SAL
DA TERRA, LUZ DO MUNDO.
Côn. José Geraldo Vidigal de
Carvalho*
Jesus,
grande pedagogo, empregou duas imagens significativas para caracterizar seus
seguidores: “Vós sois o sal da terra [...] Vós sois a luz do mundo” (Mt 5,
13-16). Já no antigo mundo bíblico o sal era apresentado como um produto
precioso, por dar gosto aos alimentos, sendo importante agente de conservação. Ao
empregar esta imagem, Cristo quer que seus discípulos deem ao mundo o gosto e o
ardor difundido pelo seu ensinamento, conservando sempre a plenitude da verdade
que Ele veio proclamar ao mundo. Assim sua doutrina se torna desejável, porque salvífica.
Além disto, a Bíblia mostra que se utilizava o sal para concluir um pacto, uma
aliança. Lemos no Levítico: “Toda oblação que ofereceres será temperada com
sal, e não deixarás faltar em tua oblação o sal da aliança com o seu Deus” (Lev
2,13). O cristão selou com o Criador uma
aliança e, por isto também, se faz sal da terra, anunciando a amigável união do
Senhor com seu povo redimido. Aliás, o Antigo Testamento já falava de uma “aliança
de sal”. Deus disse a Aarão: “Todos os
tributos das coisas sagradas que os filhos de Israel oferecem ao Senhor, dou-os
a ti, a teus filhos e a tuas filhas por direito perpetuo; é um pacto inviolável, pacto de sal, eterno diante do Senhor contigo e por ti com
os teus descendentes” (Num 18,19). Por causa da fidelidade ao pacto divino, o
cristão, sal da terra, deve ser fiel, leal, a seu Senhor. Trata-se de uma
relação permanente. Grande então a responsabilidade dos batizados. É por isto
que se canta num dos hinos penitenciais: “Quem não te aceita quem te rejeita,
por não crer por ver cristãos que vivem mal. Cristo piedade!”. Jesus alertou:
“Se o sal se tornar insípido, com que se lhe há de restituir o sabor”? Eis porque o aludido cântico acrescenta:
“Hoje se a vida é tão ferida, deve-se a culpa e indiferença de tantos
cristãos”. Um sal saudável como aquele que proporcionou a Jesus uma excelente
metáfora do fervor de seus discípulos, supõe, porém, toda sua vitalidade. Seus
seguidores deveriam ostentar sempre total constância, respeitando uma aliança, um
pacto firme com Ele de acordo com as promessas batismais. Aos colossenses São
Paulo aconselhava: “Que a vossa linguagem seja sempre cortês, temperada com
sal, de modo que saibais como deveis responder a cada um” (Col 4,6). Apenas
assim é que o cristão se torna ao mesmo tempo também luz do mundo, iluminando a
todos que estão a sua volta. De fato, as duas imagens do sal e da luz se
articulam admiravelmente uma com a outra. Será, contudo, sempre Jesus que
comunicará a todos o sabor, o elã, a vida e a luz verdadeira. A luz dissipa as
trevas, ela aclara tudo que ela toca, Cabe aos fiéis difundir por toda parte a
luz que vem do alto, combatendo as penumbras do mal e do pecado causados pela
ignorância, pela ambição, pelo egoísmo, pelo hedonismo. Entretanto, quanto mais
o cristão volta seu olhar para Jesus, mais luminosidade recebe e é
transfigurado por Ele. Deste modo, a ordem do Mestre divino se cumprirá:
“Brilhe a vossa luz diante dos homens, a fim de que, vendo as vossas boas obras
glorifiquem vosso Pai que está nos céus”. Para tanto é preciso a sinceridade de
um coração identificado com Ele. É deste modo que o cristão afasta a escuridão
da decepção, da fadiga, da indiferença, do temor e dos desentendimentos mútuos.
Torna-se um clarão luzente em casa, no trabalho, nos lugares de diversão,
enfim, onde quer que esteja. Por seus gestos, por suas atitudes os epígonos de
Cristo são chamados a exercer uma influência lucífera neste mundo. Do
contrário, seriam eles inúteis, lâmpadas debaixo do alqueire, e não sobre o
candelabro das boas obras para clarear a todos. Pelo seu testemunho de vida o
fiel comunica de maneira vital a beleza da história da salvação e os conteúdos
da fé da Igreja. Para que isto aconteça não há necessidade de notáveis
carismas. Basta que se façam de maneira extraordinária as tarefas ordinárias da
vida numa união profunda com Aquele que é a Luz que veio a esta terra envolver
a todos na sua iluminação. Desta maneira, se revela ao mundo os segredos da
sabedoria divina, a qual, segundo São Paulo, “está envolta em arcano, sabedoria
escondida, antes dos séculos” (1 Cor 2, 7). Em síntese, para ser sal da terra e
luz do mudo o cristão deve viver em função da graça de Deus, desta vida
interior recebida no Batismo, desenvolvida pela prática das virtudes, defendida
pela oração, fortificada pelos sacramentos. Torna-se assim sal da terra e luz
do mundo.* Professor no Seminário de
Mariana durante 40 anos.
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