DESAMBIÇÃO DOS BENS MATERIAIS
Côn. José Geraldo Vidigal de Carvalho*
Quando Jesus disse que é difícil para o rico entrar no reino de Deus (Mc10,23), Ele estava pregando o desapego aos bens materiais e condenando a adoração da riqueza. O Mestre divino usou o termo “difícil”, mas não “impossível”, pois há aqueles que possuem haveres honestamente adquiridos e não se apegam aos mesmos. A desambição sob todas as formas leva à plenitude do espírito,traz felicidade e equilíbrio. Não se trata do desprezo ao que é necessário à existência, à indiferença para com a própria subsistência, mas do combate à ganância de querer sempre mais. Isto leva ao culto do luxo e à valorização do supérfluo. A Igreja na sua doutrina social mostra que há um mínimo de bem estar necessário à pratica da virtude e para o cumprimento dos deveres cotidianos. Cristo recomenda inclusive a ajuda aos pobres (Mc 10,21). O que sobra aos ricos pertence, realmente aos que nada têm. Vitor Hugo, célebre escritor francês, mostrou que à força de querer possuir, nos tornamos nós mesmos escravos do que se possui. Querer aumenta desproporcionadamente o ter é perder gradativamente o seu ser. Milchael Sander, professor na Universidade de Havard, no seu livro “O que o dinheiro não compra”, lamenta que hoje em dia quase tudo está à venda. Cita até o absurdo do fato de algumas crianças receberem dinheiro numa Escola dos Estados Unidos como uma recompensa de cada livro que lêem. Isto é a negação de toda sábia pedagogia. É a lógica perversa de submeter toda ação a compra e venda. Forma-se uma mentalidade inteiramente voltada para o lucro material e isto sem nenhum questionamento se os valores éticos estão ou não sendo violentados. No entanto, o espiritual é mais importante do que o material como ensina Jesus. O ser humano, porém, é fraco e considera facilmente que a satisfação das necessidades materiais justifica atropelar os mais elementares princípios de vida. Trata-se da morte de todo altruísmo que tanto dignifica o cristão. A estratégica do diabo é incitar a olhar as coisas na ótica do ganho terreno. Vive-se numa sociedade de consumo que propicia todas as distorções e materializa o homem e a mulher deste contexto histórico. A confiança excessiva no dinheiro é fonte de desgraças. Todas as ações humanas devem corresponder unicamente ao que Deus quer e nele e só nele depositar a mais total e absoluta confiança. Os bens materiais devem ser recebidos com gratidão, pois aquilo que se tem advém da bondade do Ser Supremo que abençoa sempre o trabalho, o empenho de quem sabe administrar com sabedoria o que Ele concede. Felicidade se encontra apenas no Criador e quem faz a vontade dele curte a vida em qualquer situação em que se encontre. Não se pode inclusive esquecer que o dinheiro deve ser respeitado, pois é difícil para entrar através da vida neste mundo, mas muito fácil para sair devido os apelos constantes para se gastar a torto e a direito. Através dos tempos continua, porém, a adoração do bezerro de ouro, quando somente Deus merece a adoração do ser racional. Além de ser um ridículo ídolo o vil metal leva a adorar outros falsos ídolos, levando à devassidão da conduta. Bem alertou Jesus para não se acumular tesouros na terra, onde a traça e a ferrugem o destroem e onde os ladrões arrombam e furtam. O Mestre divino aconselha a acumular tesouros no céu, onde estão em total segurança. Ele conclui: “Onde estiver o teu tesouro, aí também estará o teu coração. [...] Ninguém pode servir a dois senhores, pois odiará um e amará a outro; ou será dedicado a um e desprezará o outro.Não podeis servir a Deus e a mamon” (Mt 6,19-24). Deus deve ser o centro de todos os pensamentos, palavras, desejos, ações, projetos. Cumpre então sempre uma aposiopese corajosa, sábia nos pensamentos voltados para o ilusório, o transitório. Isto leva a ser pobre de coração, sem perde consciência dos dons e dádivas ofertadas pelo Pai do Céu. Trata-se de fazer continuamente frutificar os talentos e os colocar a serviço de Deus e do próximo. Nada da obsessão de querer sempre mais o que acaba até por impedir de se usufruir o que se possui. É preciso até entrar no interior das próprias limitações, mas na certeza de que não há limitações, isto sim, para o amor das coisas sobrenaturais e eternas. Santo Agostinho dizia: “ A minha força de gravidade é o meu amor”. Pode parecer difícil alcançar este estado de espírito, mas “para Deus nada é impossível”. * Professor no Seminário de Mariana durante 40 anos.
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