terça-feira, 27 de dezembro de 2016

ANO NOVO, NOVAS PERSPECTIVAS

ANO NOVO, NOVAS PERSPECTIVAS
Côn. José Geraldo Vidigal de Carvalho*

O início de um novo ano propicia uma reflexão sobre o bom emprego do tempo. Infelizes aqueles que malbaratam os dias de sua vida, os quais são dons preciosos que Deus lhes concede. O ideal de quem tem bom senso é utilizá-los do melhor modo possível, transformando o momento presente em contínua possibilidade de progresso em todos os aspectos. Para isto é preciso,, antes de tudo, ter consciência de que o tempo passa e a eternidade se aproxima, seja qual for a idade que se tenha. O ser humano nasce não para esse mundo, mas para a situação que não terá fim na outra vida. Entretanto, ser eternamente feliz, ou não, depende do modo como cada um agiu enquanto esteve nesta terra. Daí a importância do agora, dado que nem o passado, nem o futuro nos estão no poder de cada um. É no instante atual que se pode reparar erros cometidos e abrir as portas do céu. Isto através de uma conduta correta e bem de acordo com a vontade divina. É um risco colocar em jogo uma sorte eterna por causa de veleidades passageiras, ilusórias ou, até, pecaminosas. Bem diz o ditado: “Para dia basta sua tarefa”. Esta deve ser realizada dentro dos parâmetros da retidão, da virtude com determinação e coragem. O combate à frivolidade se faz necessária e a fuga da ociosidade é uma questão de fundamental valor. O pensamento de que não se sabe nem o dia, nem a hora em que a morte virá é um saudável meio para um aproveitamento sábio do tempo. Deus exige fidelidade total a Ele e todo cuidado é pouco, pois a vida passa celeremente de uma maneira que escapa ao poder do ser racional. Donde uma atenção ininterrupta para fazer o bem e evitar o mal. Sem agitações, mas na calma o fiel ao fazer o seu exame de consciência no final de cada dia deve examinar se sua caminhada foi ascensional, ou não, rumo à Jerusalém do alto. Outro meio então a ser empregado é uma radical dependência de Deus, evitando tudo que não esteja de acordo com sua vontade santíssima. Sabedor o cristão de sua fraqueza, ele  busca na oração as forças necessárias para avançar na pratica de todas as virtudes. Com sumo discernimento vai cortando tudo que é inútil em seu derredor, sobretudo programas da televisão ou dos outros meios de comunicação social que levam ao esvaziamento interior e acabam conduzindo ao erro e a tudo que contraria Lei de Deus. Trata-se de um combate firme à cegueira espiritual propiciada pelo mundo. Este oferece falsas ideias sobre a santidade a qual precisa ser o ponto de mira de todo cristão, levando a muitos a se julgarem perfeitos, quando, na verdade, estão cheios é de defeitos e estes lhes escampam e se fixam. Daí uma ilusão perniciosa. Eis por que é necessário implorar sempre a iluminação divina para “saber o que é reto”,  como se pede na prece pela qual se invova o Espírito Santo. Este dissipa a cegueira da alma, afasta o orgulho, a sensualidade e outros vícios. Deixar-se guiar pela  luz divina é a maneira certa para enxergar as realidades eternas. Então o cristão não traz os outros à barra de seu tribunal e não se torna juiz nem de sua própria conduta a qual deve estar sempre pautada pela vontade de seu Senhor. Donde a sabedoria de quem sempre pede a Deus para o aclarar por toda parte e em todas as suas ações, para que, depois, possa também iluminar as veredas do próximo. Então, sim, Deus mostra a quem assim procede a magnitude das coisas da eternidade, as quais só são vislumbradas com os clarões celestiais. Portanto, para que o Ano Novo seja feliz tudo deve ser feito sob as inspirações do Divino Espírito Santo que olha para a humildade de seus filhos que compreendem seus desígnios, usando bem os dons que Ele comunica a cada instante aos de boa vontade. Estes saberão sempre distinguir o que fazer para transformar o Ano Novo através de um procedimento fulgurante que conduzirá à eterna bem-aventurança. Durante todo o 2017 é bom recordar do sábio conselho de Rui Barbosa: “Oração e trabalho são os recursos mais poderosos na criação moral do homem. A oração é o íntimo sublimar-se da alma pelo contato com Deus. O trabalho é o inteirar, o desenvolver, o apurar das energias do corpo e do espírito, mediante a ação contínua sobre o mundo onde labutamos”.  Trabalho realizado com eficiência e competência, pois em tudo se está a serviço dos outros* Côn. José Geraldo Vidigal de Carvalho

segunda-feira, 26 de dezembro de 2016

COMO MARIA MEDITAR AS MARAVILHAS DE DEUS

COMO  MARIA MEDITAR AS MARAVILHAS DE DEUS
Côn. José Geraldo Vidigal de Caralho*

No primeiro dia de 2017 o Evangelho nos coloca na companhia de Maria e José e dos pastores que foram pressurosos até Belém encontrando o Menino Jesus reclinado numa manjedoura (Lc 2,16-21). Eles foram fiéis ao anuncio que lhes viera através dos anjos e louvam a Deus.  Maria retinha tudo em seu coração e meditava sobre as maravilhas divinas então realizadas. Belíssima lição para o início de mais um ano na vida de cada um. Na sua munificência o Criador oferece uma nova trajetória na solenidade de Maria, a Mãe do Redentor, o Príncipe da Paz nesta data da Fraternidade Universal. A exemplo de Maria cumpre ponderar a responsabilidade por receber esta dádiva celeste de mais trezentos e sessenta e cinco dias que começam, durante os quais os fiéis são chamados a irradiar a serenidade por toda parte, tocando os corações com uma fé profunda sob a proteção de Maria. Bela missão à qual se deve entregar com denodo para a glória de Deus e bem das almas. Ano por excelência mariano, ressaltando-se, no dia 13 de maio, os cem anos das aparições de Nossa Senhora de Fátima, numa caminhada de perseverança na realização das mensagens de conversão advindas da Cova da Iria. Como outrora Jesus se manifestou aos humildes pastores, Maria o fez a três pobres pastorzinhos mostrando para a humanidade as veredas da justiça que flui do retorno radical para Deus. Adite-se a celebração já tão solenemente preparada dos 300 anos do encontro da imagem de Nossa Senhora no Rio Paraíba por simples pescadores, mostrando também a predileção do Criado para com os simples, os humildes, os pobres. 300 anos de maravilhosas graças para todo o Brasil, ancorado na força do Evangelho, guiado pela proteção da Virgem Aparecida. Maria já no raiar de 2017 a nos mostrar seu divino Filho e a concitar a todos a um ano de maior progresso espiritual, de mais santidade existencial no cumprimento dos deveres cotidianos, na observância constante dos preceitos do Senhor. Passar estes dias numa fraternidade aberta a todos, num apostolado vibrante para que a salvação oferecida por Cristo não se torne inútil aos que se extraviam do bom caminho por Ele traçado. A exemplo de Maria, dando a Deus uma resposta de amor. Maria convida a todos nós a valorizarmos ao máximo os acontecimentos de 2017 à luz do Evangelho. Se ocorerem as provações enviadas pela Providência divina que ninguém se esqueça de que Deus está sempre no cerne da vida de seus filhos e os ajuda a transformar tudo em méritos para a eternidade. Como bem se expressou São Paulo nada nos pode separar de sua dileção. A confiança na proteção de Maria deve levar a um olhar otimista sobre si mesmo e sobre os outros. Este primeiro de janeiro é um apelo a uma abertura para o futuro que Deus oferece.  Este ano será o que Deus quiser, mas também o que cada um fará colaborando com as graças que Ele oferecerá em abundância aos de boa vontade. Tal o alerta do Apóstolo Paulo: “Nós somos mais do que vencedores por Aquele que tanto nos amou”. Maria e José deram ao Menino o nome de Jesus, que significa o Salvador poderoso em todas as circunstâncias da vida. É preciso nos deixar guiar por Ele, meditando como Maria as maravilhas que há em nosso derredor. Num contexto marcado pela aceleração da História, onde tudo passa rapidamente, será bom refletir a cada dia em nosso coração os acontecimentos de mossa vida. Que nada nos afaste de Deus. Diante de todos está a santa Mãe de Jesus que viveu intensamente sua vocação e executou até o fim sua missão de corredentora da humanidade. Por tudo isto nada melhor do que durante todo este novo ano viver o sábio conselho de São Paulo: “Que vos comporteis de maneira digna da vocação a que fostes chamados, em toda humildade e mansidão, com longanimidade, suportando-vos mutuamente com caridade, pressurosos em manter a unidade do espírito mediante o vínculo da paz”. Então, sim, este será um 2017 venturoso para cada um e para todos que estiverem em nosso derredor. Como Maria saibamos meditar as maravilhas de Deus! *Professor no Seminário de Mariana durante 40 anos.

segunda-feira, 19 de dezembro de 2016

O VERBO DE DEUS HABITOU ENTRE NÓS

O VERBO DE DEUS HABITOU ENTRE NÓS
Côn. José Geraldo Vidigal de Carvalho*

O nascimento do Menino Jesus foi uma novidade ímpar dentro dos acontecimentos históricos. Um encontro maravilhoso se deu então. Fulgurou a ternura de Deus para com a humanidade De fato, o anjo que apareceu aos pastores lhes deu a boa nova: “Não temais, pois vos anuncio uma grande alegria para todo o povo. Nasceu-vos hoje, na cidade de Davi, o Salvador que é o Cristo Senhor”. (Lc 2,11). Foi uma notícia que revolucionou profundamente a História que ficaria dividida como antes ou depois de Cristo. É que aquele Menino anunciado pelo mensageiro divino era o Esperado das nações predito pelos Profetas, Maravilhoso Conselheiro, Deus Forte, Príncipe da Paz, o Emanuel, ou seja, o Deus conosco. Seu aparecimento neste mundo criou definitivamente um horizonte novo, definitivo e que nunca mais deixaria de marcar a trajetória humana nesta terra. Com Ele o júbilo e a luz brilharam neste mundo, afastando a tristeza e as trevas para todos que O recebessem através dos tempos com fé e amor. Para os pastores foi um extraordinário encontro (Lc 2,12). Entretanto, no futuro todos os que nele reconhecessem o Filho de Deus salvador O deparariam em todo instante de suas vidas. Isto nas mais variadas circunstâncias, como na Eucaristia, na figura de cada irmão. O inefável encontro dos Pastores com o divino Redentor se multiplicaria para o cristão que estivesse sempre a Ele aderido, nunca dele se afastando. Desde seu nascimento Jesus atrairia uma multidão de todo o mundo, como breve iria acontecer com a visita dos Magos, vindos do oriente. Sua luz atravessaria as fronteiras religiosas e sociais, garantindo aos que Lhe fossem fiéis uma eternidade feliz, dado que Ele veio para abrir as portas do Paraiso perdido. Além de tudo isto, o Natal é uma solenidade que envolve a todos na ternura de Deus que se manifesta no esplendor de uma criancinha deitada numa humilde manjedoura (Jo 1,16).  O Papa Francisco alertou que “não devemos ter medo da bondade, e mesmo da ternura”. É da imensa comiseração divina que o Presépio fala a toda a humanidade. Daí o motivo pelo qual se deve chegar até o Divino Infante envolto na mais total e absoluta confiança. Deus nos amou e habitou entre nós! Eis por que o Papa assim se expressou se referindo a Belém: “É lá que aparece a ternura de Deus, a graça de Deus”. Em Jesus, através de sua humanidade, o Criador toca o coração daquele que crê. Foi o mais maravilhoso estratagema amoroso que o Ser Supremo inventou para nos seduzir, para afastar todas as falsas imagens que dele se possa ter no que tange sua comiseração infinita. Então se compreende o que disse Santa Teresinha de Lisieux num momento de pulcra inspiração: “Eu não posso temer um Deus que se fez por mim tão pequenino. [...] Eu O amo, porque Ele não é senão amor e clemência”. No fundo é esta ternura de Deus a chave do mistério inexprimível do Natal. São João com toda razão pôde escrever: “Deus é amor” (1 Jo 4,8). Dado ter sido tão grande esta dileção divina, que devemos não apenas retribuir este amor, porque “amor com amor se paga”, mas ainda irradiar por toda parte a ternura de nosso Deus, amando-nos uns aos outros. O cristão deve ser por toda parte arauto daquela serenidade anunciada pelos anjos: “Glória a Deus no mais alto dos céus e paz na terra aos homens por Ele amados” (Lc 2,14). É necessário, realmente, penetrar no sentido grandioso do Natal, para que este fato possa  transfigurar nossas vidas, fazendo o mundo mais feliz. Aproximemo-nos de Jesus, mas deixemos também que Ele esteja bem próximo de nós, lá no íntimo de um coração sincero, numa forte adesão a Ele de todo nosso ser. É preciso que nossas opacidades, nossas fraquezas, nossas dubiedades não nos afastem do Natal. Cumpre lembrar sempre que a alegria natalina não é uma conquista humana, mas um dom de Jesus. Assim sendo, “alegremo-nos porque nasceu-nos o Salvador que é o Cristo Senhor”. [...] “O Verbo de Deus se fez carne e habitou entre nós e vimos a sua glória, como a glória do unigénito do Pai, cheio de graça e de verdade”. Entretanto cumpre que não nos esqueçamos  de que Deus se fez homem para que  os homens fossem mais humanos e para a todos mostrar o caminho da fraternidade que é fonte do júbilo e da paz que caracterizam o seu Natal * Professor no Seminário de Mariana durante 40 anos.

terça-feira, 13 de dezembro de 2016

CONCEPÇÃO VIRGINAL DE JESUS

CONCEPÇÃO VIRGINAL DE JESUS
                                               Côn. José Geraldo Vidigal de Carvalho*

Após a figura de João Batista o Advento nos lança na história de Jesus com a presença de José e de Maria (Mt 1,18-24). São Mateus trata da origem, da ação de Deus quando na plenitude dos tempos, o Verbo Eterno se encarnou e habitou entre os homens. Este Deus é Todo-Poderoso, Senhor dos acontecimentos históricos na existência humana neste mundo. Maria já estava desposada com José e antes de habitarem juntos ela, por ação do Espírito Santo, havia concebido virginalmente Jesus. Ante a perplexidade de São José um anjo vem e o põe a par dos planos salvíficos, pois Jesus salvaria a humanidade de seus pecados. Enorme a felicidade de São José ao escutar as palavras do embaixador divino: “Não temas receber contigo Maria tua esposa, pois o que nela se gerou é obra do Espírito Santo”. Ficara então clara a iniciativa da Providência de Deus. Na sua narrativa São Mateus, no início de seu evangelho, teologicamente explica os fatos e mostra que Jesus veio a ao mundo na linhagem de Davi: “Jacó gerou a José, o esposo de Maria, da qual nasceu Jesus que se chama o Cristo” (Mt 1,16). Isto estava plenamente de acordo com a expectativa do povo judeu e acontece por intermédio de São José que adota Jesus legalmente como filho. Ele era o Messias prometido, nascido de uma virgem como havia predito Isaías (Is 7,14) e pertencente à casa de Davi, graças a São José. O nome que este deu ao menino era pleno de sentido, pois Jesus significa o “Senhor que salva”. Era o Salvador que ofereceria uma libertação de ordem moral e espiritual, promovendo a restauração do liame entre o homem e Deus. Na verdade, uma libertação universal que se estenderia a todos os que pela fé se tornariam filhos de Abraão. Era o Emanuel, o “Deus conosco”, Deus presente de modo especial nos acontecimentos futuros. Tal seria a missão do divino Redentor. Ele caminharia com aqueles que Ele redimiria, a saber, os reconciliados com o Pai. Aliás, o próprio Jesus, depois de cumprir sua tarefa salvadora, antes de sua ascensão aos céus, enviou os seus discípulos a todas as nações, lhes disse: “E eis que eu estou convosco todos os dias até ao fim do mundo” (Mt 28,20). Entretanto, se Jesus cumpriu inteiramente seu ministério messiânico, grandes foram as lições que São José legou para os seguidores de Cristo. Como ressaltou São Mateus ele era um homem justo, ou seja, correto, santo. No sentido bíblico, uma pessoa coerente com sua fé, maleável às inspirações divinas, inclinado por isto mesmo a fazer em tudo a vontade de Deus, conformando-se aos seus desígnios. Eis por que logo que o essencial do plano divino lhe foi revelado imediatamente ele recebeu sua esposa. Daí por diante seria o custódio, o guarda de Maria e de Jesus. Como foi dito, devido a ele, Cristo seria legalmente ligado á linhagem de Davi e em Jesus de Nazaré se poderia reconhecer o Cristo de Deus, anunciado pelo profeta Isaías. A exemplo de São José é preciso que todo cristão saiba acolher as iniciativas de Deus sem O transformar para nós num mero satélite e sem O querer a nosso serviço. É o ser humano que deve fazer girar sua vida em função de seu Senhor e estar sempre adaptado a Ele. Muitos querem, por vezes, enquadrar Deus nos seus esquemas mentais. Cumpre deixar este Deus agir na vida de cada um. José seria submetido a outras provações como na fuga para o Egito, na perda do Menino Jesus em Jerusalém, no seu labor humilde e cansativo na sua oficina em Nazaré, mas se apresentou sempre com a mesma discrição e submissão aos intuitos celestes. Inúmeros são aqueles que diante de situações difíceis para si, para a comunidade em que vive, para a Igreja em geral, se desesperam e se revoltam. Intransigentes não esperam a hora de Deus, rezando e fazendo com discrição o que está a seu alcance para solucionar os problemas. Deste modo os conflitos familiares, no setor de trabalho, nos momentos de diversão, seriam mais facilmente superados.  Por vezes não há discernimento dos fatos e solidariedade com os outros. Falta-lhes a maneira de agir de São José. Na preparação para o Natal tudo isto deve ser considerado, operando uma mudança de mentalidade para que frutuosas sejam as graças natalinas. Peçamos então a São José que com Maria nos acompanhe até o Presépio e no dê  a graça de corresponder às inspirações divinas para sermos salvos por Jesus, o Emanuel, o Deus conosco. * Professor no Seminário de Mariana durante 40 anos.

sexta-feira, 9 de dezembro de 2016

SEDENTARISMO ESPIRITUAL

SEDENTARISMO ESPIRITUAL
Côn. José Geraldo Vidigal de Carvalho*
Grandes são os males do sedentarismo físico, mas pior ainda são os que causam o sedentarismo espiritual.
 Este se cifra numa frágil união com Deus, pois ocasiona muitos desvios psicossomáticos. Aparta, de fato, da prática efetiva das virtudes e então os vícios tendem a aumentar e fica instalada a desordem interior.
O espírito de oração é a fonte de todo vigor espiritual.
 A prece é a elevação da alma a Deus e consiste não apenas em súplicas dentro da promessa de Cristo: “Pedi e recebereis; buscai e achareis; batei e se vos abrirá, porque aquele que pede recebe e o que procura acha e ao que bate se lhe abrirá” (Mt 7,7).
Com efeito, o Mestre divino também havia aconselhado: “Tu, quando orares, entra no teu quarto e, fechando a porta, ora a teu Pai que está presente em lugar secreto; e teu Pai, que vê o que é secreto, te recompensará” (Mt 6,6).
 Trata-se da tertúlia com o Criador de tudo, a qual confere a disposição de sair do marasmo para espiritualmente crescer.
 O católico valoroso entrega pela manhã a seu Senhor tudo que vai fazer naquele dia e deseja isto realizar para glória divina e bem do próximo.
Passa assim a viver em clima de oração e a humildade envolve sua existência, pois tudo atribui ao Ser Supremo, o qual “resiste aos soberbos, mas aos humildes dá a sua graça” (Tg 4,6).
O sedentarismo fica afastado, sendo que a ordem de Jesus pode ser observada: “Assim brilhe vossa luz diante dos outros, para que vejam vossas boas obras e glorifiquem vosso Pai que está nos céus” (Mt 5,16).
O serviço ao próximo se torna possível porque tal cristão vê no outro a figura do Filho de Deus e sai sempre de seu comodismo para cumprir, do melhor modo possível, as tarefas cotidianas.
Fulge para ele o que Cristo falou: “Tudo o que fizerdes ao menor dos meus irmãos, é a Mim que o fazeis” (Mt 25, 40).
Quem se livra do sedentarismo espiritual entra então em sintonia com o que o divino Redentor ensinou.
Isto porque o sedentarismo impede qualquer ascensão dado que quem  se deixa por ele dominar se instala numa enganosa zona de conforto íntimo. Conforma-se com o que é e aquele que  não avança na perfeição retroage e acaba vítima de sua indolência. Esta o joga nas garras do leão infernal, o qual, como alertou São Pedro, está em derredor dos incautos prestes a devorá-los. Nada mais deletério do que a acomodação, caminho seguro para a degradação.
 Os seguidores de Cristo enfrentam um contínuo combate espiritual, mas sua alma é como o monte Sião que nada pode abalar, exatamente porque não admitem, em hipótese alguma, o sedentarismo espiritual.
Lembram-se de que a vida do cristão neste mundo é uma luta contínua contra os poderes das trevas e estão alertas e nunca ociosos, estagnados.

Professor no Seminário de Mariana durante 40 anos.

terça-feira, 6 de dezembro de 2016

NENHUM MAIOR QUE JOÃO BATISTA

NENHUM MAIOR QUE JOÃO BATISTA
Côn. José Geraldo Vidigal de Carvalho*

Admirável o elogio de Jesus ao seu Precursor: “Em verdade vos digo que, entre os nascidos de mulher, não surgiu nenhum maior que João Batista” (Mt 11,14). É certo que Cristo estava se referindo ao Antigo Testamento, mostrando uma máxima dignidade, superior a de todos os outros profetas. João era. de fato. o mensageiro de Deus predito por Malaquias (3,2-3), preparando o caminho do Messias prometido. Ele ocupa um, lugar único na história da salvação. É justamente a grande figura que precede a vinda de Cristo. Como bem observou Orígenes, “até o dia de hoje o espírito e a virtude de João precedem o advento do Senhor Salvador”. Os Evangelistas no-lo apresentam como possuidor de um caráter sem jaça, homem dotado de uma intrepidez inquebrantável. Sua vida austera se tornou um exemplo para preparação do Natal. Ele, realmente, lança uma ultima mensagem de conversão total que significa a aceitação sem restrições do amor de Deus. Viveu continuamente na luz de Cristo, repleto do Espírito Santo desde o seio materno (Lc 1,41). Está então a nos lembrar que cumpre reavivar a chama viva de nossa esperança ao caminharmos rumo ao Presépio. Assim como João manifestou quem era Jesus, não somente em palavras, mas sobretudo através de toda sua vida, também a nós cumpre demonstrar por toda parte a grandeza da obra realizada pelo divino Redentor. Toda a existência de São Joao Batista se deu em função de Cristo. Seu nascimento maravilhoso, filho que era de uma mãe estéril (Lc 1,36), foi um fenômeno que patenteou o poder de Deus. Isto, contudo, não teve outra finalidade senão preparar outro prodígio infinitamente maior que era o surgimento neste mundo do Verbo de Deus Encarnado. João Batista fez esplender a fidelidade de Deus a suas promessas feitas no decurso dos séculos ao longo da história de Israel. O Advento, recordando, toda esta grandeza de São João Batista prepara os fiéis para acolher, revestidos de fé profunda, a graça incomparável da Encarnação. Eis por que já paira uma enorme alegria que brilhará no próximo 25 de dezembro. João Batista foi o enviado de Deus para dar testemunho da luz “para que todos cressem por ele” (Jo 1,7). Não obstante todas estas maravilhas que contemplamos em São João Batista, Jesus asseverou que “o menor no reino dos céus é maior do que ele” (Mt 11,11). O papa emérito Bento XVI, magnificamente explicou o que significa esta sentença de Cristo, afirmando que “o cristão é maior do que João, porque partilha do Reino de Deus que em Jesus se tornou próximo dos homens”. É que no Novo Testamento, dado que pertence a uma ordem superior, o seguidor: de Cristo ultrapassa em dignidade a do próprio Precursor por Ele tão elogiado. Compreende-se então o que proclamou o Papa São Leão Magno: “Reconhece ó cristão a tua dignidade”. É que a vida sobrenatural oferecida por Jesus é um aperfeiçoamento divino do homem. Cabe então ao cristão viver à altura de tão nobre dignidade que o torna maior que o próprio São João Batista. Foi o que aconteceu e continua a ocorrer na história do cristianismo. Não apenas os santos e santas que foram já canonizados, mas inúmeras almas que se santificaram ou na vida consagrada, ou nos lares, ou que nas mais diversas atividades  cultivarem as mais elevadas virtudes, aclamando a grandeza o Reino de Deus. Jovens que vivem sua mocidade na pureza de vida, em busca de um ideal profissional no qual servirão o próximo, muito engrandecendo a sociedade humana. Assim também pais e mães de família fiéis às promessas matrimoniais e que se sacrificam pelos seus filhos e são para eles exemplos fulgurantes. Catequistas denodados e perseverantes a ensinar as crianças os caminhos o bem. Vicentinos e tantos outros engajados nas Obras Sociais a bem dos mais necessitados. Enfim, almas que no silêncio de seu cotidiano vivem unidas a Deus e são  “a luz do mundo e o sal da terra”. São aqueles que, olhando os exemplos de São João Batista, que hoje recordamos, mostram a beleza da missão daquele que o Precursor anunciou o qual estabeleceu na história a cátedra da santidade que leva milhares ao Reino dos céus. Estes discípulos de Jesus superam em dignidade aquele que no Antigo Testamento. foi o maior dos nascidos de mulher, uma vez que o cristão é outro Cristo a iluminar a história da humanidade.  * Professor no Seminário de Mariana durante 40 anos. 

segunda-feira, 28 de novembro de 2016

CONVERTEI-VOS

CONVERTEI-VOS
Côn. José Geraldo Vidigal de Carvalho*

No Advento ressoa a vós de São João Batista em mais um alerta na preparação para o Natal: “Convertei-vos” (Mt 3,1-12). Mensagem sublime a ser acolhida para que se possa receber as graças natalinas. É de se notar que o Precursor pregava no deserto da Judéia. Na Bíblia o deserto é sempre uma terra desabitada. Portanto, os que queriam escutá-lo tinham que caminhar até ele numa região solitária situada a alguns quilômetros de Jerusalém ou de Belém. Eis uma primeira lição a ser observada. Como se lê na tradução da Vulgata, “non in commotione Dominus” – “Deus não se acha na agitação” (1 R 19,11). Isto significa que cumpre escutar a palavra divina no deserto do coração, no silêncio de uma reflexão profunda e numa disposição de sair do comodismo. Neste caso é possível a conversão, a qual não é um mero mudar de mentalidade, mas uma marcha decisiva, corajosa para Deus. Muitas vezes se pensa que a conversão é um instante especial de uma grande graça, mas ela é bem mais do que isto. Com efeito, se a conversão é um instante de uma grande bênção do céu, é mais ainda um encaminhamento, uma nova maneira durável de pensar, de agir, de ser. Além do arrependimento de faltas passadas, é, sobretudo, uma peregrinação de amor que projeta o cristão para Deus. Coloca-o no rumo certo do Reino daquele que comunica paz e alegria. Trata-se da submissão integral à autoridade soberana do Criador de tudo, o qual enviou o seu Filho a esta terra com a missão messiânica de abrir as portas de uma felicidade eterna para os que O acatam. Mudança de vida à luz do verdadeiro significado natalino que, comemorado cada ano, deve produzir novos frutos de salvação. É o que São João Batista está a proclamar: “Fazei, pois, frutos convenientes ao arrependimento”. Eis porque São Mateus não julgou ser inútil descrever a vestimenta e o rigor a que o Precursor se submetia: “João tazia uma veste de peles de camelo e um cinto de couro à volta dos rins, e o seu alimento eram gafanhotos e mel silvestre”. Não basta, contudo, admirar como João Batista podia suportar uma vida tão dura. Durante o Advento é necessário o espírito de penitência que leve a abolir comodidades inúteis visando a purificação interior. O Salvador cujo nascimento se comemorará nós o veremos não num palácio suntuoso cercado de luxo, mas no frio de um estábulo, na mais rigorosa pobreza.  Na preparação para o Natal, João Batista e o Menino de Belém estão a condenar toda espécie de ostentação, de gastos desordenados, de excessos no comer e no beber, enfim abstenção de tudo aquilo que uma sociedade de consumo prega e que tanto mal faz à saúde do corpo e da alma. Abusos que não condizem com um cristão precisam ser cortados corajosamente. O seguidor de Crsito  recebeu não o Batismo de água, mas o Batismo “com o Espírito Santo e com fogo” instituído por Cristo. Este tempo do Advento é assim ocasião oportuna para que o cristão reveja como tem empregado os dons celestes de seu Batismo o qual o purificou de toda a a imundície. Cumpre, então, retirar todas as vestimentas da vaidade e do orgulho e mostrar ao mundo austeridade que é uma reprimenda aos que se deixam levar pelas paixões terrenas. O convite de São João Batista é a renúncia a tudo que contradiz a existência de quem se prepara para o Natal. Clamor por uma vida sóbria, moderada e equilibrada. Deste modo, se estará cada um se dispondo a fazer uma fervorosa Comunhão dia 25 de dezembro, participando com uma consciência pura dos mistérios sagrados da vinda do Filho de Deus a esta terra. Instrução e exemplo nos legou São João Batista e para bem acolher suas mensagens é de bom alvitre o lembrete de São Paulo: “Aquele que deve vir, virá e não tardará” (Hb 10,37). A penitência pregada por São João Batista, porém, não deve consistir somente em se abster do mal, mas ainda em multiplicar as boas obras. Pensar em proporcionar ajuda aos mais carentes, em perdoar todas as ofensas,  mais paciência com todas as pessoas, irradiar imperturbabilidade por toda parte. Ruptura corajosa com tudo que macula o coração e a alma que vai se aproximar do Presépio. Escutemos, então, o apelo do Percursor de Jesus: “Convertei-vos que já está próximo o reino dos céus”. * Professor no Seminário de Mariana durante 40 anos. 

terça-feira, 22 de novembro de 2016

ESTAI PREPARADOS

ESTAI PREPARADOS
Côn. José Geraldo Vidigal de Carvalho*

Este alerta de Jesus nunca é demais refletido: “Estai preparados, porque a hora em que menos pensais o Filho do Homem chega” (Lc 12,40). A morte e a vinda gloriosa de Cristo na sua glória devem ser dois referenciais nunca esquecidos na vida do cristão. Este corre o risco de se deixar impregnar pelo impacto da secularização que leva a adotar os modelos de pensamento e de conduta do mundo; do horizontalismo que conduz  a um compromisso social exclusivo como única dimensão da existência cristã; da incredulidade reinante nos meios de comunicação que vai abalando os alicerces da fé. Todo cuidado é pouco porque é no tempo atual que se decide o destino eterno de cada um. O alerta de Cristo foi claro: “Estejam cingidos os vossos rins e acesas as vossas lâmpadas”, ou seja, que haja uma vigilância atenta para que nos dois encontros com Ele o fiel esteja preparado, quer no momento de deixar este mundo, quer no juízo universal. Trata-se do cumprimento fiel de todos os deveres pautados pelos valores do Evangelho. No presente é que se constrói uma eternidade bem-aventurada. O cristão está sempre atento porque sabe que tem um grande futuro a sua frente. A vinda do Filho de Deus a esta terra se humilhando até a morte da Cruz para redimir a humanidade perdida, é uma prova peremptória da importância da salvação eterna que cada um deve procurar sem nenhum descuido.  Cumpre a todo batizado se revestir de Cristo, pertencendo inteiramente a Ele, mesmo porque a graça santificante, semente da glória eterna, não pode ser perdida, e, se for perdida, deve logo ser recuperada, sob pena de incorrer na perdição perene.  Porque possui Jesus dentro de seu coração o cristão, seja onde estiver, está iluminando os outros, pela sua conduta alertando-os a fim de estarem vigilantes na prática do bem nesta preparação terrena para os encontros com Deus além-mundo visível. É necessário ser sempre um cristão preparado para estes chamados inevitáveis e decisivos do Criador, o qual está à espera dos que lhe são leais para lhes dar uma recompensa perene. O Mestre divino veio a este mundo para ensinar os de boa vontade como caminhar nesta terra com o objetivo de alcançar o Reino Eterno. Não se trata de se estar alienado da realidade, pelo contrário, aquele que está vigilante em vista da realidade futura se torna um cumpridor exato de suas obrigações e constrói um mundo melhor em torno de si num serviço admirável ao próximo. O autêntico discípulo de Jesus está atento para viver de uma maneira mais intensa esta sua marcha neste mundo, como lembrou o Papa Francisco na sua Encíclica “Lumen Fidei” (n. 16).  Em qualquer situação social, seja onde a Providência o colocou o cristão verdadeiro, continuamente antenado nas realidades vindouras, semeia paz, difundindo pelas boas obras felicidade e sabe que não tem um minuto a perder rumo ao que lhe espera na outra vida sendo, de fato, fiel a Deus.  O bem-aventurado Papa Paulo VI inúmeras vezes insistiu que o batizado estivesse sempre com a lâmpada acesa precisamente para também iluminar os que estão a sua volta. Esta luz é a fé que se traduz em obras luminosas, lucífluas. Cumpre refletir seriamente nisto.  Jesus virá para inaugurar “os céus novos e a terra nova”, para por o selo de Deus sobre toda a obra que cada cumpriu com amor na sua trajetória terrena. Ninguém sabe nem o dia nem a hora em que vai deixar este mundo, nem quando se dará a parusia, isto é, sua volta gloriosa no fim dos tempos. Jesus falou várias vezes sobre a preparação para estes dois eventos como nas parábolas relatadas por São Lucas. O leit motiv das mesmas é estar vigilante.   Pouco importa o lugar que seu discípulo ocupe neste mundo O essencial é que quando Ele vier, Ele encontre seu seguidor cumprindo suas obrigações com eficiência e competência para glória de Deus e bem das almas.  Uma prudência elementar aconselha a quem tem fé e juízo a assim proceder não perdendo jamais o gosto de bem viver e o sentido de um devotamento ininterrupto ao próximo, consagrando a ele e a Deus todo seu amor. Quem assim agir degustará em plenitude a promessa feita por Jesus: Ele o porá à frente de todos os seus bens. * Professor no Seminário de Mariana durante 40 anos.

quinta-feira, 17 de novembro de 2016

VOTOS

Aos prezados amigos votos de abençoado Natal e feliz 2017. Coloco as intenções de todos nas Missas de 25 de dezembro e primeiro de janeiro.
Côn. José Gealdo Vidigal de Carvalh
                                         VALORIZAR O TEMPO
                                             Côn. José Geraldo Vidigal de Carvalho*

Nunca se reflete demais sobre o cuidado que se deve ter em bem empregar o tempo. É sempre uma temeridade menosprezar os instantes de cada dia.  O momento presente precisa ser explorado ao máximo, pois ele rapidamente passa. Trata-se de uma dádiva de Deus que não pode ser perdida. Uma diretriz preciosa é não adiar as obrigações, mesmo porque aquilo que está feito não está por fazer e outros deveres vão surgir. Sabedoria é ter consciência de que a cada dia basta sua tarefa. É o que ensina o Livro do Eclesiastes “Todas as coisas têm seu tempo e para cada ocupação chega a sua hora debaixo do céu” (Ecl 3,1). Assim sendo, a programação diária precisa ser organizada com antecedência para que sejam usufruídos todos os benefícios decorrentes das boas ações. O autêntico cristão está persuadido de que a vida nesta terra pode acabar a qualquer momento. Cristo preveniu seus discípulos: “Vigiai, pois não sabeis o dia nem a hora” (Mt 25,3). Daí a seriedade com que as obrigações a serem feitas de acordo com a vontade divina devem ser encaradas. Trata-se de nada perder para a eternidade. Donde ser preciso sempre uma total adesão a Deus. É necessário pedir continuamente a Ele o discernimento para bem praticar o que é conforme a seu beneplácito e para perceber os próprios defeitos a fim de corrigi-los. É que o conhecimento de Deus é tão necessário como o conhecimento próprio. Eis por que Santo Agostinho solicitava: “Senhor que eu Vos conheça e que eu me conheça”.  Apenas assim, se valoriza a existência humana nesta trajetória terrena. Disto decorre a fidelidade a Deus a começar pelas pequenas tarefas diárias. Cristo deixou claro: “Quem é fiel nas pequenas coisas, o será também nas grandes” (Lc 1916). Coragem e constância no cumprimento dos deveres cotidianos é que fortalecem o cristão para superar as tribulações pelas quais Deus costuma provar aqueles que desejam valorizar sua vida. Entretanto, o desejo de explorar com sabedoria o tempo, que flui inevitavelmente, não deve levar o fiel a desanimar ante as faltas cometidas. Só Deus é perfeito. Grandes santos diziam a si mesmos: “Ainda que eu caia vinte vezes, cem vezes, eu me levantarei e prosseguirei a minha caminhada”. É óbvio que eles não cometiam faltas graves, mas se referiam ás fraquezas inevitáveis ao ser humano. Assim tomavam todas as precauções para progredirem na prática das virtudes. O que valem são os esforços contínuos, uma vez que grande é a debilidade humana. São Paulo declarou: “Para os que amam a Deus tudo coopera para o bem” (Rm 8,28). Deus permite as fraquezas humanas para curar seu seguidor da presunção e do orgulho. É de se notar que grandes santos atingiram notável perfeição após erros gravíssimos que depois deploraram profundamente, como aconteceu com Davi, com São Pedro e tantos outros. Davi, arrependido, asseverou no salmo 50: “Um coração contrito e humilhado, Deus não despreza”. O Príncipe dos Apóstolos, após lamentavelmente negar a Cristo, chorou amargamente (Lc 22, 62). A conversão de quem se arrepende sinceramente constitui o fundamento de salvação e possui, deste modo, valor inestimável. O convite de amor da parte de Deus para que se empregue com sabedoria o tempo, com o poder de sua graça, capacita à correspondência a uma vida de fidelidade a Ele. É impossível determinar os dons ofertados por Deus a cada hora e perscrutar os corações, pois as condições existenciais variam. É certo, porém, que cumpre estar atentos às inspirações celestes para não se abusar da misericórdia divina. Donde o alerta do referido Santo Agostinho: “Temo a Jesus que passa e que pode não voltar”. Adite-se que a valorização do tempo passa por uma espiritualidade encarnada na vivência profunda da profissão que cada um exerce. É preciso não escapar do ambiente do próprio compromisso laboral, mas mister se faz vivê-lo profundamente. Deste modo se desenvolvem plenamente as possibilidades de auto aperfeiçoamento e de serviço a Deus e ao próximo. Isto inclui uma exigência de empenho, de esforço, de competência.  É assim que se tem uma visão clara da dimensão social das implicações realizadas no âmbito da vocação de cada um com toda sabedoria e inteligência sob o olhar de Deus, Senhor do tempo. Deste modo o cristão tende a transformar o mundo e a dar testemunho da esperança na construção e pela construção da comunidade em que vive. Trata-se de existir plenamente nesse mundo, empenhando-se a fundo em face das possibilidades humanas. Em síntese, o ser humano precisa bem se situar na tríplice dimensão do tempo, ou seja, no passado, no presente e no futuro. Do cronos que se foi lições devem ser tiradas com sabedoria, o que constitui o cerne da experiência vivida. Esta possibilita explorar melhor o instante presente, o agora, tornando-o proveitoso para si e a comunidade na qual se vive. O porvir é uma incógnita e está sempre a exigir estratégias para que se amenize o impacto do imprevisível. Para quem tem fé a confiança em Deus o enche continuamente de expectativas de dias felizes. Está sempre lembrado do alerta que é profundamente bíblico: “Ajuda-te que o céu te ajudará”. * Professor no Seminário de Mariana durante 40 anos.

segunda-feira, 14 de novembro de 2016

CRISTO, REI DO UNIVERSO

CRISTO, REI DO UNIVERSO
Côn. José Geraldo Vidigal de Carvalho*

Na Cruz Jesus se manifestou como Rei num episódio cujos detalhes merecem uma reflexão profunda por parte de seus seguidores (Lc 23,l35-43). Como era costume no seu tempo no caso de um condenado à tortura da cruz, no alto da mesma, havia uma tabuleta, que esclarecia o motivo daquela crucifixão. No caso de Cristo lá estava uma inscrição em grego, latim e hebraico: “Este é o rei dos judeus”. A Judéia era governada diretamente pelo Procurador romano e não tinha, de fato, um rei como outras regiões vizinhas. As autoridades de então estavam ironicamente a mostrar aos que haviam reconhecido Jesus como o Messias-Rei o destino desastrado do mesmo. Entretanto,  mesmo os que acertadamente viam em Cristo o soberano de que falaram os profetas, erravam ao julgar que Ele era Rei num sentido político. Pensavam que Ele haveria de expulsar os romanos invasores e ofereceria ao povo judeu sua autonomia perdida, dando-lhe um reino humanamente glorioso. Enganavam-se os que assim julgavam ser esta a missão daquele que fizera tantos milagres e se mostrara como o libertador dos mais necessitados. Jesus, contudo, não deixou ilusão ao responder claramente a Pilatos no processo a que fora submetido: “Meu reino não é deste mundo” (Jo 18,36), Bem, podemos, contudo imaginar a decepção daqueles que o haviam aclamado na entrada triunfal em Jerusalém poucos dias antes. Agora estavam diante do Filho de Davi, perante um Messias retalhado de feridas pendente no lenho de um suplício humilhante. Jesus, antes de morrer, como narrou São Lucas, observava diante de si aqueles que o olhavam desiludidos; os chefes  que zombavam dele; os soldados romanos os quais caçoavam daquele pobre homem ali martirizado. São Paulo dirá com propriedade aos Coríntios que Jesus era “um escândalo para os judeus e uma loucura para os pagãos” (1 Cor 1,23).  Ao lado, porém, do Mártir divino lá estavam dois famigerados ladrões. Um a provocá-lo: “Não és tu o Messias? Salva-te a ti mesmo e nós”. O outro a proclamar solenemente a realeza e a divindade de Cristo ao lhe dizer: “Jesus, lembra-te de mim, quando vieres na auréola de tua realeza”. Mereceu uma resposta admirável de alguém que era, realmente, Rei: “Em verdade te digo: hoje estarás comigo no paraíso”, Gestas se equivocou porque Jesus não veio para libertar da cruz. Dimas acertou, dado que Ele viera salvar pela cruz .Aí  uma notável mensagem. Com efeito, aqueles sofrimentos, aquela cruz eram a manifestação de um grande amor. São João magistralmente havia explicado: “Como amasse os seus que estavam no mundo, amou-os até o fim” (Jo 13,1). A cruz seria a prova definitiva da dileção imensa do Rei do Universo que havia dito: “Ninguém dá maior prova de amor do que aquele que dá a vida por seus amigos” (Jo 15,13). Pendente da Cruz, Ele demonstrou que era um Rei que viera não para salvar da cruz, mas para libertar pela cruz, sinal definitivo de um  amor imenso pela humanidade da qual se tornara o Soberano, abrindo aos que O amam um Reino eterno de glórias conquistado com tantos sofrimentos. Deixou, contudo, uma ordem para seus súditos: “Se alguém quer vir após mim, negue-se a si mesmo, tome a sua cruz, e siga-me” (Mt 16,24) . Hoje este Rei está a interrogar a cada um de nós se temos carregado a nossa cruz, pois a dele Ele carregou até o Calvário. Ele não está a exigir sacrifícios impossíveis, mas sim o cumprimento exato do dever de cada dia, a paciência diante dos naturais sofrimentos inerentes a um exílio terreno. Ele pede uma fidelidade incondicional na fuga corajosa do pecado.. Ele quer a observância corajosa dos Mandamentos e muito amor a Ele e ao próximo. É a cruz de uma luta sem tréguas contra o mal, de uma caridade sem limites para com todos, de uma cooperação generosa na difusão do Evangelho no meio em que se vive, sobretudo através do exemplo. Uma vida voltada para Ele, Rei do universo, ao qual cada um foi consagrado no dia de seu Batismo.  Os batizados  O devem fazer conhecido e amado. Jean-Christian Lévêque, foi inspirado ao dizer que “o reinado de Jesus é o brilho universal de sua palavra, é a iluminação do coração daquele que crê, é o incêndio do amor até os confins da terra a começar pelo incêndio de nosso coração, onde tudo deve arder  para glória de Deus e salvação do mundo”.  Pensemos nisto! Professor no Seminário de Mariana durante 40 anos.                           

segunda-feira, 7 de novembro de 2016

O FUTURO A DEUS PERTENCE

O FUTURO A DEUS PERTENCE
Côn. José Geraldo Vidigal de Carvalho*
São Lucas leva-nos a meditar sobre o que Jesus falou sobre o que deverá acontecer no fim dos tempos, num futuro longínquo (Lc 21,5-19). Até chegar o término do mundo Cristo relata uma série de acontecimentos, cuja data apenas é do conhecimento do Criador de tudo. Ao assinalar alguns fatos marcantes o  Redentor pedagogicamente alerta seus seguidores. Neste sermão escatológico, porém, alguns eventos serão recentes como a ruina do templo e de Jerusalém. Trata-se da realização das ameaças proféticas contra a cidade infiel. Além disto, contudo, Jesus, na sua visão de toda a História da sua Igreja,  alude às provações   pelas quais passarão as comunidades, as perseguições que serão feitas a seus discípulos. Isto vem sucedendo século após século. Ecoa, entretanto, sempre sua advertência: “Mas tende confiança! Eu venci o mundo” (Jo 16,33). Estamos já no terceiro milênio depois de sua vinda a esta terra e não sabemos quantos milênios ainda virão antes da consumação do tempo, mas temos, contudo, uma certeza absoluta de que a História do mundo com a chegada do Messias prometido está na sua reta final, na sua fase definitiva. O importante é que devemos viver em plenitude a existência que atualmente nos é dada. É mister, no entanto, estar atentos a um fato inexorável que é o instante da morte. Para esta se deve estar preparado, vigilante para não cair nas garras de satanás, comprometendo a própria salvação. O conselho de Jesus foi meridianamente claro: “Tomai cuidado para não serdes desencaminhados”. Muitos falsos profetas, realmente, têm aparecido no decurso dos séculos e infelizes os que se deixaram ou se deixam enganar por eles. O importante é que, se o futuro a Deus pertence, cada um de nós tem o dia de hoje para O servir e amar, acolhendo em tudo o ensinamento de Cristo, iluminados por sua palavra salvadora. Cumpre a cada um deixar um rastilho luminoso dentro desta História da Igreja como o fizeram todos aqueles que foram fiéis ao Evangelho. São Lucas registrou ainda  outra recomendação de Jesus: “´É por vossa perseverança que obtereis a vida”. Com suma sabedoria e lucidez divinas  Cristo ensina como superar todos os percalços existenciais pessoais e como os fiéis podem cooperar pelo triunfo de sua Igreja. Palavra maravilhosa: “perseverança”! Deus está sempre ao lado daqueles que nele esperam e são constantes no seu engajamento às verdades reveladas. A questão é saber como perseverar. Não é fácil muitas vezes por entre os sofrimentos e provações testemunhar a fé ultrapassando todas as dificuldades. Lemos no livro de Jó: “A vida do homem nesta terra é uma luta”(Jo 7,1). Jesus, contudo, afirmou: “Sem mim nada podeis fazer” (Jo 15,05), o que significa que com Ele tudo podemos realizar. Ai está o segredo do sucesso na trajetória dos santos e na marcha da Igreja não obstante tantas
contradições. São Tiago assim se expressou: “Tende na conta de pura alegria, meus irmãos, quando vierdes a encontrar-vos em provações de toda a espécie, sabendo que a vossa fé produz a perseverança. A perseverança, por sua vez, cumpra a obra, a fim de que sejais completos e perfeitos em nada deficientes (Tg 1,1-4). A fidelidade ao nome de Jesus. tem dado ânimo a seus seguidores e sustentado a Igreja por entre as vicissitudes da História. Invocar o  nome de Jesus é uma maneira de reconhecer que a Ele pertencemos e este nome dá identidade e consistência à sua Igreja. Lembra sempre um ideal de vida e inflama a esperança para se ter parte no Reino futuro já inaugurado pelo divino Redentor. É o que aparece evidente  na diretriz dada por Ele. No contexto atual, por entre tantas calamidades, perversidades, corrupção, crimes hediondos, mais do que nunca é necessário crescer na fé e na esperança. A presença de Jesus nos revela sempre a visão de Deus que  ultrapassa a compreensão humana. Cumpre deixar nossa vida aberta a uma maneira nova mais espiritual, crendo na Providência divina e na submissão  aos planos do Criador. Daí resulta a perseverança que leva a uma sabedoria que é mais forte do que o mal. Perseverar é fazer em tudo a vontade divina sem querer polemizar, sendo arrogante com Deus. Uma humilde docilidade aos desígnios divinos é de vital valor na caminhada dos cristãos e da Igreja. Lembrança de que o campo da batalha a que se referiu o livro de Jó é o interior de cada um e assim se consegue a liberdade que se pode irradiar em raios de paz para toda a comunidade. É o viver não no temor, mas na confiança absoluta no Senhor Onipotente. Deste modo se ganhará a vida eterna, garantida pelo nosso salvador Jesus. Nele nós podemos sempre confiar!         *Professor  no Seminário de Mariana durante 40 anos.
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segunda-feira, 31 de outubro de 2016

A FELICIDADE DOS SANTOS

A FELICIDADE DOS SANTOS
Côn. José Geraldo Vidigal de Carvalho

Na solenidade de todos os santos a liturgia leva os fiéis a refletirem sobre as Bem-aventuranças (Mt 5,1-12), É que os santos compreenderam plenamente que ser feliz é reconhecer a Deus como única felicidade e foram, assim, bem-aventurados. Entretanto, a ventura que Jesus descreve não é segundo a medida dos valores humanos, nem segundo a sabedoria terrena. Supõe, ao contrário, uma ruptura com os critérios mundanos e isto como condição para se atingir a santidade a qual se contempla em todos aqueles que estão por toda a eternidade lá no céu. Deste modo, as bem-aventuranças são a descrição daqueles que já conquistaram a glória eterna, especificando os aspectos de suas existências nesta terra. Eles devem ser imitados por aqueles que ainda estão a caminho da Jerusalém celeste. Cristo mostra que felizes não são aqueles que possuem a abundância de riquezas, mas os que suportam com paciência as adversidades; os que conservam a mansidão em todas as circunstâncias da vida; aqueles que procuram a justiça, ou seja, que fazem em tudo a vontade divina; quem tem compaixão, imitando a misericórdia da Deus; os que não se deixam macular com as paixões desregradas; aqueles que são profetas da paz. Por tudo isto, muitas vezes eles são perseguidos, injuriados, mas se alegram porque seus nomes estão no rol dos que se candidatam a entrar na casa do Pai. Tudo isto aconteceu com os santos não porque eles se privaram de algo que é bom oferecido pela bondade de Deus ou se viram sempre em situações dolorosas, mas porque em tudo estavam unidos ao seu Criador, observando seus desígnios em todos os momentos e circunstâncias. Amaram a vida, mas a amaram não através de vulgares prazeres e míseras ambições. Amaram-na pelo que a existência neste mundo tem de importante, de grande, de divino. Há, portanto, em cada bem-aventurança alguma coisa de radical que estrutura a verdadeira felicidade a qual se radica no Senhor Todo-poderoso.  Porque Deus é a herança dos santos, porque a pátria verdadeira é o céu onde se verá o Ser Supremo face a face, é que se deve procurar ser feliz dentro dos parâmetros estabelecidos por Cristo. Os santos foram ditosos na alegria ou na tristeza, na pobreza ou no bem-estar, dado que viveram initerruptamente em função de Deus o qual a eles bastava. Por isto imitaram a misericórdia divina e tiveram o coração aberto às misérias alheias para aliviá-las. Foram puros uma vez que observaram o sexto e o nono mandamentos à risca e não se deixaram contaminar pelas aliciações lascivas suscitadas pelo espírito do mal. Compreenderam e viveram a máxima estabelecida por Jesus: “Sede perfeitos como o Pai celeste é perfeito”. Procuraram então ter um coração grande como o do Deus no qual pulsa um amor infinito. Eis aí o que propõe a solenidade de todos os santos. São eles não apenas os que foram canonizados e estão nos altares das Igrejas, mas tantos parentes e amigos nossos que retrataram em suas vidas as bem-aventuranças registradas por São Mateus.  Todos eles estão a mostrar que, de acordo com o Evangelho, a felicidade consiste em ter Deus como o bem supremo, único, suficiente. Eles nos convidam a ter uma vida conforme os ensinamentos bíblicos e não como as estapafúrdias visões de um mundo divorciado da verdade, imerso nos vícios, na voluptuosidade e em toda espécie de corrupção.  Os santos foram luz do mundo e sal da terra e estão a nos recordar o conselho do Mestre divino: ”Brilhe do mesmo modo a vossa luz diante dos homens, a fim de que, vendo as vossas obras, glorifiquem vosso Pai está nos céus” (Mt, 5,16). Que então a proclamação das bem-aventuranças possa significar a essência mesma da vida do verdadeiro cristão, pois a felicidade íntima de cada um é proporcional à largura e à profundidade de sua fé. É preciso saber viver o que Jesus nos propõe. Ele quer uma atitude decidida de nosso coração, de todo o nosso ser que se concentra na vontade de Deus para poder estar com Ele um dia lá no céu por todo sempre na companhia de todos os santos.* Professor no Seminário de Mariana durante 40 anos.

quinta-feira, 27 de outubro de 2016

A TURBULÊNCIA POLÍTICA CONTINUA

A TURBULÊNCIA POLÍTICA CONTINUA
Côn. José Geraldo Vidigal de Carvalho, da Academia Mineira de Letras, cadeira n.12

A crise atual agora envolvendo o Legislativo e o Judiciário é mais um episódio lamentável que vem agitar a história brasileira. Os paradoxos emergentes trazem no seu bojo uma advertência séria. O que deve pesar é a retidão do homem público que precisa sempre usar uma linguagem nobre e não resvale para a vulgaridade. É preciso a aferição da tensão concreta sobre a qual se pode erguer uma verdadeira democracia, Que haja um final honroso deste novo affaire. Além disto, o fato dos escândalos envolvendo políticos continuarem a vir a público, depois de tantas enigmáticas atitudes, é porque houve anteriormente pactuação condenável nas falcatruas que estarrecem o país.  Tais ações levam ao alheamento do que interessa de fato à melhoria das condições de vida dos que sofrem, uma vez que o foco é o julgamento de pessoas que não cumpriram com o seu dever e desviaram o dinheiro público. É mister buscar a verdade social sobre a normativa na conciliação entre o desenvolvimento econômico e o político, respeitada a ética, evitando-se qualquer fraude lesiva à sociedade. É necessário denunciar o binômio perverso expresso tantas vezes pela contradição entre o que se diz na Câmara dos Deputados e no Senado e o que se passa na realidade cotidiana dos brasileiros. Estar vigilante diante das contradições concretas da realidade social para uma diagnose das mensagens que vão fluindo tantas vezes para manipular a opinião pública. Saber captar circuitos interrompidos que ficam embasados pelo jogo de cena, pelas montagens ilusórias, e, inclusive, pelas promessas que nunca foram nem serão cumpridas. Nada de supervalorizar um triunfalismo risível daqueles que se dizem salvadores da sociedade, mas dilapidam o erário público. Não se perca a grade da leitura real dos valores que foram agredidos e que são escondidos numa fala que pode enganar. Os anéis da História não podem ser vistos separados, mas devem poder se ligar sob pena de haver a dilaceração do humano e o ludíbrio das consciências. É aí que o papel do verdadeiro cientista social aparece não se perdendo em análises superficiais e sensacionalistas, mas tirando conclusões profundas de tudo que está ocorrendo sem  acomodação às circunstâncias, sem a distorção dos fatos, sem exceção de pessoas. Que a justiça plena seja feita e que retorne realmente aos cofres da nação todo dinheiro que foi desviado. Que se tomem medidas eficientes para que tanta calamidade não se repita. Estarrecidos ficam os brasileiros quando a imprensa noticia que quantias fabulosas foram bloqueadas nas contas de certos políticos e isto num país com milhões de desempregados e grande parte na miséria. Haja então para o futuro mecanismos que impeçam tanta ganância numa concentração espúria de bens nas mãos de alguns que usurpam o que a todos pertence. 

terça-feira, 25 de outubro de 2016

ZAQUEU E JESUS

ZAQUEU E JESUS
Côn. José Geraldo Vidigal de Carvalho*

O publicano Zaqueu desejava ver Jesus (Lc 19,1-10). Uma simples curiosidade o moveu a remover os obstáculos de seu intento, dado que era de baixa estatura, estava a serviço do governo romano, era ganancioso e idolatrava o dinheiro. Sua curiosidade o conduziria, porém, a um final feliz. É que no íntimo de sua alma ele tinha sede de uma realidade que pudesse satisfazer inteiramente suas mais íntimas aspirações. O conforto em que vivia e as lições dos escribas e fariseus não lhe proporcionavam uma solução à sua inquietude interior. Ele ouvira falar de Jesus de Nazaré possivelmente através de algum publicano que fora convertido pelo Mestre divino. Este, aliás, era conhecido como amigo dos cobradores de impostos e pecadores. Ele poderia endireitar sua vida e iluminá-la com seu ensinamento. Eis porque com perseverança venceu todos os óbices que o impediam de olhar para Jesus, inclusive sacrificando a dignidade de seu cargo e subiu a uma árvore. Lá de cima, como um fruto esdrúxulo, ele pôde assistir a passagem do célebre Rabi da Galileia. Este que buscou, no seu bureau, Mateus, que era também coletor de impostos, Bartolomeu sob uma figueira, a Samaritana perto de um poço, e na cruz encontraria o Bom Ladrão, ali em Jericó deparou Zaqueu no alto de um sicômoro. Jesus era aquele que lia o coração dos homens e deu uma ordem: “Zaqueu, desce depressa porque hoje eu devo ficar em tua casa”. Bem podemos imaginar a estupefacção de Zaqueu ao escutar o seu nome e a receber tal notícia. Entretanto, é a cada um de nós que Jesus também dirige este apelo, pois Ele quer morar não apenas hoje, mas sempre dentro do coração de seus discípulos. Na casa de Zaqueu Ele operou uma conversão total e é isto que Ele quer ininterruptamente obrar na vida de seus fiéis. Zaqueu recomeçou sua existência longe dos cuidados fatigosos de sua profissão, sem se importar mais com o desprezo dos outros, sem defraudar no futuro a ninguém. Estava resolvido inclusive a restituir quatro vezes mais a quem ele havia prejudicado e até iria dar a metade de seus bens aos pobres. Cumpre observar que esta conversão admirável se deu por diversos motivos. Em primeiro lugar, a obediência de Zaqueu à determinação de Jesus, pois desceu imediatamente da árvore e foi ao encontro de Cristo. Uma grande alegria dele se apossou, o que já revelou sua gratidão interior. Sua generosidade em receber Jesus em sua casa foi notável e, sobretudo, a presteza com que se dispôs a rever sua vida passada, fazendo uma reparação condigna de seus erros. Tudo isto serve de alerta, pois bem se expressou Santo Agostinho: “Temo a Jesus que passa e pode não voltar”. .Cumpre que sempre percebamos Jesus passando às portas de nosso coração que só se abre por dentro, dado que Ele respeita a liberdade de cada um. Cristo não arromba a porta, mas bate suavemente.  Pede acolhida e quer um diálogo amigo, salvador, mas exige muita sinceridade da parte de cada um. Ele deseja que tenhamos sempre a disposição e a maleabilidade de Zaqueu. A Deus que vem até nós é preciso dizer com Davi: “Fazei-nos ver, Senhor, teu amor e dai-nos vossa salvação” (Sl 84,8). Segundo o salmista, “o que Ele diz é a paz para seu povo e seus fiéis e que eles não voltem nunca a sua loucura” (Idem, v 9). Como ensina São Cipriano, “Vivamos como templos de Deus, para que se veja que em nós habita o Senhor”. Na casa de Zaqueu, Cristo obrou uma admirável conversão. Tal foi sempre a incumbência de Jesus nesta terra, ou seja, procurar as ovelhas tresmalhadas e as conduzir até Deus. Esta é também a missão de seus seguidores que devem humildemente, pacientemente, perseverantemente levar os pecadores para o redil do Bom Pastor. Além de todas estas considerações, cumpre ainda ressaltar que Zaqueu mostrou como  transformar nossas incapacidades em atitudes inventivas. O publicano subiu a um sicômoro e venceu sua pequenez física. Não ficou paralisado ante o anseio de ver Jesus que ele não poderia contemplar no meio da multidão. Feliz aquele que ignora as estreitezas de seu coração e corre para junto de Cristo para escutar sua palavra de vida e salvação.. Não se pode, realmente, nunca deixar passar a hora de Deus que continuamente distribui suas mensagens salvíficas. Não é necessário realizar grandes coisas para que Jesus nos convide a estar com Ele. É preciso saber captar suas inspirações e seguí-las.com fé e prontidão. O passado pode ter sido tenebroso, o instante presente doloroso, o futuro é incerto. Para tudo, contudo, o divino Salvador tem solução. O importante é saber acolher sua misericórdia infinita com alegria e perseverança. Ofereçamos a Ele nossa disposição de progredir sempre mais espiritualmente e ele fortificará o nosso espírito, solidificará nossas resoluções e veremos maravilhas ainda maiores dos que as que se deram com Zaqueu. * Professor no Seminário de Mariana durante 40 anos.

quarta-feira, 19 de outubro de 2016

O PERIGO DAS GENERALIZAÇÕES

O PERIGO DAS GENERALIZAÇÕES
Côn. José Geraldo Vidigal de Carvalho*

 Há uma música denominada “Pelos pecados” muito difundida que tem a seguinte frase: “Hoje se a vida é tão ferida, deve-se a culpa / E a indiferença dos cristãos!”. Melhor se diria “Deve-se à culpa de alguns cristãos”. Nem todos os cristãos são maus cristãos a ponto de tornar a vida do mundo tão desgraçada. Há numerosíssimos santos na Igreja que são, de fato, para-raios diante dos crimes que se cometem mundo afora. Perfeito é só Deus e há de se distinguir entre pecados graves e leves e também entre falhas que não são pecados, mas fruto da mera fragilidade humana, cometidas sem pleno conhecimento e sem pleno consentimento. Segundo Dom Murilo Krieger, Para o cristão, mais do que um culpado, o mal tem uma causa: a liberdade. Fomos criados livres, com a possibilidade de escolher nossos caminhos. Podemos, pois, fazer tanto o bem quanto o mal. Se não tivéssemos inteligência e vontade, não existiria o mal no mundo; se fossemos meros robôs, também não. Por outro lado, sem liberdade não haveria o bem e nem saberíamos o que é um gesto de amor. Também não conheceríamos o sentido de palavras como gratidão, amizade, solidariedade e lealdade”. Adite-se que são os santos da vida de cada dia e os mártires de nossos dias que fazem progredir a Igreja com sua vida coerente e seu corajoso testemunho de Jesus Ressuscitado, graças à obra do Espírito Santo. Foi o que inclusive ensinou o Papa Francisco na sua homilia na missa matinal do dia 7 de abril de 2016 na Capela da Casa Santa Marta em Roma. São, na realidade, um sem número de bons cristãos que dão testemunho de vida e se alegram em ser luz do mundo, atraindo as bênçãos de Deus para esta terra e não desventuras. Há muita coerência entre a vida de muitos batizados e sua fé, fruto da ação dos dons divinos. São os santos de todos os dias que no cumprimento de seus deveres e na observância dos mandamentos divinos fazem gloriosa a Igreja de Cristo que é  “una, santa, católica”. * Professor no
Seminário de Mariana durante 40 anos 

sábado, 15 de outubro de 2016

ORGULHO EXECRADO E H HUMILDADE EXALTADA

ORGULHO EXECRADO E  HUMILDADE  ENALTECIDA
Côn. José Geraldo Vidigal de Carvalho*
Notável pedagogo, Jesus na parábola na qual focaliza um fariseu dominado pela soberba e um publicano a irradiar profunda sensatez retratou com maestria duas posturas contraditórias diante de Deus. Mostrou peremptoriamente a diferença. entre uma prece condenável e um contato verdadeiro com o Ser Supremo. O fariseu na sua altivez se centra em si mesmo faz a pintura de sua grandeza. Manifesta-se como um poço de virtudes. Os outros são “rapaces, injustos, adúlteros”, ele é um herói possuidor de todos os atributos, merecedores de aplausos. Era uma pessoa à parte, inatacável. Sua auto justificação fluía de uma erupção de deplorável narcisismo merecedor de repulso, pois os seu amor para consigo mesmo raiava as bordas do ridículo. Tudo isto o fazia ignorar seus muitos defeitos, os quais, aliás, projetava nos outros, como acontecia no seu julgamento deturpado do humilde publicano. Ele eliminava os outros para ser o único e exclusivo objeto do amor de Deus Firmava-se  apenas em ações exteriores, mas vazias porque contaminadas pela arrogância com que se posicionava perante Deus o qual, conhecedor de tudo que se passa no íntimo de cada um, via o desequilíbrio de um coração no qual só imperava o mais profundo exclusivismo do próximo. Por isto mesmo ousava fazer uma prece que era uma apologia que dimanava de seu psiquismo viciado. A agressividade marca a oração feita por este publicano, inclusive diminuindo a amplidão do coração de um Deus que ama todas as suas criaturas e que conhece o íntimo de cada um, não se deixando enganar pela hipocrisia, pela falsa devoção, pela simulação. Ao contrário, o publicano mantendo-se à distância, não queria nem sequer erguer os olhos ao céu, mas batia no peito, reconhecendo-se um grande pecador. Era um sábio, pois somente, de fato, Deus é perfeito e o ser humano é contingente e sujeito a erros e imperfeições cometidos por sua própria culpa. Ele sabia que não tinha direito de exigir nada de seu Senhor, mas esperava sua clemência e comiseração. Eis porque não se julgava superior a ninguém e confiava unicamente na bondade divina que viera suplicar. Não ostentava a mesquinhez do fariseu. No seu interior havia a aversão ao pecado que impede o verdadeiro amor ao Doador de todas as graças. Podia então numa atitude de verdadeira conversão solicitar que Deus tivesse dele compaixão. Naquele momento ele trilhava o caminho da autêntica paz, pois “Deus resiste aos soberbos, mas aos humildes ela dá sua graça” (Tg 4,6). Jesus declarou abertamente: “Quem se humilha será exaltado” (Lc 14,11) e lançou uma norma preciosa: “Aprendei de mim que sou manso e humilde de coração”. (Mt 11,29). O publicano estava matriculado na escola deste Mestre admirável. A humildade é o alicerce da vida do verdadeiro cristão. Este apaga o “eu” e não se deixa dominar pelo egocentrismo. Com isto atrai o amor misericordioso de Deus. Foi o que aconteceu com a Virgem Maria que pôde dizer: “Ele olhou para a humildade de sua serva” (Lc 1,48). Como o orgulhoso n é incapaz de amar os outros, o humilde, ao contrário, cheio do amor divino é capaz de envolver o próximo num amor sem limites. Eis porque Maria, a humilde serva do senhor,  se tornou a Senhora das graças, tendo se tornado a corredentora da humanidade. O fariseu da parábola não ama seu próximo, mas se limita a julgá-lo. O humilde não se sente maior que os outros e nem os traz a seu tribunal, porque está imerso na misericórdia de Deus e reconhece que em derredor de si há pessoas muito mais santas e virtuosas. Além do mais,      levado pela humildade, o verdadeiro cristão reconhece que nunca pratica todo o bem que deveria fazer e, assim, se confia à indulgência divina. A humildade é, verdadeiramente, a porta pela qual entram todas as bênçãos do Senhor Onipotente.* Professor no Seminário de Mariana durante 40 anos.



quinta-feira, 13 de outubro de 2016

A PERSEGUIÇÃO DOS CRISTÃOS NO MUNDO ATUAL

                 A PERSEGUIÇÃO DOS CRISTÃOS NO MUNDO ATUAL
Côn. José Geraldo Vidigal de Carvalho*

Jesus foi claro ao dizer aos apóstolos: “No mundo tereis aflições, mas tende coragem, eu venci o mundo” (Jo, 16,33). Através da História da Igreja se pode verificar a veracidade destas palavras do Mestre divino. No império Romano, de Nero no ano de 54 até a chegada de Constantino ao poder no ano de 313, as diversas etapas de ódio aos cristãos fizeram milhares de mártires. No século VI, Dhu Nwas, rei judeu do Himiar, no Iêmen, moveu um massacre contra os cristãos da península Arábica  por volta de 518, destruindo as cidades cristãs de Zafar e Najaran e queimando suas igrejas e matando quem não renunciasse ao cristianismo. O evento diminuiu consideravelmente a população cristã na região, perecendo cerca de 20 mil pessoas. Ao longo da história da União Soviética  de 1922 a1991, as autoridades suprimiram e perseguiram, em diferentes graus, várias manifestações de cristianismo, A política marxista-leninista soviética defendia consistentemente o controle, supressão e a eliminação sobretudo da Igreja católica e encorajou ativamente o ateísmo durante este triste período. A Igreja de Cristo e seus adeptos foram sempre objeto de duros e cruéis ataques. O mesmo continua ocorrendo em nossos dias. São mais de duzentos milhões de cristãos que são perseguidos. Como a imprensa tem publicado, isto ocorre na África, onde grupos jihadistas ganham sempre mais terreno. Na Ásia, também isto ocorre, pois aos fundamentalismos islâmico, hindu e budista se soma a perseguição perpetrada por regimes totalitários como o norte-coreano. Entre os cenários mais difíceis, obviamente, se acha o do Oriente Médio. No Iraque, onde de 2002 até hoje a população cristã passou de um milhão para menos de 300 mil, com uma impressionante média de 60 a100 mil que deixaram o país a cada ano. Se a tendência continuar, em poucos anos a comunidade cristã deixará de existir no País do Golfo. Por tudo isto, cumpre que os católicos se unam em oração para que, não obstante tanta calamidade, os seguidores de Cristo fiquem firmes na fé. Os mártires de hoje, porém, acabam sendo semente de novos cristãos.  As portas do inferno jamais prevalecerão contra a Igreja de Jesus Cristo. Para fazer frente a toda e qualquer discriminação é preciso a graça poderosa de Deus. Mesmo nos lugares nos quais a perseguição não é tão ostensiva, infelizmente, muitos batizados renegam sua condição de cristãos e atraiçoam os compromissos batismais. Portanto, é necessário que todos orem pelos irmãos perseguidos em tantas partes do mundo, mas também é preciso trabalhar pelo crescimento do Reino de Cristo no meio em que se vive. Anunciá-lo por toda parte com ânimo e alegria, sobretudo com o testemunho da própria vida. É de vital importância o oferecimento dos próprios sofrimentos para que o Evangelho seja conhecido e respeitado e para que os perseguidos tenham coragem para não abandonarem a Igreja. Eis aí um apostolado que todo cristão pode e deve fazer. Ter consciência de que a nova evangelização deve ser o empenho claro e sem equívoco para que Jesus Cristo reine nos corações pela vivência de sua doutrina. Isto é trabalhar para a glória de Deus e salvação das almas. Todos unidos espiritualmente aos irmãos perseguidos e aos  que não possuem a liberdade religiosa. *Professor no Seminário de Mariana durante 40 anos.