A MISERICÓRDIA DIVINA
Côn. José Geraldo Vidigal de Carvalho*
Coube ao Papa São João Paulo II
fazer deste segundo domingo da Páscoa o
domingo da Misericórdia divina (Jo 20,19- 31). Se é verdade que esta
misericórdia sempre esteve no centro do mistério cristão, a canonização no ano
de 2000 da Irmã Faustina Kowalska trouxe a lume a urgência de se implorar o dom
desta comiseração em nosso mundo marcado por tantas tragédias. Asseverou a citada santa “que a humanidade não
encontrará a paz enquanto ela não se dirigir com confiança à misericórdia
divina”. O Papa sublinhou que a clemência divina nos ajuda a enfrentar três grandes dificuldade que deparamos na
nossa vida cristã. A primeira
dificuldade é compreender plenamente o mistério pascal sobretudo o da ressurreição,
Com efeito, muitos cristãos são tentados a seguir o apóstolo Tomé dizendo: “Se
eu não vir, eu não acreditarei”! Cada um
de nós recorda esta experiência a partir do Evangelho de hoje. Nossa
incredulidade, contudo, surge por causa de uma postura errônea, pois queremos
abordar a verdade revelada antes de fazer nela um ato de fé, Devemos pedir como
os Apóstolos “Senhor, aumenta a nossa fé” (Lc 17,5). O encontro entre Jesus e
Tomé narrado no Evangelho de hoje manifesta o dom da misericórdia divina que
permitiu ao Apóstolo uma atitude correta. Depois de ser convidado por Cristo a
colocar seu dedo nas suas chagas e sua mão no seu lado transpassado, Tomé
entrou na plenitude da confissão de uma fé sincera dizendo: “Meu Senhor e meu
Deus”. Confessando a humanidade e a divindade
de Jesus, Tomé não admitiu somente o que viu, mas também o que ele acreditou. “Bem-aventurados,
porém, os que não viram e creram.” Santo
Agostinho deixou então esta reflexão: “É preciso crer para compreender, mas a
partir daí é necessário compreender para crer”.
A segunda dificuldade apontada pelo Papa é descobrir que não é fácil
viver como cristão. Muitos têm o desejo de poder chegar à ressurreição
gloriosa, mas se esquecem que cumpre passar pela cruz, como ocorreu com Jesus.
Ele foi claro:” Se alguém quer vir após mim, tome a sua cruz e siga-me”. São Pedro evoca esta dimensão falando do dom
da fé que abre a uma bela esperança, mas também aos desgostos. Diz ele: “Por
isto exultais, embora sofrendo um pouco por hora, se necessário, diversas
provações, para que a genuinidade de vossa fé, muito mais estimável do que o
ouro que, apesar de efêmero, acrisola-se pelo fogo, resulta digna de louvor, de
glória e de honra, quando aparecer Jesus Cristo (1Pd 1, 6-8). Trata-se, realmente,
de uma absoluta fidúcia no Senhor Onipotente. Vemos no Evangelho de hoje que
Jesus é sumamente paciente com seus discípulos tão lentos em crer, uma vez que
os escolhe de novo e os envia em missão: “Assim como o Pai me enviou eu vos envio”.
Soprou sobre eles o Espírito Santo e fez deles os fundamentos da Igreja e da
presença da clemência divina. Ser fiel a esta vocação leva a descobrir o
mistério do sofrimento. Uma mensagem universal, pois a vereda do padecimento e
do silêncio é importante para o seguidor do Ressuscitado. Entretanto, a terceira dificuldade encontrada
na vida do cristão não é menos importante.
Esta dificuldade surge na nossa maneira de responder a essa questão: “Tudo
isto, no fundo, não é muito belo para ser verdadeiro?” Responder a isto
corretamente é entrar maravilhosamente no dom da indulgência divina. Jesus,
convidando Tomé a tocar suas chagas e seu lado aberto pela lança, não se
contentou em lhe mostrar a realidade de sua ressurreição, mas o levou a entrar
numa contemplação mais profunda. O Sagrado Coração de Jesus é verdadeiramente
uma fonte inesgotável de luz e de verdade, de amor e de perdão, conduzindo à
verdadeira vida, a vida eterna. Eis aí a sublime verdade, ou seja, Jesus não
cessa de querer que partilhemos sua imensa dileção. Deus quer que imensamente O
amemos, lembra São João Paulo II, a fim de nos fazer entrar na vida verdadeira,
Ele faz de nós pobres pecadores os convidados ao festim das bodas do Cordeiro.
Cumpre então procurar, acima de tudo e sobretudo, conhecer Jesus Cristo
presente em nós e no meio de nós que devemos acolher maravilhosamente suas
superabundantes graças, fontes da verdadeira luz, e levar a muitos à participar
destes eflúvios da misericórdia divina. A divina misericórdia favorece, deste
modo, maravilhosamente, a abertura à alegria e à esperança desse tempo pascal.
Isto porque a divina misericórdia não é somente uma lembrança, mas deve ser uma
norma de vida Deve guiar nossa existência de cristãos que confiamos estar em
harmonia com o Coração de Cristo “rico em misericórdia, *. * Professor o Seminário de Mariana durante 40
ano
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