segunda-feira, 29 de abril de 2019

A TERCEIRA APARIÇÃO DE JESUS RESSUSCITADO


A TERCEIRA APARIÇÃO DE JESUS RESSUSCITADO
Côn. José Geraldo Vidigal de Carvalho*
Jesus Ressuscitado, junto do lago de Tiberíades, pela terceira vez manifestou-se a seus discípulos. (Jo 21,1-14). Pedro e seus companheiros trabalharam noite adentro e nada tinham pescado. Os apóstolos ainda estavam aturdidos com o que ocorrera com Jesus no Calvário e sua fé no Ressuscitado era ainda bem tímida. Jesus, que inicialmente não reconheceram, apresentou-se na margem e, para testá-los, lhes pede algo para comer e aqueles pescadores só tiveram uma resposta, dizendo que nada tinham a oferecer. .Ali, porém, estava o Senhor poderoso que havia multiplicado os pães e peixes no deserto e já havia, antes, promovido uma pesca- milagrosa (Lc 5, 4-11). Ele os instrui, pois, deviam, lançar a rede para o lado direito do barco. Seguiram a instrução e a pesca foi surpreendente. Entre as lições que este acontecimento oferece é preciso inicialmente fixar que nas horas de incerteza, de dúvida na vida pessoal, familiar ou comunitária frequentemente é necessário prosseguir na rota simples do cotidiano. É necessário não esmorecer e continuar agindo. Isto a partir dos elementos habituais das atividades próprias de cada um. Pedro afiançara, alto e bom tom, que iria pescar e seus companheiros resolveram ir também. Houve então um trabalho de equipe e, mesmo que nada tivessem pescado, aquele esforço lhes fora psicologicamente benéfico, apesar da fracassada tentativa de apanhar peixes. Foi quando se deu a presença do Ressuscitado. Aí vem outra mensagem de grande valia espiritual, pois, João, o discípulo amado, alma pura e simples, reconheceu que era Jesus quem ali estava: “É o Senhor”. Admirável, em seguida, a atitude de Pedro que imediatamente se lançou às águas para logo estar com o Mestre divino, nadando para chegar depressa à margem. Naquele momento Pedro já fazia um ato de fé no Senhor Ressuscitado e compreendeu que devia entrar no estilo de Jesus, sempre pronto a ajudar aqueles que nele creem. Os sinais do divino Redentor surgem nos acontecimentos da vida de cada um, no seu cotidiano e felizes os que captam suas mensagens sublimes percebendo o dinamismo de Jesus que visa sempre aprofundar a espiritualidade de seu discípulo. Naquele momento em que o próprio Cristo toma o pão e o peixe e os dá àqueles pescadores maravilhados com o que estava acontecendo eles entram numa atmosfera meditativa, silenciosa. Pedro inclusive estava então preparado para receber a chefia do rebanho de Cristo. Aqueles foram momentos de uma familiaridade comovente e de profunda proximidade do Mestre vencedor da morte. Este Senhor poderosos a convidá-los a comer com Ele era algo surpreendente. Uma cena tocante, pois não se tratou de uma aparição cintilante de luz fazendo brilharem as vestes de Jesus. Tratava-se de gestos e de palavras da vida do dia a dia. O Ressuscitado se mostra aos discípulos e deles se aproxima como o fazia antes nos dias de sua trajetória terrena. Os liames com Ele não haviam desaparecidos, mas simplesmente transformados. Como nas outras duas aparições anteriores Jesus se manifesta aos apóstolos com uma presença nova. Por isto os detalhes da narrativa de São João foram escritos para fazer compreender que esta presença de Jesus, após sua ressurreição era uma presença real, uma presença que ele queria fosse sentida na vida de todos os seus seguidores em todas as suas atividades cotidianas. É preciso, de fato, perceber Jesus Ressuscitado nas ocupações habituais, no trabalho, nas conversas pessoais ou pelo telefone, ou pelo Twitter, ou pelo Facebook.  Ver Jesus Ressuscitado nos amigos, nas crianças, nos jovens, nas pessoas idosas. Contemplar Jesus, sobretudo, em casa no convívio familiar. Com efeito, Ele continua a se manifestar no contexto histórico de cada um como o fez para os discípulos a beira do lago. Ele quer uma resposta de amor e de fé. Com ternura Jesus disse à beira do lago aos apóstolos: “Vinde comer”. Presente na Eucaristia, no Pão e no Vinho consagrados, Ele alimenta em cada participante da Missa a fé na sua presença. A Igreja renova então a exclamação do Apóstolo João: “È o Senhor”! Eis “o Cordeiro Imolado, digno de receber poder e riqueza, sabedoria e força, honra, glória e benção” (Ap 5,12).  Nele nós podemos confiar, pois está sempre ao lado dos que nele creem e O amam. *Professor no Seminário de Mariana durante 40 anos.

terça-feira, 23 de abril de 2019

A DIVINA MISERICÓRDIA


A DIVINA MISERICÓRDIA
Côn. José Geraldo Vidigal de Carvalho
Neste domingo da Divina Misericórdia escutamos no Evangelho que Jesus Ressuscitado se manifestou aos Apóstolos e lhes dá a paz (Jo 20,19-31). Repete duas vezes “a paz esteja convosco”. Isto significa que esta saudação traz consigo uma mensagem especial e um projeto de vida. Trata-se da paz que vem do Deus misericordioso. Não é simplesmente a ausência de violência ou uma relativa tranquilidade de espírito. É a paz profunda do coração reconciliado com Deus que sempre perdoa e quer envolver a todos na sua clemência de Pai cheio de comiseração. Eis porque solenemente Jesus conferiu uma missão especial ao colégio apostólico: “Como o Pai me enviou, eu também vos envio [... ] Recebei o Espírito Santo àqueles  a quem perdoardes os pecados  ficar-lhes-ão  perdoados; àqueles a quem os retiverdes, ficar-lhes-ão retidos”, O dom do Espírito Santo está ligado à presença do Divino Ressuscitado. Isto para que os Apóstolos e seus sucessores fossem perenemente os ministros do perdão. Cristo instituiu um sacramento que é a fonte mesma da indulgência do Senhor de tudo. Esta misericórdia é fruto do sacrifício que Jesus ofereceu na cruz pelos pecados do mundo. Note-se que oito dias depois, quando novamente Jesus se manifestou aos Apóstolos e Tomé estava presente, expressivo o que Ele disse ao seu seguidor incrédulo, mandando que ele tocasse nas suas chagas agora gloriosas. De fato, Cristo Ressuscitado é o mesmo Jesus de Nazaré elevado da terra sobre a cruz, o qual de seu lado traspassado pela lança fez jorrar a vida para a humanidade. Aos fariseus Jesus havia declarado: “Ide aprender o que significa: “Quero misericórdia e não sacrifício, porque não vim chamar os justos, mas os pecadores” (Mt 9,13). Portanto, na luta diária contra o pecado cumpre reconhecê-lo como o Deus misericordioso e imergir nesta misericórdia infinita numa certeza cega como dizia Santa Teresinha de Lisieux. Quando no ano de 2000 o Papa São João Paulo II decidiu que no segundo domingo da Páscoa fosse nele comemorado a Divina Misericórdia, sua intenção foi que todos fizessem a experiência do perdão de Deus no qual se deve depositar a mais absoluta confiança. Fica então aberto o caminho da conversão e da renovação do coração movido por um sincero arrependimento. Com São Tomé pode então o cristão repetir diante do Ressuscitado: “Meu Senhor e meu Deus”! Trata-se de proclamar sinceramente a fé, estabelecendo um liame íntimo com o Vencedor da morte que vem a todos os que amorosamente O invocam. Esta relação pessoal com Cristo resulta então de um arraigado amor garantia de uma vida nova fruto da vivência pascal intensa. Tal deve ser a convicção dos que acreditam num Deus rico de misericórdia como falou São Paulo aos Efésios (Ef 2.4). Daí resulta a esperança que oferece a todos a possibilidade de enfrentar  as dificuldades da vida apesar das fraquezas humanas.  Reina, desta forma, a reconciliação consigo mesmo, com Deus e com o próximo, afastado todo desalento, toda falta de perdão, expulsa definitivamente qualquer queixa quanto às atitudes alheias. É que a partir da verdadeira compreensão da misericórdia de Deus é possível irradiar por toda parte a serenidade e a paz. Deste modo, as maravilhas do amor divino envolvem todas as ações de quem tem fé. Desta maneira Deus nunca se torna um estrangeiro na existência do cristão. Quando com Tomé o discípulo de Jesus Ressuscitado lhe diz “Meu Senhor e meu Deus” toda espécie de ilusão terrena se dilui. Muitos são tentados a procurar um Deus longínquo, no impossível de suas imaginações, quando, na verdade, Ele está bem perto daqueles que bradam “meu Senhor e meu Deus”. Ele quer realizar prodígios nas mais pequeninas ações de cada um, pois a seus olhos não há separação entre o cotidiano e o eterno, mesmo porque quem vive na sua presença só opera o bem e vai construindo sua salvação na eternidade. O sim dado a Deus não pode passar pelas dúvidas de São Tomé, mesmo porque Jesus lhe afirmou solenemente: “Bem-aventurados os que não viram e creram”. Nem todos têm percepção das graças que continuamente recebem. Não se trata de ver e tocar as chagas de Cristo como antes queria São Tomé, porque é no coração que se devem guardar as maravilhas divinas, jamais duvidando de sua misericórdia. * Professor no Seminário de Mariana durante 40 anos.


segunda-feira, 15 de abril de 2019

CRISTO RESSUSCITOU


01 CRISTO RESSUSCITOU
Côn. José Geraldo Vidigal de Carvalho*
Por entre o júbilo pascal fulge a magna verdade da fé dos discípulos de Cristo, pois se não existisse a ressurreição de Jesus, não existiria o cristianismo. Grandiosa a mensagem que fluiu de um túmulo vazio. Diz o Evangelista que Pedro diante do sepulcro no qual não estava o corpo do Mestre, “viu e acreditou” (Jo 20, 1-9).   Jesus havia dito a Marta “Eu sou a ressureição e a vida” (Jo 22,25) e Ele, de fato, depois morto e sepultado, ressuscitou imortal e impassível. Sua vitória sobre a morte inaugurou um mundo novo no qual a morte foi vencida, tendo raiada para seus seguidores a certeza de idêntico triunfo. São Paulo, portanto, com toda a razão interrogou: "Onde está ó morte a tua vitória, o teu aguilhão?" [,,,] e concluiu: “Graças sejam dadas a Deus que nos deu a vitória por meio de nosso senhor Jesus Cristo” (1 Cor 15, 58.-59). Todas as gerações cristãs proclamariam esta realidade sublime, pois à Ressureição de Cristo é o fundamento da esperança na felicidade além-túmulo. Com efeito, o divino Ressuscitado é o mesmo que foi Crucificado. É que a festa de Páscoa supera de muito a dor da Sexta Feira Santa. Não houve Ressurreição sem a Cruz. Na verdade Cristo levou ao extremo seu imenso amor para com todos os homens através do preço do sofrimento e da morte para que raiasse a glória da Ressurreição, ostentando seu poder grandioso em toda a sua plenitude. É o mistério sublime do humano e do divino e a Ressurreição de Cristo vem decifrar e iluminar as vicissitudes humanas, proclamando que nada que é humano é banal, pois se torna semente da eternidade. O Ressuscitado abriu as portas da beatitude perene para todos que seguissem o seu caminho de Cruz o qual se tornaria um caminho de fé rumo a uma inefável alegria. Nos planos insondáveis de Deus foi necessária a morte de sexta feira santa, seguida do silêncio do túmulo onde o corpo do morto divino fora depositado, para que depois brilhasse a luz de seu esplendoroso triunfo. Sua ressurreição foi o final glorioso, o cúmulo de sua admirável dileção por nós, amor em profusão. Hoje cada um pode se ufanar e dizer que não é um vivo destinado à morte, mas um mortal ao qual está prometida uma vida sem fim junto de seu Redentor nas delícias do céu. É esta verdade que dá sentido à vida do cristão, não obstante as angústias, os sofrimentos e as dificuldades do dia a dia. Cumpre então irradiar por toda parte a fé no amor infinito de Deus, amor mais forte que toda a morte, acima de todo o mal que campeia mundo afora. Entretanto, a Ressurreição de Cristo ficaria inacabada se ela não fosse vivida intensamente no seu Corpo Místico, em cada um de nós. Cristo ressuscitado exige disposição interior, pois seu túmulo aberto mostra a necessidade que todos os cristãos tenham corações abertos, receptivos às inefáveis mensagens da Páscoa. Nas brumas do cotidiano Cristo Ressuscitado está a lembrar a todos que o Amor e a Vida são os únicos valores eternos, marcados com o selo de eternidade. Faz então jorrar a plenitude da adesão amorosa a todas as virtudes e a repulsa corajosa ao pecado. Em Cristo Ressuscitado é toda a vida do cristão que se encontra renovada. É preciso, porém, deixar Jesus agir através de sua graça, de seu poder, de sua misericórdia. Trata-se da presença de Cristo sempre atual, capaz de fazer rolar por terra os muros dos impasses que impedem viver em plenitude o mistério pascal, acolhendo-O como o eterno amigo e salvador. Para quem souber viver o mistério pascal, resplandece a esperança de um dia, no ocaso da passagem por este mundo, poder escutar estas palavras do Mestre divino: “Muito bem servo bom e fiel, entra no gozo do teu Senhor” (Mt 25,21). Isto significará então a vitória da Vida e do Amor sobre todas as forças da morte do corpo e da alma. Páscoa, deste modo, lança uma mensagem de coragem, de audácia e de alegria que, levada por toda parte, irradiará naqueles que titubeiam na fé a procura das veredas da autêntica ventura. Então o cristão se torna de fato teóforo, isto é, portador de Deus, filho de Deus, deificado pela presença do Ressuscitado. O mundo estará então mais iluminado! Isto porque no dia glorioso da sua ressurreição Cristo convida a todos a recomeçar a viver plenamente, a passar do medo à alegria, das trevas à luz, da morte à vida. * Professor no Seminário de Mariana durante 40 anos.

segunda-feira, 8 de abril de 2019

DOMINGO DE RAMOS E DA PAIZÃO DO SENHOR


DOMINGO DE RAMOS E DA PAIXÃO DO SENHOR
                             Côn. José Geraldo Vidigal de Carvalho*
Neste domingo celebramos dois acontecimentos opostos: a entrada triunfal de Jesus em Jerusalém e sua ignominiosa condenação à morte no alto de uma cruz. À apoteótica chegada de Cristo na famosa capital por entre o alvoroço do povo a liturgia apresenta sua saída desta cidade para ser crucificado, sendo grande a animosidade de muitos que antes o aclamaram. Há, porém, pontos comuns entre os dois fatos, envolvendo a volúvel multidão e Jesus, que deixam uma mensagem profunda no início da Semana Santa. Com efeito, nossa atitude de fé em Cristo Salvador deve nos levar a um olhar de uma crença inabalável na pessoa do divino Redentor. De fato, através dos tempos muitos cristãos se mostram receptivos àquele Jesus triunfante, mas não vivem o mistério de seus sofrimentos. Por vezes, acolhem com alegria Cristo e seu Evangelho e, depois, não se manifestam em plenitude como discípulos daquele que foi traído e morto por entre terríveis sofrimentos. É o contrate entre rezar a Deus: “não nos deixeis cair em tentação” e, depois, não evitar as ocasiões de pecado Muitos a se encherem de confiança no poder do Filho de Deus e, posteriormente, a duvidarem da eficácia de sua força salvadora. É a falta do olhar de uma fé profunda e abrangente. Será depois de seus sofrimentos humilhantes que, após sua morte, raiará o verdadeiro triunfo de Cristo que foi sua Ressurreição dentre os mortos. Eis porque é de suma importância penetrar fundo no valor único e universal da Paixão de Cristo. É por ela que se deu a reconciliação de Deus com os homens Cumpre ponderar as palavras de São Paulo: “Deus estava em Cristo, reconciliando consigo o mundo, não imputando aos homens os seus pecados e depondo em nossos lábios as palavras da reconciliação" (2 Cor 5,19). A paixão de Cristo foi fonte de salvação, fruto de um amor sem limites. Para alcançar a vida eterna é preciso a seu exemplo abraçar a cruz de cada dia para se chegar à vida eterna. Durante a Semana Santa é necessário que, perante os sofrimentos de Jesus, se tenha consciência da gravidade dos pecados para deles se arrepender e poder gozar das alegrias da Páscoa com um coração inteiramente renovado. A morte de Jesus deve ser uma lição de vida longe dos desvios éticos que podem manchar o cristão. Fechar o coração a uma tristeza vazia, a um dolorismo inútil, por causa dos sofrimentos de Cristo, mas abrir este coração à ação da graça regeneradora. O drama da paixão de Jesus revela a grandiosidade da paixão do amor do Criador que quer a salvação de todos. Aos pés da Cruz o Centurião, vendo o que tinha acontecido, deu glória a Deus, dizendo: “Na verdade este homem era justo” (Lc 23,47). Ele fora condenado injustamente  dado que era inocente e espelho de virtude.  Jesus foi fiel até à morte, fiel a seu amor infinito para com o Pai, fiel a seu amor infinito pelos homens. Ao aceitar livremente sua Paixão, Ele veio quebrar o dinamismo da morte e do pecado. Martirizado cruelmente em face daquela espiral de violência, Ele se mostrou a toda a humanidade como  quem ama e amará até o fim dos tempos aqueles pelos quais se sacrificou. Sobre cada ser humano Jesus crucificado lança um olhar de amor que convida a viver do amor de Deus e pelo amor a Deus. Cristo viveu sua Paixão e Morte em sua vida que foi uma vida entregue totalmente à missão que o Pai lhe confiara. Sua cruz, instrumento de sua Paixão, se tornou o sinal de seus seguidores, ela que foi o trono de sua glória. Ele era um rei que se fizera servidor. Um rei não como os outros reis, mas soberano que veio “para que todos tivessem a vida e a vida em superabundância”. Morrendo por todos os homens Jesus inaugurou um mundo novo. Contemplando a Cruz do Redentor é necessário entrar na lógica do sua dileção que conduz ao dom de si mesmo, ao acolhimento de todos como irmãos salvos pelo mesmo sangue salvador. Ao morrer por todos os homens Jesus inaugurou um mundo novo. Cada um de nós lá onde a Providencia divina nos colocou precisamos tudo fazer para que não tenha sido inútil tanto sofrimento do Filho de Deus. Chorar como São Pedro nossos erros e abrir os corações à conversão, estando sempre a serviço uns dos outros. Não lavemos as mãos como Pilatos diante das situações de provações e das tribulações inerentes a este exílio terreno. Então, sim, diante da Cruz do Senhor lançaremos onde estivermos o clamor do Centurião: “Verdadeiramente este homem era justo”, repetindo com a Liturgia “Jesus Cristo é o Senhor para a glória de Deus Pai” e esta será, de fato, uma Semana Santa. * Professor no Seminário de Mariana  durante 40 anos.



segunda-feira, 1 de abril de 2019

A CONDENAÇÃO DO PECADO E O PERDÃO DA PECADORA


A CONDENAÇÃO DO PECADO E O PERDÃO DA PECADORA
Côn. José Geraldo Vidigal de Carvalho*
No episódio envolvendo a mulher adúltera Jesus com sua autoridade fez fulgir a justiça e a misericórdia, quando com sua sabedoria escapou da cilada armada pelos fariseus e anistiou a pecadora dizendo-lhe: “Vai e doravante não tornes a pecar” (Jo 8 1-11). Escribas e fariseus, demonstrando serem feras espirituais da maldade, apresentam ao divino Redentor uma adúltera e, invocando a lei mosaica O interrogaram: “Mestre Moisés nos ordenou lapidar tais mulheres. Tu o que dizes?”. A armadilha estava bem armada. Com efeito, se Cristo a deixasse entregue à morte, além de ferir sua fama de mestre misericordioso, Ele estaria publicamente afrontando a autoridade romana que reservava para si, naquela época, todas as execuções capitais. Jesus nada respondeu e escrevia algo no chão. Diante da insistência de seus arguidores Ele lançou uma assertiva para eles desorientadora: “Aquele de vós que estiver sem pecado lhe lance por primeiro uma pedra”. Inclinou-se novamente e continuou a escrever no chão. Resposta sábia que pegou seus interlocutores a contrapé, citando também uma sentença do Deuteronômio que preceituava, no caso de uma sentença de morte, que as mãos das testemunhas fossem as primeiras a lançar a pedra sobre o acusado para fazê-lo morrer e, em seguida, a mão de todo o povo (Dt 17, 5-7).  Jesus remetia os escribas e fariseus diante de sua condição de pecadores. Não tinham, portanto, direito de punir a adúltera. Ao voltar Jesus a escrever no chão, um a um saiu a começar dos mais velhos, certamente os menos inocentes. Todos os acusadores foram embora e Jesus então proferiu solenemente o perdão divino, mas deixou clara sua recomendação à pecadora: “Vai e doravante não tornes a pecar". Esta admoestação valia para todos aqueles que se arrependessem de suas faltas, pois, de fato, com Deus não se brinca. Mostrar o arrependimento é antes de tudo e, sobretudo, estar disposto a fugir das ocasiões de pecado, como por exemplo, não entrar em sites pornográficos; não vencer a gula, infringindo o plano alimentar traçado por um competente nutricionista. A pecadora fora salva da morte pela intervenção de Jesus, mas agora era preciso que ela renunciasse á sua paixão, a suas loucuras e se entregasse a uma lealdade contínua. Esta é motora da conversão diante da misericórdia do Senhor. É óbvio que Deus, sendo Pai, está sempre pronto a perdoar, mas ninguém sabe até onde a reincidência nos vícios esgota a clemência divina. Eis aí a maravilha da redenção. Deus não se cansa de perdoar um coração contrito e humilhado, dando numerosas chances de conversão, mesmo porque um arrependimento amargo diante das recaídas no mal firma o bom propósito de emenda. Aos poucos quem cultiva o hábito do arrependimento passa a perceber o quanto é amado por Deus. Ao olhar sempre a Cruz aumenta o desejo de se entregar a Ele apesar da pusilanimidade humana. Se alguém, porém, se sente paralisado pela sua miséria espiritual passa a avançar na compreensão da infinita misericórdia daquele que é amor infinito. A condenação da própria consciência perante o recaimento no pecado se torna um momento de um mergulho no oceano imenso da clemência do Ser Supremo. Quem conserva a fé e humildade tem sempre a possibilidade de recomeçar uma vida nova como ocorreu com a mulher adúltera. É o instante da graça, da verdadeira liberdade que livra o ser humano da escravidão de sua perversidade. Então por mais que alguém se sinta pecador, estando só perante Jesus, descartando todas as invectivas do mal, todos os sistemas da maldade que impregna os meios de comunicação social, pode escutar a salutar palavra de Cristo: “Nem eu te condenarei, vai e doravante não tornes a pecar”. Eis aí a grandeza do dom que Deus faz de sua misericórdia a quem deseja suplantar seus desacertos, pouco importando a enormidade das faltas e das recaídas no mal. Através do profeta Isaías Deus deixou sua mensagem: “Deixai de recordar os acontecimentos antigos e do passado não tenhais cuidado. Eis que vou realizar um mundo novo que desponta. Não o reconheceis?" (Is 43,16-21). Ele quer total confiança para a vivência de um futuro mais santo, menos dependente das insinuações do espirito do mal. São Paulo bem entendeu isto e pôde afirmar aos filipenses que ele fora conquistado por Cristo. Ele era como um atleta que competia sem se prender ao passado. Avançava para frente para a meta a qual Deus lá do alto o chamava. (Fil 3,8-14). Estava inflamado de um amor tenaz e perseverante no bem. É que o caminho do seguidor de Cristo não é medido pelas suas falhas, mas a partir do olhar de Deus sobre cada um, sobre sua pessoa e não sobre seus erros dos quais se dispõe a sinceramente apartar, vencendo-os com a graça divina. * Professor no Seminário de Mariana durante 40 anos.