01 O MILAGRE EM CANÁ DA GALILEIA
Côn.
José Geraldo Vidigal de Carvalho*
Todos
os pormenores do célebre milagre operado por Jesus em Caná da Galileia são
profundamente significativos e, entre eles, aquilo que sua Mãe falou aos que
serviam os convidados daquela festa de casamento: “Fazei tudo que Ele disser”
(Jo 2,1-11). Ao pedido de Maria, sua Mãe, Jesus antecipou o momento no qual ele
devia começar a revelar sua glória, seu poder divino. A ordem dada por Cristo,
por certo, causou estranheza àqueles serventes: “Enchei de água essas talhas”.
Eles as haviam esvaziado após as abluções rituais dos convivas e ali estavam
seis vasilhames vazios, podendo cada um conter cerca de 40 litros. Adite-se que
os convidados já estavam à mesa e, portanto, se tratava aparentemente de um
trabalho inútil. No entanto, Maria, mais pelo acento afetivo da voz do que
pelas palavras, lhes havia convencido a obedecer fielmente o que seu Filho lhes
mandaria fazer. Por isso encheram logo as talhas de água, tendo Jesus ordenado
que as levassem ao mestre da mesa. O milagre havia sido realizado e Cristo se
serviu da ação daqueles serventes para proporcionar a todos naquela festa um
vinho de superior qualidade. Aquela bebida mereceu inclusive a congratulação ao
esposo que tinha invertido a ordem, oferecendo o vinho melhor depois de um
inferior. O Evangelista não desceu a outros detalhes nem mesmo como o papel de
Maria foi reconhecido. Muito sobriamente menciona que aquele foi o primeiro dos
sinais operados por Jesus que manifestou a sua glória e que os discípulos
creram nele. Ressoa, porém, as palavras
de Maria: “Fazei tudo que Ele vos disser”. Aí o segredo de uma espiritualidade
profunda dos que querem, de fato, seguir Jesus, ou seja, fazer em tudo a vontade
de Deus. Mais tarde Jesus ensinará a rezar ao Pai que está nos céus: “Seja
feita a vossa vontade”. Esta liberdade do coração que quer em tudo o que Deus
quer é uma das lições deste episódio em Caná. Trata-se da obediência salvífica
e, assim, o fiel pode tudo, como asseverou São Paulo: “Eu tudo posso naquele
que é a minha fortaleza” (Fil 4,13). A adesão completa aos desígnios de Deus
comunica a cada cristão um vigor sobrenatural conferido pela graça,
nobilitando-o, unindo e coordenando todas as ações num sistema de vida
compacto, totalmente inspirado na submissão ao Senhor de tudo. Cumpre esvaziar
as taças do vinho velho da desobediência aos mandamentos para que Jesus nelas
coloque o vinho novo da adesão completa aos preceitos divinos. Para que isto
ocorra é imperiosa a presença mediadora de Maria que se tornou para todos um
modelo, ela que havia dito ao Arcanjo Gabriel: “Eu sou a serva do Senhor, faça-se
em mim segundo a tua palavra”. Ela alcançou em Caná aquele milagre da parte de
seu Filho graças à sua grande humildade. Muitas vezes na vida dos seguidores de
Cristo é a falta desta virtude basilar que leva ao desprezo dos dez
mandamentos, julgando-se a criatura mais sábia do que o Criador de tudo. Quem
imita a submissão de Maria abre todas as possibilidades da ação de seu Filho
que pode então agir e operar maravilhas. A seu Filho, lá em Caná, ela não deu
uma ordem, mas simplesmente expôs uma situação: “Eles não têm mais vinho”.
Quantos, porém, querem trazer Deus a seu próprio tribunal, ignorando inclusive
que somente Ele sabe o que é melhor para cada um. Há até aqueles que fazem de suas preces
imposições ao Senhor Onipotente, julgando-se merecedores de tudo, esquecidos de
que é preciso primeiro purificar o coração, afastando tudo que desagrada a
Deus. É necessário ao orante ajustar sempre a própria vida à vontade divina
para tudo alcançar de seu Senhor, a quem deve manifestar uma confiança
absoluta,envolta numa resolução sincera de mudança de vida. Adite-se que Maria continua através dos
tempos a ser a poderosa intermediária e recorrer a ela significa poder sentir
os efeitos de suas súplicas maternas junto de seu Filho, como ocorreu em Caná
da Galileia. * Professor no Seminário de
Mariana durante 40 anos.
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