AS TENTAÇÕES DE JESUS
Côn. José Geraldo Vidigal de
Carvalho*
Como lemos
em São Mateus, Jesus, após ser batizado, “subiu da água e eis que se lhe
abriram os céus e viu o Espírito de Deus, que, em figura de pomba, desceu sobre
Ele. E veio uma voz que dizia: “Este é o meu Filho amado, no qual ponho minha
complacência”. Portanto, confortado em sua identidade, foi que Ele foi
conduzido pelo Espírito Santo para o deserto (Mt 4,1-11). Foi, assim, para um lugar de encontro, em
solidão com Deus, e um lugar de combate espiritual. Observe-se que satanás
tentará, Jesus, inicialmente, por duas vezes invocando explicitamente a
qualidade excelsa de seu ser: “Se és o filho de Deus”. Aquele que acabava de ser manifestado como
Filho de Deus foi colocado à prova e foi o mesmo Espírito que repousa sobre
Jesus que o conduz ao deserto para aí suportar provas da tentação. Fala o
demônio a Jesus: “Se tu és Filho de Deus, dize que estas pedras se transformem
em pães [,] “Se és o Filho de Deus, lança-te daqui abaixo”. O motivo invocado
pelo diabo não era falso. Jesus era bem o Filho de Deus. Entretanto, as
consequências que ele tira disto eram um erro crasso e constituem a tentação.
Transformar as pedras em pão e se lançar do alto do templo são duas tentações
que se resumem numa única prova, ou seja, se valer do título de Filho de Deus
para agir em consequência. O demônio queria que Ele manifestasse prodígios para
se gloriar de sua independência daquilo que, na verdade, era um dom de seu Pai.
Esta tentação lembra bem aquela do homem sofreu no jardim do Éden. A serpente
infernal incitava o primeiro casal humano a desconfiar de Deus: “Absolutamente, não
morrereis, mas Deus sabe que no dia em que comerdes da fruta proibida vossos
olhos se abrirão e vós sereis como deuses que conhecem o bem e o mal”. Ser como
os deuses no meio da criação, decidindo o bem e o mal, dominando para seu
proveito os elementos, eis o que o homem iria adquirir. O que é notável nas
respostas de Jesus é que Ele fará apelo a sua humanidade e à submissão para com
o Pai, a fim de afastar a tentação. Está escrito: “Não só de pão viverá o
homem” [...] Tu não tentarás o Senhor, teu Deus”. Descobrindo nossa identidade,
nosso valor, a tentação fundamental, para Jesus e para o homem é de se porem
rival de Deus, nosso Pai. Ora nossa identidade e nossa vocação não são algo que
devemos escolher e defender cuidadosamente contra aquele que a desejaria retirar
nós. Mas o que nós somos é um dom que se recebe e se vive numa dependência que
é um filiação. Jesus era o Filho de Deus não porque poderia mudar as pedras em
pão ou se lançar incólume do pináculo do templo abaixo, mas Ele realiza sua
identidade de Filho de Deus alimentando-se da Palavra de seu Pai e não o
colocando à prova. A terceira tentação levava a uma ambição desmedida
oferecendo falsamente tudo que existe no mundo em troca da absurda adoração do
espírito do mal. Firme as palavras de Jesus: “Adorarás ao Senhor, teu Deus, e a
ele só prestarás culto”. Na sua humanidade Cristo sofreu as tentações e as
venceu e com Ele sempre também nós triunfaremos do demônio. Ele nos ensinou a
rezar ao Pai: “Não nos deixeis cair em tentação, mas livrai-nos do mal”. Todas as incitações do espírito perverso que
o homem suporta o Senhor as suportou na sua humanidade e nos ensinou como
vencer satanás e suas maldosas insinuações para que com Ele e por Ele sempre
vençamos na luta entre a verdade e o erro. Jesus, enquanto homem, poderia
afirmar que seu alimento era fazer a vontade do Pai e jamais, portanto, se
portar como um seu rival. Jesus apela para a Palavra de Deus que como uma luz desmascara
o erro e como uma espada expulsa o inimigo. Jamais Ele perderia sua identidade,
porque Ele era o Verbo de Deus que habitou entre nós. Por sua atitude perante
satanás Cristo cumpria as Escrituras e também realizava sua vocação de salvador
do gênero humano. Jesus venceu a fome, o orgulho, o desejo de poder, o imediatismo.
Deste modo, praticamente nos ensinou como vencer as tentações diabólicas.
Deu-nos inclusive o exemplo da oração e do jejum como uma prova de fé e de amor.
Pelo pequeno sacrifício do jejum fazemos algo que nos custa um pouco e nos
dispomos a afastar as insinuações diabólicas, pois a oração e a penitência são
uma prova de sinceridade e de amor diante de Deus e seus desígnios. O diabo é
aquele que divide e desune, o tentador que quer seduzir para o mal. É satanás o mentiroso, o pai da falsidade,
procurando excitar o desejo humano de ter, de poder, de ser igual a Deus. Quem,
porém, se apoia na Palavra divina o pode sempre vencer. * Professor no Seminário de Mariana durante 40 anos.
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