segunda-feira, 28 de março de 2016

A MISERICÓRDIA DIVINA

A MISERICÓRDIA DIVINA
Côn. José Geraldo Vidigal de Carvalho*

O Papa João Paulo II, em trinta de abril do ano 2000, proclamou  o II Domingo da Páscoa como "Domingo da Divina Misericórdia. Uma verdade que nem sempre é bem analisada é sobre a misericórdia divina. Surge uma questão que é mal posta: mereço ou não a clemência de Deus? Nunca se merece a misericórdia do Ser Supremo, porque ela é dada por acréscimo por um ato generoso da parte daquele que é o Senhor de tudo. Trata-se de um fato divino que ultrapassa a inteligência humana. Com efeito, o ponto culminante da comiseração do Pai foi a Paixão e Morte do Filho Unigênito, objeto de todas as suas complacências, e isto para a redenção da humanidade. São João admirado proclamou: “Com efeito, de tal modo Deus amou o mundo, que lhe deu seu Filho único, para que todo o que nele crer não pereça, mas tenha a vida eterna” (Jo 3,16). Portanto, quem crê em Jesus Cristo já está envolto na misericórdia do Pai, a não ser que, peremptoriamente, a recuse. Se o Todo-Poderoso agisse no plano da estrita e pura justiça a humanidade estaria perdida. Cumpre, porém, àquele que tem fé se imergir no oceano da bondade do Deus misericordioso, não colocando empecilho à ação de suas graças superabundantes. Daí uma confiança sem limites nele. O salmista assim se expressou: “Clemente e misericordioso é o Senhor, tardo para a ira e sumamente benévolo. Bom é o Senhor para todos, e a sua misericórdia estende-se sobre todas as criaturas” (Sl 144, 8-9). Nas parábolas contadas por Jesus deparamos quão grande é, realmente, a clemência de Deus.  Ele se manifesta como o Pastor que muito ama suas ovelhas e se interessa pelas que se extraviam (Lc 15,4-7). Todo filho pródigo que volta para a casa paterna é recebido com festas (Lc 15,2-32).  Se o pecador é uma dracma perdida Ele sai a sua procura (Lc 15, 8-10). Trata-se de um cuidado providente e perseverante que não abandona quem se extravia de seu destino eterno e isto com uma solicitude sem igual. Na sua passagem por este mundo Cristo demonstrou inúmeras vezes esta comiseração. Ele perdoou os  muitos pecados de Maria Madalena, a presunção de Pedro, anistiou a mulher adúltera, canonizou Dimas, o bom ladrão. Jesus opõe à miséria radical do homem a ternura radical de seu coração. Olha-o na sua bondosa humanidade. Ele abrasou em fé e amor a Samaritana, junto do poço. Os fariseus espantavam-se e  murmuravam por ver Cristo  junto aos  publicanos, pecadores, gente desencaminhada. É que Ele viera ao mundo enviado pela misericórdia do Pai, Deus que perdoa, Deus que recebe no seu seio,  todos os que choram, sofrem e padecem por seus desvios. É que Deus é a sede eminente e superabundante  de toda bondade.  Que doçura, que consolo, que arrebatamento de amor deve produzir nas almas o pensamento da misericórdia de Deus! Uma lágrima sincera de arrependimento e o indulto total!  Muitos pecados, mais perdões possui Cristo no seu coração, desde que haja firme propósito de emenda. A misericórdia só não pode descer sobre a soberba, a obstinação, a empáfia, a rebeldia. É que a confiança  em Deus não pode  ser brincadeira nem cálculo. Jesus sempre dizia a quem ele perdoava: “Vai e não peques mais”. À infinita misericórdia de Deus se deve corresponder com generosidade, com perseverança no bem, com sinceridade absoluta. Quando, de fato,  a alma sofre por se ter desviado de Deus, e o seu sofrimento se exprime em confissões humildes e dolorosas, não se pode duvidar do perdão,  pois isto seria injurioso para Deus, mas Este exige uma contrição leal.   Na História da Igreja entre tantos remidos pela clemência divina  lembremo-nos, por exemplo, de um Santo Agostinho, de uma Santa Margarida de Cortona, cuja conversão foi radical. Jesus fez de sua Mãe, Maria Santíssima o Refúgio dos pecadores, os quais com sua intercessão materna se levantam do abismo, saem do sepulcro dos vícios, volvem seus passos para a casa paterna com o coração contrito e humilhado como o de Davi. Ela derrama o bálsamo de paz e de perdão de seu divino Filho sobre tantos que se emendam de seus crimes. Todas estas reflexões levam ao verdadeiro motivo da confiança na misericórdia divina, porque Deus pode salvar dado que é todo poderoso; Deus quer salvar uma vez que é Pai infinitamente bom; Deus salva porque deixa-se vencer pelo arrependimento confiante e está sempre oferecendo oportunidade a todos os pecadores para que se convertam e se salvem. Com São Tomé repitamos sempre confiadamente: “Meu Senhor e meu Deus”! Continuemos a viver ainda mais intensamente este Ano da Misericórdia instituído pelo Papa Francisco.* Professor no Seminário de Mariana durante 40 anos.

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