sexta-feira, 20 de janeiro de 2023

 

FELIZES OS QUE TÊM ESPÍRITO DE POBRE

Côn. José Geraldo Vidigal de Carvalho

No Evangelho de hoje Jesus proclama: “Felizes os pobres de coração, os pobres em espírito” (Mt 5,1-12) Notemos inicialmente, como observam bons hermeneutas, que o Filho de Deus não diz: “Felizes os que vivem na miséria, felizes as mães cujos filhos morrem de fome, mas Ele diz: “Felizes os que têm um coração de pobre, porque na época em que Ele pregou a   palavra pobre tinha já no seu povo uma longa história. Nos textos mais antigos o pobre era um homem encurvado, oprimido, incapaz de resistir e de ter o rosto levantado, aquele que devia sempre ceder aos poderosos. Acentuava-se menos a sua indigência do que sua humilhação pelo fato de ser pobre. Eis porque a palavra tomou muito rapidamente sua coloração religiosa e, assim, os opressores passaram a aparecer como orgulhosos, os ímpios e o pobre fazendo figura do homem que coloca sua confiança em Deus, esperando dele seu socorro.  Assim sendo, a primeira beatitude de Jesus não se dirige precisamente aos indigentes, mas a todos que têm coração assaz pobre para se colocar pequeno perante Deus, as mãos abertas para receber unicamente dele a força e a esperança. Jesus não diz “Vós a quem tudo falta, ficai na miséria”!  Ele não prega um fatalismo mais ou menos resignado, não se trata para Ele de frear a promoção humana e o pregresso social, mas Ele se dirige a todos os homens, àqueles que possuem algo parra viver e aos que não têm mesmo o mínimo para viver e lhes diz: “Guardai um coração   de pobre”, diante de Deus e de vossos irmãos. Diante de Deus que ignora as classes sociais, porque em todo homem Ele contempla um filho que tem necessidade de ser amado, de ser perdoado, de ser salvo. Os humanos julgam os sinais exteriores, sinais por vezes, enganadores de riqueza ou de pobreza. Deus, porém, olha o coração, porque alguém pode ser rico com um coraçAAAão de pobre e pobre com   um coração de rico É certo que a pobreza material, não a miséria, predispõe à pobreza de coração. Somos nós que fazemos divisões, recusas e exclusões.  Em um mundo onde as relações sociais são por vezes cruéis, a tentação pode nos vir ao fecharmos mais ou menos a porta do Reino aos homens diferentes de nós e então   estabelecemos barreiras lá onde Cristo passou exatamente para as destruir, É preciso estar atentos pois no coação do cristão a impetuosidade paralisa o desejo evangélico de justiça e liberdade.  Por isto uma segunda beatitude vem precisar a dos pobres de coração: “Felizes os mansos pois eles herdarão a terra prometida”. Cumpre inicialmente notar que Jesus n]ao diz: “Felizes  os incapazes, os ignorantes,  felizes  os que têm medo de viver, os  que fogem diante de sua  responsabilidade, mas  felizes os afáveis, os que recusam o anseio do poder , os que aceitam combater sem ira, os que sabem não abusar de suas forças os que deixam  aos outros um espaço no qual podem ser livres e possuir os meios de se superar, É a brandura mesma de Crisso que pôde afirmar: “ Tomai sobre vós o meu jugo e colocai-vos  na minha  escola porque eu sou doce e humilde  de coação” Trata-se  da suavidade mesma do Evangelho, ainda que ela possa parecer terrivelmente exigente. Ela não nos conduz a uma situação fácil e infantil, mas a uma espécie de realismo cristão, o realismo do batizado, adulto confirmado pelo Espirito, o realismo que é o fundamento da verdade interior, do acolhimento filial do que Deus faz e da misericórdia incansável diante do mundo. Tudo isto nos mostra que, se não podemos viver sob o signo da inocência, podemos, porém sempre viver uma graça de contínua conversão. Assim sendo para todas as outras bem-aventuranças o termo feliz não significa uma serenidade beatífica e inativa mas, pelo contrário uma maneira de viver concretamente sua fé profunda no Espírito Santo e fortifica os batizados pela prática do amor fraternal na vivência das mais grandiosas virtudes, numa dileção fraternal irradiante. Compreende-se então que os pobres de espírito se acham repletos de felicidade, os aflitos consolados, saciados os que têm fome e sede de justiça, a visão de Deus se abrindo aos puros e a filiação divina os envolvendo na paz, os prosseguidos por causa da justiça recebendo em a herança o reino eterno e a recompensa dos profetas. Por tudo isto, tornar-se outro Cristo, eis o significado de ser feliz. * Professor no Seminário de Mariana durante 40 anos.

 

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