12 SENHOR,
DAI-NOS DESTA ÁGUA
Côn. José Geraldo Vidigal de
Carvalho*
Há momentos em que nos sentimos cansados de tudo, ou
seja, de oferecer algo aos outros, de recomeçar, de ir buscar água nas fontes,
de apanhar a água balde a balde sem nunca ser suficiente tal tarefa. Por vezes,
é no momento mesmo em que dizemos “Tenho sede” que Jesus, para uma resposta, nos
diz calmamente: “Dai-me de beber”. É que para refazer nossas forças Ele nos
solicita um serviço; para nos conferir confiança, Ele nos dá a possibilidade de
lhe oferecer algo, como, por exemplo, uma água fresca. Trata-se, na prática, de
um momento de suma gratuidade, ou seja, da escuta de suas mensagens, de uma
prece que flui do íntimo do coração; da adesão perfeita à vontade do Pai, como
nós somos com nossas fraquezas e nossas possibilidades que Ele conhece melhor
que nós mesmos. Muitas vezes, Jesus atravessa nosso caminho como aquele que se
convida e nos convida. No Evangelho de hoje (Jo 4,5-42) Jesus não era um
convidado pela mulher de Samaria e esta não pensava senão na água para seu
último falso marido. É de se notar que é Cristo que toma a iniciativa do
diálogo à beira do poço, como tantas vezes Ele procede conosco. O que importa
nas várias circunstâncias da vida é não fugir do encontro com Ele, não se esquivar
do olhar de Cristo, ostentando uma autossuficiência que tornaria menos visível
nosso contato com Ele, menos clara nossa opção pelo Reino de Deus, menos
austeros nosso caminho até Ele a o colóquio com este Mestre divino. A
Samaritana pensou inicialmente resolver humanamente a questão levantando o fato
de um judeu estar a pedir água a uma samaritana e os judeus não se davam bem
com aquele povo. Ela, contudo, logo percebeu o que lhe seria pedido, ou seja, a
conversão de seu coração, uma mudança de vida.
Cristo também nos interpela Ele que tão bem nos conhece, como Ele
conhecia a vida da Samaritana. Como acontecia com ela, Jesus quer sempre que
nós lhe descrevamos nosso proceder, pois Ele quer de nós a palavra que liberta antes
que Ele pronuncie a palavra que salva. Ele tudo sabe, tudo conhece. Conhece
nossa história, a esperança que trazemos dentro de nós e nossos momentos de
fragilidade. Não obstante nossas negligências e falsos compromissos, é a Ele
que decidimos pertencer e por nada neste mundo queremos deixar sua presença nem
trair sua amizade. Ele sabe que nós O amamos. Ele nos visita como aquele que
salva, redime. Ele acolhe tudo para tudo recriar. Ele quer tudo para tudo
santificar, purificar, salvar. Ele nos diz como à Samaritana: “Vai vasculhar
teu passado, todos os teus atos e dai-os a mim”. Com Jesus o passado não impede nunca o
futuro. Se Jesus coloca às claras nossas feridas é para nos mostrar um caminho
de liberdade. A iniciativa de Cristo não é nunca culpabilizante e a calma com
que conduz o diálogo sublinha bem que Ele não trabalha com pressões morais, mas
no nível da verdade e podemos sempre lhe dize: “Tu dizes bem e o que tu dizes é
verdadeiro”. É já viver a salvação o ser autêntico, sincero com o divino
Salvador, sem contestações, sem cálculos. Cumpre, porém, face a seu olhar de
misericórdia deixar descer a verdade no fundo do nosso ser e é isto que
liberta. Cristo vem até nós como aquele
que nos transforma em apóstolo. A Samaritana antes de ser totalmente convertida,
antes mesmo de ter ultrapassado o estágio das primeiras interrogações, recebe
uma missão de Jesus: “Vai, chama teu marido, e volta aqui”. Tarefa impossível
de ser realizada sem um retorno na vida daquele mulher, porque ela deve se encontrar
com o verdadeiro marido, mas esta clarificação que lhe é proposta é como
envolver sua missão e é mesmo a tarefa que resulta o mais claramente do que lhe
pedia Jesus. Junto a seus conterrâneos a Samaritana proclama: “Vinde ver”! Ela,
entretanto, não força o assentamento, pois leva somente um testemunho e propõe
uma questão. Uma declaração que um estrangeiro vem de fazer sobre ela: “Ele me
disse tudo o que eu tenho feito”. Paradoxalmente sua má conduta passada torna
seu testemunho ainda mais contundente. Ela resume inclusive o processo de sua
própria fé: “Este homem que me abordou, que me falou como um profeta, não será
ele o Messias?” Quanto a nós que cremos que Jesus restaura nos incutindo
confiança, respondamos sem temor à sua amizade e sejamos sempre um testemunho
de sua graça. * Professor no Seminário de
Mariana durante 40 anos.
.
Nenhum comentário:
Postar um comentário