A CONVERSÃO E O
REINO DE DEUS
Côn. José Geraldo Vidigal de Carvalho*
No início de sua pregação da boa nova neste mundo, começo de seu
ministério público, na sua primeira admoestação, antes mesmo de chamar seus
primeiros discípulos, Jesus recomenda solenemente: “Convertei-vos, porque está
próximo o reino dos céus" (Mt 4,12-23). Esta conversão significa mudança
de mentalidade, verificando se a Palavra de Deus tem tido plena aplicação na
vida cotidiana de cada um. Existência iluminada pela luz divina que deve ser
irradiada por toda parte. Trata-se da libertação das insídias diabólicas e da
entrega total ao serviço de Deus na justiça e na santidade. É o reviver no Espírito
Santo que leva a repudiar pecados num retorno absoluto às realidades celestes.
As primeiras mensagens de Jesus ao iniciar sua evangelização foram assim
palavras de arrependimento e purificação do coração. Assim se estará caminhando
na luz do Senhor e não nas trevas longe do reino de Deus. É que neste reino não
entrarão os orgulhosos, os perversos, os pecadores renitentes. Entretanto, a
imagem do Reino do Céu não deve causar temor, mas, sim, o desejo de não o
perder através da humildade, do remorso, da mudança de vida, pelo repúdio de
toda ação indigna do cristão. É o caminhar nobremente como em pleno dia, agindo
sempre na claridade, resplandecendo diante dos outros pelas boas obras. Com
efeito, como bem se expressou Elisabeth Leseur, “uma alma que se eleva, eleva o
mundo inteiro”. Graças aos bons exemplos e as palavras oportunas muitos são os
que reencontram o Mestre da Vida que a todos criou para a alegria interior,
para a paz da consciência durável e profunda, para um júbilo todo divino. E
deste modo que se caminha para o Reino do céu, arrastando muitos para também o
conquistar. Trata-se de deixar de lado os falsos ídolos e de se entregar
inteiramente a Deus. Isto porque somente Deus é a vida verdadeira. A idolatria
dos falsos prazeres, da ambição, do afã de dominar leva à frustração, à
tristeza, à decepção. É preciso então se converter para Aquele do qual vem toda
autêntica salvação. Cumpre poder dizer o que o salmista asseverou no salmo 26:
“O Senhor é minha luz e salvação, de quem eu terei medo? O Senhor é a proteção
da minha vida, perante quem eu tremerei? [...] Sei que a bondade do Senhor eu
hei de ver na terra dos viventes”. Assim, será possível proclamar: “Espera no
Senhor e tem coragem, espera no Senhor”. Foi de propósito que Jesus iniciou sua
pregação na Galileia, bem o símbolo da salvação universal que Deus oferece a
todos. Como salientou São Mateus,
“Galileia dos gentios, o povo que jazia nas trevas”, dela fez Jesus o centro da
irradiação do Evangelho, indo inicialmente pregar nas suas cidades e nas suas
aldeias. O chamamento dos primeiros apóstolos, após lançamento do cerne de suas
preleções, tem também um sentido profundo. Com efeito, isto significa que Jesus
desde o início de seu apostolado escolheu discípulos que após seu retorno para
junto do Pai no dia de sua Ascensão, iriam prosseguir o seu trabalho no tempo e
no espaço. Na Galileia nasce assim uma evangelização que caracterizaria sua
Igreja séculos afora. Antes, como notou São Mateus Jesus havia deixado Nazaré e
fora morar em Cafarnaum uma cidade agitada, cruzamento de várias nações e
culturas, de variadas religiões onde imperava a diversidade e a desordem. Nem
sempre se observa que foi nesta região que Jesus escolheu os primeiros
colaborados, de plano, pescadores de peixes que deveriam se tornar pescadores
de homens de todas as raças e línguas. Ele os instruiria e por isto o evangelista
diz que aqueles rudes homens simplesmente se puseram a segui-lo. Caminhariam junto
com Ele abertos à diversidade, aprendendo que não há maior amor do que dar sua
vida pelos que precisam de conversão, como os excluídos da sociedade, os que
têm fome de esperança. Conflitos e tensões haveriam de existir no seio de sua
Igreja, mas nada deveria impedir a expansão do Evangelho. Inúmeros movimentos
evangelizadores se sucederiam através dos tempos. Deste modo, por exemplo, com o Concílio
Vaticano II o notável apostolado dos leigos foi incentivado com todos os seus
desdobramentos. Atividades apostólicas que propendem para o grande anseio de
Cristo: a extensão e a consolidação do reino de Deus. Todos cooperando para a expansão
deste reinado porque todos somos súditos deste soberano Senhor. Para todos há
lugar nos mais diversos ramos de apostolado, segundo o carisma próprio de cada
um. Assim pela prece, pelo exemplo e pela palavra surgem maravilhosas conversões.
É preciso, de fato, que o desejo de Jesus ressoe por toda parte: “Convertei-vos,
porque está próximo o reino dos céus”. * Professor
no Seminário de Mariana durante 40 anos.
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