DESAPEGO DOS BENS TERRENOS
Côn. José Geraldo Vidigal de Carvalho*
Nem sempre se compreende bem o que Jesus proclamou: “Bem-aventurados os pobres de espírito, porque deles é o reino dos céus (Mt 5,3). O Mestre divino prega a interiorização da pobreza, ou seja, viver o dom de ser pobre, desapegado dos bens terrenos, disponível para realizar em tudo a vontade divina. Ele deu o exemplo. A condição para seguir Cristo consiste em se fazer pobre. Esta pobreza significa total confiança em Deus (Lc 12, 22-24); esperança na salvação divina longe da idolatria das riquezas; liberdade diante do supérfluo e integral desprendimento de tudo. Isto leva à consciência da prioridade e da excelência do reino de Deus. Assim sendo, os ricos também estão predestinados a essa ventura celeste, embora os pobres estejam mais perto, tenham maior facilidade de alcançá-la, porque não têm grandes obstáculos a vencer. O Evangelho ensina que as riquezas podem se tornar um fardo pesado, porque há o perigo do endeusamento daquilo que deve ser um meio e não um fim em si mesmo. Isto pode perturbar a caminhada rumo ao céu e as riquezas não devem ser espinhos que abafem a visão da eternidade, impedindo o crescimento espiritual. À luz da fé uma pessoa de posses pode se santificar, ajudando os mais necessitados, vendo neles a figura de Jesus, que sendo rico, se apresentou como pobre. Amparo às obras sociais, contribuição para uma sociedade mais justa e equânime na qual haja uma maior distribuição da riqueza. A pobreza de Jesus não significou uma falta de bens necessários à subsistência. Ele morou numa casa, na verdade modesta, mas que era propriedade de seu pai perante a lei, o carpinteiro José (Mt, 2,12). Depois o grupo de seus apóstolos recebiam subvenção dos amigos, sobretudo de senhoras abastadas da burguesia (Lc 8,1). Sua pobreza equivalia à liberdade (Mt 8,20), à mansidão e à humildade de coração, à disponibilidade diante da vontade do Pai (Jo 4,34) e foi pobre até a morte na cruz (Fl 2,8). Como mostrou São Paulo, de rico se fez pobre para enriquecer outros (2 Cor 8,9). Ele expressou solidariedade completa com os pobres a ponto de tomar sobre si os pecados do mundo (Jo 1,29). Ele curou os doentes e evangelizou os pobres (Mt 11,2-6). Ensinou que se deve amar os indigentes, honrá-los e servi-los. Do ponto de vista de Jesus é feliz o homem que tem a compreensão do necessitado e do carente de amparo. A Bíblia exalta a ajuda aos mais desprovidos de bens, pois a esmola redime os pecados e Deus tem compaixão de quem se interessa pelos marginalizados. Cristo está presente no pobre e no juízo final ele dirá aos eleitos: “Tive fome e destes-me de comer; tive sede e destes-me de beber; era peregrino e me hospedastes-me; andava nu e vestistes-me, estava doente e visitastes-me; estava no cárcere e fostes ver-me” (Mt 25,31 e ss). Trata-se de uma verdadeira exaltação do pobre! Eis porque, num momento de pulcra inspiração, Bossuet assim se expressou: “Não seja desprezada a pobreza, nem tratada com desdém. O rei de glória a tomou para si, a enobreceu, a divinizou, e concedeu aos pobres todos os privilégios do seu reino”. É que se deve ter a compreensão do pobre, vendo nele a pessoa de Cristo e tratando-o como se tratássemos a majestade padecente de Deus, que honra aquele que é caridoso, recebendo o óbolo da sua esmola. Cumpre lutar sempre para que todos os cidadãos tenham condição de trabalho e vejam sua dignidade respeitada. É preciso esforço para melhorar a sorte dos que sofrem e agir em tudo com espírito de solidariedade. Como ensina o salmo 81, é necessário fazer justiça ao fraco, ao órfão e acatar o direito do indigente que padece (Sl 81,3). É belo entrar no tugúrio do mendigo, assentar-se nas suas toscas cadeiras e deixar que ele desabafe suas amarguras e, até mesmo, aprender com sua experiência de vida. Com efeito, quantas virtudes sublimes e heróicas se escondem debaixo da miséria, sobretudo num país como o Brasil onde impera tanta corrupção e os impostos são tão mal empregados e, de fato, alarmantes os desvios do dinheiro público como os jornais, as revistas, e a televisão continuamente estão a denunciar. Nem se pode esquecer que a caridade coletiva tem um enorme valor, porque ela faz auxiliar estas associações caritativas, sobretudo, a Sociedade de São Vicente de Paulo, na qual os confrades vicentinos multiplicam a assistência aos desamparados, aplicando, religiosamente, os donativos. Não é necessário ser rico para dar, basta ser bom, porque os bons sempre encontram meios para fazer o bem. A oferta, porém, adquire um duplo valor quando é o fruto de algum sacrifício. Se ela é tirada dos nossos prazeres lícitos, das nossas necessidades particulares, então não damos somente um objeto material, damos alguma coisa da nossa alma, e Deus que vê a nossa esmola não deixará de nos recompensar. Nem se deve esquecer a esmola de um bom conselho, a esmola de uma boa palavra. Instruir, dirigir, proteger os infelizes em seus negócios temporais e espirituais, é um dos mais belos atos de caridade. É honroso ser semeador do bem, dando, assim, também a esmola do coração. A caridade cristã opera realmente maravilhas. * Professor no Seminário de Mariana durante 40 anos.
quarta-feira, 16 de novembro de 2011
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