02 O RICO MAU E O POBRE LÀZARO
Côn. José
Geraldo Vidigal de Carvalho*
Na célebre parábola do rico mau e do pobre
Lázaro narrada por Jesus, Lázaro lembra o amor e a predileção divina pelos
indigentes, sobretudo os carentes de amor. O rico não havia compreendido a
razão de ser de sua vida e de sua missão (Lc 16,19-21). O endinheirado, cego
pelos bens terrenos, colocou toda sua esperança nos bens materiais deste mundo.
Ignorava que Deus esperava muito mais dele. Do pobre Lázaro Deus teve piedade
por ocasião de sua morte e o recebeu “no seio de Abraão”. No contexto desta
parábola o cristão é incitado a imitar Lázaro e não o abastado glutão. É assim
que se podem receber os dons magníficos do Senhor Onipotente. Trata-se de
reconhecer que tudo de bom que alguém possui vem do Espírito Santo, visando o
serviço divino e do próximo, levando-o à união com Deus. O rico só pensava em
si mesmo e nos gozos terrenos. Até
depois de sua morte pedia que Lázaro lhe enviasse gotas de água para lhe
refrescar a língua ressecada. Seu egocentrismo não o abandonava nunca. As
atitudes do homem mau desta parábola recordam a todos que temos somente uma
vida neste mundo e uma chance para conquistar a existência eterna feliz. Aqui
na terra o seguidor de Cristo deve ser um canal, um intermediário das graças
redentoras. Grande responsabilidade ser instrumento de Jesus para a salvação
dos parentes e amigos sem perder nenhuma oportunidade, mesmo porque a morte
estabelece um limite absoluto. É o instante no qual tudo ganha o seu verdadeiro
valor. Isto deve ser um referencial na vida de cada um, pois ao morrer se
totalizam todas as fidelidades ou infidelidades de uma existência. O rico da
parábola estava cego ao longo de sua trajetória terrena. Não pensava em Deus e
muito menos se apiedou Lázaro, coberto de chagas e que desejava matar a fome
com as migalhas que lhe caiam de sua mesa. Ao morrerem, porém, tudo muda. Ambos
estariam diante do Criador e Juiz infinitamente lúcido e coerente. Ele conhecia
a qualidade de vida e o coração de cada um. Agora um grande abismo separava o
bom e o mau. Antes, o rico ímpio teria podido ter socorrido o miserável pobre
Lázaro. Lá no outro mundo já não poderia
nada realizar, mesmo reconhecendo seus erros, dado que o tempo da conversão
passara. Nem mesmo seus irmãos haveriam
de se converter, porque ante a palavra de Deus através de Moisés e dos profetas
não se entregariam à prática da penitência e da caridade. Ainda que viesse até
eles algum dos falecidos eles não dariam crédito e não mudariam de conduta, não
sairiam de sua mediocridade. Toda a atenção é pouca, uma vez que somente o
Evangelho pode dar sentido à vida do cristão, envolvendo-o numa fúlgida
esperança. Apenas assim a vida não fica bloqueada numa fatalidade gerada por
uma riqueza mal empregada, ignorando o destino dos mais necessitados. Na
eternidade, contudo, anjos levando Lázaro para o reino de Deus e o rico lançado
no fogo eterno do inferno. Um esbanjou seus bens numa falsa felicidade, o outro
se viu coberto de desgraça. A situação após a morte modificou-se, pois este
último recebeu consolação e o outro justa paga por seus desatinos, um castigo
eterno. A trajetória nesta terra supõe a aventura da fé sincera, vivida
imensamente em todas as suas consequências, sobretudo no que diz respeito ao próximo.
É a luta contra o egoísmo, a ambição, o desinteresse pelos outros. Ao narrar
esta parábola Jesus concita a seus seguidores a tomar uma posição corajosa na
prática das virtudes por Ele ensinadas. Então o cristão não se vê preso ao
instante que passa, sai de seu egoísmo e procura tratar cristãmente seu
semelhante. Esta parábola, portanto, é um sério lembrete do Mestre divino que
adverte sobre a possibilidade de se perder a ventura eterna por causa do
desprezo para com os outros. Nesta parábola o rico vai para a condenação sem
fim porque sua vida foi passada no excesso da glutoneria e dos bens ilusórios
sem prestar atenção aos que passavam necessidade. Jesus ensina a importância de
agir em função da marcha rumo à Casa do Pai e não para a punição sem fim. A
transcendência do mandamento de Cristo de amar o próximo tem toda sua
importância à luz dos fins últimos de cada um, qual seja, a morte, o julgamento,
o céu ou o inferno. Uma vida superficial pode levar a encontrar escusas levando
a uma indiferença fatal para com os que estão em seu derredor. Muitos procuram razões
para justificar sua passividade diante das desgraças alheias, descurando a
prática das boas obras, vivendo a caridade fraterna. Pessoas idosas, doentes,
abandonadas tantas vezes à espera de atenções e cuidados. Cumpre a opção entre
amar a Deus e o próximo ou amar a si mesmo, ignorando os sofrimentos alheios. O
caminho que conduz ao céu é pavimentado com atos de caridade. O que faltava ao
rico da parábola era exatamente a dileção ao sofredor. O cristão, contudo, sabe
que, quando ele se interessa pelo outro, está escolhendo o próprio Deus. Então
fica aberta a porta da felicidade Quem tem o coração cheio de amor a Deus e as mãos
ocupadas no serviço do próximo, decifrou a grandeza da vida. * Professor no Seminário de Mariana durante 40 anos.
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