A ÉTICA CRISTÃ
Côn.
José Geraldo Vidigal de Carvalho*
Iluminadora
a diretriz de Jesus: “Se me amardes, guardareis os meus mandamentos” (Jo 14,15)
Todos os valores da vida se acham não nas palavras, mas nas obras, na
observância de tudo que está compendiado no Sermão da Montanha (Mt cap. 5-7). A lei divina não é de essência jurídica, mas
essa lei é amor. Não se trata de um mero conformismo, mas de uma submissão amorosa
de todo o ser à única vontade do Senhor de tudo. A vida cristã, porém, seria
impossível, sem incluir Deus a quem tudo é possível. O ser humano não pode
perseverar na prática do bem, se o dom da graça não o faz compreender que ele
só será feliz nos caminhos do Evangelho. Isto como fruto da fé, da esperança e
da dileção a Deus e ao próximo. Os mais elevados cumes da moral cristã são
acessíveis a todos que confiam em Cristo, pois sem Ele ninguém é forte, ninguém
é santo e os esforços humanos em si nada são. É pedido ao cristão levar uma
vida longe da vulgaridade de tudo que deturpa a nobreza de quem foi criado à
imagem e semelhança de Deus, mas nunca a graça é negada a quem se dispõe a
corresponder aos desígnios divinos. Entretanto quanto mais uma alma se eleva
nas trilhas de Deus, tanto mais experimenta o sentimento de sua pequenez,
porque Deus cresce a seus olhos infinitamente mais do que ela própria pode
crescer. Torna-se mais humilde, dado que atinge a verdade por se conformar à
própria Verdade eterna. O cristão verdadeiro se define pela abnegação completa
de si e da vontade própria, procurando se identificar com o Mestre divino como
aconteceu com São Paulo: ”Já não sou eu quem vive é Cristo quem vive em mim”.
Dá-se então a distinção entre o mundo da fé e o mundo do mundo. O primeiro deve
impregnar os pensamentos, gestos, ações, não deixando que o segundo ocupe todos
os espaços pessoais. Cumpre, portanto, que haja a apuração e subordinação
completa a Deus de todas as potências ativas e passivas da vida. Deste modo se
foge das ilusões mundanas. Assim sendo, não basta ter confiança em Deus e rezar
para o bom êxito em tudo que se faz. A religião verdadeira subordina tudo a
Deus e vê o seu reino estender-se a tudo e se dedica de corpo e alma à
plenitude e à extensão desse reino. Por isso Jesus ensinou a rezar ao Pai d
Céu: “Venha a nós o vosso reino”. O autêntico cristão, unido a seu Senhor, está
impregnado do espírito profético, anunciando pelo exemplo e pelas palavras a
grandiosidade do reino de Deus, longe do qual não há felicidade possível.
Trata-se de orientar tudo para Deus, submeter tudo a Deus donde resulta sempre
retificar a conduta diária, de sacrificar os gostos pessoais, de, perseverantemente,
se aperfeiçoar em casa, no escritório, nos lugares de diversão, onde quer que
se esteja. Busca da perfeição na vida familiar, nas amizades, na vida
individual e isso é viável porque o Espírito Santo habita no autêntico cristão,
iluminando cada uma de suas ações. Nunca se pensa demais que o céu não é para
os que nele simplesmente acreditam, mas não fazem por merecê-lo, atentos às
exigências estabelecidas pela ética cristã. Cristo foi claro; “Entrai pela
porta estreita, porque larga é a porta e espaçoso o caminho que conduz à
perdição, e muitos são os que entram por ela” (Mt 7,13). O cristianismo supõe realizações
concretas sem as quais os ensinamentos são inúteis. Não basta se dizer cristão,
é preciso ser cristão. A fé e a religião verdadeira procedem do interior do
verdadeiro cristão refletido isto numa conduta coerente em tudo. É necessária
uma vitória persistente contra as resistências obstinadas do egoísmo que impedem
a renúncia; da fuga do culto do eu, substituindo o culto de Deus e o amor aos
irmãos. Como bem se expressou Pascal, muitos cristãos se ocultam em
exterioridades e não na pratica da fé. Não se pode esquecer que a máxima do
mundo é ter, conseguir muito êxito a qualquer preço, mas a máxima cristã é ser,
é renunciar a tudo que confronta com os preceitos estabelecidos por Cristo. A
vida eterna deve ser vivida desde agora, pois o desprendimento cristão não é
pessimismo, desconhecimento das coisas, mas sim o desprendimento do amor,
desprendimento de tudo que é conforme ao amor próprio para poder a amar a Deus
e o próximo. O desprendimento, porém, sem Deus é impossível e absurdo. Sem Deus
só temos a nós mesmos. A ética cristã é, deste modo, uma moral de senhores de
si próprios pela submissão ininterrupta a Deus do que resulta um mundo melhor. *Professor no Seminário de Mariana durante
40 anos.
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