos. Isto, contudo, nem sempre acontece. * Professor no Seminário de Mariana durante 40 anos.

sábado, 4 de maio de 2013

SANTISSIMA TRINDADE, NOSSO DESTINO


SANTÍSSIMA TRINDADE, NOSSO DESTINO.
Côn. José Geraldo Vidigal de Carvalho*
Saímos de Deus. Um dia, a Ele voltaremos. Esta foi a grande revelação de Cristo. Aí esta o núcleo mesmo da religião. Eis porque a Trindade é o dogma central de nossa vida. É nossa beatitude que está em jogo quando professamos o mistério trinitário. Sem este, a religiosidade se desarraiga e perde sua profundidade e sua força salutífera. Este dogma deve polarizar a vida cristã. O Concílio Ecumênico Vaticano II mostra que “unidos, pois, a Cristo na Igreja e marcados pelo Espírito Santo, que é penhor da nossa herança, somos, na verdade, chamados filhos de Deus e o somos de fato, mas ainda não aparecemos com Cristo na glória, na qual seremos semelhantes a Deus, porquanto O veremos como é”. Santo Tomás explica que as processões trinitárias são a razão e a causa da produção das criaturas, bem como de todo o retorno destas à sua origem. É dentro desta perspectiva que se pode conceituar o mundo criado conforme o dito joanino: “No princípio era o Verbo e o Verbo estava em Deus, e o Verbo era Deus. Ele estava no princípio em Deus. Todas as coisas foram feitas por Ele, e nada do que foi feito, foi feito sem Ele”. Este universo criado, grandioso, mas limitado, por que marcado pela finitude essencial é a pulquérrima exteriorização da idéia divina. Mas no cosmos, ao borbulhar de um amor eterno, o homem recebeu a plenitude do Espírito de Deus e está destinado à visão e ao gozo eterno das Pessoas divinas. É esta a maravilhosa História da Salvação por meio da Encarnação da Segunda Pessoa e da vinda do Paráclito. A Igreja situa-se nessa faixa como sacramento do retorno humano para a Trindade. É a comunidade congregada na unidade do Pai, do Filho e do Espírito Santo. Por toda a eternidade veremos o Pai na luz do Filho, amando-os com o amor intenso do Espírito Santo. Felicidade sem fim. Venturosa inenarrável! Eis porque, nesta terra, por uma devoção interior e pessoal, devemos continuamente já viver em função do Deus três vezes santo. Santo Anselmo nos ensina que “de nada serve crer na Santíssima Trindade, se não se tende religiosamente para Ela”. A esperança de um dia estar sempre com Deus é força nas lutas neste exílio terreno. É o que confortava São Paulo: “Tenho para mim que os sofrimentos da presente vida não têm proporção alguma com a glória futura em nós”. O mesmo apóstolo então mostrava que, fortes na fé, aguardamos “a esperança bem-aventurada e a manifestação do grande Deus e Salvador nosso Jesus Cristo” [...] “Será Ele que transfigurará nosso corpo abatido, para que seja conforme o seu corpo glorioso”. Enquanto peregrinamos no exílio nos unimos a nossos irmãos já de posse da glória num mesmo louvor da Santíssima Trindade Até que chegue o dia claríssimo da eternidade, “quando Cristo aparecer e se der a gloriosa ressurreição dos mortos, a luz de Deus iluminará a Cidade celeste e o Cordeiro será sua luz”. Será este o momento máximo da história pessoal de cada fiel, porque, doutrina o Concílio, “então toda a Igreja dos Santos na suma beatitude da caridade adorará a Deus e ao Cordeiro que foi imolado (Apoc. 5,12), proclamando numa só voz: “Ao que está sentado no trono e ao Cordeiro o louvor e a honra, e a glória e o poder pelos séculos dos séculos” (Apoc. 5,13-14). Enquanto não surge o grande momento da manifestação do Senhor, em cada Missa da qual participamos, e, sempre que o Espírito Santo nos inspirar, repitamos cheios de fé, esperança e muito amor: “Santo, Santo, Santo é o Senhor Deus dos exércitos. Os céus e a terra proclamam a Tua glória. Hosana no mais alto dos céus”. Crer na Trindade é apoiar-se nas Três Pessoas divinas, firmar-se nelas, refletindo no comportamento diário a sabedoria e a dileção de Deus. Acreditar neste Deus-Amor que nos criou, nos salvou e nos santifica. Experimentar Deus Uno e Trino e vê-lo presente nos outros, até que se concretize a volta ao Pai pelo Filho no Espírito Santo. * Diretor Espiritual do JUC

sexta-feira, 3 de maio de 2013

A oração deve atingir o íntimo do coração

A ORAÇÃO DEVE ATINGIR O ÍNTIMO DO CORAÇÃO
Côn. José Geraldo Vidigal de Carvalho*
Muitos orantes não alcançam o objetivo primordial da prece por se esquecerem de que uma oração que não atinja a profundidade do coração é útil, mas superficial. É benéfica porque não deixa de ser um esforço para entrar em contato com Deus. Pouco profunda, porque orar é falar, mas também saber escutar o Ser Supremo. Lemos na Carta aos Hebreus: “Por isso, como diz o Espírito Santo: “Hoje, se ouvirdes a sua voz, não endureçais os vossos corações, como no lugar da exasperação, no dia da prova no deserto, quando vossos pais me puseram à prova, numa experiência, não obstante tivessem visto as minhas obras” (Hb 3,10). Cumpre ouvir as mensagens divinas e colocá-las em prática. A primeira conseqüência desta atitude silenciosa é a purificação interior, uma vez que, quando ocorre a introspecção, logo o fiel percebe que estar na presença do Deus três vezes santo leva, de plano, a aborrecer todas as distorções que possam existir lá no íntimo de si mesmo. Este arrependimento ao qual se une a reta intenção de ser agradável em tudo a seu Senhor possibilita a verdadeira intimidade com Ele. Como gosta de repetir o Papa Francisco, “Deus não é uma espécie de empresa de logística que envia mensagens o tempo todo”. O fiel precisa estar conectado com Ele numa atitude receptiva. Dá-se, então, uma aproximação cordial que ilumina, fortifica e renova o modo de pensar e agir. Isto ocorre exatamente quando alguém reza com todo o seu ser. Acontece o papel transformador da oração. Disto resulta a calma, a tranqüilidade, a serenidade absolutas. Deus é luz que ilumina os que dele se aproximam com um coração repleto de sinceridade e de amor. A prece do coração consiste desta forma em encontrar o caminho que permite ao orante captar esta luminosidade. Permite-se, desta forma, que Deus mesmo santifique seu nome naquele que se volta para Ele. Orar outra coisa não é, de fato, senão acolher o Pai e participar de sua vida que ele oferece pela graça. Acolhê-lo é permitir que Ele nos comunique o Filho que passa a possuir o seu reino na alma de quem assim reza. O Espírito Santo ganha espaço para produzir entre o fiel e a Trindade Santa liames indestrutíveis. Dá-se, realmente, uma purificação fundamental, porque todas as manchas interiores, todas as desordens, todas as vulnerabilidades são confiadas Àquele que se torna o baluarte do cristão. Este repete com São Paulo: “Eu tudo posso naquele que é a minha fortaleza” (Fl 4,13). Envolto na luz divina, abertos os olhos sobre a realidade da fraqueza humana, se percebe ao vivo a infinita misericórdia de Deus na qual se imerge sem restrições, sem o jogo das circunstâncias que levam a mil distrações. É quando o coração conhece a autêntica liberdade. Isto porque se adquire, progressivamente, o hábito de se voltar continuamente para Deus, sobretudo, quando assim se caminha até Ele a partir daquilo que em cada um é obscuro, tenebroso, inquietante. O verdadeiro orante intui o movimento do Espírito Santo nele, agindo maravilhosamente, livrando-o da rede complexa das emoções, dotando-o c de paciência, perseverança. O principal é estar integrado conscientemente no dinamismo do Espírito. Trata-se de aprender a estar vigilante aos movimentos do próprio coração de tal modo que se possa estar unido voluntariamente à ação divina que age nos fiéis de boa vontade. São Paulo asseverou que o Espírito Santo vem a cada um com gemidos inexprimíveis. Sua ação, porém, normal não oferece idéias claras, nem luz ofuscante, ou proporciona seja o que for. Ele induz, isto sim, a estar voltado para as coisas do alto e não para as da terra. O cristão se vê liberto, não se sente escravo do mundo, não tomba no temor, mas se percebe, verdadeiramente, filho deste Deus que tanto o ama. Deste modo, fica, inclusive, afastada a ousadia de se querer controlar a Deus, fazendo-Lhe exigências descabidas. É quando o cristão roga os favores divinos, intercede por si e pelos outros, mas simplesmente colocando tudo nas mãos da Providência divina. Tem inclusive a certeza de que, se o benefício almejado não for da vontade sapientíssima do Todo-Poderoso, Ele dará algo muito melhor. * Professor no Seminário de Mariana durante40 anos.