segunda-feira, 27 de abril de 2020

A PORTA DAS OVELHAS


01 A PORTA DAS OVELHAS
Côn. José Geraldo Vidigal de Carvalho*
Jesus se designa “a porta das ovelhas” (Jo 10, 1-10) Esta definição de si mesmo é uma síntese de sua missão de salvador da humanidade, é sua identidade. Ele quer que seus discípulos nele vejam o genuíno Bom Pastor. Declara-se então como o único medianeiro entre Deus e os homens, porque somente por meio dele pode-se entrar no redil que garante a caminhada segura rumo ao Pai. Aliás, ele dirá que ninguém vai ao Pai senão por Ele (Jo 14,6). Quando Ele se identifica como a porta do seu redil está mostrando que no seu rebanho reina a liberdade e que suas ovelhas não temem nenhum perigo. Elas escutam sua voz. Podem ir e vir, pois Ele as chama cada uma pelo seu nome e oferece segurança e a vida em abundância. Ele se diz uma porta, mas porta aberta de entrada e de saída. Esta saída deverá ser sempre para irradiar seu amor e atrair novas ovelhas para seu rebanho.  Expressiva, portanto, a imagem da porta, pois salienta um aspecto essencial do ministério redentor do Filho de Deus. No Antigo Testamento a figura da porta foi utilizada para simbolizar a presença de Deus. Assim o profeta Isaias fala do dia da paz universal e descreve um tempo no qual “as portas serão sempre abertas, nem de dia, nem de noite elas serão fechadas” (Is 60,11). Davi assim se expressou: “Levantai, ó portas vossos frontões e aumentai em altura, antiquíssimas aberturas, pois deve ingressar o rei da glória” (Sl 24,7-10), Este rei da glória vem responder a todas as expectativas do Povo de Deus. Agora é por Jesus que há o “acesso ao Pai” (Ef 2,18). Cumpre então aproximar-se dele “com intenção sincera, cheios de fé, com o coração purificado da má consciência e o corpo lavado com a água pura”, como se lê na Carta aos Hebreus (Hb 10, 22). Jesus abre a porta da salvação que é oferecida gratuitamente a todos que se dispõem a segui-lo livremente e com muito amor e confiança. Ele oferece a verdadeira vida para que suas ovelhas a tenham em abundância. O Bom Pastor é o guarda atento e poderoso. Para suas ovelhas se abrem vários caminhos no sentido de oferecer a inúmeras outras a mesma felicidade de pertencer ao Bom Pastor. Paraísos ilusórios, artificiais, atraem e levam a abandonar a caminhada rumo à felicidade eterna sem passar por Jesus. Esta tentação se torna ainda mais perigosa no contexto atual. Cria-se uma imagem distorcida do verdadeiro Pastor que se identificou também como o caminho, a verdade e a vida. Eis por que é preciso renuncia a tudo que leva a se afastar do Reino de Deus. É preciso passar sempre pela porta que é Cristo e se entregar a uma conversão contínua para ter acesso às realidades do mistério infinito deste Reino de Deus. Cada etapa da vida da ovelha de Cristo significa assim também uma luta contra as ideologias que lutam versus o Bom Pastor, mas que, mais hora menos horas, se mostram desumanas e destruidoras. As grandes heresias dos primeiros séculos até as muitas seitas hodiernas, sem se esquecer de que as fatais filosofias errôneas tudo fizeram e fazem para impedir que se entre no verdadeiro redil pela porta que é Cristo. É necessário então não participar das infectas obras das trevas para poder se encontrar sempre aberta a porta do reino eterno, oferecido por nosso Senhor e Salvador, Jesus Cristo, o Bom Pastor. Nele é necessário confiar nesta grande e perigosa caminhada para a casa do Pai. É preciso então sinceramente visualizar sempre aqueles momentos nos quais Cristo não é a porta das decisões de cada um. Muitas vezes o que predomina é o amor ao dinheiro, aos prazeres pecaminosos, ao apego às coisas materiais. Deste modo, a analogia da porta leva a uma revisão de vida, buscando a coerência em tudo. Apenas Jesus é a porta que abre o sentido das palavras da Bíblia retamente interpretadas com as quais Ele alimenta as ovelhas que lhe pertencem. Todo cuidado é pouco para não se deixar iludir pelos falsos profetas que enganam com suas artimanhas e falsas promessas. Eis por que, além de alimentar suas ovelhas com a Palavra, Ele também pela Eucaristia quis se unir intimamente a cada uma delas. São Paulo viveu estas verdades tão intensamente que pôde afirmar: “Já não sou eu quem vive, é Cristo quem vive em mim” (Gal. 2,20). O ideal é então que cada ovelha que entra pela porta, que é Jesus, se assemelhe a Ele não apenas para o júbilo deste Bom Pastor, como também pelo crescimento de seu rebanho iluminado pela sua Palavra e pela Eucaristia. Deste modo, um dia se dará o seu desejo de que haja um só rebanho e um só Pastor. * Professor no Seminário de Mariana durante 40 anos.

segunda-feira, 20 de abril de 2020

O ENCONTRO DOS DISCÍPULOS DE EMAUS


O ENCONTRO DOS DISCÍPULOS DE EMAÚS
Côn. José Geraldo Vidigal de Carvalho*
A aparição de Jesus Ressuscitado aos discípulos de Emaús resultou na restauração da fé daqueles que estavam desiludidos diante de tudo que acontecera com o Mestre divino. (Lc 24,13-5). Eles não reconheceram Cristo naquele que se pôs a acompanhá-los na caminhada até a povoação para onde se dirigiam. Todo o episódio apresenta um comovente modelo de evangelização. Eles mesmos disseram depois: “Não nos ardia o coração no peito, quando ele nos falava pelo caminho enquanto nos explicava as Escrituras?”. Receberam uma catequese sobre a fé e a vida do cristão. É que eles haviam antes seguido Jesus, mas, na verdade, não O tinham verdadeiramente conhecido. Sua expectativa messiânica os havia cegado tanto que eles tinham enclausurado Jesus no modelo estreito de um libertador político, chefe de um reino temporal. Foi-lhes necessária uma explicação exegética, uma releitura das Escrituras feitas pelo próprio Cristo para lhes abrir o coração à percepção do plano divino de salvação. Entretanto, foi na refeição na estalagem, no momento da fração do pão,  memorial da vida do Redentor, partilhado num gesto de amor, que seus olhos se abriram. Refulgiu a realidade da Palavra divina, a qual já os havia iluminado pelo caminho. Instante sublime quando o encontro com o Ressuscitado, através de sua Palavra partilhada e de sua vida fracionada, que provocou a iluminação de sua fé. Isto animou a esperança deles em um novo reino instaurado pela redenção do Filho de Deus. Tudo isto foi também fruto do apelo que fizeram àquele peregrino num gesto grandioso de atenção: “Fica conosco porque entardece e o dia já está em declínio”. Outra mensagem maravilhosa de Cristo, pois a caridade é condição para se imergir na Palavra de Deus que deve ser vivida nas ações de cada dia. Missão cumprida, Jesus desapareceu da vista deles, mas eles estavam esclarecidos, fortificados e, então imediatamente voltaram para Jerusalém. Comunicaram o ocorrido aos onze apóstolos que confirmaram: “Realmente o Senhor ressuscitou e apareceu a Simão”. Cléofas e seu companheiro confirmaram que tinham reconhecido Jesus ao partir o pão. A experiência que tiveram seria a de milhares de seguidores do Ressuscitado através dos tempos. Isto no cotidiano de sua vida cristã, pontilhada de uma série de situações e acontecimentos proporcionados por Deus, visando a vivência plena da sua Palavra salvadora. Cumpre, de fato, aos cristãos ter olhos abertos e o coração sincero para estes encontros com Deus Isto, sobretudo, nos instantes do culto eucarístico, momento solene por entre o ritmo trepidante da caminhada de cada um neste mundo. Importantíssimos, portanto, os instantes reservados para as Missas dominicais e também nas Visitas ao Santíssimo Sacramento. Jesus é, realmente, o companheiro de viagem rumo à Casa do Pai. Ele sabe escutar as alegrias e sofrimentos, as esperanças e decepções, a riqueza e a pobreza que constituem a experiência da existência de cada um. É preciso sempre repetir a súplica dos discípulos de Emaús: “Fica conosco Senhor” e viver na sua presença santíssima, alimentados com o Pão Eucarístico. É preciso sentir sempre a presença do divino Redentor que toma a iniciativa do diálogo. O importante é saber escutá-lo como fizeram os discípulos de Emaús. Deste modo, o trabalho de cada dia ao invés de ser fonte de revolta, se torna caminho de redenção. A luz divina entra então na vida do cristão. Este passa a compreender como é importante estar unido a seu Salvador nestes encontros pessoais e vivificantes com Ele. Surge a consciência de uma missão que é anunciar como é bom estar com Jesus num testemunho de vida que arrasta os indiferentes para uma vida espiritual salutar e beatificante. Daí surgem a solidariedade, a fraternidade de todos aqueles que estão unidos ao Ressuscitado. Trata-se de um apelo a uma vida sobrenaturalizada que se abre aos outros. Cléofas e seu companheiro, instruídos por Jesus e alimentados na fração do pão, foram relatar aos outros seguidores do Mestre divino tudo que lhes acontecera, firmando também a fé daqueles que acreditavam que Jesus era o Filho de Deus. Ser testemunhas de Cristo Ressuscitado eis aí a tarefa sublime do autentico cristão. * Professor no Seminário de Mariana durante 40 anos.




domingo, 5 de abril de 2020

Páscoa

JESUS RESUSCITOU

Côn. José Geraldo Vidigal de Carvalho*

Júbilo imenso paira sobre a cristandade em festa, recordando um
episódio fundamental bem alicerçado na Sagrada Escritura: Jesus
ressuscitou (Jo 20-9; Mt 28,1-10). Significativo o fato das piedosas
mulheres e dos apóstolos irem até o lugar onde Jesus fora sepultado. O
sepulcro estava vazio. Um anjo e o próprio Jesus testemunharam que a
morte fora vencida.  Cristo ressuscitara imortal e impassível a dar
esta ordem: ”Não temais. Ide dizer aos meus irmãos que vão para a
Galileia e lá me verão”. A fé levou até ao Mestre vitorioso e o túmulo
vazio, mostrava como é importante procurar a verdade dos
acontecimentos. Isto tem sempre como resultado uma profunda esperança
que dilata o amor ao divino Redentor. As realidades deste mundo
enfraquecem a coragem, mas a visão do Ressuscitado leva a realidades
sublimes. Este foi, depois, o conselho de São Paulo aos Colossenses:
“Se, portanto, ressuscitastes com Cristo, buscai as coisas lá do alto,
onde Cristo está sentado à direita de Deus. Afeiçoai-vos às coisas lá
de cima, e não às da terra. Porque estais mortos e a vossa vida está
escondida com Cristo em Deus” (Col 3,1-3). As realidades terrenas
causam decepção, mas o apelo de Jesus repleta de coragem, pois Ele tem
sempre palavras de vida eterna, bem longe das ilusões terrenas. Tal o
seu legado sublime, ou seja, lá onde nada se tem a esperar, rebrilha
sempre a esperança luminosa que flui de um túmulo vazio, pois a
ressurreição de Jesus lança uma nova luz a inundar de felicidade seus
seguidores. Isto vem ocorrendo através dos séculos e transforma cada
contexto histórico num tempo favorável. Eis porque muitas vezes nas
Missas, após a consagração, os fiéis, com estas ou outras palavras
proclamam: “Nós anunciamos tua morte, Senhor Jesus, nós celebramos tua
ressureição, nós esperamos tua vinda na glória”. É que a Ressurreição
de Cristo é o ponto alto do mistério da salvação. Sua ressurreição é
um momento essencial da fé cristã no amor de Deus que se dá através
dos tempos ao mundo em seu Filho Jesus Cristo. É isto que as primeiras
testemunhas, Maria Madalena, Pedro e João foram encarregados de
anunciar a partir de sua descoberta de que o túmulo estava vazio e do
encontro que tiveram com o Mestre muito amado. Eles viram e creram.
Esta fé prossegue séculos afora. Dirá São Paulo aos Coríntios: “Se
Cristo não ressuscitou vã seria minha fé” (I Cor 15,17). Com Ele,
porém, vencedor da morte, o cristão vive totalmente para Deus. Mortos,
porém, para as incoerências e as aberrações morais suscitadas pelo
espírito das trevas. Mortos para o pecado, vivos para Deus em Cristo
Jesus (Rm 6,9-11), Eis porque o dia da Páscoa é um dia de alegria de
libertação de todos os males. Como bem lembrou o Papa Francisco, cabe
ao cristão disseminar pelo mundo afora estas mensagens gloriosas que
são germens de um mundo novo. (In A alegria do Evangelho, 278).
Reflitamos nesta verdade, proclamada por Laurette Lepage, de Québec:
“A pedra do túmulo foi retirada e deixa passar Aquele que está vivo.
Entre o céu e a terra fulge notável luminosidade que flui em milhares
de fagulhas. Jubilosa notícia lançada ao mundo como fermento, semente
e fogo. é um Deus que passa, um Deus que é passagem, Deus para sempre
no meio de nós. Aleluia”. De fato, este é o dia que fez o Senhor, que
ele seja para nós dia de festa e de alegria” (Sl 117,24). Como
proclama a Sequência da Missa, “O Mestre da vida morreu, mas, vivo,
Ele reina” Ele, realmente age nos seus seguidores, abre um caminho,
oferece a verdade e a vida. Dá aos que nele creem e O amam a
possibilidade de receber em suas vidas o Deus da vida. Foi procurado
no túmulo que estava vazio e pelos séculos afora seria encontrado nos
Sacrários das Igrejas e em todas as pessoas humanas. Ele seria sempre
o contrário dos ídolos que se apresentam sob todas as formas de
prazeres desordenados, do orgulho, da vaidade, das ilusões terrenas,
Ele e apenas Ele oferece sempre felicidade, alegria e paz. Em Jesus os
fiéis sempre encontrariam tudo que é preciso para alcançar sua
salvação eterna. Isto se dá nos corações que nele depositam todas as
suas esperanças. Nele se pode confiar. * Professor no Seminário de
Mariana durante 40 anos.

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