De Caifás conduziram Jesus ao Pretório”
( João 18,28)
Na Semana Santa cumpre meditar sobre o julgamento de Jesus. Terrível o julgamento, grande o amor que conduz Jesus aos tribunais. Profunda iniqüidade do homem, excelsa a misericórdia de um Deus que quer salvar os pecadores através das maiores humilhações. Quadros sinistros da miséria humana, cenas deslumbrantes dos exemplos de divina grandeza. Gestos inequívocos da humanal malícia, rasgos marcantes da celestial paciência. O ódio profundo escreve uma obra prima de maldade e intolerância, mas a dileção imensa faz surgir um monumento esplendente de bondade e condescendência. Rebrilha o mistério inefável de uma fineza que ostenta o Filho bem-amado preterido e condenado a favor de filhos prevaricadores. Acontecimentos terríveis assinalam a mais desastrada ação judicial do universo. Esta penaliza um Deus, em infames tribunais, num processo insólito, incrível. Envolvem os procedimentos então empregados as trevas da mais impressionante injustiça, as sombras da ignorância, o desprezo pelas mais elementares leis então vigentes, a caligem da perversidade, o nevoeiro da fraude, a nódoa do dolo, a mácula da pusilanimidade, da insensatez, da covardia. Numa palavra, Jesus se viu num torvelinho de perseguição e torturas descabidas. Surge um traidor famoso, discípulo infiel, ambicioso, desleal, Judas Iscariotes. O sanhedrim, colégio dos mais altos magistrados do povo judeu, os quais se mostrarão inaptos para cargo tão importante. Anás, antigo sumo pontífice, com quem os membros do sinédrio se aconselhavam e, no dizer de Flávio Josefo, “ninguém mais esperto do que ele para enriquecer”. Segundo Ernest Renan foi Anás o “principal ator desse drama terrível, o verdadeiro autor do assassínio jurídico que ia cometer-se”. Caifás, sumo sacerdote, personalidade vaidosa, cortesão ambicioso, responsável pela instalação do processo. Lúcio Pôncio Pilatos, procurador da Judéia, que entraria na história como o protótipo do covarde. Jesus de Nazaré, o benfeitor do povo, a “luz verdadeira que ilumina todo homem que vem a este mundo” ( Jo 1,9), a vítima de um julgamento fatal. Nos anais da história os fatos que mais repulsa causam ao espírito humano, parturejando revolta interior, asco e aversão são aqueles nos quais o liame sagrado do amor, o vínculo profundo da amizade, o laço sacrossanto do afeto são violentados por egoístas manifestações que conduzem à aberrante atitude de uma traição. Preso abruptamente por volta das vinte e três horas, à meia noite Jesus foi levado à presença de Anás, que dominava o Sinédrio no qual cinco sacerdotes eram filhos seus e o presidente, seu genro Caifás. Anás envia Jesus amarrado a Caifás. Apenas duas testemunhas de acusação depuseram, dizendo ter ouvido Jesus Cristo afirmar: “Posso destruir o Templo de Deus e reconstruí-lo em três dias” (Mt 26, 61). Como Jesus nada respondesse, Caifás obtém dos lábios do próprio Cristo a declaração de que Ele era o Messias, o Filho de Deus. Proclama-o blasfemo, réu de morte. Os milagres que Cristo operara, sinais claros de seu poder divino não suscitara naquele homem a fé na divindade daquele que possuía tais poderes. Caifás rasga suas vestes em sinal de horror, mas segundo alguns autores os sumos sacerdotes já tinham um rasgão de antemão preparado e ligeiramente costurado que podia servir para outras encenações de pasmo para comover a turba, sem danificar as vestimentas. Ali ele conseguiu plenamente o seu intento, pois cuspiram em Jesus, o esbofetearam e zombaram dele. Era o início de uma série de ousados mal tratos a quem a tantos agraciara! Como o Tribunal Supremo dos Judeus não tinha força para condenar alguém à morte, pois Jerusalém estava sob o domínio dos romanos, Jesus será encaminhado a Pilatos. Com a consciência o acusando de covardia perante os judeus, advertido oportunamente por sua mulher: “Não te envolvas com este justo, porque muito sofri hoje em sonho por causa dele” (Mt 27,19). Os judeus então atinge o que mais vulnerável era naquela autoridade: sua subserviência ao Imperador e clamam: “Se perdoas a este homem não és amigo de César” (Jo 19,12). Pilatos estremece. Uma desconfiança de César, mesmo de longe, perturbaria qualquer Juiz. A amizade ou temor do Imperador de Roma estava acima da Justiça e da vida de um inocente! Grande a iniqüidade dos homens! Pilatos vai e então escreve nas páginas da História o maior gesto de uma imensa covardia. Lavou as mãos e se proclamou inocente daquele sangue de um Justo. A água lava, purifica. Ela no Dilúvio regenerou o mundo, na fuga dos hebreus lhes foi salvação no Mar Vermelho, no Jordão curou a lepra de Naaman e no mesmo Jordão o Batista dela se servia para o batismo de penitência. Cristo instituiria o sacramento da regeneração através da água sinal da remissão do pecado original. A água, porém, para Pilatos era perdição e ao lhe correr entre os dedos selava a penúria de um caráter débil, fazendo dele o protótipo perene da pusilanimidade, do acobardamento, da poltroneria; sinal inditoso de todos os caracteres servis. A covardia foi e será sempre a desculpa dos estultos encastelados na torre de suas fraquezas morais.Torturas terríveis seguir-se-iam para Jesus depois de mais este gesto infausto. * Professor no Seminário de Mariana durante 40 anos.
quinta-feira, 29 de março de 2012
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