domingo, 4 de maio de 2014

ESCUTAR A VOZ DO BOM PASTOR
Côn. José Geraldo Vidigal de Carvalho*
Para se entender ainda melhor as metáforas empregadas por Jesus, quando ele se diz o bom pastor e fala que seus seguidores são suas ovelhas, cumpre, de plano, se façam algumas observações. Grande parte do território da Galiléia era um planalto com um solo rude e pedregoso. Servia mais para criação de ovelhas do que para a agricultura, embora a alimentação das reses trouxesse alguns problemas. Com efeito, a erva era rara e o rebanho devia permanentemente se deslocar. Eis porque a presença constante do pastor no meio de seu rebanho era necessária. O pastor então vivia fatigado, exposto às intempéries e, apoiado em seu bastão, estava sempre atento aos movimentos de sua grei e dos que poderiam roubar alguma de suas ovelhas.  Por isto na história de Israel o pastor adquiriu tal importância que. este título foi dado aos reis. No Antigo Testamento Deus mesmo foi representado como o pastor de seu povo, o que se lê em inúmeras passagens dos salmos e dos profetas. Cristo o escolheu como emblema de sua atividade missionária. A imagem ideal do pastor foi realizada plenamente por Ele que procura a ovelha perdida e tem piedade do povo porque o vê “como ovelhas sem pastor” (Mt 9,36). São Pedro chamou Jesus “o pastor de nossas almas” (1 Pd 2,25). Na Carta aos Hebreus Ele é mostrado como o Pastor por excelência (Hb 13,20). “De fato,  Cristo patenteia no Evangelho de hoje que suas ovelhas O conhecem, escutam a sua voz e O seguem”. Fogem, porém, dos estranhos, dos assaltantes. Se entre o ser humano e os animais há uma percepção notável, no relacionamento dos homens entre si isto resulta num processo ainda mais admirável. Escutar alguém é permitir ao outro ser ele mesmo e oferecer oportunidade para que ele se manifeste como é. É abrir o coração ao coração do outro numa empatia total, que é bem mais do que uma mera simpatia. É aderir ao que ele diz acertadamente e vibrar uníssono com seus sentimentos por vezes incomuns. É poder compreender sua riqueza interior,  sua experiência donde fluem mensagens enriquecedoras. Eis por que escutar a voz de Jesus é estar à espreita do que Ele nos quer dizer e do que Ele oferece vindo do silencio de seu coração amoroso através da Bíblia, do testemunho da Igreja, da trama dos acontecimentos cotidianos. Aí a razão pela qual, como a Esposa do Cântico dos Cânticos, a alma do cristão suplica: “Mostra-me, a tua face, faz com que eu escute a tua voz, porque  tua voz é doce e encantador o teu semblante”. Quando acolhemos os recados de Jesus, seu amor, seus preceitos, então Ele reconhece que somos seus. No batismo cada um nasce com Ele para uma vida nova. É marcado com seu selo divino. O que se esquece tantas vezes é que este engajamento leva uma aliança profunda com Ele, união privilegiada, mística. Isto supõe a fuga dos falsos profetas, dos pseudo-arquitetos de idéias, das comunicações  deletérias transmitidas pelos meios de comunicação social. É preciso, em consequencia, uma total disponibilidade para escutar a voz do Bom Pastor e segui-lo. Ser ovelha de Jesus é se colocar em condições de nunca se afastar dele para estar atentos à sua voz. Deste modo se pode mostrar ao mundo a vitória pascal no paradoxo da vida mais forte do que o poder da morte. Jesus proclama claramente  sua missão: “Eu vim para que tenham vida e a tenham em abundância”. Aí esta o motivo pelo qual, Ele se fez também o pão da vida e  à hora da Comunhão  o cristão é tocado pela  experiência espiritual por excelência e reconhece a voz de seu Senhor. É a hora de uma releitura da própria vida. Encontra então o batizado sua identidade profunda. Toma consciência de que faz parte de um rebanho e, portanto, o sentido comunitário deve marcar sua existência na marcha para os prados eternos.  Aquele que ouve a voz do Bom Pastor e o segue, arrasta infalivelmente outras ovelhas para junto dele. Há sempre, entretanto, risco do escândalo, da hipocrisia, do contra testemunho e todo cuidado é pouco, dado que uma ovelha que se afasta do Bom Pastor dele aparta também inúmeras outras. Resta, contudo, a certeza de que “uma alma que se eleva, eleva o mundo inteiro”! Saibamos ser fiéis ao Bom Pastor e atrairemos para junto dele as ovelhas tresmalhadas! Professor no Seminário de Mariana durante  40 anos.