OS ENVIADOS DE JOÃO BATISTA
Côn.
José Geraldo Vidigal de Carvalho*
O trecho do Evangelho de São Mateus focalizando o
Precursor que, estando no cárcere, envia discípulos até Jesus interrogando-O
sobre sua missão, de início, levanta, algumas questões (Mt 11,2-11). Assim, por
exemplo: o Evangelho de Jesus é ainda capaz de falar a nossos contemporâneos,
ou é preciso inventar um discurso diferente? O estilo da ação de Cristo, aquele
das Bem-aventuranças, pode ainda salvar o mundo ou é necessário um outro tipo
de manifestação? Estas questões podem ter surgido para João Batista ao
verificar a maneira de falar de Jesus que era bem diversa do seu modo de agir.
Ele conheceu então uma rude prova para sua fé, uma incerteza tal que o levou a
colocar sua dúvida através de seus próprios seguidores. Em síntese a questão
decisiva proposta a Jesus foi esta: “És tu Aquele que deve vir, (o Messias
aguardado por Israel) ou devemos esperar um outro?” Ninguém melhor do que o Batista
havia sentido as aspirações de seu tempo, o extraordinário desejo de liberdade,
autenticidade, que borbulhava no povo judaico. Os tempos, naquele momento, eram
duros para todos que desejavam ser fiéis. Havia os Romanos, ou seja a paz pela
força. Havia também a propaganda oficial a favor dos deuses do Império. Havia outrossim
o poderio das transações comerciais do ocupante e as práticas fáceis de uma
civilização já decadente. João Batista iniciara sua pregação de preparação dos
caminhos de Jesus, vindo do deserto longe das grandes cidades. Centenas tinham
ido até ele, o asceta, o homem que lutava para purificar os costumes, aparando os vícios,
cortando os erros. Eis porque seus ouvintes haviam escutado uma palavra
estranha, até então não ouvida, até revolucionária clamando veementemente:
“Arrependei-vos porque o Reino de Deus está próximo”. João Batista era um homem
de uma só ideia: “Deus não admite o pecado”. Era isto que ele havia dito nas
bordas do Jordão ao povo, aos soldados, aos funcionários. No palácio de Herodes
ele foi claro: “Tu não tens direito de ter a mulher de teu irmão!” Agora ele
estava na prisão. Entretanto o que lhe importava era que ele havia podido
reconhecer o Messias que se esperava e falado dele aos seus ouvintes como
“Aquele que iria tirar o pecado do mundo”. Ele sempre se julgou inferior a
Jesus: “Ele deve crescer e eu diminuir”. Ele mesmo disse que ele era uma a voz
que gritava no deserto. Agora, na prisão, ele ouvia falar das obras de Cristo,
de sua pregação, de seu estilo peculiar. João jejuava, Jesus comia e bebia com
todo mundo, mesmo com os pecadores. João havia predito: “Já o machado está
posto à raiz das árvores e toda árvore que não der frutos será cortada e
lançada ao fogo”. Jesus recusou o
estilo de um messias guerreiro e nacionalista, pregando a ternura de Deus. João
gritava, Jesus em vez de agitar as massas, dedicava o tempo para reencontrar
cada um e cada uma, como um ser insubstituível. Como Messias recusava toda
libertação pela força e mostrava o essencial: Deus vindo ao encontro do homem.
João estava na prisão confuso sobre a obra que realizara e manda seus
discípulos perguntar a Jesus: “És tu aquele que deve vir ou devemos nós
aguardar um outro”? Jesus responde através de fatos e por uma citação da
Escritura: “Releia Isaias e verás isto: Então os cegos recuperam a vista, os
coxos andam, os leprosos são limpos, os surdos ouvem, os mortos ressuscitam e
aos pobres é anunciada a boa
nova. Feliz aquele que não encontra em mim uma ocasião de queda”. Eis aí o drama da esperança que nós também
vivemos hoje. Nós sabemos que, em Jesus, Deus nos deu tudo: o perdão, um
caminho de vida, a esperança da glória eterna. Alguns, porém, estando agitados
perguntam: “Senhor a quem iremos nós? Somente vós tendes palavras de vida eterna
e mais ninguém nos pode ajudar!” Dizem também ser Ele a Cabeça do Corpo que é a
Igreja, mas que o modo como esta Igreja cresce na terra muitas vezes os
desconcerta. É que quereriam uma Igreja triunfante e a veem tantas vezes
perseguida e envolvida nos percalços da história. Nós muitas vezes desejamos
uma Igreja mais audaciosa, mas ela avança ao passo de pecadores que são os seus
membros. Não se trata assim da Igreja que imaginamos. Ela é santa e pecadora,
ou seja, santa na sua estrutura estabelecida por seu Fundador, mas pecadora nos
seus membros, frágeis criaturas. É preciso que creiamos ser Cristo o Redentor
absoluto do mundo, mesmo que sua mensagem não nos coloque no mundo em posição
de força, porque a atitude do cristão no mundo deve ser a do serviço, visando o
futuro de nossas comunidades e para isto é preciso atravessar o deserto de
nossas incertezas. É necessário atestar com convicção que Cristo hoje ainda é a
força da salvação para o mundo em marcha. Ele abre um caminho de doçura e de perdão. Em
todas as circunstâncias Ele é nossa salvação e é aquele que se manifestou aos seguidores de João Batista como o Messias que deveria vir a este mundo. * Professor no Seminário de Mariana durante 40
anos
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