O SIGNIFICADO DA MORTE DE CRISTO
Côn.José Geraldo Vidigal de Carvalho*
Muitas vezes se reflete sobre o motivo do sacrifício do Calvário o que é sumamente importante para a vida espiritual do cristão. É necessário, porém, além disto, ir fundo no significado da morte do Filho de Deus. São Paulo na Carta aos Filipenses ressalta que Cristo Jesus “despojou-se a si mesmo, tomando a natureza de servo” (Fl 2,7). Ele, realmente, renunciou a si mesmo num total abandono ao Pai, tornando-se “oblação e sacrifício de agradável odor” (Ef 5,2), “humilhou-se, fazendo-se obediente até à morte e à morte de cruz” (Fl 2,8). Ele consentiu inteiramente nesta entrega radical, sendo o servidor sujeito ao Pai, imergindo-se totalmente no silêncio de Deus. Este aspecto da cristologia é importante, dado que a glorificação de Jesus decorreu exatamente desta sua postura. Explica São Paulo: “Por isto Deus o exaltou e lhe deu o nome que está acima de todo o nome, para que, ao nome de Jesus, todo o joelho se dobre, nos céus, na terra, e abaixo da terra, e toda a língua proclame que Jesus Cristo é o senhor para a glória de Deus Pai” (Fl 2, 9-11). Eis aí o fundamento de toda honra e glória do divino Redentor da humanidade. O rebaixamento voluntário do Filho corresponde à honraria que Lhe estabelece o Pai. Houve um sublime intercâmbio entre estas duas Pessoas da Santíssima Trindade sob o influxo do Espírito Santo, dado que tudo isto se deu por força de um amor mútuo sem limites. O próprio Jesus assim se dirigiu ao Pai: “É chegada a hora. Glorifica teu Filho para que teu Filho te glorifique” (Jo 17,1). Jesus se referia à sua morte no Gólgota. Comentando esta passagem, Santo Agostinho escreveu que foi como se Cristo dissesse “Ressuscita-me para que tu te faças conhecer por mim a todo o universo”. Tem razão o sábio bispo de Hipona, pois a plenitude de Jesus se manifesta no seu surgimento da morte pelo poder divino. Jesus que admitira a entrega ao Pai até o ato supremo da morte, concorda, igualmente, na recuperação da vida da parte dele, pelo seu poder onipotente. A glória da ressurreição tem o seu epílogo admirável no dia da ascensão ao céu. Tudo isto porque pelo Filho a obra que o Pai lhe outorgou para fazer é a revelação do dom mútuo do Pai e do Filho na pessoa do Espírito Santo. Trata-se de verdade que ultrapassa a razão humana, mas que a teologia harmoniza, dado que introduz o fiel no âmago do mistério trinitário. A manifestação divina por ocasião do batismo de Jesus no rio Jordão e da transfiguração no monte Tabor são sumamente então elucidativas. Todas estas considerações levam a consequências teológicas essenciais, indispensáveis à existência cristã. Penetrar a glória de Deus é se aproximar de maneira mais tangível do esplendor e da magnificência do Ser Supremo, não apenas num deslumbramento exterior a si mesmo, mas também, muito mais, numa experiência íntima, rica de uma percepção quase sensível do indizível, num acolhimento do amor do Pai, da obra salvadora do Filho, através do total acolhimento do Espírito Santo. Com sua morte, Jesus satisfez inteiramente a justiça divina e enviou aos seus discípulos a Terceira Pessoa da Santíssima Trindade para prosseguir neles a sua obra. Esta obra é a manifestação da glória do Pai e do Filho. Isto se realiza na hora da morte do cristão que recebeu em plenitude os frutos de sua redenção, quando “Deus será tudo em todos” (1 Cor 15,28). O verdadeiro seguidor de Cristo é já neste mundo o lugar da glorificação das Três Pessoas divinas. Foi o que ensinou o próprio Jesus: “Se alguém me ama, meu Pai o amará, viremos a ele e faremos nele nossa morada” (Jo 14,23). Aí está o penhor da vida eterna merecida pela morte do Salvador. Este amor para com Ele e o Pai é fruto da ação do Espírito Santo que leva ao conhecimento pleno do significado da morte de Jesus. Então à imitação de Cristo Salvador, a peregrinação do cristão nesta terra tem um fim sublime: glorificar o Pai no Espírito dando frutos de santidade. Isto representa manifestar a presença de Deus em cada instante da própria vida, testemunhado as maravilhas que o Criador realizou na obra salvífica através da adesão total do Filho numa ação que manifestou uma dileção sem limites. Então o cristão, vivendo sua proximidade extraordinária de Deus, se torna sinal vivo de sua presença no meio em que se acha. Entretanto, este ideal só é colimado se cada um sai de si mesmo, se despoja como Jesus e se entrega inteiramente nas mãos do Pai. Renúncia que é um verdadeiro enriquecimento por ser despojamento de tudo que impeça a clara visão de Deus. Enriquecimento, porque, penetrando então melhor no amor de Deus, o ser humano se engrandece, realizando-se em plenitude. Como a glória de Cristo culminou na cruz no dom sem reserva que Ele fez de sua pessoa ao Pai, assim pela oblação cotidiana de si mesmo o cristão entra neste movimento de uma glorificação sem cessar de Deus. Eis porque é importante decodificar o verdadeiro significado da morte de Cristo. * Professor no Seminário de Mariana durante 40 anos.
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