segunda-feira, 27 de julho de 2020


O DOM DO DISCERNIMENTO

Côn. José Geraldo Vidigal de Carvalho*
A Bíblia mostra que o dom do discernimento é a capacidade de compreender ou saber qualquer coisa pela força do Espírito Santo, podendo detectar os erros e o males escondidos em nós e nos outros. Leva então a encontrar e a fazer   o bem em todas as circunstâncias e a entrar no mistério de Deus, a compreender do interior da fé as verdades reveladas, tornando o cristão um verdadeiro teólogo. Faz com que se possa acolher com disponibilidade absoluta as surpresas de Deus. Impede a resistência às inspirações divinas. Cumpre, porém, sempre pedir a graça do discernimento   para que não se endureça o coração do fiel. Resulta então uma total fidelidade que conduz a um progresso espiritual contínuo. Para que se possa, porém, saber se algo vem do Espírito Santo ou do espírito do mundo ou do diabo é preciso captar as luzes celestiais que indicam o   que fazer e como fazer de acordo com a vontade divina, tudo julgando com sabedoria. É preciso que o cristão peça ao Divino Espírito Santo a graça de distinguir entre o bem e o mal, entre as motivações pessoais e as inspiradas por Deus. É necessário que se afaste corajosamente tudo que impede a entrega ao amor das coisas espirituais, pois é difícil para o invejoso, o preguiçoso, o impudico, o larápio, o difamador aderir ao bem. Eis porque se deve desejar que o amor   a Deus e ao próximo cresça dia a dia em sabedora e plena inteligência. Daí a importância do hábito de rogar sempre ao Espírito Santo a ajuda para saber o que realmente se deve fazer. Assim se pode adquirir aos poucos uma real maturidade espiritual. * Diretor Espiritual do JSC









01 O JOIO NO MEIO DO TRIGO
Côn. José Geraldo Vidigal de Carvalho*
Como o próprio Cristo explicou é Ele quem semeia a boa semente no mundo, mas o inimigo, o demônio, espalha o joio (Mt 13, 24-43).  Os obreiros da iniquidade, porém, serão punidos no juízo final com penas eternas. Até lá, no Reino de Deus nesta terra há o componente bom e o mau. Este último vem do uso errado da liberdade que leva a inúmeros males. Um dia, entretanto, haverá o triunfo definitivo do bem, quando os perversos receberão o castigo pelos desmandos cometidos, indo para o lugar onde por toda a eternidade pagarão pelos seus erros. Por isto, enquanto se tem tempo, é preciso cultivar as virtudes, vivendo de acordo com os valores sobrenaturais pregados pelo Mestre divino. Isto supõe vigilância continua e perseverança ininterrupta. Com efeito, a má erva com o passar do tempo se assemelha ao bom trigo e muitos se tornam incapazes de reconhecê-la com clarividência. O inimigo da salvação de cada um semeia os grãos do joio, como o desprezo dos dez mandamentos da sagrada lei divina, donde a falta de caridade mútua e a presença do egoísmo, das tristezas e de uma infinidade de desordens pessoais.  Se o cristão não para e se examina continuamente, seu coração fica dividido e pode gerar frutos bons, mas também os germes contrários à santificação. Disto resulta o desastre espiritual. Eis a razão pela qual não basta a vigilância, mas é preciso perseverança no combate imediato a tudo que se opõe à vontade divina e pode manchar a consciência. É necessária uma correspondência interrompida às inspirações celestes e não às insinuações demoníacas. Estas conduzem a muitas ilusões e levam ao caminho da perdição. A tentação deve imediatamente ser vencida quer no próprio coração, como ainda nas comunidades, nos grupos de reflexões, nos locais de trabalho. Em tudo, deve prevalecer unicamente o desejo do crescimento espiritual próprio e dos irmãos na fé sob as graças do Divino Espírito Santo. Deste modo, se dá a expansão missionária do campo apto ao bom trigo e a salvação se difunde para todos. Trata-se de uma jornada que exige muito tato, muita paciência e confiança na proteção de Deus nunca negada aos de boa vontade.  Estes não se deixam contaminar pelo joio que satanás espalha por toda parte, sobretudo em nossos dias através dos meios de comunicação social e das expressões desastrosas que vão corrompendo a mente dos discípulos de Jesus. No entanto, felizmente, grande é o número daqueles que querem possuir sempre um coração limpo das misérias espirituais, se refugiando na prece e na companhia daqueles que lutam por uma vida realmente cristã. Deus é paciente e aguarda o fim dos tempos para fazer o julgamento final. Assim também quem tem fé caminha nas estradas traçadas por Jesus, o divino semeador do trigo que será recolhido no celeiro do céu, vivendo cada batizado num processo de contínua conversão. É que perfeito e santo somente Deus que a todos, porém, dá a oportunidade de se corrigir logo que algum desvio é percebido, antes de se confundir o erro com a verdade. É preciso confiança porque Jesus disse claramente que Ele venceu o mundo Deixemos a Ele a última palavra em nossas vidas e o mal não ganhará espaço e cada um poderá ajudar os outros a cultivar a boa semente que possui dentro de si Isto com as armas do Evangelho oferecidas pelo divino Semeador as que         tornam, isto sim, possível progredir sempre rumo ao Reino Eterno. Jesus sempre estará ao lado dos que O temem e invocam. Estes se fazem sob sua proteção luz do mundo, sal da terra, uma plantação do Todo-Poderoso para servir à sua glória. Os filhos do maligno se empenham em obscurecer a luz e em anular a ação do sal salvífico. Jesus advertiu: “Guardai-vos dos falsos profetas que vem a vós em veste de cordeiro, mas por dentro são lobos rapaces” (Mt 7,15). Cumpre neutralizar suas ações perversas. Através da oração, por meio das boas ações do começo ao fim do dia, eis aí uma demonstração de que se é uma boa semente. Além disto, é preciso conhecer cada vez mais profundamente a palavra de Deus, abrindo o espírito a suas mensagens. Trata-se do progresso perseverante na santificação pessoal. Jamais fechar o coração à compreensão das realidades sobrenaturais. Eis como impedir que o inimigo lance joio na vida do cristão sempre atento às realidades sobrenaturais. * Professor no Seminário de Mariana durante 40 anos



O MILAGRE DOS PÃES
Côn. José Geraldo Vidigal de Carvalho*
Ao multiplicar os pães num lugar deserto e afastado Jesus não apenas demonstrou seu extraordinário poder, como também ofereceu a seus seguidores um gesto que levava a reflexões atinentes a outras passagens bíblicas (Mt 14,13-21).  Com efeito, trazia, por exemplo, à tona as cenas do maná que alimentava o povo no deserto, mostrando que a providência divina nunca deixa à mingua os que lhe pertencem. Lembrava também o milagre do profeta Elizeu que multiplicou pães para cem pessoas (2 Reis 4,43-44). Jesus inclusive se mostrava superior a estes servos de Deus, pois Moisés foi apenas uma testemunha da cena do maná e bem limitado foi o número de pessoas assistidas por Eliseu. Naquele momento Jesus visava também suscitar a fé nos moradores da Galiléia.  Estes não captavam a mensagem de seus milagres. Viam nele um poderoso messias, líder político, mas não o Filho de Deus, o salvador de toda a humanidade, o enviado do Pai. Conforme registrou São João no seu Evangelho a reação diante do milagre dos pães foi querer fazê-lo Rei. Entretanto outra era a intenção de Jesus com este prodígio, ou seja, suscitar a fé dos doze Apóstolos, inspirando-lhes sentimentos de comiseração para com os famintos, por todos que passassem por qualquer necessidade. Eis por que Ele lhes disse: “Dai-lhes vós mesmos de comer”. Jesus desejava inclusive fazer ver ao povo a fome da palavra de Deus, palavra que sustenta para a vida eterna. Já era uma preparação para que estes Apóstolos depois viessem alimentar seus seguidores com o pão eucarístico, pão vivo de seu Corpo que ressuscitaria imortal e impassível, mas presente para todas as gerações cristãs no Sacramento da Eucaristia, no qual se daria uma multiplicação muito mais admirável. Na véspera de sua Paixão, reunido com os Apóstolos no Cenáculo,outra  Jesus tomaria o pão, o partiria, o abençoaria e o daria aos Apóstolos, que assim repartiriam o pão em sua memória. Ali no deserto os discípulos, do que sobrou, totalizaram doze cestos cheios. Bela imagem do que se daria pelos séculos afora, pois nos sacrários das Igrejas sempre haveria o pão eucarístico que jamais faltaria a quem tivesse fé. Tal a felicidade dos que acreditassem no Reino messiânico que Ele viera instaurar nesta terra. Então se compreende melhor como a Eucaristia, o pão multiplicado, condensa para os cristãos toda a     história da salvação. A Eucaristia iluminaria a existência do verdadeiro seguidor de Cristo. Ele que demonstrou seu poder imenso alimentando no deserto mais de cinco mil pessoas, poderia também, ao tomar o pão no Cenáculo, dizer “Isto é o meu Corpo: isto é o meu Sangue”, dando em seguida uma ordem aos Apóstolos: “Fazei isto em minha memória”. Tratava-se de um memorial, de uma presença e de uma promessa de vida eterna. Antes, naquele  lugar deserto, diante de uma multidão que poderia passar fome, a estratégia dos Apóstolos era despedir os que ali se achavam. Para Jesus havia, porém, uma outra  solução e Ele afirma: “Eles não têm necessidade de ir embora”. É que Ele com sua onipotência haveria de providenciar o alimento para todos. Isto impelido Ele por sua compaixão, agindo conforme ditava seu coração amabilíssimo. Para os Apóstolos o problema era sério, mas Jesus não via problemas, limites. Ele contemplava uma multidão que atentamente ouvira sua palavra repleta de consolação, de esperança, de verdade. Promoveu então Jesus o festim da compaixão e ninguém ali haveria de passar fome. Esta seria a destruição da vida, mas ali estava o Senhor da vida e se dá então aquele ato miraculoso que ficaria para sempre na memória de seus discípulos através dos tempos, como, aliás, se dá conosco no dia de hoje. Felizes os corações que desejam estar assim com Jesus, que O procuram, em que O vêem sob os acidentes do pão e do vinho e, depois, passa a a irradira esta felicidade por toda parte. É que no encontro com Cristo no Sacrifício Eucarístico da santa Missa não apenas Ele alimenta a todos com sua Palavra, mas a muitos, que para isto se prepararam, alimenta também com o seu Corpo, Sangue Alma e Divindade na hora da Comunhão. Num e noutro caso, revelando-se um Deus de ternura e de misericórdia, lento à impaciência, cheio de amor e de verdade. * Professor no Seminário de Mariana durante 40 anos.