ZAQUEU E
JESUS
Côn. José Geraldo Vidigal de Carvalho*
O publicano
Zaqueu desejava ver Jesus (Lc 19,1-10). Uma simples curiosidade o moveu a
remover os obstáculos de seu intento, dado que era de baixa estatura, estava a
serviço do governo romano, era ganancioso e idolatrava o dinheiro. Sua
curiosidade o conduziria, porém, a um final feliz. É que no íntimo de sua alma ele
tinha sede de uma realidade que pudesse satisfazer inteiramente suas mais
íntimas aspirações. O conforto em que vivia e as lições dos escribas e fariseus
não lhe proporcionavam uma solução à sua inquietude interior. Ele ouvira falar
de Jesus de Nazaré possivelmente através de algum publicano que fora convertido
pelo Mestre divino. Este, aliás, era conhecido como amigo dos cobradores de
impostos e pecadores. Ele poderia endireitar sua vida e iluminá-la com seu
ensinamento. Eis porque com perseverança venceu todos os óbices que o impediam
de olhar para Jesus, inclusive sacrificando a dignidade de seu cargo e subiu a
uma árvore. Lá de cima, como um fruto esdrúxulo, ele pôde assistir a passagem
do célebre Rabi da Galileia. Este que buscou, no seu bureau, Mateus, que era
também coletor de impostos, Bartolomeu sob uma figueira, a Samaritana perto de
um poço, e na cruz encontraria o Bom Ladrão, ali em Jericó deparou Zaqueu no
alto de um sicômoro. Jesus era aquele que lia o coração dos homens e deu uma
ordem: “Zaqueu, desce depressa porque hoje eu devo ficar em tua casa”. Bem
podemos imaginar a estupefacção de Zaqueu ao escutar o seu nome e a receber tal
notícia. Entretanto, é a cada um de nós que Jesus também dirige este apelo,
pois Ele quer morar não apenas hoje, mas sempre dentro do coração de seus
discípulos. Na casa de Zaqueu Ele operou uma conversão total e é isto que Ele
quer ininterruptamente obrar na vida de seus fiéis. Zaqueu recomeçou sua
existência longe dos cuidados fatigosos de sua profissão, sem se importar mais
com o desprezo dos outros, sem defraudar no futuro a ninguém. Estava resolvido inclusive
a restituir quatro vezes mais a quem ele havia prejudicado e até iria dar a
metade de seus bens aos pobres. Cumpre observar que esta conversão admirável se
deu por diversos motivos. Em primeiro lugar, a obediência de Zaqueu à
determinação de Jesus, pois desceu imediatamente da árvore e foi ao encontro de
Cristo. Uma grande alegria dele se apossou, o que já revelou sua gratidão
interior. Sua generosidade em receber Jesus em sua casa foi notável e,
sobretudo, a presteza com que se dispôs a rever sua vida passada, fazendo uma
reparação condigna de seus erros. Tudo isto serve de alerta, pois bem se
expressou Santo Agostinho: “Temo a Jesus que passa e pode não voltar”. .Cumpre
que sempre percebamos Jesus passando às portas de nosso coração que só se abre
por dentro, dado que Ele respeita a liberdade de cada um. Cristo não arromba a
porta, mas bate suavemente. Pede
acolhida e quer um diálogo amigo, salvador, mas exige muita sinceridade da
parte de cada um. Ele deseja que tenhamos sempre a disposição e a maleabilidade
de Zaqueu. A Deus que vem até nós é preciso dizer com Davi: “Fazei-nos ver,
Senhor, teu amor e dai-nos vossa salvação” (Sl 84,8). Segundo o salmista, “o que
Ele diz é a paz para seu povo e seus fiéis e que eles não voltem nunca a sua loucura”
(Idem, v 9). Como ensina São Cipriano, “Vivamos como templos de Deus, para que
se veja que em nós habita o Senhor”. Na casa de Zaqueu, Cristo obrou uma
admirável conversão. Tal foi sempre a incumbência de Jesus nesta terra, ou
seja, procurar as ovelhas tresmalhadas e as conduzir até Deus. Esta é também a
missão de seus seguidores que devem humildemente, pacientemente,
perseverantemente levar os pecadores para o redil do Bom Pastor. Além de todas
estas considerações, cumpre ainda ressaltar que Zaqueu mostrou como transformar nossas incapacidades em atitudes
inventivas. O publicano subiu a um sicômoro e venceu sua pequenez física. Não
ficou paralisado ante o anseio de ver Jesus que ele não poderia contemplar no
meio da multidão. Feliz aquele que ignora as estreitezas de seu coração e corre
para junto de Cristo para escutar sua palavra de vida e salvação.. Não se pode,
realmente, nunca deixar passar a hora de Deus que continuamente distribui suas
mensagens salvíficas. Não é necessário realizar grandes coisas para que Jesus
nos convide a estar com Ele. É preciso saber captar suas inspirações e
seguí-las.com fé e prontidão. O passado pode ter sido tenebroso, o instante
presente doloroso, o futuro é incerto. Para tudo, contudo, o divino Salvador
tem solução. O importante é saber acolher sua misericórdia infinita com alegria
e perseverança. Ofereçamos a Ele nossa disposição de progredir sempre mais
espiritualmente e ele fortificará o nosso espírito, solidificará nossas
resoluções e veremos maravilhas ainda maiores dos que as que se deram com
Zaqueu. * Professor no Seminário de Mariana durante 40 anos.
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