VIRAM JESUS EM SUA GLÓRIA
Côn. José
Geraldo Vidigal de Carvalho
No episódio da
Transfiguração de Jesus um detalhe ressaltado por São Lucas merece atenção
especial (Lc 9,28-36). Diz o evangelista que Cristo, “enquanto estava em
oração, seu rosto tomou aspecto diferente, seu vestuário assumiu um candor
refulgente”. Os discípulos então viram Jesus transfigurado na prece e pela
prece. Momentos de pura graça foram para Pedro, Tiago e João contemplar a
glória do Mestre divino. Estavam antes oprimidos pelo sono, mas despertaram
completamente e se sentiram imersos numa
luz transfigurante. Muitas vezes os que se aproximam de Jesus estão
inicialmente sonolentos, sono da fé, porque pouco habituados às maravilhas
divinas; sono da esperança, ofuscada pelas ilusões terrenas; sono do amor,
desvirtuado pelas mensagens mundanas veiculadas pelos meios de comunicação
social. Entretanto, surgem providencialmente instantes surpreendentes que levam
a um despertar luminoso das três virtudes
teologais. Isto faz o cristão exclamar com São Pedro: como é bom viver
intensamente o contato íntimo com as realidades espirituais que iluminam com o
resplendor do Todo-poderoso. Trata-se do júbilo de perceber a presença do Deus
três vezes santo nesta terra para um dia contemplar sua face na eternidade. A
transfiguração no Tabor foi fugaz, mas anunciava o triunfo definitivo do
Redentor da humanidade. Eis porque pôde afirmar São Paulo: “Ressuscitados com
Cristo procuramos as coisas do alto lá onde se encontra Cristo, assentado à
direita de Deus” (Col 3,1). O Pai transfigura aqueles que olham e cantam seu
esplendor, como está na Carta aos Coríntios: “Quanto a nós todos que com o
rosto descoberto, refletimos como num espelho a glória do Senhor, somos
transformados nessa mesma imagem, cada vez mais fúlgida como obra do Senhor, o
qual é espírito” (2 Cor 3,18). Cristo transfigurado na montanha, então
glorificado. Cristo martirizado no Calvário, salvador, manifestando em tudo seu
imenso e indescritível amor, mais forte do que a morte. É preciso, contudo,
acatar a ordem do Pai: “Este é meu Filho amado, escutai-O”. Ouvir as palavras
de Jesus para ser transfigurado, haurindo todas graças da caminhada quaresmal,
vencidas todas as moléstias do corpo e da alma, todas as fraquezas, todos os
defeitos. É o convite divino para uma renovação espiritual, desinstalando os
que precisam de uma renovação interior, deixando a rotina e se colocando numa
peregrinação renovadora até o dia da Páscoa que se aproxima. Combate ao
imobilismo e à estagnação. Pedro queria ficar lá no monte com João e Tiago, mas
Jesus os trouxe para a realidade que para Ele seria o drama sanguento de sua
Paixão e Morte. Lá no Tabor Moisés estava a lembrar a importância do Decálogo e
Elias a recordar o valor das lições dos Profetas. Serão felizes e
transfigurados aqueles que são fiéis ao Pai. Ao vencer, como vimos no domingo
passado as tentações do diabo, Jesus dera uma demonstração desta fidelidade, a
qual O levaria ao Calvário. Ele tomaria
sobre si o absoluto do mal para livrar
seus seguidores das garras de satanás e para que o amor tivesse sempre a última
palavra. Jesus subiu a montanha para rezar, para se concentrar no Pai e receber
dele a força de ser fiel ao Espírito que os unia e que estava sobre Ele. Muitas
vezes Ele se retirou sozinho para rezar. No acontecimento de hoje Ele levou
consigo três Apóstolos que eram então representantes do corpo eclesial do qual
Ele é a cabeça. Seus seguidores conheceriam o júbilo do Tabor, mas também o sacrifício
do Gólgota. Ele deixara bem claro: “Se alguém quer vir após mim, que renuncie a
si mesmo, tome a sua cruz de cada dia e siga-me” (Lc9, 23). Este caminho passa
pela morte, mas não é mortífero. Ao contrário é a fonte da vida eterna,
conduzindo à luz da felicidade sem fim. Cumpre, porém, escutar Jesus que é a
aliança do povo e a luz das nações, pois somente Ele tem a Palavra da salvação
eterna. Depois que se ouviu a voz do Pai Jesus estava novamente sozinho. O
mistério do grão que lançado na terra morre para dar a vida haveria de
continuar nele, na Igreja e em cada um de nós, seus discípulos A missão
redentora que Ele consumiria no Calvário seria também a tarefa de seus
seguidores. Se às vezes faltam luz,
transfiguração na vida do cristão, é porque o seu alimento não é a vontade do
Pai, seu pão não é a Palavra de Cristo, seu olhar está fixado não nele, mas em
falsos profetas. Saibamos então contemplar sempre e unicamente a Jesus e Ele
nos transfigurará nele. * Professor no
Seminário de Mariana durante 40 anos.
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