quinta-feira, 17 de novembro de 2016

                                         VALORIZAR O TEMPO
                                             Côn. José Geraldo Vidigal de Carvalho*

Nunca se reflete demais sobre o cuidado que se deve ter em bem empregar o tempo. É sempre uma temeridade menosprezar os instantes de cada dia.  O momento presente precisa ser explorado ao máximo, pois ele rapidamente passa. Trata-se de uma dádiva de Deus que não pode ser perdida. Uma diretriz preciosa é não adiar as obrigações, mesmo porque aquilo que está feito não está por fazer e outros deveres vão surgir. Sabedoria é ter consciência de que a cada dia basta sua tarefa. É o que ensina o Livro do Eclesiastes “Todas as coisas têm seu tempo e para cada ocupação chega a sua hora debaixo do céu” (Ecl 3,1). Assim sendo, a programação diária precisa ser organizada com antecedência para que sejam usufruídos todos os benefícios decorrentes das boas ações. O autêntico cristão está persuadido de que a vida nesta terra pode acabar a qualquer momento. Cristo preveniu seus discípulos: “Vigiai, pois não sabeis o dia nem a hora” (Mt 25,3). Daí a seriedade com que as obrigações a serem feitas de acordo com a vontade divina devem ser encaradas. Trata-se de nada perder para a eternidade. Donde ser preciso sempre uma total adesão a Deus. É necessário pedir continuamente a Ele o discernimento para bem praticar o que é conforme a seu beneplácito e para perceber os próprios defeitos a fim de corrigi-los. É que o conhecimento de Deus é tão necessário como o conhecimento próprio. Eis por que Santo Agostinho solicitava: “Senhor que eu Vos conheça e que eu me conheça”.  Apenas assim, se valoriza a existência humana nesta trajetória terrena. Disto decorre a fidelidade a Deus a começar pelas pequenas tarefas diárias. Cristo deixou claro: “Quem é fiel nas pequenas coisas, o será também nas grandes” (Lc 1916). Coragem e constância no cumprimento dos deveres cotidianos é que fortalecem o cristão para superar as tribulações pelas quais Deus costuma provar aqueles que desejam valorizar sua vida. Entretanto, o desejo de explorar com sabedoria o tempo, que flui inevitavelmente, não deve levar o fiel a desanimar ante as faltas cometidas. Só Deus é perfeito. Grandes santos diziam a si mesmos: “Ainda que eu caia vinte vezes, cem vezes, eu me levantarei e prosseguirei a minha caminhada”. É óbvio que eles não cometiam faltas graves, mas se referiam ás fraquezas inevitáveis ao ser humano. Assim tomavam todas as precauções para progredirem na prática das virtudes. O que valem são os esforços contínuos, uma vez que grande é a debilidade humana. São Paulo declarou: “Para os que amam a Deus tudo coopera para o bem” (Rm 8,28). Deus permite as fraquezas humanas para curar seu seguidor da presunção e do orgulho. É de se notar que grandes santos atingiram notável perfeição após erros gravíssimos que depois deploraram profundamente, como aconteceu com Davi, com São Pedro e tantos outros. Davi, arrependido, asseverou no salmo 50: “Um coração contrito e humilhado, Deus não despreza”. O Príncipe dos Apóstolos, após lamentavelmente negar a Cristo, chorou amargamente (Lc 22, 62). A conversão de quem se arrepende sinceramente constitui o fundamento de salvação e possui, deste modo, valor inestimável. O convite de amor da parte de Deus para que se empregue com sabedoria o tempo, com o poder de sua graça, capacita à correspondência a uma vida de fidelidade a Ele. É impossível determinar os dons ofertados por Deus a cada hora e perscrutar os corações, pois as condições existenciais variam. É certo, porém, que cumpre estar atentos às inspirações celestes para não se abusar da misericórdia divina. Donde o alerta do referido Santo Agostinho: “Temo a Jesus que passa e que pode não voltar”. Adite-se que a valorização do tempo passa por uma espiritualidade encarnada na vivência profunda da profissão que cada um exerce. É preciso não escapar do ambiente do próprio compromisso laboral, mas mister se faz vivê-lo profundamente. Deste modo se desenvolvem plenamente as possibilidades de auto aperfeiçoamento e de serviço a Deus e ao próximo. Isto inclui uma exigência de empenho, de esforço, de competência.  É assim que se tem uma visão clara da dimensão social das implicações realizadas no âmbito da vocação de cada um com toda sabedoria e inteligência sob o olhar de Deus, Senhor do tempo. Deste modo o cristão tende a transformar o mundo e a dar testemunho da esperança na construção e pela construção da comunidade em que vive. Trata-se de existir plenamente nesse mundo, empenhando-se a fundo em face das possibilidades humanas. Em síntese, o ser humano precisa bem se situar na tríplice dimensão do tempo, ou seja, no passado, no presente e no futuro. Do cronos que se foi lições devem ser tiradas com sabedoria, o que constitui o cerne da experiência vivida. Esta possibilita explorar melhor o instante presente, o agora, tornando-o proveitoso para si e a comunidade na qual se vive. O porvir é uma incógnita e está sempre a exigir estratégias para que se amenize o impacto do imprevisível. Para quem tem fé a confiança em Deus o enche continuamente de expectativas de dias felizes. Está sempre lembrado do alerta que é profundamente bíblico: “Ajuda-te que o céu te ajudará”. * Professor no Seminário de Mariana durante 40 anos.

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