quarta-feira, 27 de outubro de 2021

 

SOLENIDADE DE TODOS OS SANTOS

Côn. Jose Geraldo Vidigal de Carvalho*

A solenidade de Todos os Santos é uma etapa do ano litúrgico que pode induzir os incautos a um erro, ou seja, festejar o mistério celebrado, olhando unicamente para o céu. A tentação é forte de prestar atenção somente aos Santos que se acham no paraíso junto de Deus. Eles, de fato, são os frutos mais preciosos e maduros da árvore da perfeição espiritual. Atraem uma admiração abismada, mas que pode impedir vislumbrar a santidade e o engajamento na vida cotidiana dos santos que ainda labutam no cotidiano deste mundo terrestre. Entretanto o Evangelho nos orienta de maneira decisiva em outra direção e deve nos levar a evitar este erro (Mt 5,1-12). São Mateus na narrativa das bem-aventuranças   indica o caminho a seguir na vida para poder recolher os frutos da adesão integral na vivência do dia a dia nesta terra. A colheita será abundante se hoje somos efetivamente pobres em espírito, se temos fome e sede de justiça, se somos misericordiosos, tendo uma vida inteira pura, se construímos a paz. Além disto, se suportamos as injúria, as perseguições e os falsos testemunhos por causa da justiça, quando somos provados durante o nosso caminhar terreno. Aí está uma descrição viva da santidade como convém aos que se comportam como filhos de Deus que um dia gozarão dele por toda a eternidade   Trata-se de trilhar um caminho da perfeição cristã, no esforço cotidiano se tornar semelhantes ao Pai que está lá no céu. É a vivência completa da nossa vocação batismal. Dois os pilares a sustentarem este edifício da vocação à santidade: Amar a Deus sobre todas as coisas e ao próximo como a si mesmo. O viver de quem foi batizado deve ser um caminho de uma conversão contínua, como aconteceu, por exemplo, com Santo Agostinho depois de sua mudança radical de atitude perante Deus. A vida cristã parte sempre de um chamado divino, de um encontro com a verdade de Cristo como aconteceu com Pedro e André às margens do mar da Galileia, ocasião em que estavam ocupados em suas atividades de pescadores. Eles souberam abandonar uma existência feita de fatos de cada hora para seguir a Verdade e se tornarem pescadores de homens, pregoeiros corajosos de uma Palavra capaz de transformar o mais íntimo do ser humano, tanto o coração dos sábios como o das pessoas simples e dos pequenos, uma Palavra salvadora para todos. A solenidade de Todos os Santos nos interroga antes de tudo sobre nossa vocação, sobre nossa capacidade de renunciar a nós mesmos, às nossas falsas seguranças e mesmo à ideia que nós fazemos daquilo que   é ser santo. Como Pedro e André, como tantos outros na milenar história da Igreja, devemos pedir sempre a Deus a coragem de saber abandonar os numerosos entraves da vida que a aprisionam nossa vocação para a santidade, a saber, as barreiras que se opõem às sábias exigências do Evangelho, como o egoísmo, o individualismo que limitam nossa real participação ativa no crescimento da comunidade na qual estamos inseridos, o terrível empecilho da guerra conosco mesmos e com os outros. Isto destrói as relações sinceras com o próximo. Adite-se a preguiça que nos impede de colocar à disposição dos outros nosso tempo e nossos talentos. Todos estes obstáculos anulam o espírito das beatitudes e são empecilhos na caminhada da santidade Além disto, por exemplo, a imagem bíblica de São Pedro na prisão deve levar a refletir nas consequências da disponibilidade até o sacrifício pessoal para seguir a Verdade como vemos também em tantos lances da existência dos outros santos. Antes da Paixão e Ressurreição de Jesus, Pedro era tímido, temeroso e mesmo sujeito a falhas clamorosas. Depois, porém, de receber o dom do Espírito de Pentecostes Ele se fez testemunha intrépida de uma liberdade particular, aquela lhe foi comunicada por Cristo, ou seja, liberdade com relação a lutar contra o pecado e o mal. Paradoxalmente o anúncio desta liberdade levou Pedro e Paulo para a prisão.  Em nossos dias aquele que tem a coragem demonstrada por estes Apóstolos e os demais santos através dos tempos, destemor para anunciar a liberdade das beatitudes, liberdade diante da hipocrisia, da ira, da injustiça social, do enriquecimento egoísta, são marginalizados, condenados e, até perseguidos. A estes é imposto silêncio por uma sociedade corrupta e pelos interesses mesquinhos dos homens perversos. No entanto, é a luta pela liberdade de ação que devemos proclamar, se bem compreendemos as beatitudes. Nenhuma injunção humana deve colocar um limite no caminho da perfeição cristã, pois o amor a Deus e ao próximo precisa ser total e desinteressado. Não se deve, porém se deixar iludir uma vez que o caminho da santidade não é fácil. A luta é empregando as armas oferecidas pelas bem aventuranças. Para nós, portanto, ser santo deve significar vencer graças ao poder extraordinário da Palavra de Jesus, * Professor no Seminário de Mariana durante 40 anos.

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