A MISERICÓRDIA DO PAI
Côn. José Geraldo Vidigal de Carvalho*
Deus é Amor. Nele não há senão um Amor eterno que se manifesta de uma maneira toda particular: a Misericórdia. Esta palavra literalmente exprime o sentimento do coração tocado pela miséria do outro. A Misericórdia de Deus é seu Amor para com os pecadores, ou seja, aqueles que estão longe dele pela ignorância, indiferença ou mesmo hostilidade. As páginas do Evangelho revelam que Ele ama os seres racionais não obstante numerosos pecados, os quais suscitam Sua compaixão para com a humanidade transviada. No alto da Cruz Cristo, dando sua vida para salvar do pecado os que erram, é a manifestação suprema deste amor. São Paulo assim se expressou: “Deus que é rico em misericórdia, movido pela imensa caridade com que nos amou, restituiu-nos à vida juntamente com Cristo” (Ef 2,4-5). Foi o que lemos em São João: “Deus tanto amou o mundo que lhe deu seu Filho único [...] para que o mundo fosse salvo por Ele” (Jo 3,16-1). Foi para que todos compreendessem a largura, o comprimento, a altura deste sublime mistério que Cristo narrou a famosa Parábola do Filho Pródigo (Lc 15, 1-32), a qual pode bem ser chamada de Parábola do Pai misericordioso, na qual o Mestre divino patenteia o Coração de seu Pai. É de se notar que Jesus se dirigiu aos judeus piedosos e corretos que estavam a ponto de murmurar contra Ele que recebia os pecadores e tomava a refeição com eles. Estavam escandalizados pela proximidade de Jesus com as pessoas rejeitadas porque eram indivíduos que se apoderavam de bens alheios por manobras fraudulentas, autênticos escroques, ou aqueles que colaboram com os romanos, enfim os pecadores em geral. Jesus faz então menção a todos estes pecantes e mostrou como eram tidos com um olhar de clemência pelo Pai. O filho mais novo da Parábola pegou sua herança e perdeu tudo numa vida desregrada. É o que acontece com muitos batizados que recebem os dons de Deus e, depois, os malbaratam nos caminhos do pecado. Receberam no batismo e na crisma uma herança maravilhosa. A graça santificante, a plenitude dos frutos do Espírito Santo, mas preferem as coisas materiais, se engolfam nas suas ocupações e nos seus projetos terrenos e perdem o tesouro recebido. Muitos, num momento de reflexão, se sentem tomados pelo remorso e iniciam uma caminhada de conversão. Retornam ao convívio divino, porque perceberam que longe do Pai amoroso não há salvação possível. É o começo da salvação. Ao se reconhecer um pobre pecador, indigno e miserável, o cristão que havia se afastado de Deus volta a se imergir na sua bondade infinita e recebe o perdão. Compreende o que Jesus dissera: “Eu não vim chamar os justos, mas os pecadores” (Mt 9,13). Ainda que o filho mais novo tenha regressado por mero interesse, pois passava fome, a ternura do Pai o envolveu em manifestações de carinho. Longe de recriminá-lo, inclusive mostrando implicitamente o quanto lamentava sua ausência, ele, tomado de compaixão, restaura sua dignidade, envolvendo-o num grande amor. Dá-lhe uma roupa nova, para que retirasse a que estava manchada pelos seus erros. É o que deve acontecer sempre com quem se arrepende de ter pecado, rompendo com o mesmo e se purificando no sacramento da confissão. Nunca se pode duvidar da misericórdia de Deus que restitui a vida divina a quantos se penitenciam de seus desvarios. O filho mais velho não trilhava a mesma vereda do amor. Recrimina o pai, não vai à festa do irmão que voltara. À margem da misericórdia ele nem mesmo degustava o que possuía a ponto do pai ter que lhe dizer: “Filho, o que é meu é teu?”. Ele representa bem tantos cristãos que se limitam a fazer o mínimo necessário para não perder a graça santificante, mas não usufruem da presença de Deus em seus corações, não entram em tertúlia com Ele. Deste modo não saboreiam a felicidade de estar sempre na presença do Ser Supremo. Cumpre curtir o amor de predileção do Pai misericordioso e não ter o coração fechado como o do filho mais velho. Temer simplesmente a justiça de Deus e não confiar na sua misericórdia é colocar um entrave no progresso espiritual. A exemplo de Santa Teresa é preciso saber sempre escolher entre a Justiça e a Misericórdia, preferindo sem hesitar a indulgência de um Deus que é Pai misericordioso, que enviou seu Filho a esta terra para que todos tenham a vida e a tenham em abundância. * Professor no seminário de Mariana durante 40 anos.
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