9
FILHOS DO PAI CELESTE
Côn. José Geraldo Vidigal de Carvalho*
Claríssima a ordem de Jesus: “Sede perfeitos como é
perfeito o vosso Pai celeste (Mt 5,38-48), Bem outro é, geralmente, o comportamento
da sociedade humana. Cristo nos deixa patente que a justiça do coração de seu
seguidor não deve ser retidão meramente mundana. É certo que as leis civis são
necessárias e os tribunais sociais têm razão de ser. O Filho de Deus não os
nega, mas Ele quer que seus discípulos tenham vistas mais largas, ultrapassando
os preceitos terrenos. É que o homem não foi feito para viver eternamente na
terra, aqui ele está de passagem, pois sua destinação final é a vida eterna com
Deus e esta vida eterna é preparada agora neste mundo. Eis porque é necessário
não se deixar prender às coisas da terra, mas delas se servir como meios para
caminhar rumo à casa do Pai. O comportamento do cristão tem então um sentido todo
especial cuja orientação o Mestre divino deixou bem explícita, mostrando qual
deve ser a verdadeira relação do ser humano com Deus e com os outros. Trata-se de estar voltado verdadeiramente para
Deus e perceber de que maneira nós O escutamos e amamos, buscando a perfeição
divina. A Lei do talião era naquela época uma medida de progresso, dado que ela
limitava o direito à vingança, levando a uma proporção equilibrada de maneiras
de ser e de agir. Cristo, porém, além disto, afirma a necessidade de um perdão
total, vencendo o desejo de represália com um amor profundo. Ele mesmo na cruz intercederia
pelos seus
algozes: “Pai, perdoai-lhes porque não sabem o que fazem (Lc 23,34). Ao
mandamento antigo deveria se sobrepor o preceito do amor. Ele ensinou: “A quem
te bater na face direita, oferece-lhe também a outra”. Muitos pensam que se
trata simplesmente do abandono de direitos legítimos. Não é bem assim, pois
Jesus, pedagogicamente, quis é mostrar a
reconstrução da fraternidade ao expor
voluntariamente seu seguidor a uma forma de vulnerabilidade, desejando que o outro reconheça sua perversidade
com tal ação de violência, opondo à maldade um gesto de abandono confiante e a confiança
conduz ao amor, ao reconhecimento do gesto
incoerente e impetuoso, porque oferecer também a outra face significa, deste modo, denunciar e interpelar o agressor, com um
gesto ou uma ação pacífica, mas firme, como que dizendo: “ Tu me bateste na
face direita, não queres também me bater na outra? O que tu fazes te parece
correto?” O verdadeiro cristão não apela nunca para a vingança mas fica firme,
fundamentado, e está sempre aberto ao perdão cordial. Perdoar não é fácil, mas
deve ser sempre a atitude do cristão. São Basílio aconselha a se ter em todas
as circunstâncias a calma. Quem não é discípulo de Jesus lança mão da injúria,
o cristão, contudo, paga sempre o mal com o bem. À atitude de violência se opõe
a doçura; ao rancor a brandura; à maldade a virtude. Um age como filho das
trevas, o outro como verdadeiro filho de Deus. Jesus quis nos ensinar o essencial da vida
cristã, nos incitando a ir além dos preceitos da lei mosaica. O código da Aliança
do Antigo Testamento prescrevia o equilíbrio nas relações humanas estabelecendo
o princípio da reciprocidade dos atos (Ex 21,23-28) Jesus, porém, quis conduzir
seus seguidores a uma sabedoria bem superior que é aquela de ser humanista e respeitoso
com todos sem distinção, sem julgamento e sem espírito de retaliação. O
princípio do “olho por olho, dente por dente” difunde o espírito da ira, da
animosidade. Jesus, entretanto, pregou a fraternidade, a dileção que leva à
liberdade espiritual que permite impedir o ciclo infernal do mal. Cristo
desejou que se tivesse bem clara a distinção entre o erro e a virtude. Quem se
reconhece como filho de Deus deve considerar os outros como irmãos, mesmo
porque Deus ama todas as criaturas sem distinção. A ira, a cólera, o rancor devem ser transfigurados no verdadeiro
sentido da filiação divina, numa atitude que é o apogeu da sabedoria, fruto da contemplação
do esplendor do Pai que precisa impregnar inteiramente o coração do cristão.
Este abandona a lei de talião para incrementar o mandamento do amor, reconhecendo
sempre que é filho do Pai celeste e, assim, ama a todos como irmãos que gozam
da mesma filiação divina A virtude da caridade fazia com que os pagãos dissessem a respeito dos cristãos: “Vede
como eles se amam! A caridade é a marca
definitiva do seguidor de Cristo É preciso pedir sempre a Jesus que nos ajude a
praticar em plenitude a caridade delicada e eficaz, fazendo desta virtude,
verdadeiramente, o sinal distintivo de nossos cristianismo. * Professor no Seminário de Mariana durante
40 anos.
Nenhum comentário:
Postar um comentário