quarta-feira, 9 de novembro de 2011

MULTIPLICAR OS TALENTOS

MULTIPLICAR OS TALENTOS
Côn. José Geraldo Vidigal de Carvalho*
Na parábola dos talentos recebidos e restituídos se depara o magnífico elogio aos que os multiplicaram: “Muito bem, servo bom e fiel” (Mt 25, 21.23) e se encontra ao que nenhum lucro apresentou terrível reprimenda: “Servo inútil”. Os primeiros entraram para a felicidade de seu senhor, este último foi lançado nas trevas. A mensagem do Mestre divino é patente: da administração sábia e eficiente do tempo da vida presente depende a salvação eterna. O julgamento divino será justo e a recompensa perene ou será uma pena eterna. Num dos elementos do processo da gerência dos dons recebidos está incluído o zelo pela salvação do próximo, uma vez que ninguém entrará no Reino dos Céus sozinho, dado que as boas obras arrastam infalivelmente os outros para os caminhos de Deus. Para isto é necessário o cuidado contínuo, bem valorizando a comunicação verbal e a não verbal. As pessoas, com efeito, não se comunicam apenas por palavras, mas ainda através de seu modo de ser e de viver. Estudos atualizados mostram que a comunicação não verbal é tão ou até mais importante do que aquilo se diz. Esquece-se, muitas vezes, que menos da metade da boa comunicação é composta pela fala, o restante está ligado à vivência do comunicador. Isto não apenas pelo seu exemplo de vida, mas também porque o que ele fala só tocará o receptor da mensagem se esta tiver inteiramente impregnado a mente daquele que a profere. Bem disse o Pe. Antônio Vieira que “palavras sem exemplo são tiros sem balas”. Eis porque o apóstolo de Cristo na multiplicação dos carismas sagrados doados por Deus se esforça para se tornar semelhante a Cristo, o Verbo divino, que se fez modelo para todos. Não bastam as expressões orais, os conselhos oportunos, mas é preciso também a ratificação com a conduta condizente com as mesmas. Foi o que acontecia com São Paulo que pôde dizer aos Tessalonisenses: “Sabemos que a nossa pregação do Evangelho não se deu entre vós, somente com palavras, mas também com obras poderosas, com a força do Espírito Santo, com plena convicção” (1 Ts 1,5). O modo como se fala é de suma importância, pois o coração e a vida passam então em borbulhar na mensagem transmitida. Os catequistas, os pais, os mestres, os cristãos em geral, enfim todos que são discípulos de Jesus devem se lembrar das palavras do mesmo Apóstolo aos Coríntios: “Somos embaixadores de Cristo” (2 Cor 5,10). É desta maneira que se frutificam os talentos outorgados por Deus a cada um. Com efeito, a palavra foi dada não apenas para cantar os louvores de Deus, para Lhe dar graças, mas ainda para instruir os irmãos e lhes passar sábias inspirações, alicerçadas com o testemunho existencial. Tudo isto, é claro, com muito discernimento, doçura, perspicácia, perseverança. Feliz aquele que pode repetir sempre: “Coloquei a minha vida a serviço do próximo e o próximo é Jesus Cristo”, o qual proclamou que veio para servir e não para ser servido. O que se esquece é que em qualquer situação sempre se está a serviço dos outros em casa, na Igreja, no trabalho, nas diversões. Pela reta intenção se pode então valorizar, e muito, os talentos. Para tanto é mister se lembrar sempre a advertência de Cristo: “Vós sois o sal da terra e a luz do mundo”. Os talentos foram concedidos exatamente para que esta missão seja cumprida e, em consequência, se possa frutificar em boas obras. O sal não é sal por si mesmo e em certos países serve até para fazer a terra dar bons frutos. É que multiplicar os talentos não é viver para si mesmo, mas para os outros através de uma espiritualidade potente, irradiante. Esta espiritualidade é que torna o cristão luz, um reflexo da grandeza de Deus, vivendo coerentemente as promessas batismais. Multiplicar os talentos é também viver o espírito das bem-aventuranças. Condoer-se com os que choram; consolar os que sofrem; perdoar os que nos injuriam; ser artesão da paz, da não violência; não procurar o próprio interesse e estar atento aos marginalizados; é ser desapegado dos bens terrenos, multiplicando dentro de si os valores morais; é ter puro o coração sem se deixar contaminar com a depravação imposta pela mídia, pelos sites pornográficos; é ter fome e sede de justiça, é ser misericordioso. É, em síntese, realizar a metáfora do sal da terra dando gosto, sabor a uma sociedade que muitas vezes se divorcia de Deus. É ser luz nas trevas, iluminando os que trilham os caminhos do erro nunca se esquecendo que não há nada tão prodigioso como o testemunho existencial e que nunca praticamos grandes bens ou grandes males sem produzirem os seus efeitos nos nossos semelhantes. As boas ações são imitadas por emulações e as más pela malícia da natureza humana e esta aprisiona, enquanto o bom exemplo liberta dos vícios e arrasta para o bem e multiplicando os talentos de cada um. Professor no Seminário de Mariana durante 40 anos.

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