segunda-feira, 31 de março de 2014

JESUS VENCEDOR DA MORTE

JESUS VENCEDOR DA MORTE
Côn. José Geraldo Vidigal de Carvalho*
O episódio da ressurreição de Lázaro (Jo 11,1-45)  evidencia também como Jesus é o vencedor poderoso da morte. Esta diante dele não tem a última palavra. Ele se mostra capaz de ressuscitar o grande amigo mesmo após quatro dias de seu falecimento. Ele e somente Ele pode afirmar que era a ressurreição e a vida e que aquele que nele cresse não morreria jamais. A condição basilar para que tal maravilha aconteça é a fé que leva à participação de sua vitória, ou seja, o triunfo sobre o último inimigo no dizer de São Paulo (1 Cor 15,26). Isto porque Ele é o enviado do Pai para a redenção completa da humanidade. Esta derrota da morte desejada por Deus foi anunciada nitidamente no Antigo Testamento. Lemos o que profetizou Isaías, mostrando que o Senhor dos exércitos “aniquilará para sempre a morte, e o Senhor Deus enxugará as lágrimas de todas as faces e cancelará da terra inteira o opróbrio de seu povo” (Is 25,6-8-9). Ao falar do julgamento do povo judaico no tempo e no fim dos tempos Daniel assim se expressou: ”E muitos dos que dormem debaixo da terra despertarão, este para a vida eterna, aquele para o vitupério, para a infâmia eterna” (Dn 12,2). Impressionante a visão de Ezequiel sobre os ossos dessecados. A promessa de Deus é peremptória: “Eu vou abrir vossos túmulos e vos farei sair deles [...] Eu colocarei em vós meu espírito e vós vivereis” (Ez 12-14). Portanto, a ressurreição de Lázaro é uma demonstração do poderio do Ser Supremo que pode trazer à vida os que foram dominados pela morte. Entretanto, uma reflexão aprofundada de todas estas passagens bíblicas patenteia que se a ressurreição dos corpos se dará no último dia, quando Jesus virá no esplendor de sua glória para julgar os vivos e os mortos, quem nele crê deve conhecer uma contínua ressurreição do coração. Esta deve acontecer dia a dia. Aquele que crê em Jesus conhecerá um dia a ressurreição, mas deve ter a alma continuamente viva, possuindo a graça santificante. Neste aspecto razão tem o poeta: “Mortos não são aqueles que jazem na tumba fria, mortos são os que têm morta a alma e vivem todavia”. O cristão autêntico possui, desde já, uma parte dos dons escatológicos, isto é, dos que lhe advirão no fim dos tempos, quando também o seu corpo se unirá novamente à sua alma. Ele possui uma vida sem fim que a morte física não pode nunca destruir e usufrui continuamente da presença especial de Deus que habita nele desde o dia do Batismo. Eis porque está na Carta aos Hebreus: “Ora a fé é a garantia dos bens que se esperam, a prova das realidades que não se vê” (Hb 11,1).  Esta virtude é como que uma posse antecipada das realidades futuras, um conhecimento seguro dos eventos celestiais. Em síntese, em Jesus a salvação está realmente atualizada e aquele que escolheu associar-se a Ele já é um vencedor e não pode ser nunca entregue irreversivelmente ao poder da morte. Claras as palavras de Cristo a Marta: “Eu sou a ressurreição e a vida, Aquele que crê em mim, ainda que venha a morrer, viverá e todo aquele que vive e crê em mim não morrerá jamais. Crês nisto?” A condição é, portanto, uma crença inabalável nele. Trata-se de uma aliança de amor de um pacto sublime graças à misericórdia infinita de Deus. O salto no mundo da fé é que dispõe cada um a entrar nesta aliança salvífica. A recompensa é a vida eterna. Desde agora, entretanto, há a certeza de se estar unido a Deus em todos os momentos da trajetória terrena. Deste modo, a ressurreição de Lázaro deve ser entendida como o som antecipado dos sinos jubilosos do grandioso dia da Páscoa, quando se saudará a Cristo que ressuscita imortal e impassível. Tudo isto envolve o fiel num hino de esperança. Cumpre, contudo, agir como as irmãs de Lázaro, chamando sempre por Jesus, pois sua presença muda tudo, é penhor de vida no tempo e por toda a eternidade. Ele é o Deus dos vivos e não dos mortos. Por isto também é preciso rezar a Ele pelos Lázaros que estão na tumba do pecado que é a morte da alma. Orar para que seus corações ressuscitem. Para Jesus nada é impossível. Nunca esgotamos as riquezas do amor do Coração do divino Redentor. Seu amor por todos, sobretudo, para com os que estão nas trevas do erro não conhece limites. Ele mesmo disse: “Não vim chamar os justos, mas os pecadores” (Lc 5,32). Nele, diuturnamente, se deve confiar. * Professor no Seminário de Mariana durante 40 anos.


  


domingo, 23 de março de 2014

O PODER DE JESUS E A SIMPLICIDADE DO CEGO

O PODER DE JESUS E A SIMPLICIDADE DO CEGO
Côn. José Geraldo Vidigal de Carvalho*
No episódio da cura do cego de nascença narrado por São João de plano aparecem vários contrastes(Jo 9, 1-41). Jesus viu aquele que estava tomado por duas cegueiras: a do corpo e a da alma. Com efeito, com seu poder divino Ele não só fez o cego enxergar o que estava em seu derredor, como também transmitiu-lhe a capacidade de contemplar as verdades espirituais, fazendo um ato de fé. De fato, depois de responder com admirável simplicidade aos curiosos e aos fariseus seu novo encontro com Jesus o levou a reconhecer no divino Redentor o Messias e exclamou: “Creio, Senhor”. Além disto, não se pode olvidar que,  na penumbra deste mundo, Cristo se apresenta revestido de luminosidade: “Enquanto estou no mundo, sou a luz do mundo”. Ele veio para iluminar a todos que estavam envoltos nas sombras dos males físicos e espirituais. Aí aparece outro contraste, dado que não é o homem que procura Deus, mas Deus que incansavelmente vem à procura do homem. Ele não cessa de se propor a libertar, sem, contudo, se impor. Do contrário, não haveria nem o júbilo de adesão livre, nem o valor da virtude autônoma. Ele espera, porém, sempre da parte do ser racional esta frase sublime: “Eu te amo, meu Senhor”! Deus chega de mansinho e busca um coração onde se aninhar. Então aquele que crê fica iluminado, clarificado. Pode, como o cego de nascença fazer um ato de fé e a fé é uma luz da inteligência que permite enxergar mais longe e mais profundamente do que os olhos da razão. Ela conduz à visão de Deus e de todas as suas maravilhas. Trata-se de uma visão sobrenatural. Nem se pode olvidar um outro contraste: Jesus cura o corpo para salvar a alma, ou seja,  todo o ser humano. Ele é uma luz divina para salvar  toda a pessoa. Ele sempre se mostrou o médico dos males somáticos como dos psíquicos. Muitos que pensam crer, contudo, são cegos porque presos a seus preconceitos, a suas idéias, a seus sistemas fechados. Assim eram os fariseus que, não obstante tantos milagres realizados por Cristo, nele não enxergaram o Messias, o Unigênito do Pai, o Salvador da humanidade.  Foram até objeto da ironia do cego curado por Jesus. Na sua simplicidade aquele miraculado deu respostas mordazes aos que o importunavam com perguntas até infantis, porque queriam contradizer a evidência dos fatos. Os fariseus eram os verdadeiros cegos porque voluntariamente incrédulos quanto à missão de Jesus e estavam trancados nesta descrença e apegados apenas a infração da lei do sábado por eles mal interpretada. Pela fé raiou a visão interior do cego de nascença e o bem-aventurado Papa João Paulo II dirá que Jesus depois de lhe abrir os olhos da carne lhe abre sua alma para a vista de Deus e seus mistérios”!  Pela fé cada um entra relamente em contato com a luz do mundo interior e se pode proclamar que Jesus é verdadeiramente o Filho de Deus. A quem foi batizado Cristo diz o mesmo que está no profeta Isaías: “Eu te ponho para farol das nações para levares a minha salvação até os confins da Terra” (Is 49,6). De fato, cabe àquele que pela fé contempla as maravilhas de Deus iluminar o mundo, curando os cegos que há por toda parte através da palavra, do exemplo, do testemunho de vida. Diante do verdadeiro cristão quem está a sua volta necessariamente tem que fazer uma opção, pois,  se está no mundo trevoso deve  passar a adorar a Deus em espírito e em verdade e, se está já no mundo luminoso, precisa melhorar sempre mais seu olhar espiritual. É que o verdadeiro cristão mostra que com a luz divina todas as sinistroses podem ser superadas, porque uma luz extraordinária  flui do Amor em Deus. Esta irradiação da fé vai crescendo dia a dia à medida em que a retina do olho interior vai se adaptando sempre mais à luminosidade de Deus. A atenção do ser racional se volta então para ver  não o que é passageiro, material, transitório, mas o que é eterno e imperecível e quer levar esta realidade por toda parte. Muitos então saem da famosa caverna descrita por Platão onde só se enxergam as sombras do mundo real para se imergir  no Ser Supremo como ocorreu com Santo Agostinho a exclamar: “O beleza tão antiga e tão nova, quão tarde eu te conheci, quão tarde eu te amei”. Este conhecimento é a visão pela fé  do próprio Deus no qual, segundo São Paulo “vivemos, existimos e somos”. A vida do cristão deve ser um poema de amor a Deus, que todos possam enxergar.Os santos estão continuamente na presença deste Deus que é luz e, por isto, são os iluminados e muitos só de os ver passam logo  a contemplar o Deus que neles intensamente vive. Eis um ideal a ser conquistado. * Professor no Seminário de Mariana durante 40 anos.



segunda-feira, 17 de março de 2014

LIÇÕES Á BEIRA DE UM POÇO

LIÇÕES À BEIRA DE UM POÇO
Côn. José Geraldo Vidigal de Carvalho*
Todos os pormenores do encontro da Samaritana com Jesus à beira do poço de Jacó (Jo 4,5-42) deixam mensagens de grande valor espiritual. Uma leitura superficial deste fato impede que se apreenda o essencial dos detalhes deste episódio. É preciso, antes de tudo, uma observação histórica. Havia uma dissensão profunda entre judeus e samaritanos. Os judeus detestavam os samaritanos por uma série de razões, inclusive por considerá-los um povo bastardo. Eles eram também uma gente herética porque não freqüentavam o templo de Jerusalém. Eles iam rezar no monte Garizim e judeus piedosos acreditavam que davam glória a Deus detestando os samaritanos. Era então uma injúria chamar alguém de samaritano e, sobretudo, de samaritana. Com efeito, a religião judaica, como outras religiões daquela época, considerava as mulheres como impuras desde o berço. Seus maridos também estavam maculados, bem como seus filhos e tudo que uma mulher de Samaria tinha tocado. Eis aí aonde foi parar Jesus. Estava numa região inimiga e herética e nela passaria dois dias. Ele aborda uma mulher três vezes impura, por ser samaritana, por ser mulher e uma mulher que tivera vários maridos. Diante dela, portanto, Jesus se faz três vezes contestador. Sem medo e com o poder que Ele possuía Cristo vai pulverisar esta tríplice barreira. Seu recado haveria de repercutir através dos tempos. Para Deus nada de excluídos, de inimigos, de malditos, de imperdoáveis, de irrecuperáveis. Ele viera não para os justos, mas para os pecadores fossem eles quem fossem. Nada de racismos, de preconceitos culturais ou religiosos. Deus, realmente, oferece sempre oportunidade a todos e todos têm o direito de beber a água viva de sua Palavra e de seu Amor. Naquele encontro histórico tudo ia se revestir de um simbolismo fulgurante e é exatamente o símbolo que nos conduz ao coração do mistério daquele evento. Para os nômades os poços eram bem mais do que poços. Era um lugar de trocas de idéias. Desconhecidos se tornavam ali amigos. Aliás, na Bíblia os poços frequentemente eram lugar onde surgiam casamentos. O poço de Judá onde Jesus estava não escapa a esta tradição alegórica. A água seria a representação figurada da Palavra encantadora do Redentor que iria penetrar fundo na vida daquela samaritana. Ela proclamará depois a seus conterrâneos: “Ele me disse tudo que eu fiz, vinde escutá-lo”. Tratava-se de uma palavra preciosa, mais vivificante do que uma fonte no deserto.  Palavra transformante que mudou inteiramente a existência de uma pecadora que viu saciada sua sede interior. Palavra esclarecedora, pois Jesus fez entrever a adoração do Pai em espírito e em verdade, bem além das querelas de povos e de religiões. Não será, doutrina Ele, nem em Jerusalém, nem no monte Garizim que Deus será verdadeiramente adorado, mas, sim, cada vez que um coração arrependido se voltasse para Ele, buscando sinceramente a Verdade.  Tudo isto tem uma aplicação prática imediata no contexto atual. Hoje, como ontem, Cristo faz jorrar a água viva de sua Palavra numa sociedade paganizada, hedonista, pragmatista. Se o cristão não pode aprovar o erro, ele precisa, porém, sempre compreender aquele que erra. É necessário agir como Jesus fez com a Samaritana e, com perspicácia, saber dialogar para levar o outro para o bom caminho. Quantos samaritanos há por vezes dentro da própria casa, no local de trabalho, nos lugares de diversão,  dentro de cada um que vive em conflitos pessoais contínuos. Muitos até se desesperam e chegam a proclamar que sua vida não vale nada, é uma desordem completa e que Deus não o ama. Jesus propõe a todos a água viva, pois quem dela beber, segundo suas próprias palavras,  nunca mais terá sede. A água que Ele oferece  se torna uma nascente de água jorrante até a vida eterna. Quando as evidências vacilam e as certezas tremem no coração dos irmãos ou no próprio coração e a fadiga desta peregrinação terrestre parece ficar insuportável, é bem que se lembrem as lições deixadas por Jesus à beira do poço de Jacó. Junto dos homens não se encontrará como dessedentar a sede do bem, da virtude, da verdade que borbulha lá no íntimo de cada um. É preciso evitar qualquer mistificação e é necessário não caminhar de decepção em decepção. Cumpre ir sempre ao encontro do Mestre divino. Ele ensinará a amar a verdade, a encontrar no amor, que é Deus, toda felicidade, toda ventura. A Samaritana deve ter ficado atônita diante do que Jesus lhe dizia, mas ela se deixou iluminar pelas suas diretrizes e se fez uma apóstola junto de seu povo. Há no fundo de cada coração o anseio do Infinito, de uma felicidade definitiva que somente Cristo pode saciar. Levemos Jesus por toda parte com palavras e exemplos e estaremos salvando a nós e aos samaritanos que estiverem em nosso derredor. * Professor no Seminário de Mariana durante 40 anos.


quinta-feira, 13 de março de 2014

O ENCANTO DA SIMPLICIDADE DO PAPA

.        O ENCANTO DA SIMPLICIDADE DO PAPA

Côn.José Geraldo Vidigal de Carvalho*

Após um ano de profícuo pontificado o Papa Francisco tem sido objeto de análise dos cientistas sociais. Na pessoa de Jorge Mário Bergoglio confluíram fatores importantes. Com efeito, pertencente a uma família de imigrantes italianos, nascido na Argentina, é o primeiro papa do continente americano, o primeiro pontífice não europeu em mais de 1200 anos e também o primeiro papa jesuíta da história e o primeiro a adotar o nome de Francisco. Nele se contempla de um lado Inácio de Loyola, o santo da força de vontade, e, de outro, Francisco de Assis o santo do amor. Ele faz fulgir perante o mundo a sabedoria e a cultura dos jesuítas e a doçura e naturalidade dos franciscanos.

Uma avalanche de aspectos logo surge durante 365 dias de um trabalho ardoroso a favor da evangelização, empregando com clarividência as armas que a comunicação moderna oferece. Linguagem direta, uma simbologia admirável com notável valor evocativo, místico, até mesmo intrigante. Uma ação prudente, mas fulminatória, visando o dinamismo da Santa Sé e de todos os seus departamentos. Longe de qualquer laivo de laxismo ou de relativismo ele aborda os temas mais delicados com firmeza e total clareza, deixando a muitos perplexos, mas orientando com lucidez a conduta cristã. Ele aspira por uma Igreja aberta para todos e, por isto, nada de muramentos que isolam. As fronteiras do Papa Francisco se alargam cada vez mais em busca das ovelhas tresmalhadas e das que não conhecem a verdadeira face da Igreja. Ele quer o contado direto com todos que dele se aproximam. Suas mensagens sintéticas, objetivas lhe proporcionam tempo para circular junto do povo. Ele se faz, como bom jesuíta, o arauto da misericórdia divina, pois Cristo veio para salvar os que estavam perdidos nas trevas do erro. O Papa Francisco não se instalou no Vaticano, mas se apresenta como um caminheiro de Jesus, como outrora São Francisco de Assis. Sempre um passo para frente e nunca um olhar para trás é o que transmite seu otimismo irradiante. Sua humildade, seu espírito de pobreza tocam os corações que nele percebem a sinceridade de quem quer sempre acertar, sabendo de todas as limitações humanas. Por isto mesmo, o Conselho de oito cardeais que ele nomeou, visando a reforma da Cúria romana lhe dá um apoio para agir com segurança e sem precipitações. Com espírito democrático o questionário sobre as evoluções das famílias católicas do mundo inteiro na preparação de um Sínodo demonstra seu desejo de colocar o dedo nas chagas e. sem ratificar os erros. Poder oferecer os meios para o total equilíbrio ético na conduta dos seguidores de Cristo.

A verdade em si é intocável,  os princípios fundamentais da moral exposta nos dez mandamentos  são intangíveis,  mas os problemas devem ser examinados com coragem, exatamente para que não se caia nunca em erros perniciosos, quer dogmáticos, quer éticos. Abertura de espírito sem trair a exatidão de tudo que foi revelado por Deus. Ele quer que nas atitudes cristãs não aja nunca o contra testemunho que possa patentear uma falta de fé na vida eterna e que signifique adoração dos bens terrenos. Ele não age para desestabilizar as pessoas iludidas com as frivolidades terrenas, mas para colocá-las no verdadeiro rumo da pátria celeste. Não se percebe assim contra ele nenhum movimento de pressão ou oposição, apesar das medidas reformatórias tomadas, sobretudo no que tange o governo geral da Igreja, que precisa estar a serviço de toda a humanidade e não apenas dos cristãos.

Deus sempre o ilumine, o fortaleça para glória da Igreja e bem das almas!

* Professor no Seminário de Mariana durante 40 anos.



segunda-feira, 10 de março de 2014

SIGNIFICADO DA TRANSFIGURAÇÃO DE JESUS

SIGNIFICADO DA TRANSFIGURAÇÃO DE JESUS
Côn. José Geraldo Vidigal de Carvalho*
Dentre todos os pormenores que envolvem a Transfiguração de Jesus no monte Tabor, se ressalte a ordem vinda do Pai: “Este é o meu Filho amado, no qual ponho as minhas complacências: Escutai-O” (Mt 17,5). Aí o sentido mais profundo deste episódio. Com efeito, celebrar a Transfiguração de Jesus não é comemorar um acontecimento passado sem liame imediato com o presente. É contemplar a união perfeita e indissolúvel da divindade e da humanidade na pessoa do Verbo Eterno de Deus. Nele a humanidade inteira foi transfigurada e chamada a uma união maravilhosa com sua divindade. Uma glória indescritível reservada a todos aqueles que em Cristo se tornam participantes da vida divina através da graça santificante. Trata-se do anseio salvífico da Trindade que desejou conduzir os seres racionais até sua própria santidade e felicidade. Para isto é preciso saber escutar Jesus, o Filho bem-amado, Palavra encarnada que vivifica e aponta o caminho da perfeição. Isto supõe levar a sério as oito Bem-aventuranças que o Mestre divino havia proclamado, vivendo intensamente este roteiro que envolve em luz e santidade existencial. Tal foi a ordem do Pai escutar a Jesus e este falou no desapego dos bens materiais, na mansidão, na sede e fome de justiça, na misericórdia, na pureza de coração, na paz, na justiça, na total fidelidade a Ele. São Mateus havia dito que o rosto de Jesus “brilhou como o sol”. O rosto exprime bem a dignidade de uma pessoa, seu estado de alma. Cumpre então na festa da Transfiguração de Cristo que cada um indague a si mesmo qual o rosto que tem apresentado aos outros através do comportamento político, social e, sobretudo, religioso. Comportamento daquele que carrega a sua cruz, imitando Jesus que ao descer do Tabor falou a Pedro, Tiago e João sobre sua Paixão e Morte. A cruz está no coração de toda a vida humana, mas é preciso saber lidar com as tribulações terrenas para se chegar à glória eterna, como sucedeu com Cristo. Este não deixou dúvida: “Se alguém quer caminhar após mim, tome a sua cruz e me siga”. Como Pedro, gostaríamos de fixar na eternidade os momentos felizes da vida. O Apóstolo fez uma proposta a Jesus: “Senhor, é bom que fiquemos aqui. Se queres, farei três tendas: uma para ti, outra para Moisés e outra para Elias”. Cristo, porém, não viera a esta terra para ser um organizador de camping neste mundo, mas Sua preocupação era marchar para o Calvário a fim de salvar a humanidade e para, assim, apontar a todos os acampamentos na Jerusalém celeste. Ele viera para servir e dar sua vida objetivando a redenção de uma multidão. Esta seria composta daqueles que buscariam uma glória eterna, mas passando pelo Gólgota, amando-O, escutando-O, colocando seus ensinamentos em prática.  Aqueles que seriam fielmente solidários com Ele apesar das contradições que um mundo materializado Lhe oporia. Aqueles que trabalhariam com amor e esforço pela evangelização, exercendo com responsabilidade um serviço eficiente dentro da Comunidade em que vive. São João mostrou que quem afirma estar com Jesus “deve igualmente caminhar como ele caminhou” (1 Jo 2,6) e Jesus havia dito que viera para servir e não para ser servido. Ele mostrou um caminho de um amor que se doa totalmente. Tudo isto significa uma transfiguração pessoal que leva à metamorfose de toda a sociedade através da vida de cada dia, com simplicidade na família, no trabalho, nos lugares sadios de diversão. Circunspeção em todas as circunstâncias da vida através de gestos, palavras e obras, irradiando paz, felicidade. É preciso então coragem, determinação sem nunca desfalecer.  Lá no Tabor uma nuvem luminosa envolveu Jesus, Moisés e Elias. Muitos comentaristas viram nesta nuvem o símbolo da presença do Espírito Santo. Este deve sempre envolver a vida de todo seguidor de Cristo para o ir  transfigurando a cada instante.  Deste modo, se estará sempre a escutar Jesus, Palavra que é a Sabedoria eterna a iluminar e a dar sentido a toda uma existência cristã. Deste modo se chegará ao repouso da visão beatífica. Este fim último precisa então ser o baricentro de todas as atividades neste mundo. Assim, o encontro com a Santíssima Trindade no Monte Tabor é como uma janela aberta para o futuro. É uma garantia de que a opacidade de nosso corpo mortal  e nossa alma se transfigurarão um dia lá na vida eterna resplandecente como a luz. * Professor no Seminário de Mariana durante 40 anos.



quinta-feira, 6 de março de 2014

VANDALISMO

VANDALISMO
Mandei pintar a frente da Casa da Praça do Rosário, 15, bastante danificada por vândalos.
Tinta cara, pintor caro e agora cedo, depois de tudo pintado já riscaram a parede!
Que país é este?
O pintor ainda está aqui e vai reparar o dano.
Côn.José Geraldo Vidigal de Carvalho
Viçosa, 6 de março de 2014


segunda-feira, 3 de março de 2014

CONFIANÇA NA PROVIDÊNCIA DIVINA

CONFIANÇA NA PROVIDÊNCIA DIVINA
Côn. José Geraldo Vidigal de Carvalho*
Cristo incentivou sempre a confiança absoluta na Providência Divina, uma vez que o Pai sabe muito bem tudo o que cada um precisa (Mt 6, 24-34). Crer na Divina Providência é saber que Deus age em tudo e tem um cuidado especial de cada uma de suas criaturas. Isto não é nem fatalismo, como ensinam os discípulos de Maomé, nem magia, como se o Ser Supremo devesse intervir cada vez que o ser racional se depara com momentos de provações. A fé na Divina Providência é antes de tudo um apelo a todos para cooperar na Sua obra, de uma maneira confiante e responsável, mesmo porque grande parte das desgraças que advêm são resultado exatamente da maneira desastrada do agir humano. É isto evidente, por exemplo, no que tange a fome no mundo, na má distribuição da renda. Pelo trabalho, pelas ações virtuosas, pelas preces e até pelos sofrimentos dos quais ninguém está livre neste vale de lágrimas quem tem fé pode agir tornando o mundo melhor. Foi o que aconselhou São Paulo aos Filipenses: “Fazei tudo sem murmurações e sem críticas para serdes irrepreensíveis e íntegros, filhós de Deus sem macula, no meio desta geração perversa e corrupta. No meio dela deveis resplandecer como luzeiros no mundo’ (Fl 2,  14-16). Dois conhecidos provérbios ilustram este pensamento do Apóstolo: “Ajuda-te e o céu te ajudará”; “O homem põe e Deus dispõe”. Trata-se, de fato, da participação humana no governo divino do universo. Pela sua Divina Providência, Deus deixa a cada um sua parcela de responsabilidade e concede ao ser humano o mérito de sua cooperação. O Concílio Vaticano II na Constituição Apostólica “Gaudium et Spes”, ensinou que as coisas são estabelecidas segundo sua constância e verdade própria e suas leis específicas (GS 36). Elas, entretanto ficam autônomas. O homem realmente foi criado para dominar e submeter a terra como está no início da Bíblia (Gn 1,28). Isto significa que ele se tornou assim providente para ele mesmo e sua responsabilidade é particular diante de Deus e de todos os outros homens. Muitos problemas ecológicos resultam do mau uso da liberdade humana. O mesmo se diga de tantas outras catástrofes e sofrimentos como os ocasionados pelas drogas e outros vícios. Portanto, o ser racional deve estar consciente dos males que ele mesmo causa a si e aos outros.  Entretanto, pelas boas obras pode o homem contrabalançar as desgraças que ocorrem e suas preces têm um valor imenso para que menos males aconteçam em seu derredor e pelo mundo afora. Com razão, afirmou Elisabeth Leseur: “Uma alma que se eleva, eleva o mundo inteiro”. Na verdade, nós não sabemos o bem que fazemos, quando praticamos o bem. Foi o que compreendeu magnificamente Santa Teresinha do Menino Jesus que, no fundo de seu Carmelo, espalhava rosas nesta terra de exílio, o que ela continua a fazer lá do céu. Adite-se que várias vezes adversidades que surgem são um alerta de Deus, como se lê no Livro de Judite: “O Senhor nos açoita, não para castigar-nos, mas nos advertir” (Jd 8,27). Foi o que afirmou São Paulo na Carta aos Romanos: “Tudo coopera para o bem daqueles que amam a Deus” (Rm 8.28). Este Deus, mesmo diante das infelicidades causadas pelo ser humano, sabe tirar o bem como ocorreu com a morte de seu Filho lá no Calvário, da qual resultou a Redenção da humanidade. É sabedoria, portanto, transformar os espinhos da vida em pérolas preciosas e é, por isto, que Jesus aconselhou: “Buscai antes de tudo reino de Deus e sua justiça e todas as coisas vos serão dadas por acréscimo”. Quem assim age tendo sempre em mira este Reino de Deus sabe se utilizar de todos os bens que estão a sua volta, jamais sendo ingrato para o grande Benfeitor, malbaratando tudo que dele se recebe. Desta postura resulta a confiança absoluta no Pai que está nos céus. A questão é que o pecado se inseriu no coração dos seres racionais e estes se esquecem de que somente quando se está em paz com Deus é que os males se diluem e se pode melhorar o mundo. Trata-se da conversão interior mesmo diante das coisas materiais. Quantas doenças resultam do mau uso do que se recebe da Providência Divina, como, por exemplo, tantas enfermidades advindas do excesso do comer e do beber. Tal deve ser a conduta de quem confia na Providência Divina: viver a vida do melhor modo possível, bem usufruindo de tudo que se recebe de Deus, nunca empregando seus dons para praticar o que é diretamente contra os dez  Mandamentos da Lei divina. Cumpre procurar a harmonia perfeita e definitiva do amor de Deus o qual encherá totalmente de felicidade todos os instantes da vida de cada um, vida assim passada bem de acordo com os planos traçados pela Sua providência para o bem próprio e de todo o mundo. * Professor no Seminário de Mariana durante 40 anos.



As tentações de Jesus

A TENTAÇÕES DE JESUS
Côn.José Geraldo Vidigal de Carvalho*
Seis semanas sob o signo da austeridade preparam os cristãos o dia da Páscoa. Neste primeiro domingo da quaresma, o Evangelho fala das tentações de Jesus no deserto (Mt 4 1-11). Esta narrativa contem algo essencial para cada cristão e, por isto, cumpre compreendê-la, apreendendo suas lições. Jesus viera estabelecer o Reino de Deus, criar um mundo novo. Ele não viera para demonstrar poderes mágicos, transformando pedras em pães. Sua missão não se cifraria em lances espetaculares como se lançar do pináculo do templo, sendo salvo pelos anjos. Ele dirá claramente que seu Reino não era deste mundo e, portanto, as insinuações de satanás batiam de frente com o projeto traçado desde toda a eternidade no seio da Trindade Santa. Na verdade muitos em Israel aguardavam um Messias do qual tinham uma falsa imagem, supondo que ele viria instituir um império irresistível nesta terra, fulgente pelos bens materiais. O orgulho, a vaidade, a ambição, o poder, a riqueza acenadas pelo demônio, receberam de Cristo a mais veemente repulsa e com sua autoridade disse ao mentiroso, ao pai da falsidade: “Vai-te, satanás”. Jesus vence as tentações lá no deserto, como resistirá em outras ocasiões registradas pelo Evangelho. Assim, quando ele foi tentado pela multidão que o queria fazer rei, pelos judeus que reclamavam grandes sinais no céu, pelo seu amigo Pedro que insinuava que era uma loucura ser arrastado e entregue à morte,  e também por aqueles que lá no Gólgota  gritavam: “Se és o Filho de Deus, desce da cruz”. Deixou para seus seguidores um exemplo de fidelidade até o fim aos desígnios do Pai, à missão que Lhe fora confiada. No início da quaresma é esta vitória constante contra as tentações diabólicas que Ele propõe a todos que se dizem cristãos. Isto porque as tentações no deserto são as tentações de todos no seu cotidiano. Com efeito, a tentação do pão é o apetite de tudo querer possuir. É certo que o pão de cada dia é o alimento necessário a todos, mas simboliza também o dinheiro, a profissão, as ocupações diárias, tudo que se possui.  Tudo isto não é um mal em si, mas Cristo advertiu que “O homem não vive só de pão”. O perigo é não dar tempo para se entreter com Deus, para refletir, para rezar, para ouvir as inspirações do Espírito Santo. Quaresma é tempo propício para uma revisão de vida e oferece oportunidade para escutar toda palavra que sai da boca de Deus. Jesus advertiu também contra a auto suficiência e ensinou que todos devem reconhecer os seus limites. Confiar em Deus, sim, mas sempre na mais total submissão à Sua vontade santíssima. Nunca se deve procurar o sucesso pelo sucesso para ser louvado pelos homens. O Criador de tudo não quer feitos espetaculosos como queria o demônio que Jesus fizesse se lançando do alto do pináculo do Templo. Todo cuidado é pouco para afastar o afã de domínio que leva à adoração da riqueza e dos bens temporais, curvando-se ante falsos ídolos. É necessário que se lembre sempre que todo aquele que está revestido de alguma autoridade, necessariamente deve se colocar ao serviço dos outros, evitando a idolatria do poder em si. As tentações de Jesus são bem assim o símbolo das tentações de todos os mortais. Cristo saiu vitorioso e nos propõe  participar de seu triunfo, usufruindo de todas as graças do período sagrado da quaresma. As grandes armas espirituais foram indicadas pelo Mestre divino lá no deserto: a oração que signifique, de fato, uma tertúlia com Deus, contemplando as verdades reveladas, recebendo com amor suas inspirações; a penitência vivida na austeridade que leve a uma moderação no comer e no beber; a penitência que é o arrependimento sincero de todos os pecados e o firme propósito de emenda. Tudo isto fruto da vigilância espiritual para se poder imergir nos mistérios destes quarenta dias abençoados. Apenas assim eles trarão abundantes frutos para os que tiverem uma consciência purificada. Este é um tempo de se exercitar na modéstia de costumes, de progredir na humildade, de se conscientizar da responsabilidade de ser cristão, valorizando os sofrimentos do divino Redentor. A Cruz deve ser o grande referencial para se poder participar do júbilo da Páscoa do Senhor com todas as maravilhas que ela oferece às almas de boa vontade. Através do Profeta Joel fica o convite de Deus: “Voltai-vos a mim de todo vosso coração”. Trata-se de algo de concreto. São Paulo adverte: “Este é o tempo que nos é dado, o tempo favorável, é agora o dia da salvação”. É a vivência plena da presença de Deus, no hoje do Ser Supremo,  numa revisão total de vida. A privação que cada um se impuser de tudo que é supérfluo se transforme em ajuda eficaz para os mais necessitados, numa esmola inteligente e oportuna, fruto do combate ao egoísmo. Deste modo o tempo quaresmal que leva a vencer todas as tentações é um tempo de libertação, de cura espiritual. Saber aproveitar-se deste presente de Deus e se matricular numa escola de vida que leva a uma autenticidade cristã que fulgirá no 20 de abril, na comemoração solene da Páscoa, o maior dia do ano.. * Professor no Seminário de Mariana durante 40 anos.