O
CRISTÃO NO MUNDO
Côn. José Geraldo Vidigal de Carvalho
Enquanto está neste mundo, o cristão, que caminha
para a eternidade bem-aventurada do gozo da visão beatífica de Deus, deve estar
convencido da importância da ciência de bem viver. Ele não é um alienado, mas
deve valorizar o contato com a realidade terrena. Tudo que ele faz precisa
leva-lo a um aprimoramento interior à luz de uma religiosidade profunda. O
cumprimento do dever específico de cada um, segundo a vocação recebida de seu
Senhor, necessita visar a harmonia humana na relação com a natureza e o próximo
quer na família, no local de trabalho, nos lazeres, quer enfim em todos os contatos
que se multiplicam a todo instante. Isto levado pela força divina da graça e
percebendo assim por toda parte a presença daquele no qual “vivemos, e nos movemos,
e existimos”
(Atos 17,28). Então, impregnado de espiritualidade, o cristão pode
povoar de Deus o meio em que vive numa ação afetiva e efetiva. Deste modo, se
une tudo num concerto divino-humano, combinação sublime a proclamar sempre a
glória do Criador. É que os pensamentos e as atividades, as realidades e seus
reflexos possuem todos eles uma única fonte que é o Ser Supremo, mas nem todos
têm disto total percepção que deve sobrenaturalizar todas as ações, inclusive o
descanso. De fato, saber recrear-se alternando, criteriosamente, as atividades
laborais e religiosas é uma questão de bom senso e condição de eficiência
prática. Para o autêntico discípulo de Cristo não há modos secundários de vida,
pois tudo se transforma em louvor a Deus conformando tudo à sua vontade
santíssima. O grande problema é encontrar o meio termo para que se evitem os
excessos condenáveis que impedem os efeitos salutares que engrandecem aquele
que foi criado à imagem e semelhança de Deus. Todos temos a obrigação de viver
poupando a vida das intemperanças que a arruínam. Aí entra o valor inestimável
da prudência no agir cotidiano. É sabedoria saber usar através do exílio
terreno uma marcha equilibrada, freando entusiasmos deletérios, dosando todas
as atuações. É o louvável equilíbrio entre o tempo reservado às diversas ações
e o lazer sem nunca dar lugar à indolência, seja ela qual for. Além disto, é de se notar que a constância no
trabalho diário supõe uma judiciosa distribuição das tarefas numa organização
tal que impeça qualquer dispersão que pode também levar a uma situação
esgotante e inútil. Ordem nas ocupações diárias é sinal de sensatez que tudo
clarifica. A desordem deve ser banida da existência do cristão para que haja um
progresso espiritual ininterrupto, do qual resulta uma profunda alegria que
torna tudo deleitável. Desse modo o amor de Deus fundamenta a hierarquia dos
valores, realizando a subordinação das forças de quem possui um corpo animado
por uma alma espiritual. Evita-se assim o império de qualquer paixão e fraqueza
que degradam e aviltam o homem. A todas estas considerações se acrescente a
importância da convivência com os erros pessoais. Não se pode esquecer a
veracidade do brocardo “errar é humano, perseverar no erro é diabólico”. É
preciso sempre uma correção imediata e não desistir. Deve-se fazer dos
equívocos uma impulsão para novas vitórias. Pueril e condenável seria desanimar
na árdua marcha de uma existência virtuosa. Trata-se de repetir com o salmista:
“Meu sacrifício, ó Senhor, é um espírito contrito; um coração arrependido e
humilhado, ó Deus, que não haveis de desprezar” (Sl 51,17). Então o cristão
permanece firme como o rochedo batido pelas vagas. Percebe-se uma renovada
força espiritual na busca constante das virtudes. As almas nobres vivem uma vida bela e jamais
desanimam na escalada da própria perfeição rumo à eternidade. Buscam uma vida
pura, reta e corajosa guiadas por Jesus com quem tudo de bom se pode realizar.
O Mestre divino nunca decepciona quem nele confia. A fé e a esperança de
sólidas raízes conforta o autêntico cristão. Este combate o bom combate do bem
e não descoroçoa nunca e se alegra porque o amor de Cristo o sustenta. Luta sob
seu olhar e progride sempre sem nunca desfalecer. Vive com destemor o conselho de São Paulo aos
Romanos: “Não vos conformeis com
este mundo, mas transformai-vos, renovando vossa maneira de pensar e julgar, para
que possais distinguir o que é da vontade de Deus, a saber, o que é bom, o que
lhe agrada, o que é perfeito.” (Rm 12,2) * Professor no Seminário de Mariana durante 40 anos.
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