quinta-feira, 29 de setembro de 2022

 

OS DEZ LEPROSOS

Côn. José Geraldo Vidigal de Carvalho*

No tempo de Jesus na Palestina ser leproso era ainda a mais do que hoje ser condenado a viver à margem da comunidade humana. A legislação do Levítico deixava claro: “O enfermo atacado pela lepra   trajará vestes rasgadas, andará de cabeça descoberta [...] e gritará: Impuro, Impuro!   Enquanto durar o seu mal, ele morará à parte: sua residência será fora do acampamento” (Lev 13,45). É à entrada de uma povoação que Jesus escuta que lhe clamavam: “Jesus, Mestre, tem piedade de nós!”  Dez leprosos estão lá, tomados pela miséria desta doença, mas decididos a ter ima chance de cura para suas vidas, a última chance, pois que eram rejeitados pelos homens. Eles se punham à distância, como era o costume, por temor, talvez, de se aproximar de Jesus e nunca a distância lhes parecia tão dura de suportar. É assim que tantas vezes os homens, na sua relação com Jesus, com Ele se comportam. Muitos creem que a lepra corporal e espiritual os torna indignos do amor do Pai e que ela não merecerá a ternura e o desvelo de Jesus. Vários são os que têm medo do Mestre divino por causa de suas misérias do corpo e da alma. Julgam que Deus não os ama assim como são. Pode haver o temor de se aproximar do Senhor tal como se é e pode haver o medo de crer que Deus não os ama assim como são em sua pequenez e desgraça. Ele não ama a lepra espiritual, mas ama todo o ser leproso e não há lugar no coração de Deus nem para rejeitar, nem para se desgostar de sua pobre criatura. Bem se recita no salmo: “Um coração contrito e humilhado, Senhor, tu não rejeitarás nunca” (Sl 51,19). É falso julgar que Cristo se mantêm a uma distância do pobre pecador, quando este sente o peso de sua solidão, de sua precariedade e quando o ser humano percebe a ausência de todo socorro humano. Jesus não despreza nunca quem a Ele vai com confiança. Ele se compadeceu dos leprosos que se sentiam tão menosprezados e pouco receptivos pelos circunstantes. Note-se que Jesus não lhes diz: “Aproximai-vos, aproximai-vos, pois eu v ou os curar”, mas fala com suma doçura: “Ide vos mostrar aos sacerdotes!”. Com efeito de acordo com a Lei cabia aos sacerdotes fazer constar oficialmente a cura depois do oferecimento de diversos sacrifícios da parte de quem fora curado e isto medida de suas possibilidades financeiras.  Tal a ordem dada por Cristo àqueles leprosos; “Ide para que fique constatado o fato da cura”! Jesus lhes pede um ato de fé total. Deviam pôr-se a caminho para a verificação da cura, quando ainda a lepra estava ainda lá sob seus olhos, e lhes tocava a carne. Diante da palavra de Cristo eles partiram. Pouco depois se dá a cura súbita, completa, total, para os dez ao mesmo tempo. Os dez tinham, acreditado, mas um só se mostrou agradecido. Na verdade, o mais pobre, o mais desprezível de todos, o único samaritano daquele grupo de infelizes leprosos. Os nove receberam o presente de Cristo e isto lhes pareceu algo normal. A bondade divina e não os havia tirado de seu egoísmo. Receberam o benefício, mas não captaram a grandeza do gesto do benfeitor. Eles não compreenderam que por meio desta cura Jesus lhes transmitia uma sublime mensagem, ou seja, que Deus os curava e merecia louvor, agradecimento. O samaritano voltou repleto de júbilo, proclamando louvores ao grande Benfeitor. Tomara consciência de que Cristo o amava. A ponto de o curar de uma maneira tão extraordinária. Voltou imerso em grande júbilo, não cessando de agradecer o benfeitor. Prostrou-se ante ele com seu corpo curado, com seu coração inundado de alegria, proferindo um agradecimento que muito o   dignificava. Belíssima lição! Examinemos então se temos sido sempre agradecidos a Deus por todos os seus favores, todas as suas graças. É toda nossa vida que deve ser uma resposta de amor às generosidades divinas. Deus nunca se impões, mas Ele se propõe à confiança de cada um manifestando sempre sua misericórdia, Lá onde imperam as situações de precariedade e de sofrimentos há sempre ocasião da multiplicação das graças do Todo Poderoso Senhor. A bondade divina deve, além disto, nos levar a ter compaixão de tantos irmãos e irmãs privados de dignidade e a nos sentir chamados a atender seus clamores e a lhes levar a grandeza da compaixão de Deus; O verdadeiro cristão deve ser o canal dos benefícios celestes deste Deus que não exclui ninguém de suas benemerências. Esta é também a missão do verdadeiro cristão anunciar por toda parte a clemência divina. Como bem acentuou o Papa Francisco, a Igreja, esposa de Cristo adota a atitude do Filho de Deus que vai ao encontro de todos os sofredores. Sua linguagem e seus gestos   transmitem sempre ternura, auxilio oportuno. Saibamos escutá-lo e imitá-lo! * Professor no Seminário de Mariana durante 40 anos.

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segunda-feira, 26 de setembro de 2022

 SERVIR NA FÉ

Côn. José Geraldo Vidigal de Carvalho*

Os Apóstolos pediram a Jesus: “Aumenta-nos a nossa fé” (Luc  17, 5-10). A atividade do homem deve ser orientada e caracterizada pela natureza e objeto de sua fé. Ter fé não significa simplesmente ir à Igreja, nem mesmo em pedir a ajuda divina nos limites do sofrimento ou das várias outras provações da vida. A   fé é a virtude que deve guiar toda a vida do cristão em tudo que ele é e pratica. A fé em Deus é uma maneira de apresentar e qualificar a postura daquele que crê. O cristão autêntico se acha impregnado de fé, habitado por ela, vivendo nela e atento aos recados divinos.  Donde o conselho do salmista: “Hoje não fecheis o vosso coração, mas escutai a voz do Senhor” (Sl 94). Donde haver ocasião para crescer sempre mais na prática desta virtude e daí a razão de ser do pedido dos discípulos a Jesus, porque quanto maior foi a fé tanto mais vigorosa e meritória será a existência de cada um, inclusive no serviço do próximo na imitação do Mestre divino que se apresentou como o servidor por excelência, exemplificando isto ao lavar os pés dos apóstolos na última ceia. Cumpre contemplar na fé esta vida inteiramente prestativa daquele que determinou: “Aprendei de mim que sou manso e humilde de coração”. Então coisas maravilhosas acontecem em derredor do fiel seguidor de Cristo, Este não é possuído por um espírito de temor ou de timidez mas, sim, pelo espírito de força e de amor para ousar bem servir o próximo e para perseverar sem nada guardar para si, a não ser a Palavra de Deus. Jesus convida pela fé à prática da caridade e da santidade completas.Donde a atenção em não prejudicar a ninguém, seja ele quem for, porque no próximo se enxerga pela fé o próprio Jesus Cristo. Trata-se de uma esclarecida caridade fraterna, do respeito ao outro na pratica do preceito legado por Jesus *Amai-vos uns aos outros como eu vos amei”. Deus é amor e Ele nos leva a amar, a respeitar, a ajudar.  É preciso lutar contra toda má ideologia ou desvirtuada teologia da fé, longe de qualquer atitude de desamor aos outros.  Jamais deixar de perdoar o próximo e isto só é possível com a graça divina, a qual só pela fé se desenvolve nos corações. Donde uma dileção sem restrições. Daí a fuga também de todo escândalo, palavra que vem do grego e significa um objeto que leva o outro a cair, como uma pedra no caminho. Nada se compara às alegrias do serviço na fé bem longe das servidões materiais, psicológicas e espirituais do mundo de hoje. Colocar-se ao serviços de Deus e dos outros é crescer nas aspirações fundamentais do ser humano. É um esforço necessário diante das estrutura do mundo ocidental no qual tudo é feito para que o homem creia que ele pode encontrar em si mesmo suas razões de viver e de progredir. Dizer que Deus tem uma soberania total e universal em tudo, pode parecer uma incongruência no contexto atual. Daí o afastamento daquele no qual nós vivemos, existimos e somos. Daí também a dificuldade de servir na fé, uma relação de simplicidade com o Ser Supremo. É com Ele que o cristão, que crê, deve transformar o mundo. Entretanto, não é tão fácil ter uma relação simples com Deus cuja grandeza ofusca o ser humano que tenha uma fé diminuta. Eis aí a razão de ser do término do Evangelho de hoje: “Assim, também vós uma vez feito tudo o que se vos ordenou, dizei: ‘Somos servos inúteis, fizemos o que devíamos fazer’. A fé deve nos levar a reconhecer que em tudo somos simples servidores.   A obra de Jesus é grandiosa, mas Ele quer a cooperação de todos os seus seguidores fiéis, apesar de sua pequenez. Sua obra é levar à luminosidade parcelas de sua criação. Donde, portanto, a importância da fé que inspira confiança, fidelidade apesar da grandeza da obra. Esta fidelidade leva a uma confiança na ajuda do Mestre com o qual se colabora. Os apóstolos haviam presenciado as maravilhas operadas por Jesus e eram eles que pediam a Ele que lhes aumentasse a fé. Ter fé neste caso não é admitir verdades, mas confiar inteiramente em Deus, pois é Ele que é o todo poderoso Senhor. Num mundo no qual reinam as discórdias, as altercações, a fé se torna o anteparo, trazendo a presença do amor diante da obscuridade das más ações. A fé não pode ser medida. Ser um fiel que crê é dar um salto na confiança naquele que tudo pode. Esta fé não se adquire nos livros, mas o fiel a recebes gratuitamente no contato com o Poderoso Senhor. A fé deve ser vivida intensamente. Deus está no coração da fraqueza humana, no cerne da pequenez de cada um. Ela não se acha no poder dominador, mas no fundo de nossas misérias. De fato todos somos servos inúteis porque tudo vem de Deus, tudo nos é ofertado de graça. * Professor no Seminário de Mariana durante 40 anos.

quarta-feira, 21 de setembro de 2022

 Parábola do Mau rico e do pobre Lázaro

Nesta parábola Jesus não pretendeu descrever a geografia do lugar dos mortos. Ele referiu simplesmente o que sobre isto se falava no seu tempo para melhor se fazer compreender e ir diretamente ao essencial de sua mensagem. É de se notar que a narrativa não diz que o rico é punido porque ele é rico, nem o pobre é recompensado porque é pobre. Trata-se de um rico que não se ocupa nem dos homens e nem de Deus. É a ausência de todo sentimento religioso e o império do egoísmo que são execrados e, inversamente, Deus premia a piedade e confiança do pobre porque Jesus lhe dá um nome que é todo um programa de vida, pois Lázaro significa “Deus veio em ajuda”. Dito isto, as lições da parábola aparecem claramente. A primeira concerne à morte como limite absoluto. Quer se tenha fausto e no luxo ou coberto de úlceras, mendigando na porta dos outros, chega um momento no qual as coisas tomam seu verdadeiro valor. Trata-se do modo como se viveu é que contará e esclarecerá toda a vida de quem passou por este mundo. A morte que totaliza todas as fidelidades de uma existência, fixa também o cada um definitivamente nas suas escolhas. Cumpre, portanto, enquanto se tem tempo, se converter, saber dar rumos certos à própria vida antes de entrar na eternidade. Ora, o rico da parábola era como um cego ao longo de sua trajetória. Ele não via a necessidade que Ele tinha de Deus e de seu perdão. Ele não tomava conhecimento de Lázaro que não reclamava de nada e simplesmente desejava matar a fome com as migalhas que caia da mesa do opulento, vendo os cães que viam lembra-lhe as chagas. Até à hora da morte o cenário das coisas aqui no mundo podem causar ilusões. Lázaro morre no esquecimento total. O rico falece e toda a cidade vem lhe prestar homenagens.  Entretanto, no outro mundo tudo se muda diante de Deus. Nada e ninguém impedirá jamais a Deus de ser por sua vez, misteriosamente, o Criador e o Juiz, infinitamente bom e infinitamente lúcido.  A morte não opera a justiça, pois é Deus mesmo que se reserva como apreciar cada um acima da qualidade da vida, levando em conta a qualidade do coração. Nós gostaríamos poder escapar desta lógica de nossas próprias escolhas, mas Jesus insiste e coloca nos líbios de Abraão palavras estranhas: “Entre ele e nós há um grande abismo”.  Não se trata isto senão de uma imagem, certamente, mas é a imagem do irreversível.  Foi-se um tempo, o tempo mesmo da vida, na qual o ímpio teria podido fazer qualquer coisa para Lázaro, como, por exemplo, os pedaços de pães que havia nos banquetes e que poderiam alimentar o pobre durante toda uma semana.  Agora, porém, mesmo Lázaro, mesmo o amigo de Abraão, não poderiam fazer mais nada para este rico. A outra lição da parábola diz respeito aos filhos do rico que precisavam então se converter. Jesus é bem objetivo na sua resposta O que converte não são as experiências extraordinárias, mesmo se um dos mortos voltasse para lhes falar, passado o primeiro sustos, cairiam de novo na mediocridade.  Isto porque ninguém pode responder em lugar do outro e só a palavra sincera, decisão pessoal, é que são imprescindíveis para a absoluta conversão do coração. De fato, temos Moises, lemos os Profetas e até “nos últimos dias Deus nos falou através de seu Filho “(Há 1,2). Se não somos convencidos por uma tal prova de amor quem poderá jamais nos falar de esperança? A conversão que muda uma vida é o retorno completo para Deus, a disposição de acolher a palavras de seu Enviado. Isto é o que deve dar sentido à nossa vida. Não obstante nossas diferenças, nossas riquezas ou pobrezas, o que vale é nossa crença vigorosa em Cristo que clama por conversão dando sentido real a nossa vida. Total esperança no nosso senhor Jesus Cristo que nos chama a uma mudança de vida, caminhando sempre para o melhor. Como foi dito, não se trata da situação de vida de cada um, mas do modo como se vive diante de Deus. Vivemos numa sociedade onde impera o consumismo e na qual muitas vezes o bem aparece como o mal e o mal como o bem. É preciso estar atentos, vigilantes, sabendo bem discernir o modo como vivemos perante Deus e o próximo. Assim como o rico tinha Moisés e os profetas nós temos, além deles, os santos e santas que nos apresentam tantos maravilhosos   exemplos de uma vida correta. O abastado da parábola só pensava nele mesmo e o pobre, apesar de sua louvável paciência, devia merecer mais consideração da parte daquele rico. * Professor no Seminário de Mariana durante 40 anos.

segunda-feira, 12 de setembro de 2022

 

44 O DINHEIRO DA INIQUIDADE

Côn. José Geraldo Vidigal de carvalho*

Como observam vários comentaristas do Evangelho de São Lucas (16, 1-13) muitos poderiam pensar que todo dinheiro é perverso e queima os dedos do cristão. Entretanto, esta não é a lição que Cristo quer ministrar no referido texto. Com efeito, Jesus de Nazaré conheceu a bela nobreza do homem que ganha a vida pelo trabalho de suas mãos. Ele reconhecia o justo preço da obra bem feita e como todo artesão consciencioso merece seu salário. Além disto, o grupo de seus discípulos era organizado e tinha um ecônomo, ainda que pouco fosse o que possuíam. Este ecônomo, Judas, se tornou escravo do dinheiro e traiu o Mestre divino. Além disto, algumas mulheres que também seguiam Jesus desde a Galileia e “muitas outras” os ajudavam com seus haveres (Lc 8,3).  Jesus e seus doze apóstolos não viviam de ar e, sem dúvida alguma, apreciava Ele a ajuda destas mulheres e não lhe dizia: “Guardai vosso dinheiro, porque ele é coisa má”. Então que era aos olhos de Cristo “o dinheiro da iniquidade”? Era aquele que era ganho de uma maneira perversa e aquele que se tornava um poder de injustiça ou de opressão e, sobretudo, o dinheiro que levava a uma escravidão quem o possuía ou o desejava possuir Eis porque Jesus não empregou a palavra dinheiro, mas a palavra “Mâmôn” que no judaísmo no seu tempo designava a riqueza, o ganho, frequentemente o ganho mal adquirido, e também as seguranças ilusórias deste mundo, opostos à confiança dos pobres de Israel no seu Deus. Uma vez bem conceituado o sentido do “dinheiro da iniquidade” se percebe que esta passagem do Evangelho oferece um resumo de todo o ensinamento do Mestre divino sobre o dinheiro. Este deve nos servir para cultivar amigos que nos acolherão como irmãos na vida futura lá onde o dinheiro não nos será mais necessário, nem para nós, nem para eles. Isto se liga a uma outra parábola de Jesus: “Ajuntai tesouro lá no céu” (Mt 6, 19). Cristo sublinha, em seguida, que nossa honestidade nas coisas da terra permite a Deus nos fazer confiança nos interesses do Reino dos céus. Além disto, administrando os bens deste mundo devemos pouco a pouco nos associar a Deus no grande trabalho da redenção humana. Aí está o bem verdadeiro dos filhos e filhas herdeiros de Deus e coerdeiros de Cristo. Jesus, além do mais, acrescenta que não se pode servir a dois senhores, ou seja a Deus e aos haveres terrenos, dado que, neste caso, um excluirá o outro. Ou se servirá a Deus ou às gloríolas efêmeras deste mundo, endeusando tantas vezes o amor próprio, cultivando o egoísmo, o apego às coisas materiais. É preciso, de fato, optar por Deus ou as falsas ilusões que o apego ao dinheiro pode oferecer. Ou Deus ou a divinização do poder terrestre. Portanto ou Deus ou o Mâmôn, ou Deus ou o ganho condenável, ou Deus ou as seguranças imediatas mundanas. Um dia tornará para cada um de nós bruscamente inúteis todas as nossas posses e jogará por terá toda servidão ao dinheiro em si. Todas essas considerações, porém, não devem levar a uma atitude de indolência e má compreensão do trabalho honesto a ser feito e que gera o subsídio para viver bem a vida que Deus oferece ao bons seguidores de Jesus. O importante é que no meio das transitoriedades deste mundo, se estabeleça firmemente nosso coração lá onde estão as verdadeiras alegrias, tudo conforme os ensinamentos de Jesus. O Mestre divino dizia: “Lá onde está vosso tesouro, lá estará o vosso coração” (Lc 12, 34). Portanto, cumpre fugir do dinheiro enganador. Para o autêntico seguidor de Jesus as riquezas lhe são somente emprestadas e ninguém é delas proprietário, mas administrador. Um dia se dará contas a Deus de tudo que dele se recebeu. O bom emprego da riqueza honestamente adquirida consiste em fazer com ela o bem, ajudando os mais necessitados, fazendo dela um meio de partilha. O dinheiro não é um mal em si mesmo mas pode ser instrumento de benefícios para o próximo, dando oportunidade de fazer muito bem aos outros.  Cada um deve examinar o que faz do dinheiro que ganha honestamente, examinando de onde lhe vem os recursos de suas atividades. Cumpre resistir sempre às tentações do Maligno e não se deixar levar pelos cuidados excessivos do dinheiro. É preciso ser sempre generoso, disposto a ajudar os mais necessitados para poder gozar de paz interior e alegria.   Em tudo é necessário respeitar o evangelho e a moral cristã. Procurar a solidariedade que ofereça ao próximo um viver digno de um ser humano, um futuro concreto, oferecendo aos outros boas soluções para a vida deles. Nisto é que deve consistir a habilidade dos filhos da luz. No Evangelho de hoje Jesus alerta sobre a habilidade que muitos colocam em solucionar os problemas terrenos e a falta de engenhosidade da parte dos filhos da luz na construção do Reino do céus: “Os filhos deste mundo são mais hábeis entre eles do que os filhos da luz”. É preciso estar atentos, porque o coração humano continua a ter os mesmo limites e indigências de sempre. Hoje em dia também se ouve falar do tráfico de influências, de corrupção, de enriquecimento ilícito, de falsificação de documentos e outros erros como na época de Jesus. A Deus, porém, não se engana com as aparências humanas e sua mediocridade.  O cristão não fala nunca de astúcia, mas do interesse em praticar. * Professor no Seminário de Mariana durante 40 anos.

quinta-feira, 1 de setembro de 2022


  REFLEXÕES SOBRE A PARÁBOLA DO FILHO PRÓDIGO

Côn. José Geraldo Vidigal de Carvalho*

Muitas as lições que a Parábola do Filho Prodigo oferece (Lc 15, 1-32) A maneira como o filho mais velho reagiu à recepção dada por seu pai ao irmão que havia abandonado o lar e dissipado bens da família fica bem clara nos dizeres paternos a ele que ficara fiel e não concordava com a atitude misericordiosa expressa numa peculiar festividade pelo retorno:” Meu filho tudo que é meu é teu”. Na verdade ele não   chamava aquele que regressava “meu irmão”, mas se referia a ele como “teu filho” que voltara. Fica claro deste moco que negava a fraternidade que os ligava, dado que ele estivera sempre a serviços do pai sem jamais tê-lo desobedecido.  Então o   pai tenta lhe explicar que aquele que regressara ao lar não era um estrangeiro, mas seu irmão, não obstante tudo e o que dele estava recriminando. Procurava lhe mostrar que perfeita fora e era sua comunhão com seu pai, pois lhe lembrava “Tudo que é meu é teu”, Meu filho eu sou o teu pai e não simplesmente o senhor, como sou o pai do teu irmão e não seu juiz.  Neste caso, para se alegrar com a volta do transviado ele devia antes de tudo reconhece-lo com irmão e firmar ele também uma autêntica relação filial.  Isto não estava acontecendo pois a situação era vista sob o ângulo do julgamento moral ao analisar atitudes diferentes.   O filho mais velho colocava acima de tudo a importância de sua obediência e fidelidade e quando via seu irmão rebelde, mas agora arrependido, o que lhe vinha à mente não era o que lhes era comum, mas o que os opunha: um que havia abandonado a casa paterna para viver sua vida a seu bel prazer, o outro que havia ficado sempre fiel a seu pai. Se a necessidade do perdão, da misericórdia do pai era mais manifesta para o filho pródigo do que para seu irmão, este último não devia se esquecer de que ele vivera sempre tranquilo sob a égide paterna. Belíssimo ensinamento pois todos somos irmãos filhos do mesmo Pai que está no céu e que felizes são os que   sabem usufruir a verdadeira vida em Cristo Jesus e que devem ter comiseração com os irmãos que erram e tudo fazer para que voltem à casa paterna.  Para isto, porém, é preciso muita humildade, porque somente Deus é santo, é prefeito e eis porque quem pode se aproximar do banquete eucarístico por estar em estado de graça deve humildemente dizer: “Senhor, eu não sou digno de que entreis em minha alma, mas dizei uma só palavras e serei salvo!”. O irmão mais velho da Parábola se jactava de ser obediente e até recrimina o pai por não lhe ter dado algo para festejar com seus amigos, esquecido inclusive de que estar sempre a serviço do pai já era algo a ser louvado.  A fidelidade a Deus não é um favor, mas uma felicidade e nem sempre se faz todo que se deveria fazer, pois inúmeras são as precariedades humanas. Lembrar-se de suas faltas não para se mortificar, mas para render graças àquele que nos acolhe sempre e isto é essencial para nossa vida fraterna. A ação de graça é fundamental para a fraternidade e deve fluir juntamente com o reconhecimento da própria fraqueza e de um arrependimento das faltas devidas à miséria humana. Por isto está na oração que Jesus ensinou “Perdoai nossas ofensas”, prece que até os grandes santos recitaram inúmeras vezes. Ao olhar misericordioso de Deus todos nós somos iguais na mesa dos pecadores. Todos os cristãos precisam sempre do perdão e da graça de Deus. A Ele nos dirigimos no salmo 129: “Se levardes em conta nossas faltas quem haverá de subsistir?”  Todas chamados a participarem da mesa do pão e do vinho que o Pai celeste não deixa faltar nunca, mesmo que seja um filho pródigo que sabe voltar aos braços do pai misericordioso. Notável o modo como o filho que regressou ao lar se dirigiu a seu pai reconhecendo seu erro, pois a raiz do pecado se encontra sempre naquele que se deixa levar pelo espírito de independência, egoísmo e orgulho. Como aconteceu com o filho pródigo muitos querem fazer o que lhes parecem bom, como bom lhes parece. Há aqueles que como o filho pródigo se julgam muito fortes para fazer face à vida e tomam decisões sem ter em conta a advertência do Pai que está nos céus, deixando de lado a lei divina. O filho pródigo errou ao se afastar da casa de seu pai, mas acertou quando, arrependido, regressou e humildemente se retratou. O mesmo deve fazer todo aquele que inflige a sagrada lei de Deus, voltando à obediência e fidelidade a seu Pai celeste. Deus, porém é Pai misericordioso que perdoa os corações arrependidos mesmo que estes nada tenham a Lhe oferecer, nada exigindo em troca. Façamos sempre tudo também pelo arrependimento dos que se extraviarem. * Professor no Seminário de Mariana durante 40 anos.