O AMOR DEVIDO A DEUS
Côn.
José Geraldo Vidigal de Carvalho*
No Livro do Deuteronômio
está claro o que falou Moisés: “Escuta Israel, nosso Deus é o único. Tu amarás
o Senhor teu Deus com todo o teu coração, com toda tua alma e com todo a tua força”
(Dt 6,4). Que o Criador de tudo mereça uma dileção sem limites do ser racional
é inquestionável. Com efeito, Ele é a
fonte de todos os bens e fora dele não se encontra felicidade. As ilusões
terrenas apresentam-se como algo que possa saciar a sede de ventura inata ao
homem, mas deixam sempre o amargor, um vazio tormentoso. Muito bem se expressou
Santo Agostinho: “Senhor, fizeste-nos para ti e inquieto está
nosso coração,
enquanto não repousa em ti”. É que Deus
é infinitamente perfeito, amável, fonte de todo amor. Nele, e apenas nele, se
encontra salvação e dele tudo se recebe a cada instante. Ele é o princípio de
todas as coisas, o fim de tudo e o centro de toda a existência humana. Por tudo isto, o amor autêntico que a Ele se
deve devotar necessita estar acima de todo interesse pessoal, tornando-se um
amor desinteressado. Isto por ser Ele o único que é digno de ser amado acima de
todas as coisas, de todas as outras pessoas. Cumpre então decodificar a
instrução dada por Ele através de Moisés, uma vez que se acha patente como Ele
deseja que todos O amem. Em primeiro lugar, de todo o coração, ou seja, todos
os afetos direcionados para Ele. Em consequência, tudo que tende a afastar dele
deve ser abolido. Um coração
inteiramente possuído por Ele sem o dividir com ninguém. Deste modo, quem tem
fé é direcionado para uma vida séria, digna de uma criatura totalmente voltada
para o seu Criador. Além disto, é preciso amar a Deus com toda sua alma, isto
é, com disposição sincera de tudo imolar por Ele numa renúncia a tudo que
impeça estar continuamente com Ele. Longe então fica qualquer pensamento de
transgressão aos sagrados mandamentos divinos. Deus acima de tudo que o mundo
possa oferecer. Tal se torna o lema do cristão: tudo perder por amor a seu
Senhor Onipotente. São Bernardo no seu livro “Tratado do Amor de Deus” ensina
que “a medida do amor de Deus é ama-lo sem medida”. Segundo os teólogos, há
indícios para se saber se alguém ama, de fato, a Deus. Antes de tudo é
necessário verificar se há inquietude, ficando a alma ansiosa com relação a sua
postura perante tudo que Deus merece. Desde que se tenha a reta intenção de
tudo fazer para a glória divina, excluído o amor próprio, o cristão nada tem a
temer. Aquele que perscruta o íntimo de cada um sabe perfeitamente que, apesar
das fragilidades inerentes a um ser contingente, quem é sincero almeja
unicamente agradá-lo nas menores ações de cada hora. Adite-se que não se deve
procurar uma devoção sensível, consolações ininterruptas no serviço de Deus,
mas, como alerta o Pe. Grou, é necessário “perseverar no meio das tentações,
dos desgostos, do abandono, porque tudo isto é prova de amor” É assim que se
chega à entrega sem reservas ao Ser Supremo longe de qualquer complacência em
si mesmo. Vive-se num vale de lágrimas e somente na eternidade se estará envolto
completamente nas delícias que Deus preparou para os que O amaram nesta terra (Sl
15,11). O fiel neste mundo sabe que toda sua existência está em Deus presente
em toda parte pela sua imanência. Ele pode
ser percebido de forma intensa por quem nele crê e vive na sua presença. Como está em belíssima
canção, baseada no salmo 139: “Tu me conheces quando estou sentado / Tu me
conheces quando estou de pé/ Vês claramente quando estou andando / Quando
repouso tu também me vês”. Pela sua transcendência Deus não se confunde com o
mundo, mas o mundo não existe sem Ele. A fidelidade a Ele é outro critério que
mostra o amor para com Ele. Fidelidade a tudo que Ele revelou à humanidade e
que se acha na Bíblia, fidelidade a Jesus, plenitude desta revelação divina. No
Evangelho se lê o que Cristo asseverou: “Eu vim trazer fogo à terra e o que
quero eu senão que ele se acenda” (Lc 12,49). Trata-se do fogo do amor divino.
É preciso então oferecer-se a Ele afim de que esta chama celeste consuma o que
é deste mundo e todas as impurezas da alma. Assim, cada batizado poderá
iluminar o mundo. Compreende-se desta forma a veracidade da célebre sentença:
“Se és cristão, tens o mundo nas mãos”.
O amor impulsiona a evangelização. Ninguém pode se santificar para depois evangelizar
se não for movido pelo amor a Deus e ao próximo. Foi o que ocorreu com os
santos. * Professor no Seminário de Mariana durante 40 anos
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