A SABEDORIA DO PAPA FRANCISCO
Côn. José Geraldo Vidigal de Carvalho*
A
teologia do Papa Francisco se distingue pelo seu caráter eminentemente pastoral.
Como bem ressaltou o Pe. João Batista Libânio, Francisco prefere “o discurso
direto, próximo das pessoas e procura tocá-las pela transparência da presença e por
uma linguagem simples, acessível com
toque pessoal e afetivo”. O livro “O nome
de Deus é misericórdia” recentemente publicado confirma inteiramente esta assertiva.
É que, quando alguém percorre as veredas divinas e se deixa guiar pelo Espírito
de Deus pode chegar a tal grau de discernimento e entendimento das verdades
reveladas que, passa a saborear o que é espiritual. Passa então a transmitir
aos outros esta sabedoria. Aliás, o Papa assim esclarece porque lhe veio o
desejo de realizar um Jubileu da Misericórdia: “As coisas me ocorrem espontaneamente,
são coisas do Senhor, cultivadas na oração”. A leitura da referida obra é acessível a todos
os fiéis, apresentando, porém, uma doutrina em nível dos mais eminentes
teólogos. O papa decodificou maravilhosamente o tema da misericórdia divina e
lançou uma frase lapidar: “A misericórdia é a carteira de identidade do nosso
Deus. Deus de misericórdia, Deus misericordioso”. Explica então que “a misericórdia
está profundamente ligada à fidelidade de Deus”. Como, porém, “o pecado é uma
ferida, que deve ser curada, medicada”, Francisco relembra a importância do Confessionário
onde se dá “o encontro com a misericórdia” O padre “naquele momento é o canal
da graça” que toca e que cura. Acrescenta: “O simples fato de uma pessoa
procurar o confessionário indica já um início de arrependimento, ainda que não
consciente”. Alerta então: ”Temos de sentir a nossa necessidade, o nosso vazio,
a nossa miséria”. Faz ver então que a Igreja é chamada a transmitir a
misericórdia a “todos os que se reconhecem pecadores, responsáveis pelo mal
praticado, que se sentem necessitados de perdão”. A Igreja, acentua o Papa, não
está no mundo para condenar, mas para permitir o encontro com aquele amor
visceral que é a misericórdia de Deus”. Num instante de pulcra inspiração, Francisco
lembra que “a tarefa da Igreja é fazer com que as pessoas percebam que não existem
situações das quais não podem se reerguer, pois enquanto estivermos vivos é
sempre possível recomeçar, se permitirmos que Jesus nos abrace e nos perdoe”.
Donde uma sentença luminosa que todos deveriam mentalizar: “Somos criaturas
amadas por Deus, destinatárias do seu infinito amor”. Um capítulo deste livro é
impressionante: “Pecadores, sim. Corruptos, não!” A elucidação desta verdade é
clara, pois “corrupção é o pecado que, em vez de ser reconhecido como tal e de
nos tornar humildes, é transformado em sistema, torna-se um hábito mental, um
modo de viver [...] O pecador arrependido, que depois cai e recai no pecado por
causa de sua fraqueza, encontra novamente perdão, desde que se reconheça
necessitado de misericórdia. O corrupto, ao contrário, é aquele que peca e não
se arrepende, aquele que peca e finge ser cristão, e com sua vida dupla provoca
escândalo”. Diz ainda o Papa que o corrupto “passa a vida buscando os atalhos
do oportunismo, ao preço de sua própria dignidade e da dignidade dos ouros”.
Francisco clama assim por uma sincera conversão e lembra que “na vida podemos
nos enganar, mas o importante é sempre reerguer”. Como um autêntico mestre, o
Papa ensina que há uma diferença entre a misericórdia que é divina e a
compaixão que “tem um rosto mais humano. Significa sofrer com, sofrer juntos, não
permanecer indiferente à dor e ao sofrimento alheio”. Jesus misericordioso “viu
uma grande multidão e encheu-se de compaixão por eles, porque eram como ovelhas
que não têm pastor” (Mc 6,4). Conclui então Francisco: “É desta compaixão que precisamos
hoje, para vencer a globalização da indiferença”. No último capítulo o Papa dá
as diretrizes para que se viva o Jubileu da Misericórdia. Vale a pena ler e
reler integralmente este livro do atual Pontífice para se mergulhar na clemência
divina e haurir as graças do indulto do Pai misericordioso. * Professor
no Seminário de Mariana durante 40 anos.
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