O CRISTÃO E O MUNDO
Côn.
José Geraldo Vidigal de Carvalho* Quando o ser humano procura estar unido a Deus, implicitamente ele adere
à obra admirável do Criador. Com efeito, ensina
a Bíblia que “narram os céus a glória de Deus e o firmamento anuncia a obra de
suas mãos” (Sl 18, 2); e ainda “é a partir da grandeza e da beleza das
criaturas que, por analogia, se conhece o seu autor” (Sab 13, 5). A natureza patenteia
Deus aos homens, pois Ele criou o ser racional capaz de conhecê-lo e de contemplar
na natureza os sinais da Sua existência. O Catecismo da Igreja Católica (§ 31 a 35) diz que
o homem traz em si o desejo de buscar a Deus. É um desejo inscrito pelo próprio
Criador. Não importa o quanto queiramos fugir, sempre somos atraídos para Ele. É
o que explicou magistralmente Santo Agostinho: “Fizeste-nos para Ti, Senhor, e
o nosso coração está inquieto enquanto não repousar em Ti.” (Conf. 1, 1). O
Bispo de Hipona ainda explicou: "Interroga
a beleza da terra, interroga a beleza do mar interroga a beleza do ar que se
dilata e difunde, interroga a beleza do céu (...) interroga todas estas realidades.
Todas te respondem: Estás a ver como somos belas. A beleza delas é o seu
testemunho de louvor. Essas belezas sujeitas à mudança, quem as fez senão o
Belo, que não está sujeite à mudança?" (Sermão 241. Apud CIC 32). É que as
maravilhas que há na natureza mostram às inteligências em busca da felicidade a
infinita sabedoria do Ser Supremo que as criou porque o “bem é de si difusivo”,
segundo Santo Tomás de Aquino. O Ser Infinito não deve ser entendido como quem
ultrapassa as criaturas criadas à sua imagem e semelhança, mas o Bem Supremo que
as cumula e se oferece para enchê-las sempre mais de dons. Donde o segredo de
uma vida feliz é estar unido a esse Bem Eteno com o coração continuamente
agradecido, confiando a Ele o futuro. Ai o segredo de uma realização pessoal,
assegurando um progresso contínuo, reparando as naturais debilidades humanas do
passado. Ao lastimar as faltas ocorridas, gozando o bem já recebido, abre-se para
quem crê a perspectiva para a esperança, firmada na certeza de que Deus é
misericordioso, “Deus é amor”, como bem O definiu São João (1 Jo 1,4). Nele o ilimitado dos apelos humanos e a insaciabilidade
de seus anelos encontra a solução de todos os problemas naturais a seres contingentes,
limitados. A indiferença humana ou a desatenção perante a realidade divina
fragilizam, a mediocridade religiosa aniquila, mas o imergir no oceano de
bondade que é Deus engrandece imensamente o homem. Isso por que a religiosidade
profunda lança na Realidade Eterna e o faz participante da mesma natureza
divina através da graça santificante recebida no Batismo. Feliz o que tem o
olhar para Aquele que verdadeiramente não muda e que, além-vida terrestre, oferece
uma eternidade bem-aventurada, no incomparável repouso da visão beatífica. São
Paulo deixou claro que agora conhecemos a Deus e as coisas divinas pelo seu reflexo,
através das criaturas por dedução analógica de uma imagem imperfeita, mas no
céu, conheceremos com visão intuitiva, nítida e plena porque veremos Deus face
a face (1Cor 132,12). Eis a razão pela qual cumpre evitar todo o risco de se
entregar aos fins terrenos, esquecendo os bens sobrenaturais. Lembra o livro Imitação
de Cristo que ainda que possuísse todos os bens criados, o homem não poderia
ser feliz e estar contente, porque só em Deus, Criador de tudo, consiste sua
bem-aventurança e felicidade; não qual a entendem e louvam os amadores do
mundo, mas como a esperam os bons servos de Cristo, e, às vezes, antegozam as
pessoas espirituais e limpos de coração, já aqui na terra «cuja conversação
está nos céus». Fichte, filósofo alemão, teve razão ao dizer que «Desde que o
homem caia em si e a si mesmo pergunte se é feliz, logo ecoa no seu íntimo uma
voz muito clara dizendo: Ó não! De forma alguma! Ainda continuas tão vazio e
indigente como a princípio! — Convencido disto, julga ter errado tão somente na
escolha do objeto e logo se atira a outro. Mas também este o deixa insatisfeito
como o primeiro. Jamais achará contentamento em coisa alguma que exista debaixo
do sol e da lua”. De fato, só em Deus o ser humano encontra a resposta a suas
indagações. A felicidade íntima do homem é proporcional, porém, à largura e
profundidade da sua fé. Alegria e paz eis o que Deus deseja para todos, mas é preciso
estar em sintonia permanente com Ele Encontro pessoal com Aquele que quer fazer
cada um participar de sua própria vida. *
Professor no Seminário de Mariana durante 40 anos.
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