ALEGRAR-SE COM A MISERICÓRDIA
DIVINA
Côn. José Geraldo Vidigal de Carvalho
Sobretudo neste Ano da
Misericórdia as três parábolas que patenteiam a clemência divina merecem
atenção especial (Luc 15, 1-31. Elas manifestam, através de três imagens, a
grande dileção de Deus para com os homens. Este Deus se interessa por suas
criaturas, as aguarda sem cessar. Na sua passagem por esta terra Jesus acolhia
os pecadores e causava espanto aos fariseus hipócritas. A eles com sabedoria
celestial Cristo cabalmente responde. Alegria do pastor que encontra a ovelha
perdida. Gaudio da mulher que depara a dracma que desaparecera, a qual
cuidadosamente procurava por toda a casa. Júbilo do pai com o retorno do filho
desavisado que abandonara o lar, mas que retorna arrependido. Tudo isto é o
mesmo que acontece com Deus e as comparações são claras e sugestivas. Sobretudo
a parábola do Filho Pródigo sempre causou impressão profunda naqueles que
refletem na sublimidade do perdão do pai que organiza um festim para comemorar
o retorno daquele que se transviara e caíra em erros lamentáveis. O pecado é
sempre uma injúria ao amor divino, mas o arrependimento tudo repara e merece
ser festejado pela clemência paterna. Deus que não desampara os que lhe são
fiéis e os cumula de benefícios maravilhosos, sabe, porém, perdoar e acolher o
pecador arrependido. Muitos cristãos são como o filho mais velho, pois não
apreendem a extensão do indulto divino. O pai é recriminado por anistiar aquele
que havia dilapidado sua fortuna com as prostitutas numa vida desregrada. Tenta
ele explicar, porém, que ele não se tratava de um estrangeiro, de um corrupto,
mas de alguém que errou, tendo reconhecido sua iniquidade. O pai não se mostra
então um juiz inexorável, um senhor desalmado. Ao dizer ao filho intransigente
“tudo que é meu é teu” fez vibrar as cordas de sua bondade e cabia, isto sim,
àquele que nunca o deixara saber usufruir dos bens da casa paterna. Se tal não
estava ocorrendo, a culpa não era do pai, mas daquele que não se sentia filho e
que naquele instante renegava seu irmão, que regressara confiante na absolvição
daqueles que ele lamentavelmente largara, Lição magnífica de solidariedade é o
que flui das palavras do pai que percebera a dependência vital do filho
arrependido. Naquele momento o filho mais velho era quem mais necessiva da
misericórdia do pai, pois se considerava um mero servo, um criado como outro
qualquer e não como filho. O filho pródigo, porém, proclamava sua ligação
filial, porque disse entristecido: “Meu pai, pequei contra o céu e contra ti;
já não sou digno de ser chamado teu filho”. Muitos são os que julgam o próximo
e se consideram melhores do que os outros, exatamente por não terem uma noção
exata da misericórdia do Pai do Céu, do qual todos somos filhos e, em
consequência, somos irmãos. Vale a pena recordar as palavras de São Paulo:
“Cristo veio ao mundo para salvar os pecadores, o primeiro dos quais sou eu”.
Isto, é evidente, não em ordem de tempo, mas, como explica Santo Agostinho,
“pelo número e gravidade dos pecados” (1 Tm 1,15). Quem se julga isento de
culpa é incapaz de olhar os outros com complacência. Quem serve a Deus
reconhece o mar imenso de favores celestiais que recebe e não se julga
merecedor de mais benefícios divinos. Obedecer a Deus é já uma grande graça,
não é um fardo pesado. Nada de comparações com os outros que, possivelmente,
têm muito mais merecimento diante de Deus. Ao olhar do amor misericordioso de
Deus todos somos iguais, porque pecadores necessitados do perdão e da
misericórdia divinas. Somente Deus é perfeito e santo. Assim sendo, nesta
parábola, o filho mais idoso estava mais perdido do que o irmão mais novo
arrependido. Agia como um justo, mas seu coração estava endurecido com relação
aos outros. Era um insensível, tomado por um sentimento de inveja e não
reconhecendo a dignidade de seu irmão. Criticou asperamente o direito que ele
tinha de ser perdoado e amado pelo pai, Quem erra deve imitar o filho pródigo e
ter sempre um arrependimento sincero das faltas cometidas. Jamais devemos ser
como o filho mais velho que sabia simplesmente obedecer ao pai, mas não o
amava, desconhecendo tantas maravilhas que estavam a seu derredor. Deus quer
sempre a observância dos mandamentos, mas isto por amor filial a Ele e não por
mero temor da perda da felicidade eterna. * Professor no Seminário de Mariana durante
40 anos.
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