sábado, 27 de fevereiro de 2021

 

O TEMPLO DE DEUS

Côn. José Geraldo Vidigal de Carvalho*

Quando Jesus expulsou os vendilhões do Templo de Jerusalém, os discípulos se lembraram do que está escrito no Salmo 69: “Devora-me o zelo de tua casa” (Jo 2,13-25). Indagam os comentaristas: “Que vinha Cristo procurar no Templo ao aproximar-se a Páscoa? Que esperava o Filho do Pai encontrar naquele Santuário?” Segundo alguns intérpretes da Escritura Ele veio reencontrar entre os homens a presença viva especial de Deus no meio de seu povo. Ele procurava corações voltados para seu Senhor e rezar com eles. Naquele lugar sagrado Jesus, porém, depara o mercantilismo, a superficialidade e não a adoração cordial ao Ser Supremo. Instalados no Templo estavam mercadores de animais¸ trocadores de moeda. Jesus viera a uma casa de oração e descobre um bando de profanadores do lugar santo. Ao invés de hinos de louvar ao Pai, barulho ensurdecedor de animais e de vendedores que vociferavam. Tudo isto provocou a justa indignação do divino Redentor que não poderia aprovar o que impedia a manifestação de louvor dos verdadeiros adoradores do Pai.  Ali deveriam estar somente os que prestassem o autêntico culto religioso devido ao Criador. Jesus expulsa então todos os vendedores e demais profanadores da Casa do Pai celeste. Manda-os não para trevas exteriores, mas para fora do recinto bendito para que reconhecessem   seu gravíssimo erro e pudessem regressar depois como adoradores em espírito de verdade do Deus de Israel, sem serem escravos de um comércio indigno no lugar destinado ao louvor divino. Estava claro no livro do Êxodo: “Não terás outro Deus que não eu” (Ex 20,1). Apesar da justa e clara lição dada por Cristo aquele Templo de Deus não foi preservado, pois Israel e Roma precipitaram sua ruina.  Com efeito, o descaso de um lado e a violência de outro concorreram para esta ruína, não restando senão a esplanada. Não mais oferendas e sacrifícios ou um Sumo Sacerdote para pronunciar no Santo dos Santos o Nome inefável do Eterno Senhor. Entretanto, através do Sacrifício do Calvário, oferecido pelo Salvador, ficou evidente que o poder de Deus restaria mais forte que todas as idolatrias e que todos os insultos ao Deus verdadeiro. Jesus mesmo profetizou que os judeus poderiam destruir aquele Templo, mas, em três dias, Ele o reergueria (Jo 2,19). Esta predição atravessaria os séculos e deve ressoar fundo dentro do coração dos seus verdadeiros seguidores. Estes devem, portanto, refletir profundamente no que significa o Templo de Deus nesta terra, Trata-se, de fato, do lugar sagrado para se prestar de modo especial toda honra e glória ao Ser Supremo Por toda parte se ergueriam templos majestosos, ricos em ouro e prata, ornados pelos artistas mais renomados, edifícios nos quais brilhariam os esplendores das mais variadas artes, tudo isto para a glorificação de Deus, mas não seria este esplendor externo o essencial. De fato, a sincera consagração interior que o coração de milhares de fiéis ostentariam numa espiritualidade pura seria sempre o essencial. Eis aí o valor imenso do Templo no Novo Testamento, no qual se oferece a renovação incruenta do Sacrifício do Gólgota e do qual se pode verdadeiramente dizer que é oferecido na Casa Sagrada de Deus entre os homens, seja ela pequenina como as mais humildade Capelas ou os mais suntuosas Catedrais e Basílicas. Nelas se encontrariam sempre a salvação do corpo e da alma. É que a presença de Deus não está, de fato, encerrada entre quatro paredes, mas o Templo edificado com materiais terrenos passou verdadeiramente a abrigar corações nos quais este Deus habita, fiéis que se reúnem para comunitariamente louvá-lo ou individualmente, longe do bulício do mundo, para estar silenciosamente com Ele em fervorosas tertúlias, preces que vivificam o mundo. Além disto, cumpre sempre lembrar que Jesus que esteve neste mundo é o Emanuel, o Deus conosco, o novo Templo que surgiu nesta terra e em quem residiu a vida mesma de Deus.  Como mostrou São Paulo aos Colossenses, nele habitou com a humanidade a plenitude da divindade e nele temos plenamente o chefe de todo principado e de toda potestade (Col 2, 9).  São João proclamou solenemente “O Verbo de Deus se fez carne e habitou entre nós e nós vimos sua gloria. Ora, de sua plenitude todos nós recebemos” (Jo 1, 14. 16). O Templo de Jerusalém, profanado pelos vendilhões, foi posteriormente destruído. Jesus, Templo vivo de Deus, foi morto e sepultado, mas as forças do mal não prevaleceram e não prevalecerão nunca. Cumpre, porém, a todos que creem e sabem valorizar a Casa de Deus   usufruir de todas as graças que ai se obtêm. Além de tudo isto, é imprescindível nunca se esquecer de que pelo batismo o cristão se torna também ele o templo vivo da Santíssima Trindade. Séria portanto a advertência de São Paulo: “Não sabeis que sois o templo de Deus e que Espírito de Deus habita em vós? Ora se alguém maltrata o templo de Deus, Deus também maltratá-lo-á Porque sagrado é o templo de Deus e   tal templo sois vós” (1 Cor 3,16). É preciso viver initerruptamente na presença deste Deus que mora na alma de quem está em estado de graça. Donde a advertência de São Pedro que se deponha toda malícia e todo engano, os fingimentos, as invejas e todas as maledicências, aproximando-nos de Jesus, pedra viva, rejeitada pelos homens, mas eleita e estimada perante Deus (2 Pd 2,1-9). * Professor no Seminário de Mariana durante 40 anos.

sábado, 20 de fevereiro de 2021

 VER E ESCUTAR

Côn. José Geraldo Vidigal de Carvalho*

Lemos que Jesus tomou consigo Pedro, Tiago e João e os levou à parte a um alto monte e transfigurou-se diante deles (Mc 9,2-10). Como observam os hermeneutas, os intérpretes da Sagrada Escritura, o monte Tabor longe de ser uma elevada montanha é, antes, uma bela colina de mais ou menos seiscentos metros de altura. Entretanto se o evangelista emprega o termo montanha não foi para exagerar, nem para induzir ao erro. Sua intenção foi, por certo, colocar o acontecimento da Transfiguração no universo simbólico das admiráveis manifestações do Messias, salientando o notável episódio. Há um paralelo entre o fato do Tabor e o do monte Sinai onde Deus entregou a lei a Moisés. No Tabor como no Sinai temos a montanha, a nuvem e Deus com suas mensagens, Uma presença formidável do Ser Supremo no Antigo Testamento e também na Nova Aliança. Jesus conversa no Tabor com dois personagens que representam magnificamente as duas fontes da revelação judaica: Moisés e Elias. Duas figuras realmente emblemáticas: a lei e os profetas. Moisés e Elias, personagens marcantes da primeira Aliança, em tertúlia com Jesus que surge então como uma nova etapa da revelação. Adite-se a voz do Pai que se fez ouvir: “Este é o meu filho amado, escutai-o”. Perante a nova revelação Moisés e Elias desaparecem. Não se tratou assim de uma simples nova etapa na história da revelação, mas o acabamento que, de uma certa maneira, relativiza a antiga revelação. O acontecimento da transfiguração reorienta a revelação iniciada da primeira Aliança. Com efeito, a   palavra que Deus passa a dirigir aos homens não ´e mais uma mensagem, mas uma pessoa, seu Filho amado e com uma determinação “escutai-O”. Moisés e Elias, a alei e os profetas, propunham a quem cresse uma mensagem, ou seja, fazer isto, não praticar aquilo e Deus estará convosco. Agora, com a pessoa de Jesus, a Nova Aliança não consiste apenas em acolher uma lei ou uma profecia, mas em crer na obra da graça manifestada no próprio Filho de Deus. É certo que temos textos, um Novo Testamento, que somos chamados a nos comportar segundo a fé e a moral evangélica, mas o que faz que    alguém seja cristão, não é a prática, a moral, mas a Fé na pessoa de Cristo. No sentido estrito, o Evangelho, a Boa Nova, não é o texto que conta a vida e a mensagem de Jesus, mas o acontecimento da vitória do Bem-amado do Pai sobre a morte, pois a vida de Jesus manifesta a verdadeira via para que alguém se salve, para se viver em comunhão com Deus. Sua crucifixão mostrou que Ele, tomando os pecados da humanidade era um reprovado e lemos no Deuteronômio: “Maldito aquele que pendeu do lenho da cruz!’ São Paulo dirá que Deus O havia por nós identificado com o pecado (2 Cor 5, 21). Foi, entretanto, após sua paixão que Deus, o Pai de Jesus, O ressuscitou dentre os mortos e aos olhos de seus contemporâneos, Sua paixão e Sua morte sobre a cruz demonstraram que Ele era o rejeitado de Deus. Esta rejeição era exterior, o visível, o sensível, porque o interior estaria sempre intacto. Por isto o que a Transfiguração manifestava aos três privilegiados discípulos ali no Tabor era o esplendor da divindade sempre intacta em Jesus. A Ressurreição fez brilhar aos olhos dos discípulos a realidade da comunhão profunda de Jesus com a vida divina que não fora vencida pelo mal.  O que a Transfiguração havia manifestado aos olhos de Pedro, Tiago e João ficara vivo na pessoa de Cristo durante sua paixão e morte.  Quando Deus fez aliança com o homem, Ele levou até o seu acabamento a obra de vida que Ele iniciara. Não obstante o mal que paira neste mundo e o desfigura, aquele que habita na amizade do Pai na confiança e no amor, possui a vida divina. A Boa Nova dos cristãos não é uma mera narrativa, um escrito transmitido em quatro evangelhos falando da morte e da ressurreição de Cristo. A religião dos cristão não é propriamente a religião do livro, da lei e dos profetas, mas a religião da relação viva e atual com Jesus como aconteceu no Tabor com seus três discípulos. Assim sendo, com este episódio da Transfiguração, Deus quer nos comunicar coragem: não ter medo, apesar das provações, das dificuldades desta vida. Nunca se sentir abandonado. No final da vida de cada um se manifestará na plenitude a Aliança que o Pai concluiu com os que   se salvam através de seu Filho único, Jesus Cristo, Ele o Unigênito bem- amado No Tabor, porém ressoou uma ordem do Pai: “Escutai-o”. E nós como temos colocado em prática esta determinação do Pai lá no Tabor? Como temos escutado Cristo na nossa existência cotidiana? Ele é, de fato, o Senhor que nos conduz à vida eterna ou é somente alguém que nos ajuda no dia a dia. Trata-se de uma questão que pode parecer simplista, mas se o cristão volta-se para Deus apenas para os afazeres deste mundo, será como os Apóstolos querendo fazer no Tabor três tendas. Escutemos, de fato, o Filho amado, colocando nele a toda nossa fé.  Deixemos a graça traçar seu caminho e transformar nossa conduta em vista do tempo e da eternidade. Cumpre passar todos os imantes escutando o que o Filho bem amado tem a nos dizer. *Professor no Seminário de Mar

sábado, 13 de fevereiro de 2021

 

FAZEI PENITÊNCIA

Côn. José Geraldo Vidigal de Carvalho

Neste primeiro domingo da quaresma contemplamos Jesus no deserto, onde passou quarenta dias, sendo aí tentado por satanás. Depois Jesus foi para a Galileia e advertiu: “Completou-se o tempo e está próximo o reino de Deus. Fazei penitência e crede na Boa Nova” (Mc 1, 12-15). Admirável a concisão de São Marcos a qual não embaça a intensidade dos acontecimentos e de suas preciosas mensagens. Inicialmente, o mistério do deserto para onde o Espírito impeliu Jesus, lugar de um encontro privilegiado com a divindade como havia sido descrito no profeta Oséias. Lá Deus fala ao coração (Os 2,14). João Batista foi uma voz que clamou no deserto, concitando a uma digna preparação do caminho do Senhor. Jesus ficará no deserto 40 dias, ou seja o mesmo tempo que gastou o profeta Elias para chegar através do deserto até à montanha de Deus, o Horeb (1R 19,8) Eis porque. Conforme São Marcos   Jesus foi levado ao deserto pelo Espirito não somente para aí ser tentado pelo diabo, mas também para celebrar a aliança com o Pai e daí partir para cumprir sua missão. Segundo este evangelista Jesus estava com os animais selvagens. Note-se que esta expressão “estar com” em São Marcos tem especial importância. Mais tarde ele a empregará para falar da relação entre Jesus e seus discípulos.  Ele registrará no capítulo terceiro que Jesus instituiu os doze inicialmente para estar com Ele e, depois, para os enviar a pregar. “Estar com” em São Marcos significa uma proximidade, a partilha de uma íntima amizade. Se há esta insistência sobre a vizinhança entre Jesus e os animais selvagens, é para evocar a realização das promessas messiânicas do profeta Isaías. Estas promessas foram ouvidas na liturgia da noite de Natal: “Despontará um rebento do tronco de Jessé e um renovo brotará de sua raiz Sobre ele repousará o Espírito do Senhor [,,,] Habitarão juntos o lobo e  cordeiro [...] Não causarão mal algum  em todo meu santo monte . É que com o Messias se instaura uma nova harmonia entre o homem e a criação, encontra-se novamente a paz do paraíso perdido. E se dá a aliança prometida a Noé: “Eis que eu estabeleci minha aliança convosco, com vossos descendentes e com todos o os seres vivos que estão em vosso derredor”. Realizada a primeira aliança, o Messias pode então anunciar aos homens: “Completou-se o tempo e está próximo o reino de Deus. Fazei penitência e crede na Boa Nova”. Deste modo, em poucas palavras tudo nos é comunicado sobre a vida e missão de Jesus que afronta vitoriosamente o mal e reconcilia a criação e anuncia a Boa Nova. São Pedro com razão salienta a presença do Espírito Santo no mistério da Páscoa de Jesus: “Cristo ele mesmo foi uma vez morte pelos pecados, justo pelos injustos, afim de nos levar até Deus. Entregue à morte segundo a carne, foi vivificado conforme o Espírito”. Durante toda sua vida é este Espírito que age em sua obra.  É tudo isto que nos está a lembrar este trecho do Evangelho de hoje.  Marcados pelo selo do Espírito Santo entramos no combate da fé, e pelo poder do Espírito Santo entramos na paz da nova criação, do Paraíso renovado.  Para isto a penitência preceituada por Jesus é indispensável, lembrados, contudo, que é Deus, nosso Pai que produz em nós o querer e o fazer, segundo seu desejo benfazejo como bem lembrou São Paulo aos filipenses (Fil 2,13).  Jesus quarenta dias no deserto fazia penitência e, assim partilhava a doce harmonia da criação reconciliada do reino de Deus que se aproximava da humanidade. A situação de Jesus era emblemática Jesus no deserto tentado por satanás, mas em harmonia com as criaturas e, após, num caminho pessoal de anunciar fielmente a Boa Nova.  Boa Nova   de Deus cujo segredo manifestará plenamente. Pôr isto Ele pôde se dirigir a nós e aos homens de todos os tempos mandando fazer sacrifício e a crer na Boa Nova, ou seja, anunciá-la por toda parte.  O seu discípulo deveria então estar em estado de conversa contínua demonstrando initerruptamente sua profunda fé no seu Evangelho. Isto na novidade de cada instante da vida de cada um, melhorando dia a dia nossa maneira de ser, dando valor a tudo que está em nosso derredor. Uma nova maneira de ser por que o reino de Deus está a nosso alcance. Daí a importância desta quaresma que se inicia, prestando atenção uns aos outros para estimular na caridade todas as boas obras. Quarema é tempo de tempo de penitência, da caridade, de abertura total à verdade de Jesus, o que significa, de fato, viver a Boa Nova. Portanto, realmente, poucas palavras no trecho de São Marcos, objeto de nossas reflexões, mas incitamento a muitas ações; pouco discurso, mas muita ação, levando a realizações concretas, imediatas.  Jesus no deserto se mostrou fiel ao Pai e na harmonia da criação o pensamento organizador de Deus rebrilhou fulgurantemente.  Sigamos seu conselho, façamos penitência e creiamos na Boa Nova. * Professor no Seminário de Mariana durante 40 anos.                                                                                                                      

 

sábado, 6 de fevereiro de 2021

 

A LEPRA CONTAGIOSA DO PECADO

Côn. José Geraldo Vidigal de Carvalho*

   Em busca da recuperação de sua saúde um leproso veio até Jesus e, de joelhos, clamava: “Se queres podes me curar” (Mc 1,40-45). Ele desejava recuperar inteiramente sua saúde, dando um sentido a sua existência, ocupando um lugar útil no meio em que vivia. Para os judeus a lepra era a mais impura das moléstias e o leproso um banido da sociedade. Tamanha, contudo era a fé daquele doente que, corajosamente, embora se reconhecendo um pecador, um impuro, foi pedir ao taumaturgo ali presente que o curasse.  Foi atendido e a exigência era que se apresentasse no templo aos sacerdotes para que tomassem conhecimento de sua cura. Em nossos dias, isto   vem lembrar uma lepra muito mais terrível que é o pecado no coração do ser humano, o qual Jesus no sacramento da confissão está sempre pronto a perdoar, purificando a quem tem fé e restabelecendo-o na plena  comunhão de sua Igreja; Diante da lepra do pecado para retornar até Jesus cumpre reconhecer o mal ali presente para que com a mesma confiança e humildade do leproso se depare a cura espiritual. Para o cristão é um dever espalhar não o contágio da lepra do pecado, mas sim o contágio da santidade pela qual se atrai a Jesus pecadores arrependidos, afastando-os das moléstias espirituais. Admiremos e imitemos sempre a confiança, a espontaneidade, a veemência do desejo do leproso que Jesus curou. Este quer sempre e a toda hora a saúde espiritual de seu seguidor e nunca ninguém deve se julgar incurável, pois isto significaria a perda total de toda a esperança. Em Jesus devemos contemplar a todo instante a misericórdia, o desejo de fazer seu discípulo viver a sua vida em função da força de seu imenso amor. Para muitos a própria imagem é que desola, mas Jesus quer que esta seja afastada para que se tenha diante de si somente a sua imagem consoladora de salvador, médico que cura todos os males. É preciso contudo ter continuamente o coração voltado para Deus. É necessário saber escutar este Deus para se contagiar pelo bem. Muitas vezes o fiel fala com seu Senhor com muitas palavras, mas não se preocupa em escutá-lo, desejando ouvir o que Ele tem a lhe transmitir. No combate à lepra do coração é de sumo valor o silêncio interior que leva a evitar as distrações que conduzem à desconcentração do divino interlocutor, impedindo um precioso espaço para acolher seu afeto, sua inspiração, seus oportunos recados. Todo cuidado é pouco para que o cristão não se torne uma pessoa   insensível, pessimista, desesperada, o que se torna caminho para a entrada da lepra espiritual, É necessário evitar todo o deterioramento interior. A prece é a ocasião propícia para se olhe serenamente a vida com todas as circunstâncias que a envolvem, não se deixando dominar pela lepra do espírito. Isto porque simplesmente reconhecer um mal dominante é insuficiente, pois é preciso aquela fé que levou o leproso a ir até Jesus e a Lhe declarar: ´Se queres, podes me curar”. Com efeito, ele reconheceu sua deplorável situação, mas também sua incapacidade pessoal de operar por si mesmo a cura desejada. Ele se dirigiu a alguém mais poderoso. A fé ocasionou aquela relação de confiança que permitiu a atuação de quem, de fato, podia purificá-lo. Quando Jesus diz ao leproso “Quero, sê limpo”, Ele estava afirmando: “Eu quero que sejas tudo o que eu posso fazer por ti”. Era, exatamente, o que pensava aquele suplicante que acreditava, de fato, no poder miraculoso daquele ao qual fizera súplica tão ardente. Um fato simples, mas ao mesmo tempo maravilhoso, foi    realizado por aquele que viera a esta terra para arrancar a história humana da lepra do pecado. Acontecimento no   início da manifestação de Jesus, quando as multidões O seguiam com um entusiasmo natural e com aquela excitação trepidante da qual se servem os mistificadores ou reformadores inescrupulosos. Sem dúvida o leproso focalizado por São Marcos, apesar da maneira sabia com que falou a Jesus, deve ter ficado antes ansioso, temeroso, mas perseverou no seu propósito. Ele queria também perceber a ternura humana do famoso Rabi. Tal situação continuaria através dos tempos, mas inúmeros seriam aqueles qque possuídos pela fé em Jesus dele se aproximariam e arrancariam prodígios de sua bondade e de seu poder. Um leproso com todos os terríveis sinais da malfadada doença se aproximou de   Jesus, o santo de Israel, no qual repousava o Espírito de santidade, Aquele que tinha o poder de curar os corpos e purificar as almas, Cordeiro sem mancha e só poderia mesmo resultar o grandioso milagre da cura imediata daquele pobre homem. Cena extraordinária, ou seja, o impuro em face do Santo, o miserável ante o poderoso Senhor. A lepra era o mal, mas em Jesus estava o remédio. Era o pecador ante o Salvador. * Professor no Seminário de Mariana durante 40 anos.

 

segunda-feira, 1 de fevereiro de 2021

 

COM JESUS PARA SALVAR OS OUTROS

Côn. José Geraldo Vidigal de Carvalho*

Admirável roteiro no dia a dia do Filho de Deus, um cotidiano de Jesus, que São Marcos apresenta (Mc 1.29-39. Ele foi à sinagoga, depois se dirigiu a uma casa onde estava enferma a sogra de Simão. Jesus dela se aproxima e toma-lhe a mão. Tocante gentileza do Mestre divino que a queria cheia de saúde, como sempre agindo para servir os outros. À tarde contemplamos o poderoso taumaturgo se colocando ao serviço de todos que traziam seus enfermos com as mais diversas doenças, fossem elas físicas, psíquicas ou espirituais. Jesus falava e agia, expulsando demônios e os achaques que atormentavam os que O procuravam. Pela madrugada, Ele saiu para rezar, pois lhe reservava também momentos para as tertúlias com o Pai, momentos de reflexão, de contemplação. Procurado pelos que O buscavam Jesus aumentou o espaço de suas atividades e, partindo de Cafarnaum, foi percorrer a Galileia.  Exemplo magnifico de atividades dinâmicas e de fuga a todo particularismo, pregando o Evangelho por toda parte. Cumpre sempre imitar o seu dinamismo numa extraordinária ação evangelizadora. Sempre unido ao Pai e solidário com os que viera salvar, como lemos na Carta aos Hebreus, em tudo semelhante aos irmãos e, ao mesmo tempo fiel no que diz respeito a Deus (Hb 2,17) Na medida em que cresce a união do cristão com Ele, vida e o coração de cada um remodelam de acordo com esta dupla comunhão que era para Jesus a expressão espontânea de seu ser de mediador, ou seja, a comunhão com o Pai e a comunhão com todos os irmãos e irmãs. Cada dia Jesus nos mostra o Pai e nos manifesta o seu Nome e desse modo, entramos em uma prece verdadeira, mãos abertas e a mente liberta de entraves terrenos. O cristão se sente então envolvido na paz de Deus, percebendo a necessidade de levar por toda parte a salvação.  Percebe-se então, de fato, a necessidade da oração que confirma a chama dos carismas outorgados pelo sacramento da confirmação, fazendo cada um crescer como autênticos filhos da Igreja. É preciso, contudo, estar sempre atentos, porque ligeiro, discreto é o apelo divino que identifica o batizado a Cristo, dinâmico, orante e missionário. Ele está cotidianamente nos chamando a irmos a outros lugares, não em caminhos de sonhos mirabolantes, de ilusões, mas nas sendas que levam as almas a serem salvas. Trata-se de uma missão universal para qual se é conduzido por um profundo amor a Deus e ao próximo. Não basta, porém, admirar Jesus, mas, realmente, é preciso reconhecer nele um homem de ação que possui uma força transformadora, que jamais objetivava a própria promoção, ou que estivesse a serviço de alguma ideologia ou com uma visão preconceituosa do mundo. Ele não era um ativista qualquer que desejava mostrar sua importância. Os que nele confiavam não era por causa de um falso messianismo, mas por seu valor pessoal de Filho de Deus, Salvador dos homens. Sua atividade provinha, paradoxalmente dos instantes que Ele reservava para sua prece. Como para o próprio o Cristo, o evangelizador por excelência, a oração tinha um papel estratégico. É fortalecido pela sua união com Deus, vivificada em momentos especiais, que o batizado recebe a força para com Jesus sair à procura de quem dele está longe. Cumpre como Cristo dividir bem o tempo entre a ação e a contemplação. Estar com Deus e estar com os homens. Muitos evangelizadores se esquecem de imitar Jesus e depreciam o tempo reservado à oração. É belo ser apóstolo, mas não se pode esquecer o valor do tempo reservado para uma união especial com Deus. É a exemplo de Jesus equilibrar trabalho ativo e instante sagrado contemplativo. a hora da devoção. São Francisco de Assis ensinava que “é preciso trabalhar fielmente  sem extinguir  o espírito da santa prece e da devoção”. Como fazia Jesus, e vimos isto claramente também no Evangelho de hoje, há necessidade de que cada um se organize bem, dividindo as tarefas diárias. Era por isto que Jesus mostrou se entregar às mais diversas tarefas sem descurar nenhuma delas, dando grande realce às práticas devocionais. Lição importante para aqueles que trabalham frequentemente para Deus, mas que nem sempre pedem a Ele suas luzes e forças sobrenaturais, procurando saber exatamente o que Ele quer que se faça. Além do mais, a ida de Jesus para outros lugares com seus discípulos é algo a ser mentalizado. Jesus em Cafarnaum e seus derredores tinha grande notoriedade, mas isto não interessava ao seu projeto de a muitos outros levar a Boa Nova, Jesus era o servidor da Palavra divina, servidor universal das almas e não procurava nunca sua glória, seu proveito pessoal No mais profundo de si mesmo ser sobretudo um servidor das almas a serem remidas deve ser o ideal de seu discípulo. Saber não ser em si mesmo senão um servidor, eis todo o s segredo do discipulado. Para isto se faz necessário estar na dependência de Deus e ao serviço das almas, esquecendo todas as vantagens pessoais. Em tudo, portanto, imitar Jesus * Professor no Seminário de Mariana durante 40 anos.