quinta-feira, 28 de março de 2013

A ESPERANÇA EM JESUS

A ESPERANÇA EM JESUS
Côn. José Geraldo Vidigal de Carvalho*
         Na alheta do bem-aventurado Papa João Paulo II se celebra no segundo domingo da Páscoa a festa da Misericórdia divina. Este pontífice havia conhecido os horrores da segunda guerra mundial e os terrores espalhados por Hitler, sobretudo na sua pátria a Polônia. Esta foi o primeiro país invadido pelas tropas nazistas. Depois vieram as horripilas abominações do regime comunista. Jovem, e mais tarde sacerdote e bispo, aquele que se tornaria um dos papas mais queridos da História se opôs corajosamente aos ditadores que humilhavam e perseguiam a torto e a direito. Como Chefe da cristandade João Paulo II preferiu propor a misericórdia que se torna perdão aos sentimentos de ira e vingança que nazistas e comunistas provocaram. Como os seres humanos são lentos em se corrigir de seus maus sentimentos suscitados pelos conflitos que abalaram a História, o Papa quis que o prolongamento da festa da Páscoa  fosse impregnado da misericórdia divina, ocupando um lugar importante na vida dos seguidores de Cristo ressuscitado, o Bom Pastor. Atendeu inclusive ao desejo do próprio Cristo através das revelações à Irmã Faustyna.  Jesus havia  se apresentado no meio de seus discípulos com saudações de paz e instituindo exatamente o Sacramento do Perdão. Os pecados por graves que fossem submetidos ao tribunal da Penitência seriam anistiados pelos apóstolos e seus sucessores. Deus é misericordioso e está sempre pronto a perdoar, mas uma das fraquezas humanas é a falta de fé. Quantos como Tomé recusam crê sem ver e sem tocar as chagas do Redentor! É um mal que reina sobretudo no mundo hedonista e materialista de hoje. Como outrora a Tomé Jesus está a repetir: “Bem-aventurados os que não viram e creram”. A fé em Cristo ressuscitado é fundamental. É a base sobre a qual repousa o engajamento cristão desde o início do cristianismo. São João na sua primeira carta escreveu: “Todo o que crê que Jesus é o Cristo, este verdadeiramente nasceu de Deus” (1 Jo 5,1-6). Depois ele afirmaria ser a fé a vitória sobre o mundo. Segundo São João o mundo é o mal e tudo que dele decorre. A fé oferece as forças necessárias para lutar contra as desgraças  que existem nesta terra. Desta maneira, o domingo da Misericórdia tende a levar o cristão à transformação de seu coração para poder também operar a metamorfose do mundo. Abertura ao perdão das ofensas para poder vencer as forças do mal que estão sempre em ação. A Ressurreição foi a vitória do amor de Deus sobre o pecado e cabe a seus seguidores prolongar este triunfo pelos séculos afora. Cumpre, porém, não se esquecer que o perdão divino não opera como se nada tivesse acontecido. O perdão não é uma negação com relação ao erro praticado. É um avanço por ser um triunfo sobre o desvio cometido que passa a ser inteiramente abominado, ou seja, se fosse possível voltar atrás tal pecado não teria sido cometido. Eis porque Cristo ressuscitado mostrou as cicatrizes que marcaram suas chagas dolorosas e dizia sempre aos que ele perdoava: “Não tornes mais a pecar”. Deus, porém, sempre repetindo ao pecador: “Não tenhas medo”, palavras que percorrem toda a Bíblia. O salmista aconselha então: “Dai graças ao Senhor porque eterno é o seu amor” (Sl 117,1). A manifestação máxima desta dileção foi o acontecimento salvífico através da morte e ressurreição de Cristo. Este prodígio da misericórdia divina mudou o destino da humanidade. A solidariedade do Redentor que assumiu a natureza humana foi surpreendente. Aí está a razão pela qual crer neste seu amor é acreditar na misericórdia infinita do Ser Supremo. Disto resulta a paz interior que depois se irradia por toda a sociedade, mesmo porque o verdadeiro cristão inebriado nas manifestações do amor de Deus é levado a imitar a bondade do seu Senhor, sendo também misericordioso com todas as pessoas à sua volta e se interessando pela paz no mundo inteiro. Do mesmo modo como agiu com Tomé, Jesus mostra a cada um suas chagas gloriosas e seu coração, fonte inesgotável de luz e de vida, de amor e de perdão. Daí jorraram a redenção, a salvação, a santificação. Santa Faustiyna viu fluir do coração de Cristo dois raios de luz que iluminam o mundo. Estes raios representam o sangue e a água. O sangue lembrando o sacrifício do Gólgota e o mistério da  Eucaristia. A água fazendo pensar no batismo e no dom do Espírito Santo (Jo 3,5;4,14), Dentro do Coração divino do Salvador se encontram a felicidade autêntica, durável, o segredo da serenidade absoluta. Como concitou o bem-aventurado Papa João Paulo II, cumpre repetir sempre “Jesus, eu confio em vós”. Isto deve significar um abandono total nas mãos do Senhor, nosso único Redentor. Que cada um se deixe envolver nos raios da esperança mais fulgente, porque em Jesus se pode confiar. Ele é paz, amor, beatitude. * Professor no Seminário de Mariana durante 40 anos.



segunda-feira, 25 de março de 2013

NOVA INVESTIDA A FAVOR DE UM CRIME INOMINAVEL

NOVA INVESTIDA A FAVOR DE UM CRIME INOMINÁVEL
Côn. José Geraldo Vidigal de Carvalho*
Nova investida a favor do aborto deve deixar de alerta os que amam a vida e execram a violência, sobretudo contra um ser que não pode se defender. O slogan da hora é “respeitar as opções do outro”. Entretanto, para quem crê em Deus não há opção possível entre observar ou não um dos dez mandamentos da Lei Divina.
Um dos dez  mandamentos preceitua: “Não matarás” (Êxodo 20,13). Desde o instante da concepção ou fecundação existe uma vida  que não é do pai e nem da mãe. Trata-se de um novo ser humano que se desenvolve por si mesmo e que deve ter seus direitos respeitados e  é protegido por este preceito de Deus, autor da vida. Assim, a lei divina exclui, evidentemente,  todo direito a matar diretamente um ser racional inocente, como é a criança no seio materno. A posição da Igreja outra não pode ser senão um serviço incondicional à vida. Salvo no caso extremo da legítima defesa, o homem não pode atentar contra a vida humana. Idéias errôneas que se disseminam pelos meios de comunicação social vão, infelizmente, sendo assimiladas. Assim a tão badalada emancipação da mulher que levaria ao direito de abortar livremente, em nome do domínio sobre o próprio corpo, é uma posição indefensável, moralmente inaceitável. No caso de uma mulher vítima de estupro, ela não teve culpa naquele ato animalesco. No entanto, se ela vai assassinar o filho inocente, é lógico que se torna culpada de um crime não menos horrípilo. O trauma do estupro  não será afastado por outro trauma, este, sim, a trazer um remorso por toda a vida. Na pior das hipóteses, se a mãe, vítima da violência,  não quer ficar com o filho de suas entranhas, que ela providencie uma adoção legítima para aquela criaturinha indefesa. No caso específico  no qual a vida da mãe corre risco, vale o princípio de que nem sequer por razões gravíssimas é lícito fazer o mal, ou seja matar simplesmente a criança, para que daí provenha o bem, ou seja a saúde da mãe. Esta atitude maquiavélica é abominável. Aliás, se a ciência se blasona de seus progressos, ela tem todos os meios para evitar que a saúde e a vida da mãe fiquem prejudicadas. Ante os recursos atuais da medicina, mais do que nunca, não se justifica o chamado aborto terapêutico. O médico que seja competente e não um assassino. É óbvio também que, se a mãe necessita de um remédio ou de uma cirurgia  que acabe provocando a morte do feto, se dá o caso típico do voluntário indireto, ou seja, não se provocou diretamente o aborto. É o mesmo caso de alguém que é atacado por um bandido e, para defender a própria vida, acaba por matar o agressor, sua intenção não era tirar a vida do outro, mas sim defender a sua. Os abortos clandestinos que colocam em risco a vida da mulher, não justificam a legalização do aborto, porque simplesmente seria legalizar o crime de assassinato. O que é necessário é que as leis de Deus sejam observadas. Há o sexto mandamento que é não pecar contra a castidade e o nono que é não desejar a mulher do próximo. A sexualidade tem que ser vivida dentro do projeto de Deus. A dissolução dos costumes, incrementada por filmes sempre elaborados em cima do desprezo dos Dez Mandamentos, só favorece situações melindrosas que jogam sobretudo os jovens em instantes de grande calamidade interior. A preparação cuidadosa  para o matrimônio é uma condição elementar para se impedir o aborto. Como é edificante orientar jovens que, desde o instante de um namoro sério, entram em acordo para fugir das ocasiões de pecado. A formação moral obvia todo tipo de desvio sexual. Uma estrutura social humana, justa, onde haja melhor distribuição de renda permitirá aos pais encararem a geração dos filhos sem as agruras da hora presente. Urge uma política familiar decidida, tanto no campo da moradia como nos setores da saúde, do trabalho e da educação.  Medidas profiláticas devem ser tomadas e não a legalização da violência. Se seres indefesos podem ser legalmente assassinados numa sociedade onde já impera a mais horrípila violência, então o caos será maior ainda.  Transformar o aborto   em um direito dos cidadãos, inclusive apoiado pela profissão médica e por verbas públicas, equivale a uma atitude que modifica todo o relacionamento humano, institucionalizando o crime. Hoje, mais do que nunca vale o que está na Bíblia Sagrada: “É preciso obedecer antes a Deus do que aos homens” (Atos 5, 29).
* Professor durante 40 anos no Seminário de Mariana


sábado, 23 de março de 2013

Resuscitados com Cristo

               RESSUSCITADOS COM CRISTO
                           Côn. José Geraldo Vidigal de Carvalho*
O júbilo percorre a cristandade em festa: Cristo ressuscitou dos mortos! Todos os batizados se imergem na alegria desta luminosa solenidade de Páscoa. Este é o dia da ação de graças sem hesitações porque o Senhor, vencedor da morte, abriu para todos as portas do paraíso. Na sua generosidade infinita, a quantos que com Ele ressuscitaram no batismo e procuram as coisas do alto Ele deseja envolver nos seus dons, sobretudo nas delícias de uma paz sublime e inefável. Ele revigora os bons propósitos e por mais pobre que seja alguém espiritualmente Jesus o deseja cumular de bens maravilhosos. Todos, pecadores ou santos, são convidados a partilharem as grandezas do maior dia do ano. Cristo ressuscitou e triunfou definitivamente de todo exército infernal e com Ele reina a vida em plenitude. Todos os que O amam com sinceridade contemplam uma terra nova, novos céus se abrem diante deles. Hoje se canta o aleluia da vitória, louvores a Deus que fez maravilhas a favor de seu povo. A pedra rejeitada se tornou a pedra angular e Cristo verdadeiramente é o Chefe triunfante de uma raça eleita. Aquele que estava morto, gloriosamente vive. Ao morrer Ele destruiu a morte e, ressuscitando, a todos oferece a verdadeira vida. Maria Madalena viu o sepulcro vazio. Pedro e João confirmam o fato maravilhoso e Ele apareceria aos demais Apóstolos e até Tomé se curvaria diante dele e exclamaria: “Meu Senhor e meu Deus”!   Através dos tempos multidões repetiriam este ato de fé e a dois mil e treze anos a repetirem: “Cristo vive, Cristo reina, Cristo impera”!   Homens e mulheres renovados por Cristo ressuscitado se fazem deste modo testemunhas de sua ressurreição e Ele ontem, amanhã e sempre a prometer e a garantir a existência eterna dos que O amam, praticando tudo o que Ele ensinou.  Jesus ressuscitado dos mortos é o coração mesmo da Igreja por Ele iluminada século após século. Jesus ultrapassou as fronteiras de Israel e sua glória percorreu o mundo todo.  Aquela mesma mensagem que São Pedro corajosamente dirigiu aos judeus resumiu admiravelmente a realidade da ressurreição de Jesus. Este, Deus O havia consagrado; estava com Ele; fez com que Ele saísse do túmulo, glorioso e impassível; O escolheu como juiz dos vivos e dos mortos e quem afirma que Cristo é Deus e a Ele adere está definitivamente salvo. A fé dos cristãos não teria outra prova senão a fé dos apóstolos que O viram glorioso e transmitiram o que viram.  A ressurreição de Cristo operou uma mudança radical na história humana e a mais durável. É certo que a Ressurreição do Redentor não resolve por si só nenhum problema da humanidade, mas oferece todas as perspectivas por abrir para todos os homens uma dimensão nova e essencial.  Apesar das misérias que reinam por toda parte, milhares a morrerem de fome e vítimas da violência, milhares de jovens e adultos prisioneiros das drogas e das paixões mais aviltantes, não obstante as injustiças sociais, a ressurreição de Cristo proclama exatamente que nada disto terá a palavra final porque, acima do mundo materialista, hedonista, fechado sobre si mesmo e que provoca tantas lágrimas e desesperos, está o Amor de Deus que Cristo veio oferecer aos homens e mulheres de boa vontade. Todos são chamados a descobrir a sua verdadeira identidade e lutar por um mundo melhor. Com Cristo será possível sempre vencer as enfermidades, os sofrimentos e a morte.  O mundo novo não se concretizou ainda, mas está potencialmente começado com Cristo ressuscitado. Cada cristão que segue os seus caminhos através do dom de si mesmo ajuda a ultrapassar o egoísmo e os infortúnios. É que a Páscoa do Senhor não é uma teoria abstrata, mas uma vida que transfigura a existência de cada um em ações a iluminar e a beatificar milhares de sofredores.  Com efeito, a crença firme na imortalidade beatífica, fruto da vitória de Jesus, é que pode transfigurar esta terra. É que existem duas vidas: a presente e a futura. Uma é mortal a outra durará por toda a eternidade. Uma pertence à morte e a outra à ressurreição. Eis porque, apesar de se viver num vale de lágrimas, a Ressurreição de Cristo faz com que cada um se reconheça desde já  concidadão dos anjos. Páscoa vem lembrar então o que proclamou São Paulo: “Não temos aqui cidade permanente, mas vamos em busca da futura” (Hb 13,14).   Aos romanos ele afirmou: “Tenho para mim que os sofrimentos da presente vida não têm proporção alguma com a glória vindoura que nos deve ser manifestada” (Rm 8,18) Páscoa, deste modo, é um convite a imitar multidão dos santos que superaram as misérias terrenas, ajudaram o próximo em suas necessidades, para com eles gozar um dia da Páscoa perene. Cumpre, por isto, passar dos vícios para as virtudes para poder ver face a face lá na Jerusalém celeste o Redentor vitorioso, Ele que sendo Deus vive e reina com o Pai na unidade do Espírito Santo e lá está à espera de cada um de nós.  * Professor no Seminário de Mariana durante 40 anos.                                                                                                       

segunda-feira, 18 de março de 2013

A PUJANÇA DA IGREJA CATÓLICA

A PUJANÇA DA IGREJA CATÓLICA
Côn.José Geraldo Vidigal de Carvalho*
Os meios de comunicação social deram, mundo todo, relevo aos fatos referentes à eleição do novo Papa. Antes e depois, com comentários que revelaram a bifurcação que impera entre os seres humanos: uns a verem apenas sombras nos fatos e pessoas e outros, felizmente, contemplando neles os esplendores da verdade. A eterna luta entre o sim e o não, entre os radicais e os moderados tem ficado mais uma vez patente em ocasiões      como esta. O certo é que não se ficou, sobretudo  nestes dias, indiferente a tudo que se refere à Igreja católica. Passado já algum tempo da eleição do Papa Francisco, quando, com mais serenidade, vai sendo focalizada sua figura excelsa, impoluta, equilibrada, já se medita mais profundamente o significado desta escolha singular feita pelos Cardeais. Eram já esperados que fossem propalados na imprensa tudo que se poderia dizer falsamente contra a figura do douto Cardeal de Buenos Aires sob o ponto de vista pessoal, político, teológico. Entretanto, sua imagem de admirável homem justo, desprendido dos bens terrenos, democrata acendrado, teólogo consumado, vai pairando acima de todas as incongruências humanas. O problema também é, até da parte de certos teólogos, a facilidade ingênua com que rotulam as pessoas. Ainda agora, um deles a dizer que o novo Papa se revela um bom sacerdote, muito caridoso, mas não ostenta a marca de um profeta (sic). Seja como for, uma das incógnitas era saber porque ele quis se chamar  Francisco, quando falavam em Leão XIV, João Paulo III, Paulo VII e quejandos. O próprio papa já desfez as especulações e afirmou claramente que o nome se refere a São Francisco de Assis. Muitos pensaram em São Francisco Xavier, também jesuíta, e ele será um missionário tão aguerrido quanto o apóstolo das Índias. Falaram em São Francisco de Sales e ele sempre foi um comunicador admirável, devotado à imprensa falada e escrita. Disseram que se reportava a São Francisco de Paula, o notável eremita e ele é um homem de oração, um místico. Pensaram em São Francisco Borja, terceiro superior geral dos jesuítas, e ele tem um tino administrativo tão grande quanto o santo de Borja. O Papa Francisco, porém, estava a traçar na figura do santo de Assis um verdadeiro programa de seu pontificado. Contudo, aquilo que se disse acima sobre os santos de nome Francisco se reflete integralmente na pessoa do novo Papa. Um ilustre advogado enviou um e-mail a este articulista e destacou o que já lhe impressionou nas alocuções e no modo de ser do Papa Francisco: ação, fraternidade, silêncio, oração. Aliás, seja dito de plano que ele é bem uma síntese destes cinco renomados Franciscos acima referidos. Notável já foi a atividade apostólica deste antístite na Arquidiocese portenha e ele já traz agora para seu pastoreio de toda a Igreja um ímpeto evangelizador extraordinário firmado num grande interesse pelo povo. Nunca se mostrou um demagogo, mas um populista no bom sentido do termo, ou seja, devotado, sobretudo às pessoas pertencentes às classes menos favorecidas da sociedade. Sua fraternidade rebrilhou sempre e, de fato, ele, desde o início de seu pontificado, tem clamado pela união de todos, inclusive dos que não acreditam em Deus, para ajudarem a construir um mundo mais fraternal, de paz e concórdia universais. Na sua apresentação a milhares de fiéís na Praça São Pedro e de todo o mundo pela televisão, sua primeira atitude foi pedir um minuto de silêncio para que todos rezassem por ele. Já deu, assim,  uma diretriz maravilhosa. A prece silenciosa deve ser o momento mais venturoso na vida do cristão que precisa estar em contato intimo com o Ser Supremo, escutando-O e dele solicitando tudo que necessita. No dia seguinte, o Papa foi à Basílica de Santa Maria Maior, a primeira consagrada à Nossa Senhora no Ocidente, e lá ofereceu um ramalhete de flores à Mãe de Jesus e se prostrou de joelhos numa atitude admirável de uma prece que foi retratada nos jornais de todo o mundo. Algumas de suas contundes frases já ecoaram por toda parte demonstrando os rumos que ele quer dar a este novo pontificado. Em suma, a simplicidade marcante que já imprimiu na maneira de agir e de ser, a determinação com que ele, como Arcebispo, tinha se dirigido ao Governo atual da Argentina sobre pontos éticos importantes patenteiam que ele guiará a grei de Cristo fortiter et suaviter. Terá a firmeza de Pedro e a suavidade, a doçura de Francisco de Assis! A este Cristo pediu que restaurasse sua Igreja e ele há de afastar os escândalos causados por tantos maus eclesiásticos, há de reformar a Cúria Romana e será como Pedro uma rocha inabalável no meio do mar revolto dos tempos da pós-modernidade. * Professor no Seminário de Mariana durante 40 anos.

quarta-feira, 13 de março de 2013

PAPA FRANCISCO SAUDADO COM ALEGRIA

PAPA FRANCISCO, SAUDADO COM ALEGRIA
Côn. José Geraldo Vidigal de Carvalho*
Uma das sentenças mais felizes lançadas na História da foi a de São Cipriano, bispo de Cartago, no século terceiro: “Onde está Pedro, aí está a Igreja”. Através dos tempos o papado vem sendo objeto de tantos ataques dos inimigos da Verdade, exatamente porque querem desestabilizar a Instituição estabelecida por Jesus. Nos dias que se seguiram a renúncia de Bento XVI a mídia mais preocupada com sensacionalismo publicou textos horripilos sobre  a Santa Sé. Esta, porém, foi edificada sobre uma rocha que é Pedro (Mt 16,18). Ele e seus sucessores, que são os bispos de Roma, são o centro da unidade e da estabilidade do catolicismo. O pontificado romano é uma estrutura decorrente de necessidades básicas, com caráter de total permanência, justamente porque as portas do inferno combateriam sempre a doutrina verdadeira de Cristo, mas deveriam ser continuamente derrotadas (Mt 16,18). O Pastor Supremo, ininterruptamente, está a custodiar a integridade da fé, condenando os erros, mantendo a pureza dos ensinamentos do Mestre divino. Com sua doutrina aclara, nos mais variados contextos históricos, a crença dos cristãos, firmando os princípios da fé e da moral. É certo que todos os apóstolos eram iguais a Pedro, adornados com a mesma participação de honra e poder, mas a força dimana da unidade e a Pedro o primado foi conferido por Jesus, para demonstrar que una era sua Igreja e una a cátedra da veracidade (Jo 21,15-17). Com prodigiosa fecundidade a Igreja se estende na multidão dos fiéis, século após século, exatamente com esta energia de uma invencível unidade em torno do mesmo Chefe, Vigário de Cristo. Assim como muitos são os raios do sol, mas único o astro rei; muitos os ramos da árvore, mas um só tronco fundado em firme raiz, do mesmo modo milhões de batizados, mas uma única Igreja, um único comandante da nave petrina. Muitos arroios procedem de um mesmo manancial, ainda que tenham aumentado seu número com a abundância de água, assim as comunidades católicas se estendem pelo mundo todo, mas tendo uma procedência comum. A Igreja católica conserva a dois mil e treze anos uma consistência admirável, uma coerência surpreendente, por causa da conexão com seu Fundador divino através daquele que Ele colocou à frente de seu Rebanho. Com uma fecundidade inigualável estende por toda a terra o Evangelho. Iluminada com a luz do Salvador, difunde seus raios por todo o orbe, mas uma só é a luz que derrama por todas as partes sem se separar da unidade da origem. Com louçania abre seus ramos por toda a terra, uma, porém,  é a árvore  e, por isto, abundantes em resultados de frutuoso apostolado  sua atuação milenar. Esplêndido o sistema de governo eclesiástico exercido pelo Papa. A função petrina do Bispo de Roma se identificou continuamente com o cuidado sobre todas as Igrejas espalhadas nas mais diversas regiões. O Bispo de Roma é a cabeça do Colégio dos Bispos que participa da responsabilidade pela Igreja universal. Trata-se de uma autoridade pastoral na sua finalidade, mesmo quando a forma se manifesta de maneira jurídica e nunca deixou de ser entendida em seu contexto colegial, ou seja, o Papa governa a Igreja com a totalidade dos bispos. O episcopado universal, pelo bem de toda a Igreja, colabora com o Pontífice de Roma em importantes problemas que dizem respeito às igrejas locais.  Deste modo há a possibilidade de discernimento no que tange ao que o Espírito Santo diz às diversas comunidades (Ap 2,7). Deste modo os Bispos, unidos ao Papa, defendem nas suas circunscrições a unidade da fé e da disciplina que é comum a toda a Igreja.  É o maravilhoso vínculo da unidade, caridade e paz que leva à resolução das questões mais difíceis suscitadas pelas novas conjunturas. Tudo isto mostra uma estrutura sólida a serviço de uma obra salvífica a ser levada a todas as gerações. Quando tantos espíritos levianos combatem o Papa e vozes díssonantes partindo, por vezes, até de dentro da própria Igreja. querem deslustrar o papel do Sucessor de Pedro, cumpre firmar estes princípios. O novo Papa há de mostrar como, de fato, era o homem talhado para suceder a Bento XVI, Pontífice que maravilhou os fiéis com sua cultura, sua sabedoria e zelo apostólico e que, pelos seus ensinamentos e ações, continuará a ser um farol neste milênio de princípio tão conturbado. Proclamemos sempre que a Igreja de Cristo é una, santa, católica, apostólica e rezemos sempre pelo Papa Francisco, como ele pediu tão insistentemente na sua primeira alocução aos fiéis ! * Professor no Seminário de Mariana durante 40 anos.




segunda-feira, 11 de março de 2013

A MISERICÓRDIA DE JESUS

                  A MISERICÓRDIA DE JESUS
                              Côn. José Geraldo Vidigal de Carvalho*
O texto do Evangelho de São João sobre a mulher adúltera apresenta uma série de enigmas que mesmo os exegetas mais sábios não são capazes de decifrar (Jo 8,1-11). Entretanto, a narração joanina está repleta de preciosas lições que cumpre sejam bem assimiladas. De plano a exposição é surpreendente: “Os escribas e os fariseus levam a Jesus uma mulher que havia sido surpreendida em adultério”. Aí surge a primeira questão, dado que estava escrito no Livro dos Levitas (20,10): “O homem que comete o adultério com a mulher de seu próximo deverá morrer, ele e sua cúmplice”. O mesmo se achava também  no Livro do Deuteronômio (22,22).  Pois bem, no caso em tela o homem não aparece e a mulher está sozinha carregando o peso  de seu erro.  Não se sabe o que teria acontecido, ou seja, como o comparsa teria escapado. É possível também que a mulher teria sido corajosa e, magnânima, não revelara quem era seu companheiro. Há também a hipótese de os escribas e os fariseus terem discretamente embaçado a situação numa atitude de conveniência masculina, deixando  o adúltero fora do caso. São João não esclareceu a estes detalhes. Seja como for, se trata de uma cena de julgamento e de duas atitudes diferentes diante do pecado, claramente denunciado como tal. De um lado escribas e fariseus e de outro Jesus. Os acusadores são impiedosos na sua lógica: “Esta mulher foi  apanhada  em flagrante delito de adultério. Ora, Moisés mandou-nos apedrejar tais mulheres”. Entretanto, aquela pecadora era a imagem viva dos próprios escribas e fariseus, pois eles a condenam sem ver que eles são adúlteros, eles mesmos, segundo a palavra dos profetas. Com efeito, o motivo que os anima não era o cuidado com a glória de Deus, nem o respeito para com a Lei de Moisés. Eles queriam, como salienta São João, colocar Jesus à prova para O poderem acusar. A atitude de Jesus diante da mulher acusada e seus denunciantes é profundamente misteriosa.  Ele, inclinando-se escrevia no chão com o dedo. Eis aí outro enigma, pois não sabemos o que Ele estava escrevendo. Os exegetas desceram a inúmeras explicações, tentando decifrar a atitude do Mestre divino. Melhor se houve a Bíblia de Jerusalém  na nota a esta passagem: “O sentido deste gesto fica obscuro”. De fato, nada de perder tempo em conjecturas, uma vez que o Evangelista nada disse a respeito. São João, contudo, luminosamente registrou a límpida resposta de Jesus diante da insistência com que queriam que ele se pronunciasse sobre aquele fato: “Aquele dentre vós que estiver sem pecado lance-lhe por primeiro uma pedra”. Escribas e fariseus compreenderam imediatamente o recado e foram se retirando. A palavra do divino Redentor fora fulminante e lhes abriu os olhos. Antes de exigir a santidade dos outros é preciso que cada um procure reconhecer os seus pecados e deles se liberte com sincero arrependimento pessoal. Santo Agostinho magnificamente assim comentou o acontecimento: “Eles se retiraram, um após outro. Não ficou mais do que a miséria e a misericórdia”. Em seguida,  a sentença formidável de Jesus: “Nem eu te condenarei, vai e doravante não tornes a pecar”. O meigo Rabi abriu um horizonte esplendoroso de esperança, um espaço de liberdade deslumbrante. É que diante de Jesus, por Ele, com Ele e nele o futuro é sempre luminoso, o impossível aos olhos humanos se torna possível, porque diz o citado Santo Agostinho, “o Senhor condenou o pecado, não a pecadora”. Ele recusou fechá-la em seu pecado, no seu passado obscuro. As faltas são condenáveis, mas aos olhos misericordiosos de Cristo, a pessoa humana vale mais do que os atos que ela tenha cometido, ainda que sejam censuráveis. O ato errado está no passado, mas a conversão se abre para o futuro, um porvir de salvação, de redenção. Cristo acreditava que a pecadora podia se regenerar e não a condena. Alerta formidável para todo cristão. A graça santificante recebida no batismo e que, por fraqueza  humana, se perdeu com o pecado pode ser recuperada pelo sacramento da Confissão e uma vida nova pode ser retomada. Foi o que ocorreu com Saulo, o perseguidor dos cristãos, o qual a graça transformou em Paulo, o grande Apóstolo. Este pôde então escrever aos Filipenses: “Eu não julgo que já tenha alcançado a meta; mas a isto só eu viso: esquecido do que fica para traz e lançando-me para aquele que tenho na frente, continuo a minha corrida, olhar fixo na meta, rumo à palma, à qual Deus  lá no alto me chama em Jesus Cristo”. O progresso contínuo rumo à meta da santidade em Jesus Cristo deve ser o ideal dos cristãos sempre  intransigentes com o pecado, mas indulgentes com os que erram. Consciente cada um  de que, se há na vida pessoal algo no passado que o possa marcar, pela misericórdia de Jesus, pelo arrependimento, a libertação é sempre possível.* Professor no Seminário de Mariana durante 40 anos.



O FILHO PRÓDIGO

O PAI E O FILHO PRÓDIGO
Côn. José Geraldo Vidigal de Carvalho*
Na parábola do Filho Pródigo, a qual poderia também ser chamada  parábola dos Dois Irmãos ou mesmo da Misericórdia Paterna, é de se notar, inicialmente, que a postura dos filhos gira em torno da herança. O mais novo pensa em mudar de vida e precisa de  dinheiro para se entregar a uma aventura longe de onde mora. O mais velho por certo pensou no seu íntimo que, se o irmão voltasse e o pai estivesse vivo, ele teria direito na partilha após a morte do pai. Deste modo, a relação de ambos com o Pai não tinha como prioridade o amor, a ternura, a afeição, mas tão só a riqueza que ele possuía. Isto explica bem a reação do filho mais velho quando o irmão, que tudo perdera numa vida dissoluta, retorna à casa paterna.   Portanto, esta parábola está centrada na figura do Pai.  Jesus se dirige a dois grupos de ouvintes: os publicanos e os pecadores de um lado e os fariseus de outro. Estes confiavam nos seus próprios méritos. Entretanto os dois grupos são convidados a se voltarem para Deus, a se reconhecerem pecadores, pobres, dependentes do amor do Ser Supremo, sob pena de não se salvarem.  Contando apenas com suas forças e suas qualidades não chegariam à vida eterna. Apenas Deus, Pai amoroso pode salvar.  O filho mais novo dilapida a herança recebida e se afunda na ignomínia. Cai, entretanto,  em si e há o retorno à casa paterna. É acolhido com imensa alegria, sem recriminações, sem uma recepção humilhante. Ao contrário, foram-lhe dado um vestido novo, anel e sandálias, sinais de suas prerrogativas anteriores que lhe eram restituídas. Há até o sacrifício de um novilho gordo em sinal da comunhão reencontrada e solenemente celebrada.  A parábola é bem mais concisa no que tange ao filho mais velho. Entretanto,  seu caso parece muito mais grave que o do seu irmão insensato. Este  foi irrefletido, ingrato, mais tolo do que perverso.  Ele planejou mal o que iria fazer com a herança, foi  impensado. No fundo, contudo, não era inteiramente mau. Sua desgraça o fez logo pensar no Pai que ele abandonara. Preparou até um discurso de volta, o reconhecimento de sua estultice: “Pai, eu pequei contra o céu e contra ti”. O sofrimento lhe havia aberto o coração e ele percebeu seu erro, seu egoísmo, sua ingratidão e sua falta de clarividência, de discernimento.  Seu irmão mais velho tivera uma postura diferente: nunca deixara seu Pai e estava sempre a seu serviço, mas com uma mentalidade de empregado, não de filho. Achava-se presente fisicamente e se tornara na verdade um estrangeiro. Não demonstra nenhum sentimento de afeto para com seu progenitor, a quem dirige pesadas invectivas.  Foi mesmo veemente: “Há já anos que estou ao teu serviço sem jamais transgredir uma ordem tua, e tu nunca me deste sequer um cabrito para eu festejar com os meus amigos”! Foi até ousado: “Mas logo que chegou esse teu outro filho, que consumiu os teus bens com as meretrizes, mataste para ele o vitelo gordo”.  Atitude audaciosa e nada de afeto para com seu pai. Ele, de fato, se considerava um criado e até detesta seu irmão. Este, contudo,  experimentou o arrependimento, ao passo que o irmão mais velho destilava ressentimento para com seu benfeitor e ira para com seu irmão. Possuía um coração amargo.  Cumpre que cada um se examine sobre qual tem sido o seu posicionamento perante Deus. Por vezes, quem sabe, infiel a seu amor, mas susceptível de um sincero arrependimento e retorno à misericórdia paterna. Será, porém, que se tem sido por demais intransigente, invejoso, incapaz de abertura e perdão para com os outros?  É este comportamento aberrante que afasta de Deus e torna impossível a reconciliação com Ele. Quaresma é tempo de penitência, de arrependimento, de uma ótima confissão, de reintegração total na casa do Pai. Uma condição, contudo, é necessária, ou seja, a reconciliação com o próximo, o respeito para com os mais idosos, a clemência para com os que erram, o perdão cordial. Esta parábola revela em todos os seus aspectos o amor de Deus  para com todos, um amor que se funda e se enraíza na dileção eterna entre  Jesus e seu próprio Pai. Cristo é filho por natureza do Pai e partilha tudo com Ele. Ao se encarnar, porém, Ele nos torna filhos por adoção, para nos revelar que, como Ele, nós recebemos a plenitude do amor do Pai celeste. Jesus quer que todos tenham sempre o arrependimento do filho mais novo, mas que a estreiteza de espírito, a rudeza do coração do mais velho estejam sempre afastadas. Então o Pai que está nos céus poderá dizer a cada um: “Tudo que é meu é teu”, porque um ânimo cheio de amor a Ele e aos outros partilha infalivelmente de todos os bens de seus tesouros infinitos. Isto se dá pela graça santificante que torna o cristão participante da própria natureza divina. Grande realidade, tremenda responsabilidade as daquele que é um verdadeiro cristão. * Professor no Seminário de Mariana durante 40 anos.



sábado, 9 de março de 2013

A MISERICÓRDIA DIVINA

                                        A MISERICÓRDIA DIVINA
                                       Côn. José Geraldo Vidigal de Carvalho*
         Na alheta do bem-aventurado Papa João Paulo II se celebra no segundo domingo da Páscoa a festa da Misericórdia divina. Este pontífice havia conhecido os horrores da segunda guerra mundial e os terrores espalhados por Hitler, sobretudo na sua pátria a Polônia. Esta foi o primeiro país invadido pelas tropas nazistas. Depois vieram as horripilas abominações do regime comunista. Jovem, e mais tarde sacerdote e bispo, aquele que se tornaria um dos papas mais queridos da História se opôs corajosamente aos ditadores que humilhavam e perseguiam a torto e a direito. Como Chefe da cristandade João Paulo II preferiu propor a misericórdia que se torna perdão aos sentimentos de ira e vingança que nazistas e comunistas provocaram. Como os seres humanos são lentos em se corrigir de seus maus sentimentos suscitados pelos conflitos que abalaram a História, o Papa quis que o prolongamento da festa da Páscoa  fosse impregnado da misericórdia divina, ocupando um lugar importante na vida dos seguidores de Cristo ressuscitado, o Bom Pastor. Atendeu inclusive ao desejo do próprio Cristo através das revelações à Irmã Faustyna.  Jesus havia  se apresentado no meio de seus discípulos com saudações de paz e instituindo exatamente o Sacramento do Perdão. Os pecados por graves que fossem submetidos ao tribunal da Penitência seriam anistiados pelos apóstolos e seus sucessores. Deus é misericordioso e está sempre pronto a perdoar, mas uma das fraquezas humanas é a falta de fé. Quantos como Tomé recusam crê sem ver e sem tocar as chagas do Redentor! É um mal que reina sobretudo no mundo hedonista e materialista de hoje. Como outrora a Tomé Jesus está a repetir: “Bem-aventurados os que não viram e creram”. A fé em Cristo ressuscitado é fundamental. É a base sobre a qual repousa o engajamento cristão desde o início do cristianismo. São João na sua primeira carta escreveu: “Todo o que crê que Jesus é o Cristo, este verdadeiramente nasceu de Deus” (1 Jo 5,1-6). Depois ele afirmaria ser a fé a vitória sobre o mundo. Segundo São João o mundo é o mal e tudo que dele decorre. A fé oferece as forças necessárias para lutar contra as desgraças  que existem nesta terra. Desta maneira, o domingo da Misericórdia tende a levar o cristão à transformação de seu coração para poder também operar a metamorfose do mundo. Abertura ao perdão das ofensas para poder vencer as forças do mal que estão sempre em ação. A Ressurreição foi a vitória do amor de Deus sobre o pecado e cabe a seus seguidores prolongar este triunfo pelos séculos afora. Cumpre, porém, não se esquecer que o perdão divino não opera como se nada tivesse acontecido. O perdão não é uma negação com relação ao erro praticado. É um avanço por ser um triunfo sobre o desvio cometido que passa a ser inteiramente abominado, ou seja, se fosse possível voltar atrás tal pecado não teria sido cometido. Eis porque Cristo ressuscitado mostrou as cicatrizes que marcaram suas chagas dolorosas e dizia sempre aos que ele perdoava: “Não tornes mais a pecar”. Deus, porém, sempre repetindo ao pecador: “Não tenhas medo”, palavras que percorrem toda a Bíblia. O salmista aconselha então: “Dai graças ao Senhor porque eterno é o seu amor” (Sl 117,1). A manifestação máxima desta dileção foi o acontecimento salvífico através da morte e ressurreição de Cristo. Este prodígio da misericórdia divina mudou o destino da humanidade. A solidariedade do Redentor que assumiu a natureza humana foi surpreendente. Aí está a razão pela qual crer neste seu amor é acreditar na misericórdia infinita do Ser Supremo. Disto resulta a paz interior que depois se irradia por toda a sociedade, mesmo porque o verdadeiro cristão inebriado nas manifestações do amor de Deus é levado a imitar a bondade do seu Senhor, sendo também misericordioso com todas as pessoas à sua volta e se interessando pela paz no mundo inteiro. Do mesmo modo como agiu com Tomé, Jesus mostra a cada um suas chagas gloriosas e seu coração, fonte inesgotável de luz e de vida, de amor e de perdão. Daí jorraram a redenção, a salvação, a santificação. Santa Faustiyna viu fluir do coração de Cristo dois raios de luz que iluminam o mundo. Estes raios representam o sangue e a água. O sangue lembrando o sacrifício do Gólgota e o mistério da  Eucaristia. A água fazendo pensar no batismo e no dom do Espírito Santo (Jo 3,5;4,14), Dentro do Coração divino do Salvador se encontram a felicidade autêntica, durável, o segredo da serenidade absoluta. Como concitou o bem-aventurado Papa João Paulo II, cumpre repetir sempre “Jesus, eu confio em vós”. Isto deve significar um abandono total nas mãos do Senhor, nosso único Redentor. Que cada um se deixe envolver nos raios da esperança mais fulgente, porque em Jesus se pode confiar. Ele é paz, amor, beatitude. * Professor no Seminário de Mariana durante 40 anos.



quinta-feira, 7 de março de 2013

O CENTRO DE UNIDADE

O CENTRO DA UNIDADE
Côn. José Geraldo Vidigal de Carvalho*
O Papa, sucessor de Pedro, é antes de tudo a garantia da unidade, chefe visível da Igreja, segundo a determinação de Cristo: “Apascenta as minhas ovelhas [...] apascenta os meus cordeiros” (Jo 21, 15-19). Nunca houve da parte dos católicos papolatria, mas, sim, uma veneração especial para com aquele que pastoreia a grei do Filho de Deus. Enquanto comunidade que se insere na história, a Igreja possui uma organização social e uma estrutura hierárquica, sendo inegável o primado pontifício de acordo com os textos bíblicos.  Ao se falar da Igreja, porém, cumpre que nunca se esqueça o caráter teândrico da mesma. A Igreja na parte divina ela é incorruptível, na parte humana há falhas. Nota-se, por isto mesmo, em muitos textos apresentados na mídia ao ensejo da renúncia de Bento XVI uma terrível confusão no que concerne à eclesiologia. Há aspectos dogmáticos, morais, históricos que não podem ser abordados confusamente sob pena de se distorcer a verdade e causar confusão entre os fiéis. Impera então uma generalização perversa e se fala numa Igreja envelhecida, crepuscular, que se definha. Aspectos históricos não podem ser analisados fora do contexto em que se deram. Assim, por exemplo, o Dictatus papae que foi um conjunto de 27 proposições publicado pelo Papa Gregório VII. Foi uma obra de direito canônico na Idade Média elaborada por canonistas que recolheram uma série de textos sob o poder papal num posicionamento claro diante dos Imperadores. Traduzir o Dictatus papae por Ditadura do Papa é já colocar uma análise preconceituosa do reflexo deste documento na história posterior da Igreja. Dictatus significa manifesto a ser divulgado. Sob o ponto de vista histórico a Igreja sempre enfrentou procelas, mas, assistida pelo Espírito Santo, princípio vital pelo qual ela recebe as forças divinas que nela atuam, nunca falhou na sua missão de salvação. No século XIX, a título de exemplo, surgiram o iluminismo, o josefinismo, o febronianismo, as ideologias de Jean Jacques Rousseau e dos jacobinos, as agitações da Revolução Francesa. Entretanto, nunca deixou de haver uma restauração ou renovação no interior da Igreja que sempre contou também com grandes teólogos. Esforço secular para fazer Deus presente no mundo numa evangelização constante dos fiéis. O mesmo ocorreu no século XX e no início do novo milênio. Dentro desta multiplicidade de aspectos convém notar que a Cúria Romana é o órgão administrativo do Estado do Vaticano, constituído pelas autoridades que coordenam e organizam o funcionamento da Igreja Católica. Trata-se do governo da Igreja. Curia no latim medieval significa "corte" no sentido de "corte real", pelo que a Cúria Romana é a corte papal, que assiste o Papa nas suas funções. Circulam denúncias entre as quais o mau uso de dinheiro, disputas de poder, relações homossexuais e até um plano para revelar a homossexualidade do editor de uma publicação católica, tudo isso dentro da Cúria. É o lado humano da Igreja que o novo Papa terá que enfrentar. Qualquer desvio que signifique o desprezo de um dos dez preceitos do decálogo jamais será tolerado, não apenas a prostituição gay, prato preferido de certos puritanos que deveriam fazer um exame de consciência e reconhecer os próprios pecados e emendar de vida. Ao comentar texto anterior deste articulista, um notável médico católico, residente no Rio de Janeiro, assim se expressou: “Sabe-se que não se muda a essência da doutrina. Medidas disciplinares, porém, são urgentes. Os padres sexualmente doentes devem ser afastados e alguns até eliminados de suas atividades. Tratamentos, em geral, são falhos. O mal que fazem é destrutivo. Hoje, as reações são maiores seja das vítimas, quanto de seus familiares. A repercussão disto é ruim. Não adianta tampar o sol com peneira com desculpas não muito aceitas”. Não há dúvida, porém, que o próximo Papa tomará todas as medidas necessárias para uma total renovação eclesiástica. Numa linguagem chula, grosseira, houve quem afirmasse que Bento XVI “jogou a toalha”, “chutou o balde”, obscurecendo assim a atitude corajosa de um sábio Pastor octogenário que consultou sua consciência, entrou em tertúlia com Deus, e percebeu que estava na hora de deixar o pontificado. O momento não é de críticas destrutivas, mas de muita oração da parte daqueles que verdadeiramente amam a Igreja de Jesus Cristo. * Professor no Seminário de Mariana durante 40 anos.
 

segunda-feira, 4 de março de 2013

ENQUANTO SE AGUARDA O NOVO PAPA

ENQUANTO SE AGUARDA O NOVO PAPA
Côn. José Geraldo Vidigal de Carvalho*
Dentre as interrogações que vão surgindo nos jornais da Europa e de outros países,  após a renúncia do Papa Bento XVI, algumas são aqui refletidas. A primeira indaga se isto foi um indicio de crise na Igreja. É lógico que se o termo em tela é entendido como estado de dúvidas e incertezas esta não foi a sinalização lançada pelo ato pontifício. Com efeito, quer sob o ponto de vista doutrinal e moral a Igreja jamais poderá ensinar nada que seja contrário à revelação contida na Bíblia, na qual se acha o Decálogo sagrado e irreformável. A questão seguinte é se a Igreja está em condições de apreender os desafios da aceleração da história, dado que o mundo se tornou uma aldeia global. Quem analisa com serenidade, por exemplo, os dois últimos pontificados, ou seja, o de João Paulo II e de Bento XVI, há de fazer justiça e ponderar que eles compreenderam os sinais dos tempos e se inseriram plenamente no mundo pós-moderno. A derrocada do comunismo teve muito a ver com as atitudes corajosas do papa polonês, que soube, além disto,  explorar a bem do Evangelho todos os recursos modernos da comunicação e da facilidade de locomoção pelo mundo afora. O papa alemão, ele também, dotado de rara cultura humanística e teológica, teve sempre a seu favor sua clareza mental, além de sua capacidade de verbalização. Com  um ar de autoridade serena, ele comandou o cenário público mundial do papado  e administrou com sabedoria a gigantesca burocracia eclesiástica, mostrando-se um Pontífice atualizado, vivificando uma Igreja bem  situada no século XXI, atendendo plenamente as necessidades atuais dos fiéis. Ambos souberam viver o contexto hodierno e falaram ao mundo pós-moderno como mestres e pastores. Eles consideraram o pontificado não como lugar da conquista e de exercícios inadequados do poder que seduz, desfigura e se distancia da condição de todos os fiéis, ovelhas do Senhor Jesus, mas como um serviço a exemplo de Cristo que veio para servir e não ser servido.  Não só na Europa como também em outras partes do mundo muito se fala de uma maior participação dos leigos. Nunca como hoje os batizados, no exercício de sua participação no múnus sacerdotal, profético e régio de Cristo, exerceram tantas atividades nas mais diversas pastorais. Muitos comentaristas, inclusive certos teólogos,  que jamais viveram a experiência no trabalho da grei do divino Mestre, não percebem como há um afã abençoado pelos Bispos e Párocos para que os cristãos, de acordo com seu carisma, se engajem nos diversos trabalhos de evangelização. Percebe-se uma mobilização geral pela catequese e pelas obras sociais. Quanto à renúncia em si do Papa Bento XVI ela se coloca no centro mesmo da credibilidade da fé e foi fruto de uma tertúlia íntima dele com Deus para saber qual seria a Sua vontade afim de não se iludir a si mesmo e aos outros. Percebeu então que, devido suas forças físicas, não estava mais em condições de enfrentar uma sociedade liberal, secularizada que está a exigir uma luta sem tréguas contra a perversidade do mundo, prosseguindo um labor incessante pela evangelização. Este é o perene desafio da Igreja, ou seja, manifestar a postura cristã que surgiu na história com Jesus de Nazaré. Isto no coração mesmo da pós-modernidade, não fora dela ou contra ela, sendo um motor de transformação do mundo. Para isto, entendeu Bento XVI, um novo Papa seria necessário para esta obra hercúlea, que exige respostas dinâmicas e pertinentes às quais sua saúde não lhe permitia inteiramente atender. Árdua a tarefa dos sucessores de Pedro, encontrar caminhos novos para a justiça, a liberdade e paz. Resistência ao reducionismo jurídico, científico e político ou tecnológico, tendo consciência de que a razão, iluminada pela fé, se enraíza no centro da personalidade humana na sua busca da Verdade e do Bem. O ser  humano é capaz de chegar a uma concepção unificada e orgânica do saber  a bem da humanidade. Seja qual for o novo Papa terá que assegurar a perenidade desta articulação entre a razão e a fé e o louvor a Deus. Deverá falar ao homem de hoje  considerado na sua unidade e sua interioridade. Enfim, um Mestre contemplativo e dinâmico, sabedor que os códigos mundanos têm critérios que muitas vezes não estão de acordo com o Evangelho. O tempo da Igreja não é  unidimensional porque ela lança suas raízes nos acontecimentos que ela, baseada na doutrina de seu Fundador,  considera como atuais e projeta um futuro luminoso certa do destino divino da humanidade. * Professor no Seminário de Mariana durante 40 anos.


 



sábado, 2 de março de 2013

TODO CUIDADO É POUCO

TODO CUIDADO É POUCO
Côn. José Geraldo Vidigal de Carvalho*
A renúncia do Papa Bento XVI está sendo explorada por alguns para lançar confusão nas mentes incautas numa manipulação diabólica de textos bíblicos e de fatos históricos.
O primado espiritual de Pedro e de seus sucessores está claro no Evangelho (Mateus 16,16-19; João 21,15). Pedro exerceu este primado (Atos dos Apóstolos 1,15 s; 2,14; 3,6; 10,1 s; 9,32; 15,7-12). Foi bispo de Roma, fato que diante das pesquisas arqueológicas realizadas na Basílica de São Pedro, está inteiramente comprovado. Uma vez que o primeiro papa se estabeleceu em Roma há uma perfeita identidade entre a sede romana e o papado. É uma afirmação inverídica apresentar o bispo de Roma exercendo jurisdição na Igreja apenas a partir da Idade Média. Com efeito, a história eclesiástica antiga mostra os pontífices romanos no exercício de suas funções de chefes de toda a Igreja e, na verdade, cônscios deste poder espiritual. Assim, no ano 96 São Clemente Romano, terceiro sucessor de São Pedro, dirigiu uma carta à Igreja de Corinto e pela linguagem que usa, se pode claramente perceber que tinha total consciência de que era ele quem dirigia a Igreja. Sua admoestação foi acatada e produziu admiráveis efeitos. Neste tempo ainda vivia o apóstolo São João e, no entanto, quem tinha ampla atuação era o bispo de Roma.  Santo Inácio de Antioquia, discípulo dos apóstolos, chama a Igreja de Roma de “cabeça da caridade”, revelando a posição primacial, da sede romana e, portanto, também a de seu chefe. Santo Ireneu, assim se expressou no ano de 180: “A esta Igreja (romana) por sua preeminência mais poderosa, é necessário que se unam todas as Igrejas, isto é, os fiéis de todas as partes, pois nela se conservou sempre a tradição recebida dos apóstolos pelos cristãos de todas as partes” (Adv. Haer. 3,3. cf. Conradus Kirch S.J. Enchiridion totius historiae ecclesiasticae antiquae. Barcelona, Editorial Herder. p. 75). São muitos os Pontífices romanos que aparecem no pleno exercício de sua autoridade. Assim Vitor II no ano 190 na questão da Páscoa. Depois será Calixto I quem publica para a Igreja universal o célebre edito admitindo à penitência os adultos, condenando com isto o rigorismo exagerado de Hipólito e Tertuliano. Em 260 é o papa Dionísio quem condena para toda Igreja os erros do subordinacionismo e o sabelianismo. É sintomático constatar como os hereges e cismáticos se esforçavam por obter o reconhecimento do bispo de Roma, o que revela como Roma era o centro da Igreja verdadeira de Cristo. Os sínodos diocesanos enviam ao papa suas decisões para aprovação e os concílios só se realizavam com a presença dos representantes do papa.
O primado espiritual do papa, verdadeiro chefe da Igreja, sempre foi exercido conscientemente pelo bispo de Roma e isto não se deve nem à ambição, uma vez que todos eles só intentavam servir; nem à influência de Roma, dado que desde 11 de maio de 330 Constantino havia transferido a capital para Bizâncio; nem à subserviência dos demais bispos, pois, muitas vezes, houve quem se rebelasse, mas a autoridade do Pontífice romano acabava por ser reconhecida. Única é a razão: Roma é a “Igreja mãe que tem em suas mãos o governo de todas as outras igrejas; o chefe do episcopado, donde parte a direção do governo; a cátedra principal, a cátedra única na qual, somente, todos conservam a unidade”, como bem se expressou Bossuet. Os Papas, como sucessores de São Pedro sempre exerceram e exercerão o seu múnus como Chefes da Igreja instituída por Cristo e a esta Igreja foi dada a promessa de seu Fundador: “As portas do inferno não prevalecerão contra ela” (Mt 16,18). * Professor no Seminário de Mariana durante 40 anos.